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quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

UM TIGRE MAL-EDUCADO

Por Rangel Alves da Costa*

O homem eu sei que é bruto, arrogante, ignorante, feroz, voraz, bestializado e também muito mal-educado. Mas imaginei que com o tigre fosse diferente.

A falta de educação humana é disseminada entre mesmo o que há de melhor na espécie. Mas jamais imaginei que o tigre pudesse ser assim deseducado.

O homem eu sei que não se pode confiar, pois é astuto demais, ardiloso demais, traiçoeiro demais. De tudo ruim há no homem. Mas pensei que o tigre fosse diferente.

A esperteza humana é tamanha que o próprio homem quer passar a perna em si mesmo. Mas nunca imaginei que o tigre chegasse ao ponto de atacar a própria sombra.

O homem é predador por instinto, pois vive fazendo tocaia, emboscada, armando arapuca para traiçoeiramente pegar qualquer um. Mas tinha certeza que com o tigre seria diferente.

Por ser também da espécie animal, o homem muito se assemelha às feras mais perigosas, mais peçonhentas e mortais. Mas sempre imaginei que o tigre jamais desejou ser comparado ao humano.

A verdade é que a descrença no reino dos humanos - e pelas justificativas mais evidentes - faz qualquer inocente da vida imaginar poder encontrar uma realidade bem diferente entre os ditos irracionais. Mas ledo engano.

Não se deve generalizar uma espécie a partir de um elemento, mas como o tigre se revelou, demasiadamente insociável, impetuoso e mal-educado, impossível não temer que o restante seja de tal ou pior feição.
Não sei bem se devia revelar o que se passou entre mim e o tigre. Não tenho certeza se está acertada a decisão de detalhar o porquê, na dependência do estado comportamental do tigre, doravante evitar ultrapassar o seu território.

Com as intenções mais cordiais, dele me aproximei lentamente. Um tanto às escondidas, é verdade. E também levando à mão, como forma de proteção contra outros animais, uma potente arma.


Talvez fosse a percepção de minha chegada na feição de caçador, que fez com que o tigre logo ficasse atento e precavido. Mas não somente isso, pois logo se mostrou pronto para contra-atacar perante qualquer tentativa minha de violência.

Imaginei que os animais das florestas fossem indolentes e passivos demais, e por isso mesmo que os humanos chegavam para fazer o que bem entendessem. Encontrando-os sempre na lassidão das sombras, adormecidos preguiçosamente, então as armas humanas simplesmente avançavam sem qualquer reação.

Imaginei que a floresta fosse um berço de desordem, com todos avançando sobre todos numa luta sem fim, e por isso mesmo o homem chegava para se aproveitar da situação. E dizimava o que quisesse sem que nenhum se preocupasse com a extinção do outro.

Mas quando fui à floresta não intencionei fazer vítimas. E também tinha certeza de que não sofreria qualquer ameaça ou ataque. Dizem que os bichos reconhecem o estranho pelo olhar, e certamente os meus olhos não carregavam qualquer brilho de maldade. O problema é que sou humano, ou penso que seja.

E o humano, pelo seu longo histórico de crueldade contra a própria espécie e contra a natureza e os seres das matas, logo é visto com desconfiança e temor. Daí que o bicho do mato, temendo ser a próxima vítima, ou foge ou se coloca em prontidão para qualquer revide.

Talvez fosse por isso que o tigre tivesse me recebido tão mal, de forma deselegante e mal-educada. Rugiu, bramiu, vociferou. Eriçou os pelos, cresceu em tamanho, agigantou a cabeça, avermelhou os olhos, levantou uma das patas dianteiras e mostrou garras longas e afiadas. E depois deu um salto tão feroz que sequer deu tempo de me proteger.

E de repente estava diante de mim com uma ferocidade terrível. Tentei argumentar, dizer que não tencionava fazer qualquer maldade, mas não adiantou. Rugiu novamente e avançou de vez. Que falta de educação perante o simples visitante.

Já caído, quando abri os olhos percebi aquela boca imensa passeando pelo meu rosto. Não sabia se estava sendo acariciado ou comido. Mas se conto a história é porque o tigre, diferentemente dos humanos, não devora qualquer um. E sabe perdoar os falsos julgamentos.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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