*Rangel Alves da Costa
Já passado dos setenta anos, quase no pé dos oitenta, todo alquebrado, cheio de reumatismos e de pulsações, reclamando de afadigamento a toda hora, ainda assim se comprazia em dizer que era bom de cama.
Ele próprio não dizia, pois encarregava a esposa – que por sinal tinha idade pra ser sua filha ou neta – de espalhar (ou fantasiar) os seus dotes a todo aquele que em sua residência chegasse para uma visitinha.
A assistente social chegava e logo perguntava como ele estava de saúde, pois o achando mais pálido, mais desbotado de tempo, parecendo adoecido. Então ele se ajeitava todo e dizia se sentindo um menino, um rapazote.
Mas antes de terminar a invenção de si mesmo, beliscava a esposa ao lado – e este era o mote – para ele dizer: E bom de cama! Ele falava que se sentia na flor da idade, e ela dizia “e bom de cama!”.
Ele dizia que jamais havia sentido qualquer doença e ela ajuntava “e bom de cama!”. Assim, após ele afirmar qualquer coisa sem pé nem cabeça, ela tinha que concluir dizendo “e bom de cama!”.
Qual a intenção do velho ao agir assim? Logicamente para dizer que dava conta do recado com sua mulher jovem e bonita. Para afirmar, mesmo em divagação, que ainda possuía apetite sexual de um jovem e que sua esposa se realizava com seu vigor.
Ou será que era na tentativa de paquerar as visitantes, de falsamente seduzir aquelas que ali chegavam para uma visita ou algum ofício profissional? Não se sabe bem o motivo, o que se tem certeza é que o velho ficou até conhecido como o bom de cama.
Certa feita, ao ouvir aquele “e bom de cama!”, uma visitante logo perguntou se ele, naquela idade, trabalhava fazendo cama, como marceneiro, pois se fosse bom mesmo de cama ela encomendaria uma naquele instante.
No mesmo instante ele virou a cara, raivoso, demonstrando não ter gostado nem um pouquinho daquele entendimento contrário à sua insinuação. Então a mocinha saiu sem entender nada, imaginando apenas que ele realmente estava trabalhando na feitura de camas.
Noutra feita, chegando uma amiga da esposa desde muito sumida, após perguntar como ele estava de saúde, se tomava remédios ou consultava médico frequentemente, logo foi cortada para ouvir que até jogava bola nos finais de semana. E depois o “e bom de cama!”.
Então ela retrucou duvidosa: “Não entendi bem esse bom de cama. Significa dizer que o senhor dorme muito, que fica muito tempo deitado na cama, que gosta de estar estirado numa cama confortável?”.
Furioso com tais questionamentos, ele quase levanta num pulo para dizer: “Não, bom de cama por que...”. Só não disse o restante porque sua esposa intercedeu para acalmar os ânimos, dizendo: “Eu sei que ele é bom de cama. Durmo com ele e sei”. Disse enquanto piscava o olho pra amiga.
Mas um dia um padre chegou – velho amigo até de outras paróquias – e foi logo perguntando o motivo de todo mundo estar comentando sobre aquele “bom de cama”. O que significa isso, perguntou em seguida. Mas antes que ele falasse qualquer coisa, foi a esposa que respondeu:
“Seu padre, como sei que é pecado mentir, então vou dizer a verdadeira verdade. Meu nonôzinho é bom de cama mesmo, muito bom de cama, muito mais do que o senhor imagina. Primeiro dorme aqui e quando chega na cama já começa a roncar. Dorme feito um anjinho a noite toda. Por isso é bom de cama”.
O velho, raivoso virado na gota serena, fez menção de levantar, mas o reumatismo não deixou. Cheio de dor, disse apenas: Vou arrumar outra, vou arrumar outra mais nova do que você!
Escritor
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