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terça-feira, 16 de outubro de 2012

O cangaceiro Corisco

Semira Adler Vainsencher semiraadler@gmail.com Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco

Certa ocasião, em relação à defesa da honra masculina, o Diabo Louro adotou uma postura que, muitos anos depois, se tornou bastante conhecida no país: tratou-se do desfecho do relacionamento amoroso entre Cristina e Português. 

Português - o primeiro da esquerda para a direita

Ela o havia traído com um integrante do bando de Corisco - o cangaceiro Gitirana - e Português contratara Catingueira para "limpar sua honra maculada".

A cangaceira Cristina

Quando Catingueira chegou ao acampamento de Corisco, chamou logo Gitirana para uma conversa particular. Naquele momento, Maria Bonita e Lampião estavam no mesmo acampamento e, por acaso, se aproximaram deles. 


Maria Bonita adiantou-se, sugerindo a Catingueira que a pessoa a ser eliminada deveria ser Cristina (a verdadeira culpada, segundo ela) e, não, Gitirana. Naquela hora, Corisco retrucou: Ela deu o que era dela! Ninguém tem nada com isso! Insatisfeita com a resposta, Maria Bonita continuou defendendo a contrapartida masculina: É, mas Português vai ficar desmoralizado! Já impaciente com aquele confronto, o Diabo Louro deu um basta à discussão:

"Ele que cuide da mulher dele! Do meu rapaz, cuido eu!"

Desde esse dia, tais palavras ficaram célebres e essa expressão vem sendo utilizada até o presente, inclusive, por muitos políticos brasileiros. Parafraseando Corisco, os parlamentares costumam dizer: Cuidem do que é seu porque, do que é meu, cuido eu!

Em relação àquele desenlace amoroso, Lampião deu total apoio a Corisco. Cristina permaneceu com o bando, escondida durante alguns meses. Todavia, como era de se esperar, ela foi morta quando ia para a casa de familiares, já que Português contratara outros cangaceiros para matá-la. Neste sentido, não restava dúvidas: o adultério feminino não era tolerado nos bandos do Nordeste.

Lampião e seus comparsas resistiram quase vinte anos, brigando com civis que os perseguiam e com as volantes de vários Estados. Durante esse tempo, os cangaceiros assaltaram propriedades, atacaram povoados, vilas e cidades, roubaram, pilharam (...)

Fonte: fundaj

Se você quiser ler o artigo completo clique no lin abaixo:

http://www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php?titulo=Corisco&ltr=c&id_perso=296

Lampião contra o Mata Sete


Autor: Archimedes Marques


Preço: R$ 50,00
BANCO DO BRASIL
Agência: 3088-0
Conta: 33384.0
Em nome de Elane Lima
Marques (Minha esposa).
E-mail
archimedes-marques@bol.com.br

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

O cangaceiro Moreno

Por: Antonio Vicelmo - Repórter

Moreno e Durvina foram localizados pelo cineasta cearense Wolney Oliveira, que estava produzindo o documentário "Lampião, o Governador do Sertão". Uma das filhas do casal, Neli, ajudou o cineasta - a chave foi um filho que 

Os cangaceiros Durvalina e Moreno

Durvina e Moreno deixaram com um padre, em Tacaratu, no sertão pernambucano, enquanto fugiam. A primeira providência de Wolney foi trazer o casal de volta às suas origens: Paulo Afonso, na Bahia, onde nasceu Durvina, e Brejo Santo, no Ceará, onde estão os parentes de Moreno.

A volta ao passado foi acompanhada pelo Diário do Nordeste. Ele foi recebido como herói, em Brejo Santo, de onde saiu em 1930, com vários crimes nas costas. Moreno foi recepcionado com festa. Concedeu entrevistas às emissoras de rádio e abraçou sobrinhos e amigos de infância. A mesma recepção festiva aconteceu com Durvina, em Paulo Afonso, sua terra natal, também acompanhada pelo Diário do Nordeste.

Segundo Nely Maria da Conceição, 60 anos, filha do casal, o pai já pedia para morrer há mais de dois anos, sempre chamando pela mãe. "Depois da morte de Durvina, em 2008, ele entrou em depressão e sempre falava assim ´Mãezinha vem me buscar. Já vi tudo que tinha pra ver. Quero encontrar Durvina´. Ele estava sofrendo muito", disse.

Recentemente, ele se submeteu a uma cirurgia de câncer de próstata. Urinava com o auxilio de uma sonda. Não tinha condições de viajar. Por isso, não participou do "Cariri Cangaço", realizado no mês passado, em Crato, Juazeiro, Barbalha, Missão Velha e Aurora.

Em Brejo Santo, na conversa com os parentes, entre risos, lágrimas e versos improvisados, reviveu a sua adolescência sofrida marcada por um ardente desejo de ser soldado de Polícia. O destino, entretanto, lhe foi cruel. Terminou levando uma surra da Polícia de Brejo Santo, sob a acusação injusta de ter roubado um carneiro. Quando saiu da cadeia, matou o homem que o denunciou e que era o verdadeiro ladrão do carneiro.

A partir daí virou uma fera. Matou e castrou alguns dos seus perseguidores. Ele nega estes crimes, dizendo que não assassinou ninguém em Brejo Santo. Mas, a própria família confirma as atrocidades praticadas por Moreno que, com 19 anos, fugiu para a Paraíba. Em Cajazeiras, matou mais um. Fugiu para Alagoas, onde já chegou com a fama de valente.

Cangaceiro

Tentou a profissão de barbeiro. Foi contratado por um proprietário rural para defender uma fazenda do ataque dos cangaceiros. Terminou se integrando ao grupo de Virgínio, cunhado de Lampião, de quem se tornou amigo. Dirigiu o seu próprio grupo. Participou de todos os tiroteios entre cangaceiros e policiais na década de 30.

Nas suas contas, matou cerca de 21 homens. Os historiadores dizem que este número é muito maior. "Ele dirigiu o seu próprio grupo e foi um dos cangaceiros mais cruéis", garante o escritor Magérbio Lucena. Moreno justificava: "Estava ali para matar e morrer, não tinha alternativa". E complementava: "Só atirava, quando o inimigo estava na mira do meu mosquetão".
Antônio Vicelmo
Repórter

Se você quiser ler o artigo completo clique no link abaixo:

http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=847193 

1938 - Angico


Autor: Paulo Medeiros Gastão

O livro pode ser adquirido através
deste e-mail:
paulomgastao@hotmail.com

 

Lampião de A a Z


Diretamente com o autor (não está a venda em livrarias).

Preço por exemplar:
R$ 20,00 (vinte reais+ frete).

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A morte de Lampião nos Jornais de Salvador

tokdehistoria.wordpress.co

Paciência beneditina para vasculhar velhos arquivos e garimpar neles a matéria prima para a história é virtude própria dos historiadores.

Luiz Ruben Ferreira de Alcântara Bonfim, pesquisador das coisas do sertão, residente em Paulo Afonso-Bahia, fez publicar um livro que vai facilitar em parte o trabalho dos que se dão ao trabalho de empreender a arqueologia do cangaço, especialmente do Rei dos Cangaceiros, Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião.


O historiador Luiz Ruben vasculhou os jornais "A Tarde", "Diário de Notícias", "O Estado da Bahia", e "O Imparcial", todos publicados em Salvador-Bahia, edições de 1938.

Deu-nos uma coletânea subordinada ao título "Notícias Sobre a Morte de Lampião", que dá bem uma ideia de como os meios de comunicação divulgaram no calor da hora, a morte do mais famoso bandoleiro de todos os tempos, que por mais de 20 anos assombrou os sertões do Nordeste.

Contato com o autor:
Av. Apolônio Sales, 840
Centro-Paulo Afonso - Bahia.
CEP: 48601-200
Fone: (75) 3281-1389

Extraído da revista: "Nordeste vinteum"
Edição nº. 31
Ano: III - 2012


Cedida gentilmente pelo poeta, escritor e pesquisador do cangaço: Kydelmir Dantas

CANGAÇO – MILLENARIAN REBELS: PROPHETS AND OUTLAWS Parte VII

Photo from the 1920s, showing the center of Juazeiro in the state of Ceará – http://www.cidadejua.com

In 1889, when the Republic was proclaimed, Padre Cicero reacted in his way by carrying out his first miracles, which consolidated his position and prestige. The republican state didn’t dare to provoke hostilities and tolerated this movement that criticized the bourgeois spirit without criticizing the state. Pilgrims became increasingly numerous. Many settled in the holy city of Juazeiro where they found protection with the “little father”. The Church was disturbed by this and tried to put an end to the turbulence which it considered dangerous. It ordered Padre Cicero not to say mass or preach anymore, but it could not force him to leave Juazeiro. It was afraid that his followers would mobilize to defend him, something that must be avoided at all costs.

Padre Cicero had allies among local political leaders. His prestige, his influence, the progressive electoral force he had available to him, pushed him to strengthen his growing political authority by getting himself elected as municipal prefect.

Here we see an elderly priest Cicero among its followers – http://www.terra.com.br

In 1914, the victory of enemies made his relations with the provincial government difficult. The “little father” then called his followers to holy war against the provincial government that represented the Antichrist. God wanted it to be overthrown so that perfect happiness without shadow could reign on earth. These incitements to struggle caused troops to be sent against the New Jerusalem. But unlike the Counselor, Father Cicero enjoyed important political support in the capital of Brazil; and besides, above all, this insurrection was limited to political goals and didn’t have the ambition of overthrowing the constituted order. The prophet’s followers, with federal complicity, triumphed over the forces deployed against them and placed the provincial capital under siege, putting the governor to flight. The victorious Padre Cicero officially became the vice-governor of the state of Ceara.

In the picture we see men who fought the forces of Father Cicero, against the troops of the governor of the state of Ceará in 1914 – http://pt.wikipedia.org

In a world shattered by the continuous warfare that raged among the great families and for which the poor unfailingly paid the price, Father Cicero could institute a more peaceful society, thus improving the tragic situation of those who had nothing. He was able to do so, because he spoke in the name of the highest authority, divine authority. In this way, he put himself above the fray, beyond the local quarrels, the only way to be heard by all. In a world increasingly dominated by selfish interests, only religion could unite, at least in appearance, what was separated in deed. In sermons, Father Cicero reproached the “small” and the “great”, because they did not live according to the divine laws of charity, mutual aid and the forgiveness of offenses. He was thus able to put an end, at least temporarily, to the hostilities between families, to blot out discord, to renew alliances, to become the arbitrator of disputes, the indisputable and undisputed master of the region, the “little father”.

His movement had a conscious function of social reform. The followers made donations to the messiah that served to form a common fund to provide for the needs of the sick, widows and orphans, to buy land, to finance enterprises (Juazeiro, a small hamlet in 1870, would become the second city of the province under the stimulus of the prophet, with 70,000 in habitants). But it also had a guardian ship function for the existing system: the ideal of fraternity and equality was rigorously understood as fraternity and equality in faith and before god.

When Canudos defended its freedom with arms in 1896–1897, some men left Juazeiro to go to the aid of the commune of Monte-Santo, but the entire city didn’t rise up. And yet, at that time, an insurrection in Juazeiro would have absolutely meant the greatest danger for the Republic, which furthermore was very careful not to challenge it. The state would have found itself forced to conduct a war on two fronts. Considering the tremendous difficulty that it encountered in getting the best of the rebels of Canudos, one could legitimately ask what it would have been able to do in the face of an insurrection of the entire northeast, a thing that would certainly have happened if the movement in Juazeiro had committed itself to that struggle.

In the final analysis, in a period disturbed by increasingly bitter rivalry between particular interests, Father Cicero brought social peace. This allowed the poor of the region, along with those who came from the coast, to breathe, to relax and to rediscover with him, if not the hope of a new life, at least that of a better life.

 
1934 – Funeral of Father Cícero – http://oberronet.blogspot.com.br

After his death in 1934, various messianic movements developed in the sertão. Most of them were immediately stopped by the action of the local authorities, unless they learned to follow the example of Father Cicero and come to terms with the politicians of the region. This was the case of Pedro Batista de Silva’s movement in Bahia. He succeeded in making the Santa Brígida precinct, where he established his messianic community and over which he ruled with uncontested authority, rise in the ranks of city hall.

This was not the case of the blessed Lourenço’s movement, which lasted from 1934 to 1938 and ended tragically.

In the image of the “warrior saint” Antonio Conselheiro, the blessed Lourenço founded a colony similar to Canudos in the plain of Araripe, also fully within the sertão. Here again, the poor who no longer wanted to submit to being slaves occupied the land, establishing a kind of primitive communism, a phalanstery. Everything produced was held in common. This scandalous practice that openly challenged the big property owners by violating or, worse, ignoring the laws of private property (sacred laws that established the social authority of the possessors) would rouse the almost immediate reaction of the united forces of the constituted order. Thesertanejos took up arms, scythes against cannons as in Canudos, resisting to the death. They were all slaughtered after a fierce and relentless battle, but it was too unequal. After a short time, the law of the Republic again ruled over the sertão.

Virgulino Ferreira da Silva, the “Lampião”, the most important bandit of Brazil – http://blogdomendesemendes.blogspot.com.br/

In 1938, the blessed Lourenço’s movement ended in a bloodbath. It was the last revolutionary messianic movement. On July 28 of the same year, Lampião was killed with some compadres at Angico. His death would be the death-blow inflicted on cangaceirismo. The police would easily manage to get the better of the last scattered, unsettled little groups that lacked protection or complicity. The slaughter would be brutal.

The cangaceiro was the social bandit of the northeast of Brazil and the cangaço was his band. The cangaceiro avenged himself for a humiliation, an injustice, for the blackmail imposed by a “colonel” or the police, for the murder of a relative. He then decided to exclude himself from society and go into hiding by uniting with an already existing band, a band that would allow him to survive through organized theft and escape the police forces that were hunting for him.

An avenger more than a righter of wrongs, the cangaceiro embodied generalized rebellion against the whole social order.

Drawing a typical cangaceiro and his characteristic outfit – http://www.eunapolis.ifba.edu.br

The cangaceiro bands that traveled around the northeast at the end of the 19th and the beginning of the 20th century stood side by side with the millenarian movements. In both equally, we find the same contempt for property and thus for the law, the same taste for wealth, the same generosity, the same challenge launched against the state and its cops, the same fierce determination, the same fighting spirit, the same fury. The boundary between the two was faint when not non-existent, and the passage in either direction was easy. We know of famous bandits, seduced by the prophecies of the Conselheiro, who participated in the founding of Canudos or rushed to defend it, bringing their skills and experience. Lampião thought so highly of Father Cicero’s movement that he always avoided the province of Ceará in the course of the raids.
In both cases, the same people were involved.

“From a very early age,” the university student Euclydes da Cunha wrote, “the inhabitant of the sertão regarded life from his turbulent viewpoint and understood that he was destined for a struggle without respite that urgently demanded the convergence of all his energies… always ready for a conflict where he wouldn’t be victorious, but he wouldn’t be conquered.” It probably wasn’t the nature of the northeast that molded the fierce character of these people; but they were truly indomitable people who preferred death to slavery. They were always quick to defend their freedom, the idea they had of man, a certain vision of wealth, with the greatest vigor and boldness. They stood against the entire world; and from all sides, they were destined to a struggle without respite that urgently demanded the convergence of all their energies, to a war in which they would not allow themselves to be conquered.

Cangaceiros – http://www.grupoimagem.org.br

Millenarians or cangaceiros, they were cowhands, sharecroppers, mule drivers. They were part of the rural society that was continually threatened in its existence and substantially in its freedom. They had been produced by it. They not only found a real complicity in this society, but they also expressed its deepest aspirations.

All in all, very little differentiates the two groups. The millenarians were carriers of a positive social project, but it had a religious essence, while the cangaceiros were carriers of a purely negative social project that was not religious in its essence.

United around a prophet through faith in the imminent arrival of the Millennium, through the same aspiration for a new life, the Brazilian millenarians formed a spiritual community that intended to organize itself in expectation of the final event, preparing for it. This messianic community did not have the ambition of realizing the Millennium itself, but it did already oppose the spirit of the existing world in a radical way by recognizing itself in the community of a future world. It carried within itself a positive social project that essentially remained religious; it formed the idea of a society not yet realized and whose realization did not belong to it. It was the premonition of this new society.

Extraído do blog: "Tok de História" do historiógrafo e pesquisador do cangaço Rostand Medeiros

http://tokdehistoria.wordpress.com/2012/09/22/cangaco-millenarian-rebels-prophets-and-outlaws/  

TUDO TÃO SIMPLES (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

TUDO TÃO SIMPLES

Debaixo do sol da tarde, ou mesmo no tempo ameno do entardecer, passar diante da casinha de Sinhá Totonha era convite certo ao despertar de uma vontade danada de ir até lá experimentar um pedacinho de cocada branca.

E dizia ela, em voz baixinha, cansada: “Coco novo, novinho, meu fio, de carne macia. E tudo cortadim em pedacinho miúdo. Açúcar do bruto, grosso, escurecido. Depois ele pega a cor do leite de coco. E um tanto de leite de gado, puro, sem ter aguação. Adespois o tempero, o cravo, o mexido, o cuidado com o ponto”. Tão fácil assim, porém ninguém fazia igual.


No passado, quando as dores não atormentavam tanto suas juntas – pois segundo ela do joelho abaixo doía tudo -, ali podia ser experimentado não só a cocada como o doce de leite com bolas, cocada mole e pirulito feito de mel verdadeiro de abelha. De vez em quando inovava com bolo de milho e de macaxeira. Uma delícia de lamber os beiços.

De uns tempos pra cá, contudo, mal podia ralar os cocos e se entregar aos outros afazeres para que a cocada não deixasse de ir ao fogo de chão na hora certa. Era uma luta danada, verdadeiro ofício de doceira na sua lide cansativa, mas que servia a dois objetivos ao mesmo tempo: ganhar tostão de encobrir gasto e, principalmente, receber a visita de um e outro.
Cada pessoa que passava pela estrada defronte à casinha e resolvesse chamar à porta para comprar pedaços de cocada era também certeza de um instante de prosa, de uma palavrinha amiga em meio à solidão. Vivia sozinha a velha senhora, mas com parentes na cidade que pouco caso faziam de sua vida. Mas gostavam de ir buscar cocada de graça, e coisa muita.

No passado havia acima da porta uma plaquinha em madeira dizendo da venda de doces e bolos. Um dia a ventania derrubou e nem precisou colocar mais qualquer aviso, pois tudo mundo já sabia o que podia encontrar ali na saleta da frente da casinha de barro e ripa. Moradia simples, muito humilde, tão velha quanto a dona, mas de uma limpeza sem igual.

Na saleta, por riba de uma mesinha de apenas três pernas, bem arrumadinhos dentro de um tabuleiro raso, repousavam saborosamente os quadradinhos de cocada. Branquinhos, branquinhos, com alguns pedacinhos de coco despontando, cada naco de avistado era um convite certeiro à gula doceira. Mistura no ponto, açúcar na medida, o leite de coco enchendo a boca.


Mais ao lado, noutra banquinha, duas moringas de barro queimado, como que gotejando pelo lado de fora, com água refrescante, deliciosa demais depois do doce saboreado. Estavam com a boca sempre coberta por panos de renda da mesma cor da cocada oferecida, numa brancura que parecia sempre colocados ali no mesmo instante. Três canecas de alumínio ao lado, limpinhas, brilhosas, sempre lavadas e bem lavadas com bucha e sabão depois de cada uso.
 
A pobreza do lugar contrastava com sua limpeza. Poucos e antigos móveis, apenas cadeiras e um banco. Uma mesa de cozinha, uma cristaleira, e pronto. No quarto, a cama e o oratório de herança familiar, com uma vela sempre acesa ao lado. Mas quem entrava ali nem se importava com a simplicidade do lugar, vez que o que interessava mesmo era o olhar guloso encontrando a mesinha com a cocada.

Por isso que não havia jeito, não havia regime que resistisse. Duvido que alguém não experimentasse três, quatro pedaços da delícia. Costumeiro visitante que era, muitas vezes vi gente lambendo as pontas dos dedos após se fartar daquela brancura com coco. Muitos saíam de lá com embrulhos, pacotes, levando a cocada até mesmo pelos bolsos.


E depois pagar aquilo tudo com quase nada de dinheiro. Certa vez perguntei se ela não tomava prejuízo vendendo a cocada por preço tão barato, um quase nada diante da delícia que era. E ela respondeu simplesmente que não, pois continuava pinicando coco não para ganhar dinheiro, mas para ter por ali visitantes e pessoas que tinham um tempinho para ouvir sua voz.

A riqueza maior que queria ter era a presença de alguém, a palavra dita e ouvida, um instante de doçura na sua solidão. A doçura do carinho, do respeito, do convívio e proseado com quem não tinha apenas muita idade, mas principalmente uma vida a recordar. E hoje uma vontade danada de comer cocada. Apenas uma vontade danada.

Encontro cocadas. Apenas encontro. Mas não encontro mais o sabor, a presença doceira. Tudo passou do ponto. Tudo passou. Tudo passado. E como dói...
  
Biografia do autor:

(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Sérgia Ribeiro da Silva - a cangaceira Dadá

Dadá, ao lado de Corisco - Foto de Benjamin Abrahão Botto.

Sérgia Ribeiro da Silva[1], mais conhecida como Dadá (Belém de São Francisco, 25 de abril de 1915 — Salvador, fevereiro de 1994), foi uma cangaceira - única mulher a pegar em armas no bando de Lampião.

Nasceu em Belém de São Francisco, onde viveu seus primeiros anos de vida e teve algum contato com índios. A família muda-se para a Bahia onde, aos treze anos, é raptada por Corisco (Cristino Gomes da Silva Cleto) - o "Diabo Loiro", de quem seria prima.

Cabocla bonita, esbelta, conheceu o homem da sua vida de forma violenta, em meio a caatinga árida por onde vivia errante o bando de cangaceiros. Consta que seu defloramento provocara-lhe tanta hemorragia que por pouco não faleceu.

A relação, que começara instintiva, transforma-se com o tempo. A vida nômade, seguindo o companheiro, que era o segundo homem, na hierarquia do bando, a chegada dos filhos, fez com que mais que uma amante Dadá se tornou a companheira de Corisco, com quem, ainda no meio das lutas veio a se casar.

Tiveram sete filhos, que eram ocultamente deixados em casas de parentes para serem criados. Destes, apenas três sobreviveram.

O bando de Lampíão dividia-se, como forma de defesa, em partes menores, a mais importante delas era justamente a chefiada por Corisco. A esposa tinha uma pistola, que ele dera, para sua defesa pessoal, e também lhe ensinou a ler, escrever e contar.

Num dos ataques feitos pelas volantes (em outubro de 1939, na fazenda Lagoa da Serra em Sergipe), o Diabo Louro é ferido em ambas as mãos, perdendo a capacidade para atirar. Dadá, então, torna-se a primeira e única mulher a tomar parte ativa - e não meramente defensiva - nas lutas do cangaço.

Se o marido era temido como um dos mais violentos bandoleiros, consta que muitas pessoas tiveram sua vida poupada graças à intervenção de sua companheira. Dada também era chamado "Suaçuarana do Cangaço".

Tendo Lampião sido executado em 1938, Corisco, que estava em Alagoas com parte do bando, empreendeu feroz vingança. Como seus companheiros tiveram as cabeças decepadas, e expostas no Museu Nina Rodrigues de criminologia, na capital baiana, Corisco também cortou a cabeça de muitas vítimas, então.

O cangaço definhava, sobretudo pela disparidade de armamentos: os volantes tinham uma arma que os cangaceiros nunca conseguiram obter: a metralhadora. A própria Justiça passa a oferecer vantagens para os bandoleiros que se rendessem.

A 25 de maio de 1940 Corisco e seu bando é cercado em Brotas de Macaúbas, pela volante do tenente Zé Rufino. Dissolvera o bando, e abandonara as vestes típicas, procurando passar por simples retirantes.
Uma rajada da metralhadora rompe os intestinos de Corisco. Dadá é ferida na perna direita.

O último líder do cangaço morre dez horas depois do ataque, sendo enterrado em Jeremoabo e, dez dias após, exumado e a cabeça decepada é enviada ao Museu, junto às demais do bando.

Dadá, colocada em condições infectas, tem seu ferimento agravado para uma gangrena, que restou-lhe, na prisão, à amputação quase total da perna. Por essa situação, o célebre rábula baiano Cosme de Farias, representa Dadá na Justiça, pleiteando sua libertação, em 1942.

Dadá passou a viver em Salvador, lutando para ver a legislação que assegura o respeito aos mortos fosse cumprida - e a tétrica exposição do Museu Antropológico Estácio de Lima[2], localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues tivesse fim. Só a 6 de fevereiro de 1969, no governo Luiz Viana Filho, foi que os restos mortais dos cangaceiros puderam ser inumados definitivamente - tendo, porém, o museu feito moldes para expor, em substituição.

Por sua luta e representatividade feminina, Dadá foi, na década de 1980, homenageada pela Câmara Municipal de Salvador. Na Bahia, que tivera Gláuber Rocha e tantos outros a retratar o cangaço nas artes, Dadá era a última prova viva a testemunhar o cotidiano de lutas, dificuldades e, também, de alegrias e divertimentos. Deu muitas entrevistas, demonstrando sua inteligência e desenvoltura.

Morreu, na capital baiana, em 1994.

http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9rgia_Ribeiro_da_Silva