Por José
Romero Araújo Cardoso (*)
Como ficou
conhecido nas lutas de Canudos, Pajeú era pernambucano do famoso vale
imortalizado por Luiz Gonzaga décadas depois do massacre abominável que manchou
indelevelmente a história do Brasil.
Escravo
liberto que rumou para Canudos apostando nas promessas do Bom Jesus Conselheiro
tendo achado por lá, às margens do rio Vaza-Barris, a tão sonhada liberdade que
a sociedade negou, e ainda nega de forma inadmissível e desumana, aos
excluídos.
Quando da
desastrosa campanha comandada pelo famigerado Coronel Moreira César, Pajeú se
destacou pela impecável forma como conduziu a guerrilha da guarda católica do
Conselheiro.
Dizem que foi
ele quem pôs fim à arrogância de Moreira César, acertando certeiro tiro de
bacamarte boca-de-sino, municiado com chifre de novilho, no sanguinário
corta-cabeças. Não obstante usar colete de aço, Moreira César foi
milimetricamente varado pelo disparo em local desprotegido.
O oficial
responsável pela substituição do Coronel Moreira César no comando da tropa
também não aguentou as táticas de guerrilha implementada por Pajeú. Uma ordem
do Coronel Tamarindo ficou famosa: “Em tempo de murici, cada um cuida de si”.
O que restou
da tropa de Moreira César foi fustigada pelos guerrilheiros comandados por
Pajeú. Verdadeira carnificina foi feita pelos bravos combatentes para pagar a
profanação do arraial sagrado do belo Monte, pois inadvertidamente Moreira
César desprezou todas instruções do regimento do Exército Brasileiro e ordenou
ataque de cavalaria a Canudos, cuja característica era a topografia
extremamente íngreme, impossível de ter sucesso por parte de Moreira César
através de investida com esse tipo de estratégia militar. Para tentar coibir e
amedrontar outras expedições que vieram em direção a Canudos, Pajeú ordenou que
os cadáveres dos soldados e oficiais ficassem insepultos, pendurados em árvores
como exposição macabra do ódio devotado pelos conselheiristas às tropas do
governo federal.
Quando a
quarta expedição foi enviada para destruir canudos, cujo comando ficou a cargo
do General Arthur Oscar de Andrade Guimarães, foi com terror e suspense que a
soldadesca encontrou o aviso dos guerrilheiros da guarda católica, na forma de
corpos ressequidos pelo sol esturricante do sertão nordestino. Com certeza,
aumentou o ódio do corpo militar do Exército Brasileiro contra os membros da
comunidade mística de Antônio Conselheiro.
Pajeú foi
responsável pelas mais significativas baixas contra as tropas federais.
Acostumados a caçar para sobreviver, os guerrilheiros usaram a experiência
adquirida e se tornaram franco-atiradores, pois quando algum soldado
desavisado, principalmente em noite sem lua, acendia um cigarro, certeiro tiro
o prostrava imediatamente. Usavam os “presentes” que Moreira César lhes deixou,
ou seja, fuzis mausers de fabricação alemã do Exército Brasileiro.
Não obstante
terem conseguido canhões e metralhadoras, esses não foram usados, pois os
guerrilheiros do Conselheiro não souberam como manusear as mortíferas armas
tomadas da expedição de Moreira César, destroçada pela genialidade
incontestável das táticas do maior guerrilheiro de Canudos.
Quando a
guerra de Canudos se tornou insustentável, com sucessivas baixas e derrotas das
tropas federais, o governo enviou verdadeiras máquinas de matar. Entre essas
estava um canhão Withworth 32, a famosa “matadeira”, como ficou conhecido entre
os habitantes de Canudos. Foi a única forma que conseguiram para pôr a baixo as
torres da igreja nova do belo Monte.
Cada tiro da
“matadeira” era verdadeiro massacre que a mesma proporcionava. O famoso canhão
tornou-se o terror dos canudenses, razão pela qual Pajeú organizou grupo de
assalto intuindo destruir a máquina destrutiva.
Onze
guerrilheiros chegaram de surpresa a bem guardada arma. Nesse ataque, o bravo
comandante conselheirista perdeu a vida, bem como nove companheiros, sendo que
apenas um conseguiu escapar.
Com a morte de
Pajeú, a guarda católica do Conselheiro ficou desfalcada do principal
estrategista, abalando sensivelmente a estrutura das estratégias da guerra de
guerrilha que até então vinha obtendo sucesso indiscutível.
Pajeú, o
famoso negro ex-escravo que marcou de forma impressionante a guerra de
guerrilhas nas batalhas em canudos, foi imortalizado por Euclides da Cunha, que
não obstante racismo e estereótipos, dedicou-lhe páginas de reconhecido mérito
pela bravura indômita em “Os Sertões: Campanha de Canudos”.
(*) Geógrafo.
Professor-adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e
Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Mestre em Desenvolvimento
e Meio Ambiente.
http://lentescangaceiras.blogspot.com.br/2010/07/pajeu-o-estratagista.html
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