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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

AQUELA FESTA DE AGOSTO

*Rangel Alves da Costa

Nem chegava o mês de agosto e Poço Redondo já parecia outra cidade, remoçada, bonita, florida, aconchegante. Era nesse período que grande parte das casas recebia pintura nova, vistosa, com barra vermelha e tudo e o mais.

Quando o mês da festança maior da cidade abria as portas, então a povoação se transformava totalmente. O que se avistava eram as moças solteiras passando com panelas para serem areadas nas beiradas do tanque velho. Necessitavam dar brilho em tudo para receber os visitantes.

Pelas calçadas, cadeiras espalhadas para receber colchas de veludos, panos mais chiques, cobertores floridos. Também uma época onde os paletós de linho e roupas festeiras eram retirados dos escondidos dos guarda-roupas para providenciais banhos de sol. Por isso um cheiro de naftalina danado por todo lugar.

Bastião Joaquim já coçava a cabeça pensando em receber da melhor maneira possível seus amigos da Serra Negra. Seu prazer era imenso, pois aquele povo do outro lado da serra era com se tivesse raiz no lugar. E tinha mesmo, pois os Carvalho desde muito encravados nas terras poço-redondenses com suas fazendas de meio mundo.

João Maria de Carvalho, o coronel de patente e mando, seu irmão Piduca Alexandre, seu filho Heraldo e seu sobrinho Evaldo, eram assíduos visitantes de Poço Redondo. Do mesmo modo Oza, Maria de Ioiô, João de Ioiô e tantos outros alexandrinos que arribavam para o lado de cá principalmente em dias da festa grande.

Entre as casas de Tonho Rosendo, Zé de Lola e Bastião Joaquim, os alexandrinos encontravam certeira e aprazível guarida. O Coronel João Maria se aboletava numa rede na sala da frente da casa de Zé de Lola e dali mesmo ordenava além-fronteiras. Já Heraldo e Evaldo deixavam a casa de Bastião Joaquim no passo certeiro dos bares, dos forrós, das cavalgadas, dos locais onde houvesse moça fogosa e namoradeira. Até de homem casado.

A chegada de Heraldo de Carvalho era uma preocupação a parte para Delino, pois sempre temendo que o doutor da Serra Negra repetisse um gesto de outra ocasião: com bar e salão lotados, com forró comendo solto, eis que o homem entra com cavalo e tudo. Entrou e foi em direção ao balcão. E quem era besta de dizer um tantinho assim?

Daquele chapéu largo e gestos vaidosos, apenas um homem bom. Melhor ainda seu primo Evaldo, que só pensava em namorar. E sem a presença deles a festa de agosto não tinha graça. Como não tinha graça sem a chegada do parque, sem a presença de Manezim Tem-Tem, sem Seu João Retratista, sem a visita certeira de Expedito, o sarará-avermelhado e desajuizado.

Manezim Tem-Tem tinha freguesia mais que garantida. Os sapatos de festa, devidamente guardados de outras ocasiões, eram colocados em suas mãos ali mesmo nas calçadas. Retornavam brilhando mais que sapato novo. Não podia faltar retrato de jeito nenhum, nem antes nem durante a festa, por isso mesmo que Seu João Retratista tinha um trabalho danado de armar e desarmar seu tripé para as fotos em meio aos jardins floridos daquele Poço Redondo de antigamente.

Era o período do alavancamento comercial da cidade. Pano de corte, lustroso, enfestado, era com as irmãs Marques: Mãezinha, Conceição e Izabel. Ter uma camisa de volta-ao-mundo era uma grã-finagem pra poucos. Mas Izabel Marques possuía à venda. Calça Lee da legítima, calça boca de sino, saia rodada, vestido ajardinado, tudo isso também colocado à venda no comércio local e também nas caminhonetes que chegavam de outras localidades.

Forró por todo lugar, desde o início do mês. Não havia salão onde o fole não roncasse desde cedinho até madrugada adentro. Agenor da Barra, Dudu Ribeiro, Zé Aleixo, Zé Goiti, Dida e tantos outros, tudo arrastando seus foles para a alegria e o chinelado sertanejo. Na memória de Zelito, o cantador maior de forró, certamente a doce recordação desse tempo.

Cinco da tarde em ponto. A música O Milionário, anunciava o início das atividades no parque. Daí em diante uma festa só e mais tarde o cheiro das brilhantinas, do Toque de Amor, do Charisma, e os gemidos pelos sapatos apertados. E aquelas donzelas em suspiros sem fim.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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