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domingo, 26 de janeiro de 2020

O CASAMENTO DE LICOR



A fama de Lampião já se espalhava por todos os lados, e sua simples presença causava medo, onde quer que estivesse. Mesmo quando não tinha nenhuma intenção de cometer qualquer delito, todos se apavoravam. Foi assim em Nazaré, Pernambuco, no dia 31 de julho, um sábado.


Para esse dia, estava marcado o casamento de Maria Licor Ferreira, prima de Lampião, com Enoque de Menezes. O oficiante seria o padre alemão José Kherle, que tinha sua paróquia em Vila Bela, e viera especialmente para realizar a cerimônia, trazendo seu sacristão a “tiracolo”.


Lampião não havia sido convidado, mas mesmo assim resolveu comparecer, chegando a Nazaré em companhia de uns quinze homens. 

Os parentes e amigos já antevendo confusão tentaram convencê-lo a retirar-se, para não estragar a festa. Quase todos sabiam, ou desconfiavam que Lampião não via aquele casamento com bons olhos, já que era de conhecimento geral que ele nutria sentimentos especiais em relação à sua prima Licor. É óbvio que não era fácil convencer Lampião a fazer o que não queria, e ele foi ficando por ali mesmo, indiferente aos pedidos para que fosse embora.


Como não ia mesmo, foi servido um jantar para o grupo de cangaceiros, do qual até o padre chegou a participar, sentando-se à mesa, comendo e conversando com Lampião. Sua intenção era, aproveitando-se do respeito que os cangaceiros tinham pelos sacerdotes em geral, convencer Lampião a não ser causa de nenhuma alteração, pedindo-lhe que, à noite, saísse quietamente da vila, deixando a festa prosseguir.

Finalmente, depois de muita conversa, Lampião concordou em retirar-se, mas deixou no ar uma ameaça velada:

- Hoje, aqui, não se dança.

E saiu, levando para surpresa de todos, a sanfona do tocador.

Licor nos disse, em entrevista, que todos ficaram sem saber o que pensar, já que podiam esperar muita coisa de Lampião, menos um papel desses, privando os convidados de um bom baile. Dali para frente, para nervosismo de todos, de vez em quando aparecia um cangaceiro, observando o ambiente, como que para certificar-se de estarem dançando ou não.

Texto do livro De Virgolino a Lampião
Autores: Antônio Amaury e Vera Ferreira.


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