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segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

OS SERTÕES: AS PRÉDICAS DE ANTÔNIO CONSELHEIRO E A POESIA DE CANUDOS - PARTE II

Por Aleilton Fonseca

As prédicas nos manuscritos de Antônio Conselheiro

As prédicas e discursos de Antônio Conselheiro constam de um caderno manuscrito que foi encontrado em Canudos, após o fim da luta, por João de Sousa Pondé, médico que participou da campanha como cirurgião da última e vencedora expedição militar. Segundo constatou Ataliba Nogueira, a obra manuscrita é autêntica e do próprio punho de Antônio Conselheiro (8). Os manuscritos foram doados por João de Sousa Pondé ao escritor baiano Afrânio Peixoto que, por sua vez, passou-os a Euclides da Cunha, quando Os sertões já estavam publicados. Euclides morreu poucos meses depois e não se sabe se teve tempo de folhear os manuscritos do Conselheiro.

Publicados por Ataliba Nogueira, em 1974, portanto, cerca de 72 anos após o lançamento de Os sertões, os manuscritos do líder religioso trouxeram para os estudiosos o dever e a oportunidade de confrontá-los com a apreciação dos escritos de Euclides da Cunha. Como descreve Ataliba Nogueira, a obra manuscrita consta de 628 páginas, numeradas e sem margem, contendo 14 linhas cada. Escrita em tinta preta, caligrafia boa e regular. O seu formato é de 10 x 14 cm (9).

O manuscrito divide-se em quatro partes. Na primeira, constam "Os mistérios de Maria", em número de 29, cada qual sendo motivo para uma prédica. Na segunda parte, constam os "Dez Mandamentos da Lei de Deus", na forma de comentários e pregações da doutrina. A terceira parte traz textos selecionados dos evangelhos bíblicos, dos apóstolos do Novo Testamento, em que os trechos citados são rigorosamente identificados, com a indicação do apóstolo, do capítulo bíblico e do número do versículo. A quarta parte consta de assuntos esparsos, em que estão desenvolvidas idéias de Antônio Conselheiro acerca de símbolos, ritos e sacramentos católicos (cruz, missa, confissão, feitos de Jesus) e, ao lado disso, seus discursos sobre seu trabalho de edificador de igrejas e sobre a República.

A leitura dos textos de Antônio Conselheiro traz ao leitor de Euclides da Cunha uma surpresa instigadora. Os textos têm um nível considerável de organização, com uma distribuição e uma seqüência lógica dos assuntos. São gramaticalmente bem estruturados e o seu conteúdo religioso, longe de qualquer aberração, é equilibrado e bastante próximo do texto bíblico. Sua aplicação como fundamento para prédicas e discursos situa-se de maneira clara na observância dos valores católicos tradicionais. É certo que em alguns fundamentos a pregação de Conselheiro encontra-se desatualizada em relação aos cânones oficiais. Um exemplo disso é a idéia do direito divino dos reis, raiz de sua discordância em relação ao regime republicano, que a Igreja oficial já abolira. Mas, quanto ao conteúdo dos ensinamentos e da moral religiosa, observa-se que não há motivo para considerá-los "misticismo doentio", ou resultado de "loucura coletiva". Trata-se, na verdade, de uma prática religiosa alternativa e popular que, diante das condições socioculturais e políticas do espaço sertanejo e do embate provocado pela intervenção militar, acabou ganhando um relevo histórico especial.

Com efeito, os discursos que expressam os traços da personalidade e a natureza da liderança do Conselheiro ajudam a esclarecer melhor o seu perfil, em contraposição aos traços negativos estampados em Os sertões. O discurso "Sobre o recebimento da chave da Igreja de Santo Antônio" (10), padroeiro de Belo Monte, revela um líder religioso humilde, sem fanatismo, com um texto estruturado que esclarece posições e idéias de forma clara e inteligível. Nesse discurso, o beato agradece a todos que "concorreram com as suas esmolas e com os seus braços" para a edificação da igreja, prometendo-lhes a recompensa do Bom Jesus. Em seguida, explana sobre o surgimento do catolicismo, sobre o sacrifício de Cristo para a remissão do pecado original e a importância da obediência aos "Mandamentos da Lei de Deus". Posteriormente, faz observações restritivas ao Judaísmo por continuar reverenciando Moisés e não aceitar os princípios da religião cristã. Ao lado disso, critica aqueles que, no seu entendimento, "se movem pela incredulidade", "espalhando doutrinas falsas e errôneas aos ignorantes". Como exemplo, cita judeus, maçons, protestantes e republicanos, acusando os últimos de perseguir a religião do Bom Jesus. Em função disso, reafirma a importância da igreja como forma de congregação:

Portanto a Igreja é a congregação dos fiéis que, por dever indeclinável, devem curvar-se reverentemente diante de Deus, rendendo-lhe as devidas adorações, invocando o seu nome com amorosa confiança, tendo por certo que Deus lhes será propício.

Enfim, o beato termina o seu discurso contando a parábola do semeador, a propósito do trabalho de evangelização e seus diferentes graus de recepção. Observa-se, enfim, no texto, que fica clara a compreensão do Conselheiro acerca do catolicismo, suas origens e fundamentos bíblicos. Observa-se também que as citações bíblicas são pertinentes e lógicas, sendo encaixadas de forma aceitável no discurso, com um tom persuasivo e evangelizador.

No discurso "Sobre a República" (11), estão expostas as idéias de Antônio Conselheiro em que se pode observar um conteúdo mais político, embora sempre determinado pela religião. A premissa fundamental do texto é a de que a República deseja acabar com a religião e por isso é nociva ao povo sertanejo. A República é criticada como "assunto que tem sido o assombro e o abalo dos fiéis". Vista como grande mal para o Brasil, sua implantação é debitada à "incredulidade do homem". Na ótica do Conselheiro, a deposição do monarca contrariava a vontade divina, pois: "Todo poder legítimo é emanação da Onipotência eterna de Deus". Assim, afirma:

É evidente que a república permanece sobre um princípio falso e dele não se pode tirar conseqüência legítima: sustentar o contrário seria absurdo, espantoso e singularíssimo; porque, ainda que ela trouxesse o bem para o país, por si é má, porque vai de encontro à vontade de Deus, com manifesta ofensa de sua divina lei. (12)

Tratava-se, portanto, de uma questão de princípio sustentada por um dogma religioso que fundamentava sua posição contrária ao regime republicano. Em função disso, ele acredita que a República, o novo regime, não triunfará por ser "filha da incredulidade", defende o direito da família real que considera "legitimamente constituída para governar o Brasil", critica a instituição do casamento civil pelos republicanos, comenta aspectos do regime escravocrata e exalta a abolição como um feito da Princesa Isabel em obediência à determinação divina (13). O beato conclui pedindo desculpas aos ouvintes por proferir "palavras excessivamente rígidas, combatendo a maldita república":

Sim, o desejo que tenho da vossa salvação (que fala mais alto do que tudo quanto eu pudesse aqui deduzir) me forçou a proceder daquela maneira. Se porém se acham ressentidos de mim, peço-vos que me perdoeis pelo amor de Deus. (14)

Em seguida, despede-se manifestando o desejo de que os ouvintes correspondam "com aquela conversão sincera", ou seja, com a adesão à causa religiosa e colocando-se contra a ordem republicana. Observa-se, desse modo, que as razões do pregador eram puramente religiosas. Para ele, combater a República era defender a religião. Sem dúvida, sua compreensão do processo histórico é limitada e politicamente equivocada, porquanto somente o analisa do ponto de vista de sua crença religiosa. Contudo, conservador a seu modo, o discurso conselheirista tem uma argumentação explicativa e persuasiva, sem nenhum traço ou tom impositivo. Trata-se de um discurso embasado em idéias passíveis de discordância, de rejeição e de crítica. No entanto, é forçoso reconhecer a sua boa estruturação gramatical e a seqüência lógica de sua cadeia argumentativa, como texto organizado por uma mente sadia. As prédicas e os discursos, longe de denunciarem-no como "heresiarca", "insano" ou "fanático", acabam apresentando-o como líder religioso humilde, sóbrio e consciente da importância congregadora da religião para os sertanejos.

CONTINUA...


Enviado pelo escritor, professor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo Cardoso

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LEMBRANÇAS DE ANNA MARIA CASCUDO BARRETO

Por Rostand Medeiros
Rostand Medeiros e Anna Maria Cascudo Barreto

Recentemente estava viajando de férias com a minha família, bem distante do nosso Rio Grande do Norte, quando tomei conhecimento do falecimento da escritora Anna Maria Cascudo Barreto.

Para mim foi uma triste notícia.

No momento da passagem de amigos para o plano espiritual eu não sou bom em escrever palavras de conforto. Prefiro registrar as lembranças que tenho destas pessoas especiais.

Eu já admirava Anna muito antes de conhecê-la pessoalmente, principalmente através de seus escritos. Gostei imensamente de um texto publicado em uma revista onde ela descrevia emocionada o amor e a admiração que tinha pelo seu pai Luís da Câmara Cascudo. Particularmente neste texto me chamou atenção a descrição que ela fez de visitas que realizou a terreiros de candomblé junto com seu pai, quando o Mestre Cascudo desenvolvia pesquisas para seus livros. Ela contou com singular clareza como Câmara Cascudo se entregava com abnegação ao seu trabalho e como era respeitado pelos Mestres da cultura popular.

Nós conhecemos em 2008, na época em que atuava na Fundação Rampa desenvolvendo em parceria com Frederico Nicolau o livro “Os Cavaleiros dos céus – A saga do voo de Ferrarin e Del Prete”. Respeitosamente a chamava de “Dona Anna Maria”, mas ela foi logo simplificando tudo e passei a chamá-la apenas de Anna.

Ocorreram entre nós memoráveis encontros, sempre regados a muita conversa sobre a história da aviação potiguar e do passado da nossa terra. Diante da ansiedade do lançamento do meu primeiro trabalho, me chamou atenção a sua simplicidade, o seu desprendimento em ajudar-nos, sua paciência e a sua extrema boa vontade em ensinar.

Um dia ela perguntou a mim e a Frederico se poderia escrever o prefácio do nosso livro. Daí surgiu um maravilhoso texto intitulado “A invenção do Azul”. Aquele gesto foi algo que jamais esquecerei.

Recordo-me com alegria de uma viagem que realizamos a Recife, a convite do brigadeiro Telles Ribeiro, então comandante do II Comando Aéreo (II COMAR). Naquela ocasião tive a oportunidade de conhecer o seu marido, o engenheiro Camilo de Freitas Barreto, uma pessoa extremamente espirituosa e alegre.

Na sequência deixei a Fundação Rampa e segui meu próprio rumo. Fui para a cidade de São Miguel, na região Oeste Potiguar, onde realizei a biografia de João Alves de Lima, fundador do grupo de torrefação de café Santa Clara/3 Corações. Coincidentemente foi nesta mesma região, na noite de 21 de dezembro de 1894, que Francisco de Oliveira Cascudo, avô de Anna, então alferes do Batalhão de Segurança do Corpo Policial, combateu e matou o terrível cangaceiro Moita Brava. Neste período ela estava muito empolgada realizando a biografia de seu avô e procurei ajudá-la no que foi possível com dados históricos coletados em São Miguel. Tempos depois foi lançado o livro “Coronel Cascudo – O Herói Oculto”.

Nesta troca de informações estive em várias ocasiões na sua casa, onde sempre fui extremamente bem recebido por esta mulher que possuía no mesmo patamar classe e simplicidade.

Continuei minha trajetória, mas sempre recordando com enorme satisfação esta amiga tão inteligente, que me presenteou com maravilhosos diálogos sobre seu pai, sobre o passado da nossa terra e da nossa gente.

Anna me disse uma vez para jamais deixar de ler, pois a falta da leitura “atrofiava a mente”. Procuro seguir este seu ensinamento religiosamente, todo santo dia.

Desejo a todos seus filhos e netos conforto nesta hora de tristeza.

Rostand Medeiros é historiógrafo e pesquisador do cangaço

http://tokdehistoria.com.br/2015/01/19/lembrancas-de-anna-maria-cascudo-barreto/

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Herculano Borges de Sales perdeu o seu couro para o cangaceiro Corisco


Nesta cerca situada na fazenda Bom Despacho, município de Santa Rosa de Lima, no Estado da Bahia, ficaram pendurados e expostos os restos mortais de Herculano Borges de Sales, antigo desafeto do cangaceiro Corisco.


Herculano foi preso, torturado e esquartejado, tendo a sua pele sido retirada com faca pelas mãos do cangaceiro Corisco, que saciou a sua vingança matando aquele que julgava ser o responsável pelo seu retorno à vida sofrida e miserável do cangaço.

... nas quebradas do sertão.

Foto cedida gentilmente pelo Dr. Sérgio Dantas (Natal-Rn)

Fonte: facebook

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É A PRIMEIRA VEZ QUE VEJO LUIZ GONZAGA MONTADO NUMA BICICLETA


Muito antes da moda das bikes Luiz Gonzaga sabia das coisas.  Enciclopédia Nordeste: Biografia de Luiz Gonzaga 
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Cronologia da vida de Luiz Gonzaga:

http://www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php?titulo=Luiz+Gonzaga&ltr=l&id_perso=129

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Capitão ou Coronel?

Por: Jorge Remígio

O preconceito que existe em relação à polícia é secular. Entre outros fatores, um órgão de repressão só em determinados momentos tem a compreensão e aceitação do público. Seria um erro crasso, admitir que não houve excessos por parte de policiais volantes e até de alguns comandantes no combate ao banditismo rural, principalmente nas décadas de vinte e trinta.

O que me deixa estarrecido é ver pessoas estudiosas, escritores e aficionados do estudo do cangaço que desconhecem o papel relevante de homens aguerridos e intrépidos que embrenharam-se nos emaranhados garranchos e espinhos das caatingas do semi-árido na perseguição quase que ininterrupta aos bandoleiros, sofrendo todas as intempéries da natureza, como chuvas, sol abrasador, dormindo ao relento, passando fome e sede muitas vezes, adoecendo, ferindo-se em espinhos, deixando de ver a família por vários meses, recebendo um soldo insignificante, correndo o risco de morrer em combate a qualquer momento entre outras coisas nefastas inerentes à missão. 

Comento isso porque sei que muitos comungam com esse pensamento e também quero deixar aqui um apelo: Não fiquem afirmando categoricamente sem a menor prova documental que as volantes praticaram mais violência do que cangaceiros. Porque isso é prova inconteste de um total desconhecimento do que foi o fenômeno CANGAÇO. 

Jorge Remígio
Pesquisador do GPEC
Membro do Cariri Cangaço

http://cariricangaco.blogspot.com.br/2015/01/capitao-ou-coronel-por-jorge-remigio.html

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QUEM FOI DELMIRO AUGUSTO DA CRUZ GOUVEIA?


Delmiro Gouveia Augusto da Cruz Gouveia, filho do cearense Delmiro Porfírio de Farias e da pernambucana Leonila Flora da Cruz Gouveia, nasceu em 5 de junho de 1863, na Fazenda Boa Vista, localizada no município de Ipú, no Ceará.

Com o falecimento de seu pai na Guerra do Paraguai, Delmiro Gouveia foi morar em Pernambuco, estabelecendo-se na cidade de Goiana, no ano de 1868, e em Recife, a partir do ano de 1872.


Em 1878, com a morte de sua mãe, Delmiro Gouveia iniciou a sua vida profissional como condutor e bilheteiro do bonde que fazia o trajeto entre Apipucos e Recife. Posteriormente, em 1881, passou a trabalhar como despachante em um armazém de algodão.

Em 1883, casado com Anunciada Cândida, filha do tabelião da cidade pernambucana de Pesqueira, Delmiro Gouveia resolveu ingressar no comércio de couros de cabra e bode.

Veja fachada em 1917

Logo obteve sucesso com a nova profissão, passando a incomodar os seus concorrentes com a prática de preços baixos e com uma forte influência no mercado, sendo, inclusive, intermediador de negociações entre comerciantes locais e empresas de exportação.

Em 1892, Delmiro Gouveia passou a atuar como gerente da filial de um curtume americano, onde outrora foi empregado.

Em 1898, tendo como referência à Feira Internacional de Chicago realizada em 1893, Delmiro Gouveia inaugurou o Mercado do Derby, no centro de Recife, que era um moderno centro de comércio, serviços e lazer, edificado em uma área de 129 metros de comprimento, com hotel, velódromo, pavilhão de diversões e 264 boxes para a comercialização de produtos.

Em 1899, Delmiro Gouveia assumiu a direção da Usina Beltrão e passou a ter conflitos políticos, envolvendo-se, inclusive, com a filha bastarda do governador de Pernambuco, Sigismundo Gonçalves, um de seus opositores.

Na eleição do ano de 1899, embora não tenha sido candidato, Delmiro Gouveia percorreu o interior de Pernambuco em campanha eleitoral, acirrando ainda mais a oposição que fazia a um poderoso grupo situacionista, então liderado pelo vice-presidente da República Rosa e Silva, que exerceu o controle da política em Pernambuco de 1896 a 1911.

No dia 2 de janeiro de 1900, o Mercado do Derby foi criminosamente incendiado, dando ensejo a uma nova fase na vida do empreendedor, que passou a ter como cenário o estado de Alagoas.

E este novo momento começou no povoado da Pedra, localizado no sertão alagoano, em uma estratégica área de fronteira com os estados de Pernambuco, Sergipe e Bahia. Na época, a estrutura da região era muito precária, sem abastecimento de água e com a presença, apenas, de uma estação da Ferrovia de Paulo Afonso e de algumas casas de taipa.

Já separado de sua esposa, que resolveu retornar a casa dos pais, Delmiro Gouveia passou a viver com a filha do governador de Pernambuco, Carmela Eulina do Amaral Gusmão, união que resultou no nascimento dos filhos Noêmia, em 1904, Noé, em 1905, e Maria Augusta, em 1907.

Em 1903, Delmiro Gouveia adquiriu a Fazenda da Pedra, no sertão de Alagoas, e reiniciou a sua vida profissional, novamente atuando no comércio de couros de cabra e bode.

Usina de Angiquinho atualmente, casa de força e embaixo a casa do ferreiro.

Assim como ocorreu em Pernambuco, seu novo empreendimento em Alagoas prosperou, transformando significativamente a região e criando um novo centro comercial de couros. Em 1909, Delmiro Gouveia já tinha refeito a sua fortuna, retomando a liderança nos negócios.

Seus adversários políticos chegaram a questionar, em Recife, a probidade de seus empreendimentos, o que deu ensejo à seguinte resposta de Delmiro Gouveia:

“Si elles tivessem no sangue, nos nervos, nas faces, vergonha, e no organismo alguma coisa de energia e sentimento, deviam orgulhar-se de haver um homem do povo, pobre porém trabalhador, capaz de mostrar-lhes com exemplos que quem lucta pela vida com honradez, actividade e perseverança, póde conseguir uma posição na sociedade e, em vez de andarem pelas ruas, cafés, trens e esquinas empregando-se na maledicência, podiam dedicar-se ao trabalho proveitoso, que nobilita o homem e dá-lhe sempre o direito de confundir seus inimigos gratuitos”

Delmiro Gouveia, diante do potencial energético da Cachoeira de Paulo Afonso, iniciou a construção da primeira usina hidrelétrica do Brasil. Em 1913, após dois anos de trabalho, a Usina de Angiquinho foi inaugurada.
Delmiro Gouveia também viabilizou a construção de uma vila operária, escolas, estradas e o fornecimento gratuito de água e energia para a região do Povoado da Pedra.

Em 1914, Delmiro Gouveia construiu uma fábrica – a Fábrica da Pedra – para a produção de fios e linhas de costura, que utilizava a energia da Usina de Angiquinho e empregava 2.000 operários brasileiros. A fábrica tornou-se referência na época, passando a comercializar seus produtos no Brasil e a exportar para o Peru e o Chile.

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Vista da usina de Angiquinho, primeira usina hidroelétrica do nordeste

Toda a ascensão de Delmiro Gouveia, que não só trazia benefícios para ele, como também para a população local, passou a ser uma ameaça para o “coronéis” da região.

A poderosa fábrica inglesa Machine Cottons que também produzia fios e linhas de costura, passou a pressionar o irredutível Delmiro Gouveia em busca da aquisição de sua fábrica.

No dia 10 de outubro de 1917, às 20h30, Delmiro Gouveia, é morto em frente ao seu chalé, perto da Fábrica da Pedra, crime este, até hoje sem elucidação do mesmo.

Fonte: facebook
Página: Coronel Delmiro Gouveia

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O CANGAÇO EM ITABAIANA GRANDE

Autor Robério Santos


Os primeiros comentários sobre meu novo livro: "O Cangaço em Itabaiana Grande", começaram a chegar. Pessoas estão lendo e tecendo seus comentários. Esta semana teremos "Jornal da Cidade" com matéria sobre ele, e também amanhã o "Jornal Cinform".

Antonio Francisco Jesus falou sobre o livro "Cangaço em Itabaiana Grande" do escritor Robério Santos:

Comprei hoje em Itabaiana. Gostei de tudo que pude ver neste pouco tempo. Inclusive de "Lampião no oitão da tenda". Depois de folhear e ler aleatoriamente textos, peguei do início e estou agora na página 75. Boa leitura. Muitas fotos e inclusive artes criadas exclusivamente (pelo que depreendi) para o próprio livro." 

Raul Meneleu Mascarenhas disse:

Tô gostando muito do livro. Merece ser lido na tranquilidade. O livro "Cangaço em Itabaiana Grande".


Sobre o livro do Robério, sei se tratar de um profundo trabalho de pesquisa, muito bem ilustrado com mapas (neste caso orgulho-me de também ter contribuído), fotografias, xilogravuras, reprodução de cartazes, gráficos e até uma HQ, com um traço magnífico. A crítica mais profunda, somente quando o ler; por enquanto apenas “olhei as figuras”.

Fonte: facebook
Página: Robério Santos

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HOJE. JORNAL CINFORM, ANO 32, EDIÇÃO 1658. CADERNO MUNICÍPIOS PÁGINA 9.


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ANTÔNIO SILVINO (CANGACEIRO QUE ANTECEDEU LAMPIÃO) VISITOU PEDRA LAVRADA-PB POR CLODOALDO MELO

Por Clodoaldo Melo
Primeira visita em 1912

Pedra Lavrada pode não ter tido o delegado mais valente do mundo, mas já teve o mais “hospitaleiro”, João Jerônimo da Costa. Tratava o cangaceiro Antônio Silvino com a maior deferência do mundo. Era o cicerone de “Fuzil de Ouro” nas duas vezes que ele visitou a cidade, levando-o de casa em casa e apresentando-o às pessoas mais importantes e prestando continência ao bandoleiro. Aí é o que se pode chamar de desvio de função! Aquela autoridade local era para proteger a cidade dos cangaceiros, mas convivia pacificamente com os facínoras.

Em 1912, o casal D. Ernestina Carrilho de Oliveira, D. Doninha, e Manoel Júlio Rodrigues de Lima, ambos de Catolé do Rocha, moravam em Pedra Lavrada. Eles tinham um pequeno hotelzinho na cidade. D. Doninha era, e ainda hoje é lembrada pelos netos, como a pessoa mais ignorante, estúpida e inconsequente deste mundo de meu Deus. Nunca levou desaforo para casa. Fazer pergunta descabida ou dar palpites fora de tom ou da hora, era pedir para ouvir o diabo de D. Doninha. Era valente mesmo e não abria para um trem não. Manoel Júlio, um neto, diz sobre ela: 

- Minha vó, Mãe Doninha, era danada. Não se sabe como se vem ao mundo daquele jeito não – e rindo termina – ou velha ruim danada! Agora que era direita e honesta, era. Essas duas virtudes chegaram nela e pararam.

Nessa primeira visita de Antônio Silvino à cidade, D. Doninha enviuvara e tocava o hotelzinho, sozinha. Antônio Silvino chegou acompanhado do delegado João Jerônimo no estabelecimento de D. Doninha por volta das nove horas da manhã. O delegado fez a apresentação:

- D. Doninha este é o capitão Antônio Silvino. Capitão, esta é D. Doninha, a mulher que faz o melhor arroz doce do mundo que lhe falei. 

Silvino olhou o arroz doce e disse: 

- Vou comer do seu arroz, coloque dois pratos. D. Doninha colocou dois pratos cheios de arroz na mesa.

O Cangaceiro olhou-a e ordenou: 

- D. Doninha, pode começar comer o seu!

D. Doninha perguntou: 

- O que? Comer o quê, homem?

Respondeu o bandoleiro: 

- Não ouviu bem, D. Doninha? Mandei comer do arroz. Eu só como quando quem prepara minha comida come primeiro.

D. Doninha lhe respondeu alto e bom som:
  
- Pois não vai comer não ou coma se quiser. Eu já comi hoje de manhã e só como na hora certa e quando quero. A essa hora não como nada e não tem quem me faça comer à força!

O impasse estava criado.

Foi quando o delegado engolindo em seco balbuciou pisando macio que só cabra procurando penico cheio com o pé em noite escura:

- Caaapiitão, o seeenhor esesestá diante de uma das mulheres mais direeeita da reeegião. Se ela diz que não vai comer, não comerá mesmo. - Eu confiiiiiio nessssta mulheeeeer. Diga qual é o meu prato dos dois, Capitão, que comerei por ela. Esssta coomiidaa não tem veneno não!

O Capitão Silvino trocou os pratos, deu um ao delegado e os dois homens começaram a comer.

Comeu, gostou e elogiou o arroz doce depois disse: 

- D. Doninha, a senhora tem muito dinheiro!

D. Doninha responde-lhe: 

- Tenho. Posso não ter o valor que lhe disseram, mas tenho dinheiro.

Silvino continuou: 

- D. Doninha, a senhora tem 200 mil réis para me dar?

E a senhora disse: 

- Tenho sim. Enfiou a mão num bolso de um avental e puxou uma nota esverdeada e grande, uma nota de 200 mil réis.
  
- Tome! estendeu-lhe a mão com o dinheiro D. Doninha.

Foi quando o cangaceiro, disse balançando a cabeça: 

- Não, não Dona eu não recebo dinheiro de criança, nem de mulher e muito menos de viúva...

Aí foi quando D. Doninha rodou a baiana, e disse: 

- Capitão Antônio Silvino, se experimenta fumo, mulher de verdade, não!

O Capitão Antônio Silvino saiu rindo e dizendo ao delegado: 

- Tudo como você me falou. O arroz doce é o melhor do mundo e D. Doninha é a mulher mais malcriada ou valente que já conheci.

A SEGUNDA VISITA EM 1913

Na segunda visita do bandoleiro a Pedra Lavrada ele foi recebido pelo delegado João Jerônimo. O coronel Eugênio Vasconcelos, irmão de Chico Ferreira, tinha uma loja e vendia chapéus. Antônio Silvino parou na loja viu um chapéu marca Ramezzoni 3X (o melhor que existia, hoje, seu preço varia entre R$ 174,00 a R$ 240,00), e perguntou o preço. 

- Dez mil réis – respondeu o coronel Eugênio. 

O cangaceiro não regateou e deu uma nota de vinte mil réis para o Coronel. Este conheceu a nota falsa e disse acompanhado de gestos de toda gentileza: 

- Ora, Capitão Antônio Silvino, o senhor acha que eu vou cobrar um chapéu a você. Ora, ora... 

O bandoleiro agradeceu o presente (era educado) e, além de levar o chapéu passando a nota falsa, ainda queria mais dez mil réis de quebra. Mas, com o Coronel Eugênio não conseguiu tal proeza.

À noite o delegado João Jerônimo fez um baile para os facínoras dançarem. A cidade transformou-se numa festa. A sanfona roncava, o xaxado comia no centro e os bandidos bebiam e dançavam. Às quatro horas da manhã Antônio Silvino chamou o delegado e disse: 

- João, eu vou indo e estou sentindo cheiro de macacos (soldados) por perto, mas me dê um recado a eles. Diga ao Comandante da Volante que não vão atrás de mim não que eu estou cansado, pois dancei à noite toda e um homem cansado não corre, briga! Disse isso e saiu logo. Depressa como os cangaceiros chegaram depressa se foram. Na hora de partir não faziam rodas para não atraírem disparos em cima deles e nem se despediam. Eram como ciganos num instante arribavam, era como serpentes escorregavam e sumiam. De repente nenhum cangaceiro no meio do povo.

Mais ou menos às sete horas da mesma manhã a volante comandada pelo tenente Joaquim Henrique e auxiliado pelo cabo Piaba chegaram a Pedra Lavrada. O tenente Joaquim Henrique ainda sentiu nas ventas o cheiro de perfume dos cangaceiros (eles andavam muito perfumados) e mandou localizar depressa o delegado. O delegado João Jerônimo às pressas ainda ajeitando o cinturão e o chapéu, disse que o bando de Antônio Silvino esteve ali sim e tinha deixado um recado. E deu o recado sem tirar nem por, sem engordar, sem emagrecer, nem esticar e nem encolher, ele deixou dito para eu dizer a vocês: - João, eu vou indo... etc.

O delegado João Jerônimo era bom de recado, pois só acrescentou o seguinte: - Eles saíram para o lado de Parelhas.

AS SERPENTES E A SUSSUARANA 

O tenente Joaquim Henrique bradou: 

- Atenção, os bandidos estão por perto, estão de cavar com a unha. Vamos pegar esses filhos das putas e de mão... - Sigam-me! 

E saíram em marcha acelerada pelo caminho que levava qualquer um que fosse muito disposto à Parelhas no rio Grande do Norte. O caminho era estreito, tortuoso, acidentado, cheios de pedra, com pedras gigantes que surgiam para fechar o caminho ou deixá-lo quase despencando nas escarpas dos riachos que só tinham águas no inverno.

A cerca de seis quilômetros do então povoado de Pedra Lavrada fica a Fazenda Maxinaré, do Coronel Graciliano Fontini Lordão. Casa grande edificada no sentido Sul-Norte com duas portas nas laterais da frente e uma janela no meio e alpendrada; a casa ficava de fronte para o povoado, mas não o avistando por conta das serras entre ela e a cidade. O terreno é muito acidentado.

O cansaço dos cangaceiros era tanto que só agüentaram chegar até em Maxinaré. O Coronel providenciou logo a matança de um carneiro, galinhas, capões e peru. Mas Antônio Silvino e seus cabras, não ficaram na sede da fazenda. Preferiram ficar mais adiante onde depois de se atravessar um riacho, segue-se pela trilha aberta com o lado esquerdo da vereda sendo uma escarpa de até trinta metros de despenhadeiro e, o direito, uma elevação de mais de 10 metros de altura sem nenhuma pedra capaz de esconder um homem.

Ao começar descer a vereda em busca do riacho que dobra à direita, têm-se uns blocos de pedras mais ou menos da altura de um homem dispostos na forma de dominós postos de lado e distantes dos outros em distâncias variadas. Homens, as pedras assim dispostas são trincheiras naturais, colocadas ali pela natureza! Os cabras do Capitão Antônio Silvino dormiam atrás delas como se fossem serpentes prontas para o bote e injetar o veneno mortífero da mais terrível delas. Vir na vereda em buscas daquelas trincheiras rochosas era como ir entrando num funil: de um lado o despenhadeiro, do outro, a subida íngreme; em frente, o encontro com a morte!

A polícia ia de marcha batida. O rastejador na frente comia a distância entre eles e os cangaceiros. Assim passaram no terreiro da casa grande da Fazenda Maxinaré. A ânsia de pegar os cangaceiros era tanta que nem sentiram o cheiro das carnes nas panelas. Nunca tinha pegado tanta moleza - talvez pensasse consigo o rastejador - pois os rastros eram fresquinhos, os galhos quebrados ainda soltavam o aroma característico de sua planta, as pedrinhas deslocadas pelo solado de couro dos bandidos, o horário era bom porque ainda era de manhã e, como estavam tão perto deles, a noite não os cobririam antes que eles pusessem as armas em cima daquele bando de malfeitores. O Capitão Joaquim Henrique experiente já tinha pegado o coice da tropa. Seus homens estavam com ânimos e o combate estava próximo.
  

Quem sabe, se ao começar descer o riacho depois daquelas pedras postas como se fossem dominós, não descem com a vista no bando de criminosos que fugia entre pedras, feitos cabritos saltadores, pulando sobre e entre elas, com medo da onça suçuarana. Ele, Capitão Joaquim Henrique, era a verdadeira onça suçuarana!

O COMBATE DA FAZENDA MAXINARÉ 

O vigia que tinha ficado entre a casa grande da Fazenda e as trincheiras de pedras onde repousavam os bandidos, ao ver a volante, saiu em disparada e avisou a Antônio Silvino. O Capitão que ficava fora do grupo mandou o portador da má notícia avisar a todos: - Eu mandei avisar ao macaco-chefe que não viesse atrás da gente. Se veio, o diabo vai se soltar. Não quero ninguém nem pensando em fugir. O sangue vai dar no meio da canela. Querem briga e vão ter! O Cabra escorregou do esconderijo do Chefe e deu a notícia aos demais cabras. Eram cerca de 20 homens que há dias não brigavam. Estavam com a brigada toda dentro e muitos ressacados da cachaça da noite anterior. Todos se prepararam.

Os cangaceiros começaram a ouvir as tropeladas da tropa. Pássaros emudeceram, o vento parou. As primeiras cabeças da volante surgiram na ladeira que antecede ao funil descrito antes, que era a chegada nas pedras em forma de pedaços de muralhas. Vinham quase num trote, arma em punho, vontade de brigar. A vereda estreita deixava os soldados em fila indiana e caminhavam perto demais um do outro. Era quase um tirando o pé e o outro botando no mesmo lugar.

Os primeiros homens chegaram a quase 10 metros dos primeiros paredões de pedras (foto) quando ouviram o grito do Capitão Antônio Silvino: - Fogo na macacada! O final de seu comando foi abafado pelo som dos disparos em cima dos soldados. Nem bem terminou os primeiros tiros já vários soldados rolando pelo chão: uns feridos outros tentando escapar da carga mortífera cuspidas pelas armas dos cabras de Silvino.

Nesse tiroteio os impropérios gritados eram só dos cangaceiros.

Os soldados não tiveram tempo de esculhambar as mães e irmãs de cangaceiros como era comum nos combates. Mas, ouviram as risadas, os gritos de deboche e de provocações dos cabras: - Tomem macacada filha de jumenta roxa! Vamos matar todos e se amancebar com as quengas mães de vocês! Ainda hoje dormirei com sua irmã mais nova, macaco filho de uma égua! A tropa só tinha tenência para tentar correr, se livrar das balas inimigas, da carga mortal.

Os tiros dos cangaceiros se repetiam e quase à queima roupa. Em minutos eram soldados feridos, caídos, fora de combate; tinha também soldados feridos sem ser de tiros, mas da tentativa de fuga e acabaram caindo no barranco com pernas e braços quebrados. Era dia, quase meio dia, e foi por isso, talvez, que o local não escureceu de tanta fumaça de tiros. Cascas de paus voavam nos resvalar das balas. Além dos gemidos dos soldados ouvia-se o grito longe do Comandante da Volante, Joaquim Henrique: - Recuar, recuar, recuar......recuar!

A SAÍDA DE ANTÔNIO SILVINO E O SALDO DA VOLANTE 

Pelo estrago da soldadesca e a condição de vencedor do cangaceiro Antônio Silvino, vê-se que ele não era um facínora sanguinolento. Qualquer cangaceiro, exceto Jesuíno Brilhante, teria caído de assalto sobre a tropa destroçada e ferida e sangrado muito militar. Antônio Silvino preferiu sair escorregando entre as pedras e sumindo em busca de Parelhas. Os cangaceiros não tiveram uma baixa e nem pequenos ferimentos. O prejuízo maior foi não terem se saciado no almoço da Fazenda Maxinaré.

Já a volante perdeu um homem no local e um gravemente ferido que morreu a caminho de Soledade carregado pelos companheiros em uma rede. O cortejo triste que saiu de Pedra Lavrada em busca de Soledade era desalentador. Os mais feridos em redes; os menos, à cavalo e, os que podiam andar, à pé.

E o pior de tudo, eram os gemidos dos doentes abaixando ainda mais o moral da tropa destroçada.

Silvino saiu danado. Passou na Fazenda Retiro, de Zé Gato. Aproximou-se sorrateiramente. O dono da Fazenda estava dentro de casa e escorado numa das janelas, de costas e escorado nos cotovelos e virado para dentro de casa com quem conversava com alguns familiares. Antônio Silvino ao chegar perto da janela, bateu com rifle com força nas pedras do alpendre. O rifle disparou. Seu Zé Gato deu um pulo com o tiro e já caiu de frente para o cangaceiro.

Silvino impaciente e a ainda movido pela adrenalina do combate, perguntou:  

- Teve medo, Zé Gato?  

- Não – respondeu Zé Gato  

- Eu tive um susto! 

Silvino o encarou, e disse: - Zé Gato, hoje estou com o diabo no couro. Matei um bocado de macacos agora, agorinha mesmo. Quero tomar um café amargo. Mande preparar comida e devagar que aquela macacada não vem atrás de mim não. O estrago que fiz na tropa foi grande!

Completou Zé Gato: - Eu escutei os tiros, Capitão. Num se avexe que vai ter café quente e comida pra todo mundo. Depois, Silvino alimentado, subiu o Seridó.

DEPOIMENTOS

Manoel Júlio foi quem me falou sobre as visitas de Antônio Silvino e o local do combate. “Na década de sessenta cheguei a visitar o local e cheguei a ver várias árvores, como juremas, pereiro e craubeiras com ferimentos das balas do combate. Manoel Gomes Calisto de Macedo, Manoel Belo, proprietário da Fazenda Maxinaré, nos disse que as árvores feridas no tiroteio entre bandidos e policiais morreram todas. Ficou uma craubeira gigante já na beira do rio, perto do Poço da Menina que a cheia de 1981, que arrombou doze açudes no mesmo rio, carregou-a.

O professor Graciliano, neto do professor e coronel Graciliano Fontini Lordão, disse-nos:  - De vez em quando achamos cascas de balas quando estamos arrancando macambira para dar ao gado. E acrescentou mais:  - Ano passado, encontramos a última e um visitante de Natal, numa hora em que só estava mãe em casa, pediu e ela a deu ao visitante como souvenir.”

Pesquisei em: Pedra Lavrada.com
Fonte: lampiaoaceso.blogspot.com.br

http://blogdoinhare.blogspot.com.br/2015/01/antonio-silvinocangaceiro-que-antecedeu.html

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

“O GLOBO” – 26/06/1957 - PARTE II

Material do acervo de Antonio Corrêa Sobrinho

CAPITÃO, NÃO: CORONEL

Tipo clássico de caboclo, grosso e atarracado, cabelos e bigodes grisalhados pela ação do tempo e das lutas na caatinga, olhos brilhantes, mas sempre ressumbrando desconfiança, o dizimador do mais terrível conjunto de cangaceiros que já atuou no árido Nordeste avistou-se com a reportagem no saguão do principal hotel da capital alagoana. “É ao capitão João Bezerra que temos o prazer de nos dirigir?” – perquirimos. E o nosso interlocutor, erguendo-se da poltrona: “Não. É ao coronel João Bezerra”. Tentando contornar o equívoco, observamos: “Creio que seria dispensável dizer que seu nome é conhecido em todo o País”. E ele, fitando o repórter ainda sem muita identificação: “Parece que sim.”

Vencido o constrangimento inicial, provocado pelo engano relativo à patente, o coronel João Bezerra dispôs-se a falar fluentemente, sem peias. Mais adiante, chegaria a confidenciar ao major Ataíde, assistente-militar do Governador do Estado e coordenador da entrevista, que gostara do repórter, que se lhe afigurara “um bom cabra perguntador”, salientando, ademais, que demonstráramos grande confiança em sua narrativa.

SAUDADE DOS PÉS DE ÁRVORE

Perguntamos ao coronel João Bezerra como e onde vive, atualmente. E completamos - Sente saudades daqueles tempos árduos de militança na Força Pública estadual?

O coronel João Bezerra prendeu no lábio um tênue sorriso que se insinuava e afirmou:

- Trago no peito a nostalgia da minha Polícia Militar e mais até dos pés de árvore, a cuja sombra eu descansava durante os dez anos que combati.

Contou-nos, a seguir, que se reformou há seis meses, no posto de coronel. Quando liquidou o bando de Lampião era um simples tenente, de 33 anos de idade, nascido em Afogado das Ingazeiras, município de Pernambuco, nos lindes desse Estado com a Paraíba. “A comuna divide-se na serra”, explicou melhor. Abeirando-se dos cinquenta anos, passou a se dedicar por completo à fazenda Aquidabã, de sua propriedade, localizada no distrito de Ibateguara, município de São José de Lajes, em Alagoas.

ONDE O ARADO SUBSTITUI A ESPINGARDA

- Na minha propriedade rural – informa o entrevistado, com indisfarçável orgulho – desenvolve-se uma apreciável criação de gado. Demais disso, planto café, cana de açúcar e cereais. Raramente, em consequência, venho à capital do Estado.

O repórter indaga se ele se enquadrou no novo regime. A resposta vem, sem titubeio:

- Integrei-me perfeitamente na qualidade de fazendeiro, após os meus trinta e quatro anos de farda.

E quando o repórter comenta que, assim, o arado está substituindo a espingarda, ele contravém, reticencioso:

- Mais ou menos...

ALGUMAS “BRIGUINHAS” EM 1930

Já mais à vontade com o jornalista, o coronel João Bezerra adianta que sua primeira filha se formou recentemente em comércio; outra está terminando o curso ginasial em São José de Lajes, enquanto o terceiro filho, de apenas seis anos de idade, ainda não se afastou da fazenda para estudar. E, reportando-se a um aspecto pouco vulgarizado de sua vida, acrescentou:

- Fiz todas as campanhas contra o banditismo organizado e ofereci combate ao Sr. Luiz Carlos Prestes. Como sargento, em 1926, incorporei-me à 6ª Companhia de Alagoas. Em 1930, fiz excursão deste Estado ao Rio de Janeiro. Viajei três meses, enquanto durou aquela questão, a saber, as briguinhas que então surgiram no País.

RECORDANDO GÓIS E O BRIGADEIRO

O coronel João Bezerra acaricia gostosamente uma faca – e o fotógrafo opera a chapa. O entrevistado larga o instrumento e pede a repetição da fotografia. É atendido e agradece:

- Agora, eu fiquei mais bonito...

Retoma, então, o fio do relato:

- Em 1932, participei da Revolução Constitucionalista de São Paulo. Estive sob o comando do general Pedro Aurélio de Gois Monteiro, de quem fui amigo e a quem sempre considerei um extraordinário tático. Fui aproveitado, outrossim, como chefe da tropa de vigilância no Campo de Aviação de Rezende, dirigido, inicialmente, pelo então capitão Dyott Fontenele e, em seguida, pelo então major Eduardo Gomes. Servi, também, com o “Melo Maluco”.

PRIMEIROS ELOGIOS NAS FOLHAS

O vento ligeiro de Maceió – réplica nordestina do minuano dos pampas – arremessa-se com violência de encontro à janela, junto à qual se desenrolava a entrevista. Perguntamos ao coronel João Bezerra se o vento o estava importunando. E ele:

- Deixa ficar, que não dá pra derrubar nenhum cabra de raça. O nosso entrevistado é homem de memória realmente excepcional: afiança que um graveto que tenha estalado sob sua bota nas longas andanças pelos sertões atormentados do Nordeste certamente será lembrado, caso se faça necessário. Voltando a discorrer sobre o movimento de 1932, acrescenta:

- Ainda hoje, lamento tenha sido desmoronada uma tropa nossa em Bocaina, onde se travaram diversos combates machos. Os jornais referiram-se elogiosamente à minha atuação, por eu ter tomado a vanguarda da porfia.

CONTINUA...

“O GLOBO” – 26/06/1957 

Fonte: facebook
Página: Antonio Corrêa Sobrinho

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