De costas para a história

Impávidos. Em posições solenes. Ou retratados apenas do tórax para cima, com olhar altivo. Em praças, pátios e áreas públicas em geral. As estátuas e bustos da cidade estão longe de receber a atenção devida. Muitos revelam as marcas do tempo e outros foram vítimas de vândalos e ladrões. Mesmo os mais "famosos", não apresentam a identificação necessária e terminam se tornando "ilustres desconhecidos" da população.

Adriano Abreu

Além de não serem reconhecidos por natalenses, estátuas e bustos de personagens da nossa história estão depredados e sem conservação

A reportagem da TRIBUNA DO NORTE visitou alguns desses locais e constatou problemas de conservação e também informação. "Tem uns que confundem com

 Padre Cícero",

revela a comerciante Maria Santana Gomes, que há 43 anos trabalha na feirinha da praça

"Padre João Maria",

onde o busto do maior líder religioso de Natal, na virada do século XIX para o XX.

"A imagem (do busto) do Padre João Maria só está melhor porque um homem que fez uma promessa vem todos os dias limpar de manhã e à noite", revela a vendedora. Além do fiel, os "flanelinhas" que trabalham na área também ajudam na limpeza. Para o aposentado Luiz Pinheiro da Costa, de 86 anos, que se benze e dedica uma prece ao Padre João Maria toda vez que passa pelo local, é fundamental a Prefeitura manter a conservação do busto.

Confundir o padre potiguar com o cearense, porém, não é tão impactante quanto misturar um ex-governador com o "descobridor do Brasil". Na conhecida "Praça Cívica", que oficialmente se chama

Pedro Velho,

o busto do ex-governante do estado que dá nome ao local sofre com a corrosão e já se encontra bastante desfigurado. A única placa sob o monumento é a que marca a "Reconstrução da Praça", pelo governo do estado e Prefeitura, em 2004. Há os nomes de todos os governantes, mas nenhuma referência ao homenageado.

Devido à falta de registros informativos ou qualquer outra estrutura de identificação, não há de surpreender o questionamento de uma dona-de-casa que passava pelo local e primeiro revelou não saber de quem se tratava o busto, mas, logo após ser informada pelo repórter, questionou com uma boa dose de convicção:

"Pedro Velho Álvares Cabral,

aquele que descobriu o Brasil, né?"

Na praça

Pedro II,

no Alecrim, o busto do imperador foi alvo de uma tentativa de furto. O aposentado Mário Gomes recorda que tentaram levá-lo no dia 23 de junho, mas não conseguiram carregar a peça de bronze, devido ao peso, e terminaram por abandoná-la ao lado do pedestal. Depois, a Guarda Municipal o recolheu. Hoje, no pedestal, restou um desenho em grafite de uma folha de maconha.

No pátio do Colégio Atheneu, o busto de

João Tibúrcio

também sofre a ação do tempo e do processo corrosivo. "A última vez que fizeram a recuperação foi quando houve uma reforma aqui em 2005", enfatizou a diretora da escola, Marcelle de Lucena.

Na praça

Augusto Severo,

na Ribeira, a estátua do aviador também sofre com a perda da cor original, já se tornando avermelhada. Além disso, uma placa que existia na parte frontal do pedestal foi retirada e não há qualquer dado sobre Augusto Severo, a não ser o nome em baixo relevo, quase ilegível. Pichações com corretivo pioram a situação do monumento.

Prefeitura recolhe alguns monumentos

O busto de Dom Pedro II não foi o único retirado do local da homenagem, por conta de problemas. Na praça Pôr do Sol, no Canto do Mangue, nas Rocas, quando de sua inauguração, em janeiro de 2008, foi colocada uma estátua do escritor francês

Saint Exupéry,

em um banco voltado para o rio Potengi. De acordo com os pescadores, no dia seguinte já não tinha o braço e a depredação só não foi maior porque foi recolhida em menos de uma semana.

Um dos motivos teria sido a polêmica a respeito da passagem, ou não, do escritor francês pela capital potiguar. Uma ideia alternativa era a de homenagear o poeta

Othoniel Menezes,

autor dos versos de "Serenata do Pescador - Praiera", até mesmo juntamente com quem musicou a famosa canção, Eduardo Medeiros. Porém, até hoje no local só se mantém o banco vazio e a placa de inauguração.

Outra homenagem "suspensa" foi a feita ao professor e juiz

Alvamar Furtado,

cujo busto se encontrava na "Pracinha do Forte", em Brasília Teimosa, mas foi retirado para ser transferido para o largo do Atheneu, em Petrópolis, quando o projeto de reurbanização da área for concretizado pela Prefeitura. O antigo espaço, próximo à Praia do Meio, se transformou na Praça da Bíblia.

A homenagem ao

livro sagrado, porém, careceu do devido cuidado e a placa comemorativa descerrada no dia da inauguração, em 16 de julho, trazia erros de acentuação, pontuação e grafia, como o uso equivocado de letras maiúsculas e minúsculas. Uma placa de acrílico, provisória, foi colocada até que sejam feitos os reparos da original, porém nem mesmo a "substituta" ficou livre das falhas. O nome da prefeita é grafado com "Souza", quando na verdade 

Micarla é da família Sousa.

Secretário diz que peças estão sendo mapeadas

O secretário Municipal de Serviços Urbanos, 

Cláudio Porpino, 

revelou que a Semsur vem mapeando os bustos, estátuas e outros monumentos existentes na praças da cidade. "Teremos o resultado desse mapeamento dentro de uns dez dias e, então, iremos buscar fortalecer a parceria com a Guarda Municipal para restaurarmos todos os monumentos e depois intensificar a vigilância e impedir que vândalos e ladrões danifiquem", ressaltou.

Ele reconhece a importância das peças e revela que dois bustos estão para voltar às ruas. "O de Dom Pedro II será recolocado na praça (no Alecrim) na próxima semana e o de Alvamar Furtado (que ficava na Pracinha do Forte, próximo à Praia do Meio) foi retirado com permissão da família e será colocado no largo do Atheneu, quando concluirmos o projeto de urbanização da área", revela.

O projeto de urbanização já estaria pronto e a expectativa da Semsur é realizar a transferência nos próximos meses. Cláudio Porpino garante, ainda, que o Município tem consciência da importância cultural dos bustos e estátuas espalhados pelo município. "É uma preocupação nossa agir de forma a preservar a história de Natal."

FONTE:

http://tribunadonorte.com.br/noticia/de-costas-para-a-historia/190902

Extraído do Blog do Neto