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terça-feira, 11 de agosto de 2020

'NÃO CANTO MAIS NEM NO CHUVEIRO', AFIRMA LINDOMAR CASTILHO

Por Lívia Machado - Do G1, em São Paulo- Publicado em 2012

Cantor diz que perdeu o prazer pela música e hoje prefere o silêncio.Aos 72 anos, ele gosta de ler a Bíblia e cultiva uma vida pacata em Goiás. (Cantou já passou dos 80 anos).

Com a voz falha e imbuída de receios, Lindomar Castilho reluta em conceder uma entrevista por telefone. “Eu não sou mais nada, cansei de ser cantor. Para que falar sobre minha vida agora?” Aos poucos, porém, ele concorda em contar um pouco sobre a sua influência na música popular brasileira. Após inúmeros problemas de saúde - um deles responsável por comprometer parte de suas cordas vocais - ele afirma levar uma vida pacata, "quietinha", no interior de Goiás.

(Ao longo desta semana, o G1 publica uma série de entrevistas com sete ícones da música brega. Famosos há cinco décadas, eles permanecem lançando CDs e hoje são reverenciados pela nova geração de cantoras da MPB).

Hoje, o comportamento de Lindomar pouco se assemelha ao artista sedutor e mulherengo que proferia os lamentos em "Vou rifar meu coração" e cantava músicas divertidas como em "Doida demais", hit reciclado na abertura do programa semanal "Os normais", exibido pela Globo de 2001 a 2003.

Diferente de seus companheiros de vertente, aposentou o microfone, perdeu o prazer de cantar e agora tem a Bíblia como companhia. Afirma que ganha "algum dinheiro" com direitos autorais e venda de discos, mas perdeu o interesse e o espaço no meio musical.

“Tenho aqui em casa muitos DVDs, CDs, mas escuto pouco. Perdi o tesão, não canto mais nem no chuveiro.” Lindomar mora sozinho, mas se diz acompanhado por dois porta-retratos de suas filhas, que vivem em São Paulo.

Aos 72 anos, o cantor fez do anonimato uma espécie de escudo. Embora avesso às entrevistas, ele gosta de comentar sobre seus feitos na música popular. Teme, entretanto, que o assunto inevitavelmente esbarre no crime que cometeu em 1981, quando assassinou sua ex-mulher, a também cantora Eliane de Grammont, em um bar na zona sul de São Paulo. “É um massacre isso. É lógico que eu me arrependo todos os dias. A gente comete coisas em momentos que está fora de si.”

Na época, cumpriu dois anos de pena na capital paulista e depois foi transferido para um presídio em Goiás. Além de compor um CD de inéditas atrás das grades – "Muralhas da solidão", lançado em 1985 e um dos poucos em que assina a maioria das canções –, ele passou os sete anos preso dando aulas de música e violão aos detentos.


“Eu ainda fazia muito sucesso naquela época, e o interesse nas aulas era grande. Comecei com a escolinha em São Paulo, mas o diretor do presídio de Goiânia gostou da ideia. Tinha três turmas e dava aulas de segunda à sexta-feira. Era um alívio, foi muito positivo.”

Nascidos em bordéis

Um dos precursores da música brega, Lindomar credita o adjetivo pejorativo ao nome de uma rua na cidade de Salvador, famosa por abrigar casas de prostituição. “Esse nome começou comigo. Eu frequentava a Rua Nóbrega, que nem sei mais se existe, lá em Salvador. Eu e os demais cantores de músicas românticas tocamos em algumas dessas casas, mas gostávamos de ir lá para ver as garotas de programa. Ficamos conhecidos como os rapazes da Nóbrega, que viviam na Nóbrega, que foi abreviado para brega tempos depois.”

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O cantor parece pouco preocupado com o rebaixamento qualitativo que seu estilo musical sofreu ao longo dos anos. “Nada mais é do que música romântica, e não vejo problema em ter vivido disso.” Justifica suas escolhas profissionais com o nome de uma das canções que gravou nos anos 80. "Eu canto o que o povo quer ouvir."

Cheio de si, ele compara o alcance de suas músicas com a baixa penetração da bossa nova, vertente de “bacanas cariocas", como gosta de classificar. “Enquanto eu cantava para milhares de pessoas, eles faziam reuniões para 100. Fui um dos maiores vendedores de disco do Brasil, fui um homem bem sucedido.”

Além do potencial comercial, um ponto comum dos ícones da música brega - ou apenas romântica - como eles preferem ser classificados, foi o frisson que provocaram no público feminino. Ao narrar histórias sofridas de amor, eles arrebatavam corações e eram constantemente agarrados pelas fãs.

“A gente cantava pra uma multidão, era muita mulher, uma loucura. Tinha que chegar junto mesmo, elas queriam, se jogavam. A gente só retribuía.” Hoje, porém, escreve canções apenas para si e resguarda o direito do anonimato. Acredita que seu tempo como artista passou: "Eu já cansei, comecei em 1962. Já chega”.


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