Por Antonio Corrêa Sobrinho
Navegando
pelas páginas de “Lampião, a Raposa das Caatingas”, obra compêndia do sergipano
José Bezerra Lima Irmão, na parte que trata da viagem de Lampião a Mossoró, no
Rio Grande do Norte, ao ler: “No início da tarde, em Canto do Feijão (Santa
Helena), Massilon matou o delegado Raimundo Luís do Nascimento, para vingar a
morte de um primo”, lembrei-me imediatamente de um recorte de jornal que guardo
há um tempo, que até hoje não sei como chegou em minhas mãos, talvez dentro de
um livro a mim emprestado, por sinal, sem data de publicação e sem o nome
jornal; trazendo um artigo assinado pelo filho do sobredito delegado, Raimundo
Santa Helena, que o faço, a seguir, transcrito, para apreciação e consideração
dos amigos.
ESTÁTUA DE
LAMPIÃO
Lampião matou
meu pai, delegado e fundador do município de Santa Helena, Paraíba, em 9 de
junho de 1927, com um tiro num olho e outro na nuca, dado por seu irmão
Ezequiel.
Depois que a imprensa divulgou sobre a estátua de Lampião, que o prefeito de
Serra Talhada (PE) quer construir em homenagem ao assassino, tenho recebido
telefonemas, dia e noite, especialmente de professores e pesquisadores,
indagando se tenho documentos a respeito. Tenho sim. De dois prefeitos, do
presidente da Câmara Municipal de Santa Helena e de 32 habitantes, todos
autenticados, que comprovam tudo o que já foi divulgado. E tem mais: só agora
estou revelando o pior que Virgulino fez contra a honra de minha mãe, quando,
logo após ter matado meu pai, ergueu um punhal de meio metro e levantou o
vestido de mamãe, grávida de cinco meses, e disse: “vou abrir o bucho desta
égua pra ver a cara do macaquinho!” Foi impedido de fazê-lo pelo cangaceiro
Jararaca, que conhecia nossa família. Lampião, enfurecido, foi à cozinha,
esquentou seu ferro de marcar animais e marcou minha mãe, Rosinha Ferreira,
conforme pode testemunhar seu médico no Rio, Dr. Miguel Morone. O facínora
Virgulino Ferreira ainda estuprou minha madrinha, a cega Isabel, marcou-a
também com o ferro em brasa e a deixou nua, desmaiada no chão do quintal, com
terra e cinza nos órgãos genitais.
Os 66 cangaceiros mataram meu pai e seu ajudante, Eliziário, tocaram fogo na
cidadezinha, mataram os animais e saquearam tudo que puderam levar em mais de
70 cavalos, burros e jumentos. Algum tempo depois, os “coronéis” roubaram
nossas terras, seta casas e um açude. Mamãe, com três filhos órfãos, passou a
lavar roupa para os habitantes da cidade que meu pai, Raimundo Luiz, fundara e
por ela morrera. Fomos morar de aluguel num pequeno quarto do Sr. Antônio
Rolim, e eu, com meus irmãos Toinho e Cândido, passamos a vender cocada e
tapioca nos trens de passageiros que cruzavam o município duas vezes por
semana. Todos diziam: “Seu pai foi um herói”.
Foi por isso que aos 11 anos fugi de casa, pulando de um jumento num trem a carvão,
descalço e só com a roupa do corpo, com um canivete, para vingar a morte de meu
pai. Mas depois que fui torturado, quando era menino de rua em Fortaleza, por
um policial de chapéu vermelho, descobri que o Lampião que eu procurava poderia
ser encontrado em qualquer esquina do mundo. E agora, com a morte trágica de
minha mãe – que se suicidou em 23 de fevereiro do ano passado, pulando numa
cachoeira, pelo desgosto de ter sido abandonada pelas autoridades – e por causa
da estátua a Lampião, o desejo de vingança invadiu o pensamento do meu irmão
Toinho e reativou a minha luta para que se faça justiça, isto é: que o meu pai
seja lembrado como herói, que os crimes cometidos contra a minha família e
contra centenas de outras famílias nordestinas não sejam esquecidos pela
sociedade e que, principalmente, jamais se pense em erguer um monumento a
bandido neste país, para que as futuras gerações não se envergonhem dos seus
antepassados.
Tem mais: meu irmão, viúvo, sem filhos, jurou que vai explodir a estátua, nem que
seja a última coisa que faça na vida. Prefiro os caminhos da Justiça, ou
abandonar o Brasil que defendi na segunda guerra Mundial, tendo recebido duas
condecorações da presidência da República. Democracia, que defendi com riscos
de vida e sacrifício de minha mocidade, não é isso não. Realizar um plebiscito
para decidir se um assassino cruel, estuprador, torturador e sequestrador
merece uma estátua pública é o mesmo que realizar outro para saber se os
monumentos em homenagem a Tiradentes devem ser demolidos. Os leitores que me
conhecem há 46 anos na Literatura de Cordel, sabem que não estou mentindo:
definitivamente, não posso conviver com a estátua de Lampião, cartões postais
respectivos, etc., como se ele fosse um segundo Padim Ciço. Juro que não posso.
Raimundo Santa Helena – cordelista – Rio de Janeiro.
Deste
conhecido cordelista, assisti, agora, a um pequeno vídeo seu, intitulado “Assim
Castrava Lampião”, onde ele confirma o que disse acima, e, no final, para minha
surpresa, vir com esta: “Lampião era perverso, matava, castrava, violentava,
era pedófilo. Agora, Lampião é meu maior inimigo, mas não concordo com essa
história de que ele era homossexual. Ele era um tarado”.
Fonte: facebook
http://blogdomendesemendes.blogspot.com