Kiko Monteiro e Luiz Ruben
O pesquisador e confrade Luiz Ruben compartilhou um recorte em que o jornalista e meu conterrâneo Ancelmo Gois em sua coluna do Jornal do Commércio de Recife, edição de 16 de Dezembro de 2012, publicou a seguinte "nota":
Um conceito demasiado. Faltou especificar, completar o adjetivo com o termo "Funcional". Virgulino mesmo limitado sabia ler, "escrever" e contar. E não são as imagens que nos fazem duvidar ou acreditar em tal habilidade. São testemunhos de ex companheiros e até mesmo dos seus oponentes, disponíveis na literatura. Vejamos o que localizei no livro de memórias do tenente João Gomes de Lira, conterrâneo e inimigo de Lampião que tem um capitulo sobre o aludido assunto:
Apesar de sertanejo inculto, vivendo em meio atrasado, José Ferreira procurou dar aos filhos a educação básica. O menino Virgulino Ferreira assim como os seus irmãos Antonio e Livino receberam os primeiros conhecimentos no ano de 1907. Residindo no Riacho São Domingos distrito do município de Vila Bella (Serra Talhada), enviou os três filhos mais velhos à casa do senhor Raimundo Gago, em Pitombeira, próxima a cidade de Vila Bella, afim de que os meninos frequentassem a escola pública do professor Auxêncio da Silva Viana... 1.
Os pesquisadores Antonio Amaury e Vera Ferreira em sua obra "De Virgolino a Lampião" ainda indicaram um outro professor chamado Justino de Nenéu 2. Um outro autor bastante consultado, o pernambucano Frederico Bezerra Maciel, também dedicou um capitulo sobre este período. Os métodos pedagógicos que fizeram época foram de inegáveis resultados positivos: O sertanejo que se interessou, aprendeu a ler soletrando e cantando as 26 lições da famosa "Carta do ABC" de Landelino Rocha, que continha apenas 16 páginas. E da tabuada cantada ritmicamente em comum pela classe, com palmatória.
O professor Jutino de Nenéu viera ensinar Virgulino e seus irmãos na casa da Fazenda Serra Vermelha, de Manuuel Ferreira de Lima bem perto da fazenda deles, a Ingazeira. 3
Voltando as memórias de Gomes de Lira: Naquela ocasião, tinha Antonio Ferreira, doze anos, Livino, 11 anos e Virgulino, 9 anos de idade. Em 1910, estudaram na "Escola" particular do Professor Domingos Soriano, na Serra Vermelha.
Entenda-se a escola aqui não como um espaço físico. As aulas eram dadas ao ar livre embaixo de Juazeiros e Quixabeiras.
A referencial Lampião – Cangaço e Nordeste de Aglae Lima de Oliveira nos acrescenta mais informações.
Como esta carta abaixo, endereçada a um fazendeiro de nome Cantidiano Valgueiro dos Santos Barros, dono da propriedade Tabuleiro Comprido no município de Floresta, PE. Na carta, escrita na peculiar maneira de Lampião se expressar, ele pede a Cantidiano dois contos de réis, de forma extorsiva, a fim de serem evitados “prejuízos”.
Entenda-se a escola aqui não como um espaço físico. As aulas eram dadas ao ar livre embaixo de Juazeiros e Quixabeiras.
...Os alunos traziam de casa os banquinhos em que se sentavam para assistir às aulas à sombra das árvores. “O esforçado mestre não se furtava aos pedidos de pais residentes em outras fazendas das ribeiras adjacentes, os quais receberiam a rara oportunidade de poder proporcionar instrução aos filhos. Hoje a escola Municipal de ensino fundamental e médio Domingos Soriano é um dos primeiros prédios públicos avistados pelos visitantes ao chegarem à Vila de Nazaré do Pico, distrito de Floresta em Pernambuco.
José Cícero e João Gomes de Lira
A referencial Lampião – Cangaço e Nordeste de Aglae Lima de Oliveira nos acrescenta mais informações.
Que o tempo de assistência com Domingos Soriano foi de apenas "90 dias". (Periodo em acordo com todos os depoentes).Que a mensalidade deste curso era de "dez tostões", que o cabrinha nunca havia levado os temidos bôlos ao ser testado em conhecimento de Tabuada e de algarismos romanos. E ainda sugere que o primeiro livro do qual Virgulino tenha explorado por completo foi o "Primeiro livro de leitura" de Felisberto de Carvalho. 4
Pelo método de soletração de Landelino ou de Felisberto é fato que Virgulino aprendeu a ler, mais tarde aplicaria seu conhecimento ao se deleitar com os jornais e revistas que chegaram até ele. Especialmente os que traziam manchetes sobre seus feitos. E, ainda que sem devida concordancia, mas com uma caligrafia regular escreveu cartas. Hoje, documentos históricos preservados em museus e coleções particulares. Reproduções de alguns de seus escritos estão disponíveis em diversos livros e sites.Como esta carta abaixo, endereçada a um fazendeiro de nome Cantidiano Valgueiro dos Santos Barros, dono da propriedade Tabuleiro Comprido no município de Floresta, PE. Na carta, escrita na peculiar maneira de Lampião se expressar, ele pede a Cantidiano dois contos de réis, de forma extorsiva, a fim de serem evitados “prejuízos”.
Segundo o pesquisador Artur Carvalho, que utilizou os conhecimentos profissionais de um especialista em paleografia , a “tradução” é a seguinte;
“Ilmo. Sr Cantidiano Valgueiro,
Eu (ou “le”) faço esta para “vc” mandar-me dois “conto dereis”, isto sem falta, não tem menos, para “vc” saber se assinar em telegrama contra mim como “vc” se assinou em um com “Gome” Jurubeba. Eu ví e ainda hoje tenho ele. Sem mais, resposte logo para “envitar” muito prejuízo. Sem mais assunto.
Eu (ou “le”) faço esta para “vc” mandar-me dois “conto dereis”, isto sem falta, não tem menos, para “vc” saber se assinar em telegrama contra mim como “vc” se assinou em um com “Gome” Jurubeba. Eu ví e ainda hoje tenho ele. Sem mais, resposte logo para “envitar” muito prejuízo. Sem mais assunto.
Cap. Virgulino ferreira Lampião. [sic]” 5.
O pesquisador e colaborador Ivanildo Silveira teceu comentário em uma discussão anterior sobre este mesmo assunto:
"O Rei Vesgo dominava, a grosso modo, o idioma pátrio, comunicando-se, de forma clara, precisa, apesar dos erros gramaticais que cometia. Inclusive, ás vezes, empregava pronomes de tratamentos de forma correta. A grafia de seus famosos bilhetes, era perfeitamente entendível".
E como vovó já dizia...
"Estude meu fio, estude pra não ser que nem sua avó, que não sabe nem pegar numa caneta, que dirá assinar o nome, não faço um "O" com um copo".
Fontes:
[1] Lira. João Gomes de, Lampião, Memórias de um Soldado de Volantes 2006 (vol. 2) Companhia Editora de Pernambuco – CEPE. Recife/PE, 2007. PÁG. 2
[2] Vera Ferreira /Antonio Amaury. De Virgolino a Lampião, 1ª edição, Idéia Visual, São Paulo, 1999. PÁG. 52
[3] Maciel, Frederico Bezerra. - Lampião, seu tempo e seu reinado, | I : As origens : Por que Virgulino se tornou Lampiao? 3ª Ediçao. Petropolis, RJ : Vozes, 1992. PÁG. 90
[4] Oliveira, Aglae Lima de. Lampião – Cangaço e Nordeste. 3ª edição, O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 1970. PÁG 22.
[5] Rostand Medeiros - Uma carta de Lampião e a história do soldado volante que se tornou ambientalista. Disponivel em: http://tokdehistoria.wordpress.com/2011/10/12/a-carta-de-lampiao-e-a-historia-do-soldado-volante-que-se-tornou-ambientalista/
Att Kiko Monteiro
http://lampiaoaceso.blogspot.com.br
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário