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sábado, 14 de janeiro de 2017

A CAPA DO LIVRO

*Rangel Alves da Costa

Eu gosto de capas de livros. Uma boa capa tem o dom de impressionar à primeira vista. E capas existem que traduzem com perfeição toda a trama, todo o enredo, todo o conteúdo da história.

Verdade que muitos títulos já sintetizam o livro inteiro, não precisando que o artista gráfico se esforce muito para bem representá-lo através de pintura, desenho ou fotografia. Mas outros se tornam reconhecíveis pela expressividade da capa.

Aqui tenho um menino de engenho olhando para um velho engenho e como se rememorando seu passado. Aqui tenho uma gravura de um tufo de mato com arma cuspindo fogo em emboscada. Aqui tenho um bordel com prostituta à porta. O que mais dizer?

Certa feita, um famoso escritor afirmou ser bastante temeroso pela capa de seus livros. É que o leitor gosta de ler somente a capa e não o livro. O grande desafio do escritor é que o leitor crie sua própria imagem descritiva após uma vagarosa e compreensiva leitura. Não sua imaginação estará a melhor capa que possa haver.

Outro dia encontrei uma capa de livro deveras impressionante. Sem título, sem nome do autor, sequer na contracapa. A bem dizer, a capa era totalmente preta e a contracapa totalmente branca. Somente na terceira página avistava-se o nome do autor e do livro: Solidão.

De início, não compreendi muito bem o motivo de uma capa totalmente preta e de uma contracapa totalmente branca, sem que houvesse sequer o nome do livro ou uma pequena explicação de orelha. Contudo, folheei rapidamente e resolvi adquirir. Mas um dos principais objetivos na aquisição foi decifrar aquele mistério.


Contudo, ainda nas páginas iniciais já estavam justificadas as pretensões com aquela capa e contracapa tão inusitadas. Percebi então que bastaria o título do livro para fazer toda a leitura do livro somente pelas opções gráficas de apresentação.

Quer dizer, todo o discurso do livro poderia ser lido na capa e contracapa. Toda a força e toda a pujança explicativas já estavam ali magistralmente expostas. Depois de avistar o título e ter na capa o preto e na contracapa o branco, bem que poderia não ler mais nada. Tudo já estava entendido e compreendido.

Como afirmado, o título do livro, encontrado somente na terceira página, era Solidão. O que significam, então, o preto e o branco na solidão? Eis a maestria visual. Traduzidas estavam as duas etapas fundamentais desse constante estágio humano: a entrada e a saída.

Ou ainda a permanência na solidão e a sua lenta fuga. Ou ainda as dores e sofrimentos da solidão e as luzes e esperanças quando de sua partida. Ou ainda o negrume da alma e a tristeza do espírito na contundência da solidão, e paz retornada quando a porta e janela começam a se abrir para novos horizontes de paz e convívios.

Assim, a cor totalmente preta da capa representava, pois, a solidão mais solitária, mais profunda, mais angustiante, mais aflitiva. E o branco na contracapa representava a saída daquele quarto e fechado, a fuga daquela tristeza medonha em busca de afetos e afeições. Dois estágios no durante e depois da solidão.

Eis o mistério da capa. E sem mistério algum. Apenas a tradução visual de uma solidão tão conhecida por todos e que, verdadeiramente, possui um quarto na escuridão de breu e uma possibilidade de fuga na brancura da paz interior.

Mas já não sei o que pensar diante de um livro que encontro agora. O livro possui a minha fotografia na capa. Mas por quê? Um livro é muito para minha história. Bastariam umas poucas linhas ou talvez algumas letras em papel comum:

“Um homem sem história. Um homem apenas de fatos. E fatos tão inusitados de vida que nem mesmo a junção de tudo possibilita conhecê-lo”.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com 

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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