Clerisvaldo
B. Chaga, 1º de dezembro de 2011 -Não tem o número da Crônica
07.08.1938. Santana/Piranhas
(AL) “Três ou quatro dias após a remessa das cabeças para Maceió, chegava a
Santana uma caravana da Faculdade de Direito do Recife, composta dos acadêmicos
Alfredo Pessoa de Lima, Haroldo Melo, Décio de Souza Valença, Elísio Caribé,
Plínio de Souza e Wandnkolk Wanderley, todos em excursão e desejando ir
diretamente a Angicos.Coincidiu que estavam chegando notícias de que os abutres
(urubus) viviam sobrevoando o local do combate, sinal de que os corpos não
haviam sido bem sepultados.
O
Tenente-Coronel Lucena resolveu então formar uma caravana com os acadêmicos e
me disse que eu teria de acompanhá-los, menos como sargento do Batalhão, do que
como correspondente do Jornal de Alagoas. Partimos, então para Angicos no dia 7
de agosto – (‘O Jornal nos Municípios’, Jornal de Alagoas de 188.38).
‘Com a chegada
dos acadêmicos do Recife, tivemos de ir com eles a Angicos, local do combate,
lá sepultar os corpos deixados à toa. Encontramo-los já meio
ressecados, amarelecidos, a pele agarrada no osso como se a carne houvesse
fugido. Já não tinham pelos e era difícil a identificação. À vista daqueles, em
plena caatinga, o acadêmico Alfredo Pessoa fez um discurso capaz de comover até
mocós e preás que andassem por ali. E só então tive uma pequena ideia da
atrocidade da decapitação. Um corpo sem cabeça, onze corpos sem cabeça e o
discurso do Pessoa: que coisa de arrepiar cabelos! (FRUTA DE PALMA, 168).’
Na realidade
os corpos não haviam sido sepultados. Ficaram ali mesmo no leito do córrego,
cheio de pedregulho. Amontoado os onze, a tropa havia simplesmente feito um
montão de pedras por cima. Além de ser difícil cavar sepultura ali, a gana de
Bezerra e de seus comandados pelos troféus dos cangaceiros lhes havia retirado
todo o restinho de senso humano que possuíssem.
Ficamos ali
quase um meio dia, a cavar uma vala comum no mesmo local, pois não havia
condições de conduzir aqueles pedaços de gente para parte alguma fora do
córrego.
O célebre
coiteiro Pedro Cândido era integrante da Caravana e, além de nos descrever as
principais fases do combate que ele engendrara, mostrou-nos o corpo de Lampião,
da mesma forma identificado por três ou quatro pessoas que integravam a
caravana e que também conheciam detalhes físicos do Rei do Cangaço.
Se não foi a
única (e não foi), foi uma das poucas vezes em que observei emoções no rosto do
Tenente-Coronel Lucena: ao ouvir o discurso do acadêmico, encarando os pedaços
de Lampião.
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