Por: Rangel Alves da Costa
Não gosto nem
de lembrar. Coisa mais terrível, chocante, assustadora. Um amor que parecia ser
duradouro, cheio de mimos e afagos, e de repente morto, acabado, destruído.
Estava lá
estendido, jazendo sem vida, silenciosamente quieto no leito da manhã. Um
semblante ainda guardando certa vividez, um tom enrubescido na pele, parecendo
até mesmo que apenas adormecia esperando a sorte dos anjos.
Mas fato é que
estava morto, irrefutavelmente sem vida. Mas teria morrido de que o amor?
De morte
natural não haveria razão de ser. Mostrava plena força, vigor, saúde, alegria,
disposição para os enfrentamentos da vida. Nunca reclamou de nada, de nenhum
sintoma, nunca disse que suspeitava alguma coisa. Aliás, até ontem estava aos
beijos e abraços, sorridente caminhando de mãos dadas com a sua paixão.
Também não
haveria de se cogitar suicídio. Chega até ser impensável imaginar o amor se
destruindo com as próprias mãos, usando como arma os próprios sentimentos. Não,
isso não. Era um amor amante, gostava de amar e ser amado, partilhar carinho e
compreensão, fazia planos maravilhosos para o futuro. E duvido que pudesse
modificar os seus planos se desamando assim, a ponto de se auto ferir no
coração.
Morte súbita, ataque
cardíaco, algum problema que fez o coração disparar e parar. Talvez tenha sido,
pois o amor amava demais e o coração de quem ama assim nunca está imune ao
surgimento de repentinos problemas. Mas o que teria feito o amor sofrer tanto
para não suportar um distúrbio no lugar que mais conhecia, que era precisamente
o coração?
O amor teria
sido envenenado, com uma dose de veneno tão sutil que não havia deixado nenhum
sintoma aparente de que teria sido consumido, devastado por dentro? Certamente
que não se pode deixar de cogitar sobre tal hipótese. Por mais que o amor tenha
amado, o fez acreditando apenas no seu poder de amar, sem ter a certeza de que
o outro correspondia na mesma medida. Então surge a cruel indagação: e se
aquele que fingia amar envenenou com palavras o amor que não suportou a dose de
infidelidade e covardia e morreu?
Ou será que o
amor não morreu, apresenta apenas um quadro de morte aparente, aquele mesmo
onde há um estado transitório de perda das funções vitais, provocada por
sincopia, asficticia, apoplexia ou traumatismo. Se for sincopal, a causa
provável foi um estado de choque profundo no coração; se for asfíctica, tudo
leva a crer que pode ter sido causada por alguma visão ou notícia que paralisou
seus mecanismos de respiração; se for apoplética, poderá ter sido por congestão
daquilo que teve de engolir e tentou suportar para manter a relação; se for
traumática, provavelmente foi ocasionada pelas desilusões amorosas que de
repente surgiram.
Contudo, por
mais que possa buscar causas para a morte do amor, ainda assim será
incompreensível demais atentar para o fato de que ele não existe mais. A não
ser uma morte aparente, de resto ele não existirá mais tão lindo e encantador
como era, tão seguidamente tido como exemplo para todos aqueles que procuram,
através de suas possibilidades, a paz, o fortalecimento interior, a beleza da
vida a dois.
Sou daqueles
que preferem acreditar na continuidade da vida, na impossibilidade de que o bem
possa morrer completamente, esvanecer como uma nuvem que não passará mais sobre
o ceu. Acredito que a força do bem que se diz ausente se emana perpetuamente
entre nós. E haverá bem maior do que o amor, do que o verdadeiro amor?
Por isso mesmo
o amor não morreu e jamais morrerá. Não se pode concluir diferentemente se
ainda existem aqueles que amam de coração, que respeitam seu par, que fazem da
conjunção de vidas o motivo maior para vencer as barreiras da existência. Não
poderia imaginar viver sem o amor que tenho, que sinto, que continuamente
busco. De sua imortalidade é que eternizo também o amor que viverá em mim até
que os dias me chamem, deixando na terra o amor semeado.
E não se
poderia esquecer que o amor é presença constante e renascimento,
espiritualidade que se eterniza naqueles que amam.
Rangel Alves da Costa
Poeta e cronista
e-mail:
rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
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