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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

SECA NO NORDESTE – POR QUE SOMOS TÃO POBRES?

Por: Paulo Araújo
zaqwe

Observe bem esta fotografia, nos seus mais pequenos detalhes. Ela foi feita há duas semanas na comunidade rural de Negros dos Riachos, no município de Currais Novos, região do Seridó potiguar. O local, como o nome sugere, é formado por remanescentes de um quilombo, da mesma forma que muitos outros espalhados pelo Brasil.
        
Na imagem, a professora Marcia Carla se prepara – com toda a emoção que o momento provoca – para se despedir definitivamente das seis crianças, depois do convívio de alguns anos na escola local. O sorriso da professora substitui um choro evidente, quase audível, encoberto pelas lentes dos óculos.
      
Estes seis pequenos brasileirinhos, excluídos do que possa haver de mais básico ao ser humano – como roupas, por exemplo –, estão cumprindo uma rotina diária bem diferente daquela a que teriam direito se a riqueza da 6ª maior economia do planeta fosse distribuída de forma justa por meio de políticas públicas que realmente fizessem o Brasil ir para frente.

Flagelados da seca do Ceará durante a seca de 1877-1879
Flagelados da seca de 1877 a 1879

Depois de parar e posar para a foto, eles vão caminhar alguns quilômetros e transportar na cabeça, em galões de zinco, alguns litros de água para tomar um banho. Quem conhece, sabe como pesa um galão de água deste tamanho na cabeça. A cisterna, reservatório de água que aparece atrás do grupo, está vazia por causa da seca que castiga o Nordeste brasileiro de forma tão inclemente como não se tinha registro nos últimos 85 anos. Comprar água de um carro-pipa para abastecê-lo é impossível.

No alcance da lente do fotógrafo, só o cinza da paisagem, interrompida aqui e ali pelo verde tímido da algaroba. O chão está seco, esturricado. A poeira transportada pelo vento cola na pele, nos cabelos, nas roupas e deixa os personagens com uma maquiagem natural de terra. A única luz da fotografia vem do sol de fim de tarde no sertão, lambendo-lhes o lado esquerdo do rosto.
   
Nos braços da professora Márcia, o menor do grupo. Quantos anos terá? O que lhe reserva o futuro? Os outros cinco, que formam uma espécie de escadinha demográfica da casa, sorriem para nós, pois neles a inocência e a falta de consciência das coisas, natural para a idade, ainda não lhes despertou para a realidade a que estão submetidos. São felizes, ponto final.

Jornal natalense A República, edição de 6 de agosto de 1915.
Jornal natalense A República, edição de 6 de agosto de 1915.
      
Quase todo o Brasil cabe nesta foto. Ela nos cobre de vergonha da cabeça aos pés e surge diante de nós para refutar, sem direito a argumento contrário, qualquer idéia de país rico, líder de um bloco econômico chamado Bric, e que vai sediar uma Copa do Mundo em 2014 e uma Olimpíada em 2016. Que triste e desigual país é este? Por que ainda somos tão pobres e temos tantos problemas em encarar esse fato? Conviveremos até quando com esta imagem?
     
Este é o pedaço do Brasil onde nunca chegará a água da Transposição do Rio São Francisco, a jóia da coroa do PAC I, por onde já escorreram mais de 8 bilhões de reais. O que há no projeto criado por Lula – ele próprio a encarnação do brasileiro que fugiu de uma fotografia como esta e tornou-se o presidente mais popular do Brasil – são canais vazios formados por placas rachadas no solo seco entre a Bahia e Pernambuco.
     
Este é o pedaço do Brasil onde, a cada dois anos, a rodovia muito próxima desta casa onde moram estas seis crianças são rasgadas por LandRovers transportando pessoas que chegam, desembarcam, dão abraços, beijos, posam para fotografias, fazem promessas de melhoras e somem no rastro da poeira – para voltar, de novo, dois anos depois. Fora a isso, eles só são assistidos por pessoas como a professora Márcia. Por isso o choro travestido de sorriso na hora da despedida.

Edição de 26 de março de 1942, no Jornal do Commércio, de Recife, Pernambuco.
Edição de 26 de março de 1942, no Jornal do Commércio, de Recife, Pernambuco.
     
Daqui a cem anos, quando não estivermos mais aqui, é bem provável que esta cena possa ser repetida para outro fotógrafo de forma absolutamente igual em pose, gestos, contexto e geografia. Também por outras professoras Márcias que vão lá, tentam mudar uma realidade tão difícil por meio do conhecimento. E também por outras crianças, e outras cisternas vazias, e outros galões, e outras terras ressequidas, e outras nudezes.

Texto - Paulo Araújo

Fontes:
http://www.thaisagalvao.com.br
http://www.tokstok.com.br
http://culturapauferrense.blogspot.com.br

P.S. – PESQUEI O TEXTO DO JORNALISTA PAULO ARAÚJO NO BLOG DA THAISA GALVÃO E ACRESCENTEI UMA FOTO E DUAS NOTAS DE JORNAIS DE NATAL E RECIFE SOBRE O VELHO PROBLEMA DA SECA. - Informação do culturapauferrense

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De quando o RN e o Ceará se travaram na bala !

Cel. Salustiano Padilha em  foto de 1897

O público nas ruas de Fortaleza o conhecia pouco. O jornal Unitário perguntava em editorial: "Quem é esse homem, a quem está confiada a tão momentosa tarefa de desafrontar a honra estadual?”.

José Torcápio Salustiano de Albuquerque Padilha nascera na vila de Camocim a sete de setembro de 1861. Considerava o fato de ter nascido na data da independência nacional um presságio. Seus pais morreram quando ele era muito jovem, fazendo com que ele fosse criado por um de seus tios maternos, o farmacêutico João Francisco de Almeida Albuquerque.

Esse tio exerceu grande influência na sua vida, pois fora voluntário da pátria na guerra do Paraguai como alferes, tendo sido inclusive ferido e condecorado. O historiador Soriano Cavalcanti afirma que todas os finais de tarde o jovem Salustiano ouvia seu tio relatar feitos heroicos pela defesa da pátria em meio aos macegais do Paraguai, e que foi isso que acendeu nele a chama do patriotismo.

Em 1878 ou 1879, os registros não são claros, o jovem Salustiano se matricula na Escola Militar de Rio Pardo, formando-se aspirante em 1883. Desde o começo de sua carreira militar Salustiano se destacava pelo seu acendrado patriotismo. Ele reprovava seus colegas quando estes se mostravam mais interessados em bebedeiras, teatros e flertes que em pensar na pátria. Sua companhia era evitada pelos outros oficiais, pois era bem conhecido que ele só tinha um assunto, único e exclusivo: a honra nacional.

O amor de Salustiano pela pátria se torna patente na carta que mandou a noiva, uma de cujas páginas que não se perderam se pode ver à direita, quando do início das querelas com a Bolívia devido à situação no Acre, e que quase levaram os dois países à guerra. Na carta Salustiano confessa seu ódio aos malévolos bolivianos, e mais do que isso, confessa à noiva que seu amor a ela é muito grande, mas que seu amor pela pátria é maior. Escreve também que o desejo mais ardente do seu coração, que o empolgou "desde o primeiro vagido no seio da mãe", é oferecer sua vida em holocausto pela pátria, para salvá-la de algum inimigo pérfido que a ameaçasse. Acrescenta no final da carta que o Brasil é a terra mais privilegiada do Planeta, e por isso é vítima de inveja das outras nações, que pretendem destruir sua glória. Diz que apreciaria morrer no campo de honra, afrontando o inimigo, batendo-se como um leão, enrolado no pavilhão nacional, e liderando a vitória das armas nacionais.

Barão do Rio Branco e Grupo Boliviano por ocasião do Tratado de Petrópolis

O Tratado de Petrópolis em 1903 que resolveu as questões com a Bolívia involuntariamente causou o maior choque da vida de Salustiano, que decepcionado voltou para a sua terra natal, o Ceará, em licença, depois de tanto sonhar com as glórias nas batalhas com o país vizinho. Mas este na verdade seria o prenúncio de seu momento de glória, pois no decorrer de sua licença o rio Mossoró foi cruzado pelas tropas norte-rio-grandense, que conquistaram a cidade de Grossos, no Ceará.

A questão de Grossos, hoje um tanto esquecida, foi um dos casos mais rumorosos que abalou o Norte do Brasil no começo deste século. As tropas do Rio Grande do Norte cruzaram a fronteira histórica entre os dois estados, que era determinada pela larga barra do rio Mossoró, em fins de janeiro de 1904. O governo do Ceará diante dessa afronta não agiu prontamente, gerando uma grande campanha por parte dos jornais oposicionistas, principalmente do Unitário. Multidões se reuniam na Praça Central de Fortaleza exigindo a guerra ao Rio Grande do Norte. E de nada adiantavam as explicações de juristas dizendo que um estado não podia declarar guerra a outro! Finalmente, premido por todos os lados, o líder político do estado, Nogueira Aciolly (ao lado), toma uma providência: nomeia o Tenente-coronel do exército Salustiano Padilha para comandar as tropas estaduais na expulsão das tropas potiguares.

A reação da imprensa e da população foi entusiástica. Por todos os lados o Coronel Salustiano era aclamado como o salvador da honra estadual, era chamado de Leão do Norte, Alexandre o Grande do Ceará, Novo Napoleão. Mas foi de novo o jornal Unitário que lhe deu o epíteto mais marcante: a Altaneira Águia do Apodi.

Alheio a tais glórias o Coronel trabalha com afinco e entusiasmo, finalmente ele iria fazer o que sempre quis: bater-se contra o inimigo! E em pouco tempo a tropa de duzentos e cinquenta homens estava organizada, e a cinco de março de 1904 instala sua base na cidade cearense de Aracati, a apenas oitenta quilômetros da zona conflagrada!

E na verdade aí começaram os grandes problemas de Salustiano. Primeiro, o problema logístico. Pelo mapa abaixo, pode-se ver que as bases potiguares estavam muito próximas do teatro de operações. A base inimiga mais próxima, a cidade fortificada de Mossoró, estava a pouco menos de trinta quilômetros de distância. Enquanto isso Salustiano e suas tropas tiveram de enfrentar cansativas marchas por praias de areias moles e sol causticante, e sem fontes d'água por perto.


Nem mesmo para seus sobrinhos Salustiao quis contar dos sofrimentos daquela marcha, pois para ele, homem de brio, tais sofrimentos pela pátria eram minúcias, indignos mesmo de menção. Mas pode-se imaginar o que ele e seus homens passaram. Diz a história popular que o Coronel Salustiano fez o percurso lendo uma velha edição de Clausewitz ("Da Guerra"), e que teria dado toda a água de seu cantil aos seus soldados, tendo ficado sem nada. Claro que talvez isso seja imaginação popular. O próprio Soriano Cavalcanti duvida que isso tenha acontecido, embora o hoje esquecido poeta José Albano tenha escrito uma ode "Ao Themístocles Cearense!" em homenagem a tal feito. De qualquer forma não deixa de ser bonito pensarmos em um comandante em pleno sol das praias nordestinas sacrificando-se por seus comandados e pensando apenas nas altas questões de estratégia, com o livro de um autor prussiano nas mãos.

Depois da longa e cansativa marcha, os homens chegaram ao teatro de operações, tendo os primeiros pelotões atingidos a região na tarde de 11 de março de 1904, para fazer espantosa descoberta: o inimigo tinha fugido!

Perguntas a moradores da região confirmaram tudo. Sabendo da aproximação das tropas cearenses, os potiguares tinham de novo cruzado a barra do rio Mossoró, tendo se reagrupado na cidade de Areia Branca, do outro lado do rio. Um tanto desanimado, Salustiano estabelece seu quartel-general na vilazinha de Grossos, tendo ordenado o hasteamento do pavilhão cearense e que se cantasse o hino, ao crepúsculo do dia 11.

Aí começa o episódio mais glorioso e obscuro da carreira do coronel, e que de certa forma revela toda a grandeza e vileza de que o homem é capaz. A verdade crua é que certos homens, inclusive certos oficiais das forças expedicionárias cearenses simplesmente estavam aliviados por saberem do recuo do inimigo. Estavam certos de que não haveria combate, eles - e a verdade precisa ser dita - estavam com medo da morte, e prezavam mais suas vidas que sua honra.

E foram esses homens que se assustaram quando, por volta de meia-noite, o Coronel Salustiano entrou na tenda dos oficiais e disse que isso não podia ficar assim. A honra estadual não podia ficar afrontada daquele jeito. O inimigo recuara para suas fronteiras, mas não poderia ficar impune: era preciso dar-lhe uma lição. E de nada adiantaram as objeções de alguns oficiais mais medrosos. Salustiano expôs seu plano e deu a ordem: no dia seguinte, eles invadiriam o Rio Grande do Norte! Havia alguns barcos lá por perto, e eles cruzariam a barra do rio Mossoró e invadiriam a cidade de Areia Branca.

O ataque começou logo ao amanhecer. A tropa cearense deveria estar pronta para embarcar nas canoas e seguir o trilho. O historiador Soriano Cavalcanti guarda algumas poucas fotos que sobreviveram, tanto do lado cearense como do lado potiguar, e essas fotos contam como foi a incursão. Ao alvorecer do grande dia o Coronel Salustiano estava eufórico, mas não uma euforia irresponsável e otimista. Não, pelo contrário, ele uma euforia rara nos tempos modernos, a euforia do homem que vai de encontro ao próprio destino, embora esse destino possa ser a morte em alguma salina perdida na costa de um rio esquecido. Salustiano não tinha ilusões quanto à guerra: sabia que nela os homens morrem, matam e são mutilados física e mentalmente. Mas também não tinha ilusões quanto a si mesmo: sabia que seu destino era afrontar o inimigo, e desafiar a morte carregando o Sagrado Pavilhão.

Às sete horas do dia 12 de março de 1904 o Coronel Salustiano, com alguns soldados, pegou o primeiro dos barcos (foto).Nesta foto vemos o Coronel Salustiano com seu uniforme afrancesado, ao lado do homem de cartola, o velho prefeito da cidade cearense de Grossos, que Salustiano acusou de ter fugido covardemente perante o inimigo quando da invasão e por isso obrigou a vir logo na primeira vaga de invasão, composta deste e de alguns outros poucos barcos.

O problema é que nunca houve uma segunda e terceira vagas de invasão. Alguns oficiais, achando que Salustiano estava enlouquecido, atravessaram o rio e entendendo-se com o inimigo conseguiram telegrafar para o Presidente do Estado, e este respondeu que eles não deveriam invadir o estado vizinho. Salustiano negou-se a cumprir tais ordens, por serem uma afronta a sua honra militar, e no comando apenas de poucos homens, empreendeu a travessia.

O combate foi renhido, tendo as poucas tropas de Salustiano lutado bravamente. (ver foto à esquerda). Esta foto da esquerda, diga-se de passagem, talvez seja a mais rara e importante de todas as que estão aqui, pois apesar de sua má qualidade, é a única de combate real, e foi tirada pelo fotógrafo da expedição, o alferes Cristiano de Moraes. O fato é que após renhida luta o Coronel Salustiano, sem apoio, foi obrigado a retirar-se. Esse talvez tenha sido seu grande problema, a retirada. Ele, que passara a vida inteira dizendo que um comandante deveria vencer ou morrer, agora se deixara convencer por seus comandados de que não deveria se suicidar, e assim retirou-se com suas poucas tropas de volta para o lado cearense, deixando os potiguares livres na cidade entrincheirada de Areia Branca, onde orgulhosamente posaram para muitas fotos, como esta abaixo. Logo depois veio a ordem do Presidente da República de que as tropas dos dois lados deveriam recuar para suas bases.

O fato é que depois daquele dia quente de março de 1904, naquela região com um vento penetrado de sal, o Coronel Salustiano nunca mais foi o mesmo. Pediu passagem para a reserva e deixou-se ficar numa cadeira de balanço olhando para o mar na sua casa em Fortaleza, sempre remoendo o momento em que tivera de se retirar, manchando sua honra para sempre. Era um homem acabado. E pouco adiantaram as homenagens que recebeu no decorrer dos anos. Foi condecorado por vários governadores e muitos anos depois ao Presidente Getúlio Vargas enviou um telegrama de enaltecimento ao velho militar.


Rui Barbosa

Para não deixar a história sem final, acrescento que a região do Apodi e de Grossos, objeto do litígio entre os dois estados, acabou sendo decidida no Supremo Tribunal Federal, onde o Rio Grande do Norte teve a esperteza de contratar o melhor advogado que havia na época, o baixinho e ranheta advogado baiano Ruy Barbosa, o homem que se agarrava aos livros como se fossem ouro. Com um homem desses acabou sendo barbada para os potiguares, e eles ficaram com a região.

Quanto a Salustiano, morreu numa data muito infeliz, 11 de julho de 1932, quanto os olhos de todo o país estavam voltados para a Revolução que estourara em São Paulo. Poucas pessoas foram a seu enterro, a maioria familiares, e dizem que o enterro foi rápido, devido a uma chuva fina de fim de estação. Sua lápide ainda hoje pode ser vista no cemitério de Fortaleza, e nela está escrito muito simplesmente: "Aqui jaz José Torcápio Salustiano de Albuquerque Padilha, a Altaneira Águia do Apodi". 

* José de Arimatéia Bandeira publicou no grupo O Apodi que queremos !

Fonte: 
www.honoriodemedeiros.blogspot.com.br
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Manoel Severo recebe Título de Cidadão de Missão Velha

 Manoel Severo e o Presidente da Câmara de Missão Velha, vereador Cícero Macedo

Aconteceu na manhã do último sábado de Janeiro, na Câmara Municipal de Missão Velha a entrega do Título de Cidadão Missãovelhense ao Curador do Cariri Cangaço, Manoel Severo Gurgel Barbosa. A propositura do vereador Cícero Macedo foi aprovada ainda em 2011 por unanimidade, tendo sido passada às mãos do criador do Cariri Cangaço naquele final de semana.

"Severo é um desses cabras da peste, trabalhador, empreendedor, que tem levado o nome de nossa cidade de Missão Velha para o Brasil e para o mundo através do Cariri Cangaço e que tem por nosso município um grande amor, por isso é mais  do justo o título de cidadão ora concedido por nossa Câmara Municipal" diz Bosco André, pesquisador e memorialista.

 Pedro Luis, Bosco André, Manoel Severo, Cícero Macedo, José Cícero e Sousa Neto.

"Para mim é uma sensação extremamente feliz. Tenho por todo o Cariri e em especial por Missão Velha um grande amor. Desde o primeiro dia em que aqui aportamos que fomos recebidos com todo o carinho e respeito e já se passaram mais de 15 anos, dessa forma foi um presente mais que precisoso o Título de Cidadania me concedido pela Câmara Municipal através de meu amigo Cícero Macedo" assegura Manoel Severo, idealizador do Cariri Cangaço.

Além dos vereadores e outras lideranças do município, estiveram prestigiando ao evento, vários representantes do Conselho do Cariri Cangaço, como o secretário de cultura de Aurora, professor José Cícero, o secretário de cultura de Barro, Sousa Neto e o Promotor de Justiça de Crato, Dr. Pedro Luis Camelo.

Heldemar Garcia
Assessor de Marketing

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Cangaceiro Esperança.

Por: João de Sousa Lima

A fazenda Quirino, no povoado São Francisco, Macururé, Bahia, era um  dos coitos do bando de Lampião e principalmente reduto dos cangaceiros nascidos entre Macururé, Brejo do Burgo, Santo Antonio da Glória  e Chorrochó. Entre eles Gavião, Azulão, Esperança, Cocada, Zé Sereno, Zé Baiano e Gato.  No povoado São Francisco a mãe de Esperança, dona Andressa, tinha terras por lá, porém ela residia na Várzea da Ema. O comandante de volante que destacava na Várzea da Ema era Antonio Justiniano e dois dos soldados que ele comandava eram irmãos de Esperança: Vicente, apelidado de Medalha e Ananias.


A fazenda Quirino pertencia a Ludugero, tio do cangaceiro Esperança.
    
Esperança, Cocada, Pancada e Gavião, encontravam-se acoitados próximo ao sítio Quirino. Dentro de um cercado os cangaceiros catavam imbu quando chegou o dono do terreno e Cocada o prendeu e depois o soltou. O sertanejo correu e foi avisar policia do encontro que teve com os cangaceiros.

Izidoro, João Lima e José Pororô. Sobrinhos de Esperança abraçando o escritor João de Sousa Lima.

Dona Andressa sempre que precisava ir ver suas criações no São Francisco tinha que pedir autorização ao comandante do destacamento e foi em uma dessas viagens que ela travou diálogo com o contratado Reginaldo que lhe sugeriu pedir para que Esperança se entregasse que nada lhe aconteceria, de preferência que ele trouxesse a cabeça de um companheiro que sua vida tava garantida. Andressa levou o recado ao filho que mesmo relutante acabou cedendo aos apelos da querida mãe. Reginaldo mandou roupas novas de mescla azul para Esperança. O cangaceiro ainda relutante disse a mãe que não tinha coragem de se entregar e a mãe saiu triste.

João e Jovelina Barbosa, irmã do cangaceiro Azulão, povoado São Francisco.

Era março de 1933, no coito encontrava-se Esperança, Cocada, Gavião e Pancada.  Esperança chamou Cocada para irem pegar água em um caldeirão ali próximo. Os dois seguiram na direção do caldeirão. Diante quando chegaram ao caldeirão sentaram-se e ficaram conversando. Cocada limpou sua arma e depois pediu a arma do amigo para ele limpar e Cocada entregou seu mosquetão. Esperança limpou, colocou uma bala na agulha e detonou. O cangaceiro com o impacto do tiro caiu uns dois metros de distância e sem saber de onde tinha partido o disparo pediu socorro:

- Me acode Esperança, não deixe os “MACACOS” me matar!
    
Esperança pegou o facão da marca jacaré, partiu na direção do moribundo e o degolou ainda com vida. Pegou os bornais, armas, a cabeça do cangaceiro e foi se entregar a policia. Na Várzea da Ema ele se entregou  as autoridades, contou detalhes da morte que fez, denunciou os coitos dos cangaceiros na região. Com dez dias  depois  foi encaminhado para a cidade de Uauá, onde o capitão Manoel Campos de Menezes que o livrou da prisão e o incorporou na volante policial do tenente Santinho como contratado . Ficou sendo o corneteiro do grupo. Trabalhou em Jeremoabo e faleceu tempos depois na cidade de Juazeiro, Bahia.

AINDA NA PRISÃO EM VÁRZEA DA EMA.

O cangaceiro Esperança quando preso, já atendendo agora por Mamede, seu nome real, encontrou o com o jovem sobrinho José  Gonçalves Varjão, apelidado de Pororô e lhe confidenciou que na frondosa árvore lateral a casa de sua família, enterrado próximo ao seu tronco, tinha um material guardado e que ele tirasse e entregasse a seu pai. Pororô procurou ao redor da árvore mais diante da pouca idade não encontrou forças para continuar a empreitada de escavação no duro chão de cascalhos. O tempo passou, Pororô cresceu e retornando certo dia de uma caçada, quando se aproximava de sua velha residência, viu quando seu cachorro passou acuando um preá, o cachorro parou próximo a antiga e frondosa árvore, Pororô se aproximou e viu o cão rosnando e olhando para um pé de macambira, Pororô tirou a cactácea e avistou uma lajota cobrindo um buraco, tirou a pedra, o preá correu com o cachorro latindo atrás, Pororô puxou um tecido em farrapos que cobriam algumas peças, entre elas: Uma colher de prata, 160 cartuchos de fuzil, um punhal, uma espora e algumas moedas. Era esse o tesouro de Esperança que ele havia pedido para o sobrinho guardar. Pororô vendeu os cartuchos a um dos prefeitos de Macururé. A colher de prata, algumas moedas, o punhal e uma das esporas ele me presenteou. Na colher encontramos as letras: MA. Talvez o cangaceiro tenha tentado escrever seu verdadeiro nome: MAMEDE. No punhal tem um “NA” ou “NH”.

Sargento Otávio Farias, radiotelegrafista da policia baiana, serviu na Várzea da Ema, enviava sempre as mensagens contando os combates dos cangaceiros contra as volantes.

Pororô ainda reside e seu irmão Izidoro ainda residem no São Francisco e os Quirino é herança que ficou com a família. Aquele longínquo pedaço de chão ainda guarda as histórias do cangaço vivido em suas terras, memórias ainda latentes de um tempo que teima em não ser esquecido e nem deve....

Cabeça do Cangaceiro Cocada, morto por Esperança.

SEGUE EM ANEXO A ESSE TEXTO UMA DAS CARTAS DE INTERROGATÓRIOS REALIZADOS PELA POLÍCIA E QUE MOSTRA A IMPORTÂNCIA DESSES LUGARES CITADOS COM A HISTÓRIA DO CANGAÇO E A REFERÊNCIA COM PESSOAS DA LOCALIDADE. A CARTA VAI TRANSCRITA NA INTEGRA COM OS ERROS E INCORREÇÕES:

“Aos três do mês de maio de 1932, no arraial de Várzea da Ema em casa de residência do segundo tenente Antonio Justiniano de Souza, sub delegado de policia, foi interrogado o bandido acima referido que disse:
    
“Em 1929, estando ele bandido, em seu rancho no lugar denominado São Francisco, foi surpreendido pelo grupo de Lampião que ali chegava a mando do Cel. Petronílio de Alcântara Reis, para que fosse as imediações do Icó e ali receber dinheiro enviado para Lampião, cuja importância era 20:000$000, mas só foram entregues 18:000$000 e que dois restantes Lampião disse que dava por recebido, quando lhe mandasse um cunheito de munição; o que não sabe-se se isso efetuou-se,  mais depois ouviu do bandido ferrugem a declaração de que teve referido Cel. Petronilio havia comprado munição. E que devido a esse encontrão foi ele depoente obrigado a refugiar-se nas Caatingas, pois as forças andavam a sua procura tendo por isso de quando em vez constantes encontros com os cangaceiros, merecendo do mesmo consideração a ponto de lhe ser entregue por “Lampião” um rifle com cem cartuchos, os quais conservou até a data de sua prisão, não tendo, porém feito uso da dita arma para a prática de crime.

Punhal de Esperança
    
Que sempre foi seduzido por “Lampião”  para fazer parte do seu grupo, mas nunca aceitou, apesar de ter parente no grupo, como sejam: Azulão, Carrasco e Moita Brava. Que esses encontros se efetuavam no lugar denominado Quirino para Lagoa Grande, sendo os sinais convencionados para os referidos encontros, três  pancadas em um pau seco, ou então berrando como boi; que nunca recebeu dinheiro de “Lampião” a não ser algumas roupas dadas pelos cãibras.
    
Colher de prata de Esperança presenteada ao escritor João de Sousa Lima pelo sobrinho do cangaceiro.

Que nos últimos encontros que “Lampião” teve com as tropas. Ele respondendo notou que alguns companheiros estavam desgostosos por verem os sacrifícios da causa, que nessa data viajaram nos “cascalhos” das aroeiras com direção a Várzea pernoitando a três quilômetros de distância.
    
Que nessa mesma noite desligou-se do bando a meia noite com Manoel Sinhô de Aquileu, sem que fossem pressentidos pelos outros e vieram pairar nas “Canouas” onde foram informados por Pedro de Aquileu que havia garantia para todos aqueles que tinham ligações com cangaceiros, uma vez que procurassem as autoridades para se entregarem.

Detalhe do cabo do punhal de Esperança.

E baseado nisso em companhia de Pedro veio à procura do Tenente Justiniano em Várzea de Ema onde se acha. Disse mais que “Lampião” depois do combate do touro com o Tenente Arsênio cuja força foi imboscada e morreu quase toda, escapando o referido oficial, pois é um herói que infrentou o grupo que era numeroso, com um fuzil metralhadora dando somente três rajadas conseguiu matar o irmão de Lampião, Ponto Fino e sendo forçado a abandonar a arma deixando-a inutilizada pelos bandidos.

Iniciais MA escrito no cabo da colher de prata. A prata foi muito usada pelos cangaceiros para testarem bebidas e comidas se estavam envenenados.

Que nessa ocasião encontrou Lampião cartas ao Cel. Petronilio acusando Lampião, por isso Lampião resouveu queimar algumas fazendas referido Cel. Petronilio.
    
Disse mais que ouviu de Lampião dizer que tinha mil tiros de fuzil enterrados em um ponto lá para baixo, não declarado ao certo o lugar e que ia também a Curaçá a procura de outros mil tiros que tinha para lá.
    
Quanto ao armazenamento sabe que Lampião tem alguns  rifles ensebados em ocos de pau (ensebados, para não darem o bicho próprio de madeira).

Detalhes do punhal e da colher de prata.

Perguntado quais são as pessoas que fornecem armas a Lampião respondeu que não conhece mais sabe que nas fazendas Juá, Várzea, e São José há “coitos” onde lhes prestam bastante serviços em abastecimentos.

Ludugero, tio de Esperança, dono da fazenda Quirino.

E por nada mais dizer nem lhe ser perguntado deus-se por findo estas declarações ao presente auto que vae por todos assignados pelo tenente e testemunhas.

Várzea da Ema, 7 de maio de 1932”
   
Paulo Afonso, Bahia, 16 de fevereiro de 2013

João de Sousa Lima, Historiador e escritor, Membro da ALPA- Academia de Letras de Paulo Afonso. Membro do IGH- Instituto Geográfico e Histórico de Paulo Afonso Membro do Grupo de Estudos do Cangaço do Ceará- Fortaleza- CE.

Enviado pelo autor:
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