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terça-feira, 14 de outubro de 2014

LAMPIÃO - O Guerreiro que corria atrás do vento

Material do acervo do pesquisador Raul Meneleu Mascarenhas

Alguns historiadores em suas dissertações a respeito de Virgulino Ferreira, O Lampião, procuram mostrar que ele não era um guerrilheiro enquanto pensamento político e têm razão, pois se tornou cangaceiro pelas circunstâncias de rixas familiares e não por política partidária e alguns chegam a afirmar a maldade dele já estava no sangue desde jovem.

O que quero demostrar aqui, é que ele poderia até não ser um militante político que partiu para a luta armada, mas que era um guerrilheiro estrategista de primeira, ninguém pode duvidar.

Chegou até mesmo a ser reconhecido por um oficial combatente seu, onde desde a primeira batalha entre os dois, narrada por Frederico Bezerra Maciel em sua sextologia ‘Lampião, Seu Tempo e Reinado’ no segundo livro ‘A Guerra de Guerrilhas’ onde o Tenente José Lucena e Lampião ficaram temendo-se mutuamente. 

De sua parte José Lucena temendo  e receando a sagacidade de Lampião e da parte do temível cangaceiro, respeitando a força do Tenente pelo poderio bélico  e também sagacidade, pois nunca andava fora das estradas reais, usando dessa tática para não aventurar-se ‘no mato’, território do cangaço.

O relato abaixo se encontra no referido livro e dará a você leitor, uma visão das estratégias do Rei do Cangaço em batalha real com seu grande inimigo, José Lucena. Vamos visitar a história, lendo o relato:

ISCAS DE FOGO PARA LUCENA

Acompanhado de seus irmãos Antônio e Livino, deixou Lampião, mais uma vez, a sepultura de sua estremecida mãe, no cemitério de Santa Cruz do Deserto. Com lágrimas nos olhos e ódio no coração. Uniu-se, com seus dois irmãos, aos Porcinos, aos Marcos, a Antônio Fragoso e a seu tio Antônio Matilde, formando, com mais outros dois cabras do coronel José Abílio, um grupo de treze homens. Subiu o vale do Moxotó, cortando seus areais frouxos e escaldantes de semi-deserto, e a 1de junho de 1921, atacou Santa Clara (Tupanatinga), no município de Buíque. Em seguida, desceu o mesmo vale, passando pelo povoado de Caboclo e pela vila de Pau Ferro (Itaíba), e atravessou a fronteira alagoana do município de Mata. Grande acrescentado de mais quatro homens, agora num total de dezessete, cada qual armado de rifle e punhal e municiado com 450 cartuchos nutrindo as cartucheiras e amojando os bornais. A 5 de junho deu combate aos tenentes Optato Gueiros e Eutíquio na fazenda Pilão do Gato, sem prejuízos de parte a parte, a não ser de objetos. 

Depois atacou a residência de Firmino Brandão e levou o terror às populações sertanejas de Capiá, Maravilha e outras localidades e fazendas que, de sobrosso, corriam para Santana de Ipanema. Tudo isto Lampião fazia por estratagema, com o fito de atrair o tenente José Lucena para um ajuste de contas: — "Quero quebrar e sujicar o sedém deste peste de Zé Lucena".

Entrementes, em Jatobá de Tacaratu (Petrolândia), reunidos quatro oficiais de Pernambuco, capitães Teófanes Torres e José Caetano e tenentes Carneiro e Campos, e um oficial alagoano, tenente José Lucena, para consertarem, em ação combinada, combate eficaz a Lampião, com o acordo simultâneo das fronteiras interestaduais. De volta a Santana de Ipanema, saiu Lucena com uma volante de sessenta praças para ôlho Dágua do Chicão (Ouro Branco), ausente dez léguas a noroeste. Tendo disto notícia, frechou Lampião, com mais de vinte homens, numa disparada para ali. E a 9 de junho o atacou furiosamente qui ném onça faminta. Foi apenas um golpe de mão. 

O todo-poderoso Lucena, acostumado a correr atrás de cangaceiros, que dele se sumiam apavorados, ficou estarrecido com o atrevimento do ataque e a afoiteza da ofensiva inusitada. Por desforra, matou, em caminho, o pacato José Porcino, que não havia participado da luta. E, temeroso face às perspectivas de rumos desconhecidos e novos, que parecia a luta contra o banditismo tomar, requisitou destacamentos e volantes por perto, perfazendo sua força um total de cento e vinte praças bem equipadas. Por seu turno, Lampião arrebanhou mais gente, perfazendo um grupo de mais de quarenta cabras e com muita privinição de armas e munições.

A PRIMEIRA GRANDE BATALHA 

a) no rumo de Poço Branco

Passou Lampião pelo Espírito Santo (Inajá), deixando para Lucena pista visível e fácil. Vadeou o leito seco do rio Moxotó a uma légua de distância, e fez arranchação de pernoite na casa de seu amigo José Mandu, no Poço Branco, posição estratégica que escolheu para dar combate. Casa grande essa do Mandu, de varanda na frente, olhando para o sul. Na frente, o terreiro ligando-se com o caminho largo, variante da estrada real, que passa ao nascente, unindo Espírito Santo à Mata Grande, localidades separadas entre si por cinco léguas. Atrás, o rio Moxotó, largo, margeado de frondosas caraibeiras e graciosas palmeiras catolé, com suas flabelas farfalhantes encobrindo pejados cachos de pequeninos cocos amarelos. Um dos belos espetáculos daquela ribeira. 

b) base da emboscada

O despertar cedo, naquela madrugada fusca e fria de 20 de junho. Depois do café gordo, reforçado com muita carne-seca para dar sustança, distribuiu Lampião o seu pessoal por trás de pés de-pau, de pedras, de barrocas e cercas, as emboscadas para O combate. 

A casa com o curral, ponto mais difícil, porque perigoso, decerto seria o primeiro alvo visado pelo inimigo. Essa posição reservou ele para si. A direita da casa, oculto pela serroteira, seu irmão Antônio, com o bote pronto para dar retaguarda, operação esta de que me tornaria, depois, exímio mestre. A esquerda da casa, por trás das cercas de pedra, seu irmão Livino, vanguardeiro, peitudo, indômito. E, mais adiante deste, também camuflado no mato e atrás de pedras, Antônio Matilde.

A cada um coube dez a doze homens. 

Larnpiãó fez privinição quiném experimentado cabo de guerra: 

- "Os macacos não vêem todos juntos, não. Antônio Matilde, sustente no fogo os que chegarem no coice. A gente só faz fogo quando os primeiros chegarem na frente da casa. Espero o sinal meu. Não gastar munição à toa. Se a gente tem de fugir é por detrás, pelo rio. Mas esperem eu dar o sinal".

c) cabreirices de Lucena 

Em desde o Espírito Santo, vinha Lucena no rasto claro, certo e seguro, deixado por Lampião, na estrada de Tacaratu, paralela à margem direita do rio Moxotó. Mas, quando os rastos entraram no mato, em direção do rio, desconfiou de cilada ao mesmo tempo, assuntou que Lampião, tudo indicava, havia tomado o rumo da fazenda Poço Branco. Apiançando dar um golpe de surpresa pela retaguarda — a hora do dia cedo era favorável para pegar na desprivinição os cangaceiros —, mais que depressa voltou, vadeou o rio, tomando a estrada real que vai para Mata Grande e penetrando na boca do desvio que chega a Poço Branco. Mais uma vez desconfiando, fez alto. Por segurança, saiu caminhando por dentro do mato, beiradeiando a variante.

 d) a batalha

Todos os cálculos de Lampião deram certo. Lucena não o atacaria pelo outro lado, a retaguarda. Teria sua tropa dizimada no atravessar do leito seco e arenoso do rio. Acertou também: a tropa veio dividida. Na frente, Lucena com bem oitenta homens. Atrás, pouco distante, o tenente Enéias Barros com uns quarenta. Logo que a cabeça do pelotão de Lucena chegou defronte da casa, fez alto, a modo de observar, através do mato, aquele misterioso silêncio e de ganhar posição. Antes que isto acontecesse, Lampião deu o sinal convencionado com um tiro de pistola, rompendo o tiroteio da casa e do curral contra a tropa. Esta, num sufragante, deitou corpo e tratou, arrastando-se, de logo se mofumbar e entrincheirar para responder ao fogo. O pelotão de Enéias acelerou o avanço, mas foi detido pelo fogo de Antônio Matilde. A peitada não foi de graça, não. Parecia um ridimunho dos infernos! Na tiroteiação, balaços açoitavam as pedras num baticum enervante, ou assobiavam doidamente no meio do panavueiro chamando a morte, ou barbavam o mato, torando as folhas, estalando os galhos... Os cangaceiros, animosos, lançavam, no parraxaxá, desafios, insultos e xingos... gargalhavam sarcasticamente de mangação... rinchavam e zurravam feito animais...

Infuleimado o sangue com a quentura das armas cuspindo fogo e escoceiando nas detonações, as gargantas torturadas de sede com a abafação da atmosfera produzida pela pólvora queimada, os olhos zaros e ardendo e a vista alazã, sem trégua para tomar alento, depressa ficaram os combatentes bebos de raiva virando feras. Lampião levava vantagem dentro de melhores emboscadas, cuidadosamente escolhidas. 

Sob as ordens de Lampião, rápido deslocou-se seu irmão Antônio, com seus homens, bem agachados, para atacar, de retaguarda, o flanco esquerdo da tropa de Lucena. Ao impacto inesperado e violento, a parte atacada se desatou do grosso da tropa e recuou com cerca de trinta soldados.

Para salvaguardar a perigosa situação, destacou Lucena imediatamente uns quarenta soldados em contraofensiva. Nesse quando, chamando seu irmão Livino, tentou Lampião o envolvimento do flanco direito da parte da tropa de Lucena que ficara na linha de fogo. Oficial instruído em curso de caserna,  compreendeu Lucena o jogo tático de seu adversário: aniquilar ou afugentar sua tropa para, ao depois, cair sobre a do tenente Enéias. Realmente, muito tempo adiante, narrando a amigos aquela batalha, confirmou Lampião a sua intenção no momento. Isso, porém, não teria passado de mera tentativa se na ocasião tivesse ele, pelo menos, outro tanto do efetivo de Lucena e um poder bélico muito superior. Mesmo assim, saliente-se, nesse movimento de cerco dentro da batalha, talvez tivesse de sacrificar muita gente. Ademais, enquanto a polícia usava carabina-fuzil de longo alcance, semiautomático, e bala de aço de grande poder perfurante; Lampião utilizava rifle papo-amarelo* ou cruzeta, arma de repetição, que esquenta muito após quarenta tiros, de muito menor alcance, e bala calibre 44, de chumbo, chata, de poder antes rompedor que penetrante. Refez e uniu Lucena sua tropa fragmentada e, num trancão impetuoso de fogo cerrado, empurrou Lampião e seus irmãos para as linhas primitivas. Durante a contra ofensiva, houve um corpo-a-corpo, desesperado e sangrento: engalvinharam-se o valente cangaceiro Cavanhaque e um "macaco", rapidamente passando os dois apronto. 

* O rifle Winchester, desde 1866, ano de sua invenção 'por Oliver Ficher Winchester, que fundou no Connecticut a "Winchester Repeatring Arms Company", fez parte da história de todos os povos: Estados Unidos, México, Peru, Brasil, Chile, Argentina, Espanha, França, Rússia, Turquia, China... tanto na guerra, como na paz. Recorde-se sua adotação pela Polícia Montada do Noroeste dos Estados Unidos e pelo presidente Roosevelt nos safáris das selvas africanas... Mesmo depois de ter adotado o mosquetão ern 1926, • jamais deixou Lampião de utilizar .o "papo-amarelo", talvez porque arma mais fácil de conseguir. Tem o rifle esse nome por causa da pequena placa de metal amarelo — o papo — na parte infe-rior, a cujo impulso a cápsula salta para cima. Diga-se de passagem que se tornou muito conhecida, naquele tempo, a casa co-mercial "A Sertaneja", de Pesqueira, pertencente a Orestes de Almeida Maciel, a qual possuía permanente estoque de rifles e munição apropriada. Consultando-se o velho Arquivo Comercial da "A Sertaneja", chega-se a saber, através de faturas emitidas por Herm Stoltz e pelo Armazém do Caboclo. quais as armas então vendidas na referida firma: revólveres "Colt" (preto) e "Smith and Wess" (niquelado), americanos, calibre 32; revólver "Azul", espanhol, calibres 32 e 38; pistola "Comblain" (Fogopagô), belga 320 e 380; pistolas de pente:, "Mauser" (')Vf..ausa") 6,35 e 7,35, "Remington" 380, e "FN", belga, 6,37 e 7,35; rifle "Winchester"-7,44-..,(PaPo-amarelo); espingardas de caça ou de passarinhar (de 'cartucho), e^ (de I.a7s+rino, famoso milanês fabricante de espingardas no século XVI), de can° fino e comprido, de encher pela boca, em três cores, verde, amarelo e encarna4o. Para espingardas desse último tipo, vendiam-se também. acessórios: canos, fechos, varetas, ouvidos... além de espoletas BB. Note-se que a primeira pistola que apareceu no sertão foi levada por um Carvalho (cf. cap. 4, nota 7). Antes existiam apenas o bacamarte¡ e pistola de encher boca.

O sol se incrisava. 


Lampião verificando a munição ficando escassa, deu sinal de retirada — cinco tiros secos de pistola para o ar. Correndo agachados e atirando, os cangaceiros cruzaram o lençol de areia enxuta do rio e fizeram pousada num arredado perto, embiocados.

Lucena não saiu na inculca deles. Voltou, com a 'tropa em muxibas, trambecando, para Santana de Ipanema. Além dos dois mortos na luta corpo-a-corpo, não foi possível obter-se informação exata do resultado da batalha. A tarde se arriara, por coincidência, sombria e triste, envolta em tons arroxeados. E com ela, a catinga começava a adormecer, toda desarranjada e destroçada pelo espasmo da luta, parecente, de mesmo, um espojeiro de monstros anti-diluvianos...

e) oficial do Exército? 

A seu amigo, Padre José Bulhões, vigário de Santana de Ipanema, comentou Lucena a batalha do Poço Branco: — "Figurei, em dado momento da luta, que Lampião queria mesmo acabar comigo, Depois, diante de seus estratagemas, me veio uma dúvida: Não é possível! Seria mesmo Lampião o comandante? Ou esses cabras estão sendo comandados por  algum oficial estrategista de alta patente, egresso do exército?!...”

Classificou também ele, a retaguarda de Antonio Ferreira de “manobra magistral”.

Nova Ordem do Cangaço

Vemos nessa bela demonstração do grande estrategista que foi Lampião: A partir do ano de 1929, passou a acontecer uma das mudanças mais radicais no modo do famoso cangaceiro portar-se perante seus inimigos, vindo a tornar-se muito mais perigoso ainda. Mulheres passaram a integrar seu bando e ele passou a dividi-lo em grupos e subgrupos.

Que estratégia incrível para os padrões ‘cangaceirísticos’ daquela sua época. Ninguém ainda tinha feito isso. Eram uma espécie de clãs familiares e autônomos sob a direção de homens de sua inteira confiança. Era a Nova Ordem do Cangaço que se apresentava. Chamava menos atenção e seus inimigos não tinham a menor ideia onde ele se encontrava, pois o bando dividido, a população os via em muitos lugares e as autoridades ficavam sem saber onde centrar fogo, com números maiores de contingente.

Essa estratégia, ou por querer ou por necessidade e imposição do destino, fez que Lampião, perseguido sem descanso pelas Forças Volantes de Pernambuco, teve de fugir e refugiar-se na Bahia com cinco companheiros que lhe restavam e maltrapilhos e famintos ali chegaram para a recomposição mais espetacular de sua vida. Era o ‘Fênix’ que retornava mais forte e das cinzas ressurgia sua têmpera de ‘cabra macho’ que não temia ninguém .

Lampião veio a entender por conta da situação em que seus inimigos contavam com armas melhores e poderosas, que deveria mudar de estratégia. Em sua mente de guerreiro privilegiado e líder, compreendeu que já não tinha condições de dirigir um número considerável de cangaceiros. Além disso o  sertão ficava aos poucos modernizado, com estradas, vias férreas e pipocava o progresso. Sua vida e de seus cabras agora dependiam mais da ‘inteligence’ que de seus músculos, coragem e pontaria pois deixava aos poucos de ser um território virgem e impenetrável. O Governo estava agora em toda a parte com suas construções de progresso e sua ‘gana’ de exterminar o banditismo naquela região.

Élise Grunspan Jasmin em seu livro ‘Lampião, Senhor do Sertão’, veio a tecer um comentário de pé de página onde o chama de ‘O Guerreiro Sedentário’ justamente por substituir seus ataques violentos, embora vez em quando o fizesse, por essa nova ordem familiar tornando-se menos nômades.

Em suas notas, Élise Grunspan Jasmin aponta para António Silvino que tentara “resistir a construção da estrada de ferro pela companhia Great Western no sertão da Paraíba. Em 1906, ele perseguia os engenheiros ingleses encarregados de executar os trabalhos, ameaçava os operários, cortava os fios telegráficos, deteriorava as vias já instaladas e extorquia os passageiros do trem. Constatando a ineficácia de sua empresa, enviou uma carta aos diretores da Great Western por meio de Francisco de Sá, um de seus empregados, dizendo que permitiria a construção da estrada de ferro mediante uma indenização de 30 contos de réis. Ver, a esse respeito.

Sempre que tinha oportunidade. Lampião ameaçava ou assassinava os operários que trabalhavam nos canteiros. Em 1929. fez interromper a construção de uma estrada que devia ir de Juazeiro a Santana da Glória, CE, e que devia passar por seu refúgio predileto, o Raso da Catarina. Em outubro desse mesmo ano, constatando que sua ameaça não tinha sido levada em consideração, matou um dos operários. Em 1930, perto de Patamuté. BA. atacou um grupo de operários e matou um deles. Em 1932. no sitio Carro Quebrado, entre Chorrochó e Barro Vermelho, na Bahia. Lampião executou nove operários.

No Estado de Sergipe. em fevereiro de 1934, atacou operários e paralisou a construção da estrada. As autoridades governamentais nunca levaram em conta as ameaças de Lampião, e a partir de 1930 intensificaram os projetos de abertura do sertão ao "progresso". No dia 9 de junho de 1935, por ocasião de uma reunião organizada em Águas Vermelhas, na fronteira de Pernambuco. Carlos de Lima Cavalcanti, governador desse Estado, e Osman Loureiro, governador de Alagoas propuseram um plano de construção de estradas e vias férreas nas zonas do sertão afetadas pelo cangaço.

Elas deviam cortar sistematicamente em diversos eixos as regiões mais freqüentadas por Lampião e facilitar o transporte das Forças Volantes por caminhão, enquanto os cangaceiros se deslocavam quase sempre a pé. Os canais e as vias fluviais também deveriam ser controlados, pois permitiam o envio de armas aos cangaceiros. Lampião sabia que as conquistas tecnológicas com as quais as Forças Volantes tinham sido municiadas e a penetração das vias de comunicação através do sertão poderiam anunciar seu fim próximo e pôr em perigo sua autoridade na região (Informações extraídas das obras de Frederico Pernambucano de Mello, op. rir., 1985, e Quengo: !Amplio?, 1993).

Cristino Gomes da Silva Cleto, conhecido como Corisco nasceu em 1907 em Marinha de Água Branca, no Estado de Alagoas. e foi morto no dia 25 de maio de 1940, no Estado da Bahia, pelo tenente José Rufino. Da mesma forma que Jararaca. ele também chefe de subgrupo, Corisco tinha-se alistado no Exército em 1924, em Aracaju. Desertou, foi perseguido e encontrou refúgio no cangaço. Seu conhecimento das técnicas de guerra lhe valeu o interesse de Lampião, bem como sua confiança. Depois de inúmeras tergiversações. 

Corisco alia-se a Lampião em 1926. em Vila Bela (Pernambuco), e lhe permanecerá fiel para sempre. Em 1927 começou a dirigir um grupo de cangaceiros e sempre reivindicou certa autonomia com relação a Lampião, embora sempre o considerasse seu superior hierárquico. Segundo Frederico Pernambucano de Mello, como Lampião, Corisco se fazia chamar de "Capitão" e assinava assim os pedidos de resgate que dirigia a suas vítimas: "capitão Corisco, chefe de grupo dos Grandes Cangaceiros" (grad Frederico Pernambucano de Mello, op. rir., 1985, pp. 88-89). Corisco, o "diabo louro", distinguia-se por sua brutalidade e crueldade.

Depois do anúncio da morte de Lampião, que ele vingará mediante um ato punitivo de rara violência. Corisco tentou retomar o lugar deixado vago pela morte de seu chefe e procurou reestruturar os grupos restantes de cangaceiros. Essa tentativa redundou em fracasso, devido, principalmente à sua falta de diplomacia para com os coronéis e coiteiros. 

Sua morte anuncia a extinção definitiva do cangaço.

Em um artigo do Diário de Pernambuco de 11/6/1935 intitulado "Assentado Medidas para a Extinção do Banditismo", dedicado aos acordos firmados entre as forças policiais de Pernambuco e Alagoas, o major Lucena diz ao jornalista que Lampião dirigindo apenas um grupo de 30 a 35 cangaceiros, dividiu-o em pequenas unidades de 5 ou 6 homens. 

Outro artigo do Mujo de Pernambuco, datado de 24/11/1937, intitulado "O Problema do Banditismo na Zona Sertaneja" e ilustrado com uma fotografia do tenente Luís Mariano, feita possivelmente no sertão, também evoca a divisão do grupo de Lampião, divisão a que ele parece acomodar-se para levar uma vida tranqüila, dando-se o luxo de se esconder ou de se exibir em público como e quando lhe bem aprouvesse: "Lampeão nestes últimos tempos tem-se embrenhado nas caatingas do Estado de Sergipe e se demora principalmente nos municípios de Poço da Folha. [...] e São Paulo, sendo neste que o bandido chefe, faz com uma certa segurança o seu quartel general.

De vez em quando Lampeão, á frente de uma parte do seu grupo invade a Bahia, entrando ahi pelos municipios de Geremoabo. [...] Nessas excursões pratica grandes roubos e depreciações e, retorna aos logares que lhe servem de coito, onde descansa meus occulro e guardado por ectiteiros de sua absoluta confiança. [...] Depois de descansar a vontade em Alagoas. o bandido com seu grupo, procura ser visto nas caatingas de Aguas Bellas, esconde depois os rastros para promover a confusão, e desorientar os pequenos troços de volantes desorganizados. que o perseguem. Violentamente regressa ás caatingas de Alagoas. occultando-se de preferencia na zona do Serrote do Carié, Riacho do Canapy. Poeira [...] dos Municipios de Marta Grande e Pão de Assucar.[...] Enquanto Lampeão e sua Maria De Déa de José Felippe e meia duzia de bandidos descansam, os bandidos de nomes Corisco. Luís Pedro. Portuguez. Angel Roque. Moreno. Moita Brava, Chumbinho, Pedro Rocha e outros chefes de grupos matam, roubam, promovem incendios. praticando, enfim, toda sorte de miseria". 

Em artigo do Diário de Pernambuco. 11/5/1935. intitulado "Luís Pedro. do bando de lampeão. visitou Pernambuco. O prefeito de Macia Grande esteve sequestrado 15 dias — Virgulino está em Sant'Anna do Ipanema", faz-se referéncia ao rapto do prefeito de Mata Grande por Luís Pedro. o homem de confiança de Lampião, em troca de uma importância elevada.

Benjamin Abrahão

Um dos historiadores mais ousados de Lampião e seus cangaceiros foi Benjamin Abrahão Botto, que após a morte de Padre Cícero, solicitou e obteve do "Rei do Cangaço" a permissão para acompanhar o bando na caatinga e realizar as imagens que o imortalizaram. O próprio Lampião assegurou o testemunho, em um bilhete, de que todas as suas imagens eram produto do trabalho de Abrahão. Abaixo as palavras do cangaceiro escritas em um de seus famosos bilhetes:

Illmo Sr. Bejamim Abrahão

Saudações
Venho lhi afirmar que foi a primeira peçoa que conceguiu filmar eu com todos os meus peçoal cangaceiros, filmando assim todos us muvimento da noça vida nas catingas dus sertões nordestinos.
Outra peçoa não conciguiu nem conciguirá nem mesmo eu consintirei mais.
Sem mais do amigo
Capm Virgulino Ferreira da Silva
Vulgo Capm Lampião

Benjamin em seus trabalhos, diz ter encontrado vários grupos de cangaceiros, dentre eles o de Corisco, Zé Sereno e Gato, o que confirma a estruturação do grupo de Lampião em pequenas unidades relativamente autônomas. Ele fotografou os chefes dos grupos e os grupos separadamente. Apesar de esses diferentes "subgrupos" estarem com toda a evidência sob a autoridade de Lampião, não se conhecem fotografias apresentando o conjunto dos cangaceiros.

Devido então a esses testemunhos, vemos em Lampião um grande estrategista, que aprendeu na lida todos esses ‘truques’ que o tornaram um inimigo a ser respeitado pelas volantes e seus comandantes.

http://meneleu.blogspot.com.br/2014/10/lampiao-o-guerreiro-que-corria-atras-do.html

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Um comentário:

  1. Anônimo15:11:00

    Excelente material caro Mendes, enviado pelo pesquisador Raul Mascarenhas.
    Antonio Oliveira - Serrinha

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