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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Casarão da Baronesa e a Caravana Cariri Cangaço

Por: Pedro Luiz
Casarão da Baronesa de Água Branca

Sem dúvidas uma das visitas mais aguardadas da Caravana Cariri Cangaço foi à região do cenário do primeiro ato relevante do futuro Rei do Cangaço, na época apenas o cangaceiro Virgulino Ferreira, já chefe de bando. No município de Água Branca, Alagoas, bem próximo aos municípios de Delmiro Gouveia e Paulo Afonso, foi palco em 1922; de um dos mais famosos  assaltos de toda sua carreira: O ataque ao casarão da Baronesa Joana Vieira, viúva do Barão de Água Branca.

Valentim Antunes pelas ruas de Água Branca; ao fundo o Casarão da Baronesa

Matriz de Água Branca


Tela - Baronesa Joana Vieira

As jóias da Baronesa de Água Branca, Joana Vieira, permaneceram com Lampião por longos 16 anos e logo após o combate de Angico, em 1938, onde perderam a vida o casal mais famoso do cangaço, as mesmas jóias foram encontradas em poder de Maria Bonita. As referidas jóias também forma identificadas em algumas das fotografias feitas pelo árabe Benjamin Abrahão nos idos de 1936 e 1937. Realmente a visita a Água Branca é indispensável para todos aqueles que pesquisam o tema cangaço.

Pedro Luiz Camelo
Conselheiro Cariri Cangaço

Cariri Cangaço
http://cariricangaco.blogspot.com

Literatura Sobre Lampião e o Cangaço;

Por: Guilherme Machado
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Revista em Quadrinho Igapó: o Ataque Desastrado de Lampião e Seu Bando a Cidade de Mossoró RN. Sobre o Suicida Comando do Ambicioso Masilon. Uma Obra Prima do Cartoom.

revista igapó lampião em quadrinhos.

retrato da cabroeira que atacou mossoró


Retrato da cabroeira que atacou Mossoró

Lampião só reconheceu ter sofrido uma única derrota em vida: em 13 de junho de 1927, quando foi posto para correr de Mossoró. "Foi quando se viu que ele não era invencível", afirma o pesquisador 

Kidelmir Dantas, Professor Pereira e Honório de Medeiros

Kydelmir Dantas, presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Cangaço - Sbec. Tanto que, após o episódio, o cangaceiro tomou um chá de sumiço. "Ele desaparece de qualquer registro histórico por um ano. 
Lampião também deixa de atuar nos estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Só em 28 que se tem notícias dele, pelos lados do Raso da Catarina, na Bahia."

Extraído do blog: Porta do Cangaço de Serrinha - Bahia,
do pesquisador Guilherme Machado

OS CANGACEIROS E CAJAZEIRAS SITIADA

Por: Nadja Claudino
Foto do Orkut: Dr. Ivanildo Silveira

28 de setembro de 1926, um menino de oito anos de idade se esconde debaixo da cama dos pais. Ele e outras crianças estão acuadas a espera do ataque do bando de cangaceiros liderados por Sabino Gomes (sub-chefe do bando de Lampião, o temível e famoso Rei do Cangaço). A cidade de Cajazeiras está em suspense à espera dos homens selvagens que viriam do mato, prometendo todo o tipo de destruição, caso não fossem obedecidas as suas exigências.
O sol quente, o calor abafado são alguns dos elementos menos perceptíveis nessa tarde de medo e ansiedade. Os homens testavam as armas, procuravam pontos estratégicos para a defesa da cidade. Na igreja, o bispo defendia sua fé, rezando, pedindo aos céus intervenção para que Nossa Senhora da Piedade protegesse a cidade, os homens, e mesmo os cangaceiros – que fossem eles embora com a graça de Deus. Os cangaceiros nas cercanias da cidade esperavam o melhor momento para atacar; o povo esperava o ataque. A cidade estava sofrendo com a espera angustiada.
O menino embaixo da cama se chamava Ivan Bichara Sobreira, que muitos anos depois escreveu um livro intitulado Carcará, romance que conta essa história acontecida em Cajazeiras, Alto Sertão da Paraíba, em uma distante tarde do mês de setembro de 1926. O romance mostra uma Cajazeiras orgulhosa da sua história, por ser uma das maiores cidades do sertão, rota de ligação da Paraíba com o Ceará, cidade símbolo da educação. Terra de famílias tradicionais como os Rolim, Albuquerque, Sobreira, Bichara. É essa cidade e são essas famílias que estão sendo ameaçadas por um grupo de cangaceiros, personagens que tanto atemorizavam a região sertaneja da década de 20 até meados de 1940, quando a morte de Corisco baniu o último dos cangaceiros.
Podemos pensar no pavor que acometia todas essas famílias, preocupadas com o destino dos seus homens e suas mulheres, caso caíssem no poder dos cangaceiros. A perversidade dos cangaceiros era altamente propagada. Os estupros de mulheres casadas e até de moças virgens, a castração dos homens, a mutilação da língua dos traidores que falavam demais, os bailes que os cangaceiros promoviam depois da vitória, fazendo as mulheres mais respeitadas da sociedade dançarem nuas na frente dos filhos e dos maridos. Verdade ou invenção eram essas as histórias que corriam de cidade em cidade. E por conta disso os homens que protegiam Cajazeiras estavam em uma guerra de vida ou morte, de glória ou de humilhação.
Ivan Bichara, traduziu esses acontecimentos que marcaram tão profundamente sua infância por meio da literatura. O moço Ivan como muitos rapazes do seu tempo sai de Cajazeiras para terminar seus estudos e se forma na Faculdade de Direito do Recife. Volta à Paraíba e começa uma carreira política promissora, sendo eleito em 1946 para a Assembléia Legislativa, em 1955 se elege deputado federal e, em 1975, é escolhido pela Assembléia Legislativa governador. Ivan Bichara integrou um time seleto de políticos escritores da Paraíba, a exemplo de Ernani Satyro, José Américo de Almeida, Ronaldo Cunha Lima, dentre outros, que assumiram o governo do estado e deram importante contribuição às letras paraibanas.
O romance Carcará toma Cajazeiras como representativa de muitas cidades do interior do nordeste que foram atacadas por bando de cangaceiros. A verdade é que as cidades do interior eram desguarnecidas, os meios de comunicação eram incipientes e não conseguiam tirar do isolamento os lugarejos mais distantes. Esse era um dos fatores por que a maioria das cidades capitulava frente às investidas dos cangaceiros. Mossoró, no Rio Grande do Norte, no ano de 1927, expulsou os cangaceiros da cidade, sendo também uma das primeiras cidades a desafiar o Rei do Cangaço. Esse passado de lutas até hoje é preservado pela população mossoroense, usada como discurso histórico, político e cultural. São museus, memoriais, livros, discursos que formulam a identidade de um povo valente, que não aceitou os invasores. Em Cajazeiras, a expulsão dos cangaceiros não foi explorada dessa maneira, foi silenciada, esquecida e tem no livro de Ivan Bichara uma significativa fonte de pesquisa.
O livro traz personagens representativos do universo sertanejo. São rapazes que na época desejam migrar para os grandes centros e assim poderem dar continuidade aos seus estudos, moças casadoiras, poderosos locais como coronéis, políticos, delegados e também a gente do povo, feirantes, cantadores de viola, que se movimentam e nos prendem nas teias do enredo. O livro de Ivan Bichara é inspirado em um fato real, que ele soube narrar com enorme expressão literária, ligando seus personagens à vida de um Nordeste arcaico, recôndito, lugar de acontecimentos inusitados.
O ataque dos cangaceiros, a ansiedade, o medo das perversidades, tudo isso envolve o leitor do Carcará, fazendo com que ele também se angustie, tome amizade pelos personagens, se importe com sua vida e com o seu destino nas mãos dos cangaceiros. Ivan Bichara integra a vida com a literatura, fazendo a vida pulsar em cada parágrafo. A ansiedade do menino deu subsídios para, juntamente com a técnica literária do homem escritor, gerarem um livro que mesmo empoeirado e esquecido nas estantes das bibliotecas públicas nos remete a um passado que merece ser lembrado.
Nadja Claudino

Por: Nadja Claudino em 25/09/2011

Código do texto: T3240581

80 ANOS DO ATAQUE DO CANGACEIRO " SABINO "

(*) Por: Francisca Pereira Martins Gomes
Pesquisadora, sócia da SBEC (Neta do Cangaceiro Sabino)

Na sombria tarde de 28 de setembro de 1926, a cidade de Cajazeiras localizada às margens do Açude Grande, tendo à frente a Igreja Matriz e ao lado esquerdo o Colégio Padre Rolim, mais à frente as casas comerciais e residências, no silêncio da espera, desperta aos tiros das armas do cangaceiro Sabino Gomes e seus asseclas.
Sabino Gomes teve a coragem de atacar a cidade de Cajazeiras, que tinha aproximadamente mais de 5.000 habitantes, e que através das autoridades da terra do Padre Rolim, como sejam Prefeito e o representante da força policial, tinham preparado estratégias para frustrar o ataque, além do juiz da cidade pedir reforço ao Presidente do Estado.
As autoridades tiveram conhecimento da marcha dos bandoleiros através de telegramas expedidos por parentes residentes nas cidades do Cariri cearense, informando-os que Lampião à frente de 100 homens, teria atravessado a região em direção à Paraíba, visando Cajazeiras.
Na verdade, quem marchou para a cidade de Cajazeiras foi Sabino Gomes, Sabino Gomes de Góes conhecido no mundo do cangaço como feroz guerrilheiro Sabino das Abóboras, lugar-tenente de Lampião, patente recebida em 06 de março de 1926, na cidade de Juazeiro do Norte, Ceará, para lutar contra a Coluna Prestes.

Foto da atual cidade de CAJAZEIRAS-PB - Cortesia: A. Z. Santos

A cidade se preparou tão bem que foram os primeiros a assassinarem três homens do Bando de Sabino, que estiveram na cidade para observar o movimento e repassar as informações.
Depois de três anos, estava de volta à Cajazeiras Sabino sob a chefia de 22 asseclas. Entre eles estavam: Laurindo, Mariano, Bom Deveras, Bentivi, Dois de Ouro, Rio Preto, Picapau, Euclides, Formiga, Braúna, Namorado, Gusmão, Maçarico e outros. Esse era um momento muito aguardado por Sabino!
Sabino e o seu bando iniciaram suas façanhas através dos Sítios: Marimbas, Tambor, Redondo e Baixa Grande onde fizeram uma parada. No sítio Baixa Grande, assassinou dois agricultores: Raimundo Cassimiro e seu filho Chico Cassimiro. Esta notícia se espalhou rapidamente assombrando a população dos recantos do município e principalmente a população de Cajazeiras.
Vários escritores, já descreveram o itinerário quando da entrada de Sabino à terra de Padre Rolim, iniciando pelo Sítio Remédios (atual bairro Remédios) com parada na casa de Luiz Boca-Aberta; desceram pela rua Cel. Vital Rolim, antiga Matança (atual Dr. Coelho), onde assassinaram, com um tiro na cabeça, um policial que fazia correição de animais soltos nas vias públicas.
A gritaria e os disparos amedrontavam a cidade. Nas proximidades do Prédio Vicentino, ex-Cine Pax, mataram Cícero Ferreira Lima, vulgo Pé de Cágado, que teve a ousadia de responder a Sabino que não tinha medo nem de cangaceiro nem de Lampião.

Em seguida entraram pela rua do comércio, atual Padre José Tomaz, até a Praça Coração de Jesus, entrincheirando-se na Igreja do mesmo nome, enquanto os defensores encontravam-se entrincheirados nas ruas Sete de Setembro, atual Av. Presidente João Pessoa, e Tenente Sabino com a rua do Comércio, acontecendo um cerrado “fogo”. No calor do “fogo”, Sabino junto aos seus companheiros, deu exemplo de bravura pessoal, correndo pela rua, atirando ora com mosquetão, ora servindo-se do rifle papo amarelo, que acendia lampejos de fogo, refletindo uma fúria monstruosa.
Na verdade, um grande guerrilheiro! Os defensores encontravam-se em posição privilegiada para o avanço dos bandoleiros, que tiveram que recuar pela rua da Tamarina e na passagem assassinaram o alfaiate Eliezer. Seguiram pela Travessa S. Francisco, entraram na rua Quinze de Novembro e atacaram a casa de Major Epifânio Sobreira, arrolado como um dos ricos da cidade.
O Major reagiu ao ataque com ajuda de seu empregado José Inácio da Silva, mas mesmo assim foi ferido. O grupo avançou para a rua Sete de Setembro, atual Av. Pres. João Pessoa, quando foram surpreendidos pela misteriosa explosão da Usina de Força e Luz, instalada ao sopé da barragem do Açude Grande, sob a direção técnica de José Sinfrônio Assis, levando os bandoleiros a recuarem. Pensava eles ser reforço e era regra no cangaço recuar, quando o combate se tornava confuso ou incerto.
O principal objetivo do ataque de Sabino à Cajazeiras era VINGANÇA, por ter sido vítima de emboscada por policiais, tendo como responsável o soldado reformado Lourenço Dunga; em seguida prender o prefeito Sabino Rolim e o Dr. Draenner engenheiro das Secas, para pedir resgate. O saque ao comércio e as casas dos ricaços era praxe quando dos ataques dos cangaceiros; e por fim também vingar-se do velho conhecido ex-cangaceiro Raimundo Anastácio que aliou-se às autoridades policiais, passando todas as informações sobre o ataque.
Apesar da resistência formada por vinte e cinco homens, em primeiro plano Tenente Elias Fernandes (Delegado de Policia) e quinze soldados; mais: Romeu Menando Cruz, Pe. Gervásio Coelho, Joaquim Sobreira Cartaxo (Marechal), Bacharel Praxedes Pitanga, Jaime Carneiro, Raimundo Anastácio, Major Epifânio Sobreira, José Sinfrônio Assis e José Inácio da Silva, a cidade viveu as agruras do ataque que deixou marcas indeléveis.
O soldado Lourenço pagou com a vida pelo que fez a Sabino. A casa de Raimundo Anastácio foi destruída, e quando da fuga, o grupo incendiou a residência de Martinho Barbosa e saquearam as residências de: Dr. José Coelho Sobrinho, do médico Dr. José Jorge Almeida, Manoel Pinheiros e do comerciante Júlio Marques entre outras.
O célebre e afamado Sabino com o seu bando, levou a cidade a viver mais de cinco horas de pavor. Inúmeras famílias, por medo, fugiram para as proximidades do município, pois os cangaceiros não usavam de piedade.
A Igreja, na pessoa do Bispo D. Moisés Coelho, tomou como arma a oração pela cidade e pelos cangaceiros, porque afinal os cangaceiros eram filhos de Deus e vítimas das injustiças sociais.
Sabino era pernambucano, veio para Cajazeiras, através do importante político e comerciante, além de ser proprietário do Jornal “O Rebate”, Cel. Marcolino Pereira Diniz, com quem tinha uma forte ligação.
Tempos depois trouxe também suas quatros filhas (Maria, Geni, Alaíde – Nazinha - e Maria de Lourdes – Delouza, e a sua mãe, Maria Paulo, à qual as pessoas chamavam carinhosamente de Vó.
Sabino era um homem cujas decisões se davam pela ponta do punhal ou do rifle. O guerrilheiro Sabino fez a sua historia pelas armas. E a partir do meado da década de 20, no Sertão, uma toada muito conhecida veio a imortalizá-lo.

Lá vem Sabino
Mais Lampião
Chapéu quebrado
Fuzil na mão


Lá vem Sabino
Mais Lampião
Chapéu -de- couro
E Fuzil na mão .

Cajazeiras – PB, em 28 de setembro de 2006.
(*) Pesquisadora, sócia da SBEC (Neta do Cangaceiro Sabino)
Livros consultados:
-Carcará – Ivan Bichara
-Guerreiros do Sol – Frederico Pernambucano de Melo
-A (S) Cajazeiras que Vi e onde Vivi (Memórias) Antonio Costa Assis
-Historia da Medicina em Cajazeiras – Luiz de Gonzaga Braga Barreto 
FONTE DA MATÉRIA: 
OBS: Foto da cidade de Cajazeiras- Cortesia de A. Z. SANTOS

Um abraço a todos
IVANILDO SILVEIRA

O coiteiro Durval Rosa enfeitou as suas entrevistas aos pesquisadores


Doutor Sérgio Augusto de Souza Dantas A sua história sobre as verdades ou mentiras de Angicos, é realmente muito bem detalhada. Mas, mesmo com toda informação de Durval Rosa, sobre sacos de balas que levou para Lampião, e a presença de João Bezerra no coito, jogando baralho juntamente com o rei, mesmo não tendo conhecimento profundo sobre o cangaço, tenho o desprazer (mas respeitosamente) de dizer ao ilustre escritor, que Durval Rosa estava querendo aparecer no mundo da história cangaceriana.
Qual é o perseguidor que tem coragem de armar o seu perseguido, levando grande quantidade de balas para ser usada contra a si mesmo?
Eu lendo e relendo o seu maravilhoso texto, entendi que as histórias contadas ao ilustre pelo coiteiro, não passam de fantasia.
Ao senhor, Durval Rosa contou o que aconteceu de uma maneira. Ao Charles Garrido, contou de outra maneira. Ao escritor Paulo Gastão (mossoroense) de outra.
Portanto Doudor Sérgio Augusto de Souza Dantas, perdoe-me por não entender bem o cangaço.Durval Rosa não tinha segurança do que informou aos senhores pesquisadores.
Só quero que o notável pesquisador não pense que eu estou duvidando das suas palavras e dos demais escritores, e sim, de Durval Rosa.
Respeitosamente:
José Mendes Pereira - Mossoró - Rn.


LAMPIÃO EM SERGIPE *

Por: Luiz Antonio Barreto
Jornalista, historiador e diretor do Instituto Tobias Barreto e ex-secretário de Estado da Cultura. Escreve para o Portal Infonet todos os sábados.

Virgulino Ferreira da Silva, o Capitão Lampião como assinava, morreu em Sergipe em 28 de julho de 1938. Atacado de surpresa por força alagoana na Gruta do Angico, município de Poço Redondo no sertão “sanfranciscano”, seu corpo, depois de decepada e levada a cabeça como troféu de guerra, ficou exposto naquela região sergipana com o da sua companheira Maria de Déa, ou Santinha, a Maria Bonita, e cangaceiros - uma dezena deles - que participavam da reunião dos grupos naqueles dias de desconfiança. 


A cena da morte de Lampião aconteceu quase dez anos depois das suas primeiras e famosas incursões em Sergipe, em 1929, que representam um capítulo especial na vida do cangaceiro e das quais se ocuparam, mais recentemente, Oleone Coelho Fontes da Bahia, Antonio Amaury de São Paulo e Vera Ferreira, filha de Expedita e neta de Virgulino e de Maria Bonita, de Sergipe. Carira, no oeste sergipano, vizinho ao sertão baiano, parece ter sido o primeiro ponto da presença de Lampião com seu grupo, em Sergipe em 1º de março de 1829 e marcaria um roteiro de visitas por vários municípios do Estado, no vai e vem cíclico que ainda não foi devidamente mapeado e nem registrado textualmente como deveria. A visita de Lampião a Carira foi rápida, precedida de uma comunicação ao Delegado e indicava uma viagem maior chegando até Frei Paulo. 

Na madrugada do dia 2 de março, depois de conversar com o povo, dar sua versão de como entrou no cangaço e zombar da Polícia, que chegava nos lugares sempre depois de sua saída, Lampião acompanho de 6 homens, voltou para o interior baiano passando pelas terras do Coronel João Sá, chegando já com 10 homens na Fazenda Capitão, em Jeremoabo. A visita seguinte, a Poço Redondo em 19 de abril de 1929, permitiu um encontro de Virgulino Ferreira da Silva com o padre Artur Passos, Pároco de Porto da Folha então celebrando missa naquele povoado como fazia periodicamente. 

Um diálogo duro entre o cangaceiro e o padre, marcou a presença do grupo em frente da Igreja quando Lampião pediu permissão para assistir missa com seus “rapazes”. Para o padre celebrante, virando-se do altar para o povo viu além do sol fora da capela, cabeças descobertas, sem armas, de braços cruzados, atentos, respeitosos, olhos pregados nele (o Capitão), “Esses homens cujas vidas têm sido um amontoado de crimes, delitos e abominações, mas homens todavia”. 

Lampião tomou lápis e papel e fez uma lista dos seus homens informando nome, apelido, idade e entregando-a ao padre com observações de defesa. Tinha Lampião 29 anos e estava acompanhado do seu irmão Ezequiel, o Ponto Fino, de 20 anos, Virgínio Fortunato, o Moderno, com 28, Luiz Pedro da Silva, o Esperança, com 24, Cristino Gomes da Silva, o Corisco, com 23, Mariano Gomes da Silva, o Pernambuco, com 25, Hortêncio Gomes da Silva, o Arvoredo, com 24, José Alves dos Santos, o Fortaleza, sem indicação de idade, José Vieira da Silva, o Lavareda, com 27, e Antonio Alves de Souza, o Volta Seca, com 18. Diante de Virgulino Ferreira da Silva, o padre Artur Passos diz: “Alto, acaboclado, robusto, andar firme e compassado, cabeça um tanto inclinada, o olho direito inutilizado, com uma grande mancha branca, olhos brancos de aro de ouro, ou metal dourado, um sinal preto na face direita. Na cabeça, grande, alto, vistoso chapéu de couro, ainda novo, bem trabalhado, a imitar os antigos chapéus de dois bicos, com as pontas para os lados, tendo as largas abas da frente e de detrás erguidas e enfeitadas. Uma estreita tira de couro, ornada, o prende a testa, uma outra à nuca, e uma terceira, o barbicacho, aos queixos. Este chapéu fica, assim, bem seguro e apesar da altura não deve cair com facilidade. Cabelos estirados, cortados à Nazarena, inteiramente bem barbeado. Blusa e calças - perneiras de caqui. 

Aos pulsos – guarda – pulsos – de couro, de uns quatro dedos de largura. Anéis em todos os dedos, teria na ocasião uns 5 ou 6 na mão direita e uns 6 ou 8 na mão esquerda.” Padre Artur Passos dá em seu testemunho dos jornais, longa descrição da figura quase cavalheiresca do cangaceiro, já integrada ao imaginário do povo brasileiro, especialmente nos estados do Nordeste, onde era tido como “governador” e como “interventor” do sertão. 

O vigário de Porto da Folha continua construindo a imagem que fez de Lampião: “Duas grandes cartucheiras de um lado e duas iguais do outro, cruzam-se sobre o peito. A cintura, à quisa de cinturão, uma larga cartucheira com dois ou três ordens de cartuchos. Tudo bem enfeitado de ilhoses e placas de metal. Na mão, inseparavelmente, a arma terrível que tantas mortes já vomitou, no rápido crepitar, no lampejar contínuo do qual, segundo consta, se origina o seu nome de guerra. Esta arma não é rifle. É sim um mosquetão de cavalaria, ou coisa semelhante, arma de cinco tiros que tem o ponto curvo. A frente, passando entre as cartucheiras, o já conhecido punhal, de uns três palmos, cabo e bainha de metal branco, arma forte, bonita, mau grado a aplicação que tem, de ótima têmpera. Ao lado e às costas, pendentes de fortes bandoleiras, as sólidas mochilas, bem recheadas de balas, formando uma larga e saliente roda, de grande peso. 

Tudo isto liga-se ao corpo de modo tal, que forma uma couraça fixa, sem lhe prejudicar os movimentos rápidos. Ao voltar-se para qualquer parte e em qualquer posição, nada desse arsenal se desloca. Usa uma espécie de sapatos de grossas solas e bem feitos. Traz esporas e rebenque e, ao montar, calça umas luvas de pano marrom que cobrem apenas as costas das mãos. Anda sempre bem barbeado. Em tudo guarda serenidade e presença de espírito. Este o homem.” Descrevendo todo o bando, padre Artur Passos diz: “Estes dez homens, moços, fortes, robustos, musculosos, formam um verdadeiro esquadrão sui generis, assim, mais ou menos, igual e formidavelmente uniformizados. 

Diversos deles, nomeadamente o Moderno, trazem, além dos guarda – pulsos de couro, pulseira nos pulsos e pendentes dos dois bicos quue formam as abas dos grandes, altos e vistosos chapéus. Cabelos bons, cortados à Nazarena, barbeados todos. Trazem muitos anéis em todos os dedos, mas nem os anéis e nem as pulseiras são de grande valor. Alguns trazem cobertas, ou cobertores, bem bordados, sob as cartucheiras, ornadas, bem como as correias das armas, de ilhoses brancos e rodelas de metal. Tal a sua disciplina, que formam um tanto compacto e homogêneo. Alguns são calados e reservados. Não mostram, porém, face carrancuda, nem os vi com maus modos. Não têm, inclusive Lampeão, cara repelente, como imaginamos nos bandidos em geral, devendo frizar, porém, o olhar especial de um deles, o fedelho de 16 a 18 anos, que os acompanha. Estão bem armados, todos, trazendo alguns 2 ou 3 revólveres e, ao que parece, bem municiados. 

Apenas uns 3 ou 4 estão armados a rifles, os demais, como Lampeão, trazem mosquetão de cavalaria. Observei bem que são destemidos e valentes.” (continua) * Trecho do ensaio O Encontro de Lampeão com o Padre, do livro O Incenso e o Enxofre. Permitida a reprodução desde que citada a fonte "Pesquise - Pesquisa de Sergipe / InfoNet".

GECC e SBEC: Nas Trilhas do Cangaço.

Por: João de Sousa Lima


O GECC- Grupo de Estudos do Cangaço do Ceará e a SBEC- Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço estiveram em Paulo Afonso e Região realizando pesquisas e entrevistas sobre o cangaço. 

Na fotografia acima João, Elane, José (sobrinho de Maria Bonita) e Dr. Archimedes.

A expedição formada por João de Sousa Lima, Aderbal Nogueira, Manoel Severo, Valentin, Afrânio Cisne, Múcio Procópio, Juliana Ischiara, Pedro Luis, Lívio Ferreira e os convidados Dr. Archimedes e sua esposa  Elane e o casal capixaba karlon e Adrienne e os filhos Matheus Lucas.


Archimedes e João na placa do Museu Casa de Maria Bonita.


João, Severo, Lívio, Alcino, Archimedes e Vilela em Piranhas, Alagoas, se preparando para descer até a Grota do Angico.


Alcino Costa "O Decano" sendo aparado pelos amigos Juliana e Severo na chegada à Grota do Angico


Archimedes, Elane, João, Juliana, Pedro Luis, Karlon, Adrienne, Lucas, Matheus, Lívio e Afrânio. A fotografia foi na fazenda Maranduba, local onde ocorreu um dos mais ferrenhos combates do cangaço.


Até que enfim, depois de três anos paguei a promessa ao Severo e Aderbal levando-os ao tangue "Lagoa do Mel", lugar onde houve o famoso combate que faleceu Ezequiel Ferreira, último irmão de Lampião morto em combate. Nesse combate morreram 16 soldados.

Na foto Aderbal colhe um depoimento de João Lima, tendo ao fundo da fotografia os pesquisadores Karlon, Severo, Múcio e Pedro Luiz.


Ainda na Lagoa do Mel com Aderbal, Juliana, Matheus, Karlon, Severo, Múcio, Afrânio, Pedro e João Lima.


No Museu Casa de Maria Bonita: Severo, João, Aderbal e Karlon.


Entre as cidades de Paulo Afonso e Santa Brígida, no meio de uma passagem entre duas serras, encontra-se um cemitério com cruzes carcomidas. Lá estão enterrados os pais de Maria Bonita, Dona Déia e Zé de Felipe.


A equipe chega em um dos mais longícuos dos lugares que guardam as histórias do cangaço, um lugar explorado pela primeira vez.
Essa expedição teve a honra de ser a primeira a pisar a Fazenda Almésca, lugar onde Lampião matou Manuel Salina e seus filhos, em Jeremoabo, Bahia.
Na Foto José Francisco de Sá (Zé Perninha) mostra os escombros da antiga residência (esse alto por trás da foto) e onde algumas pedras marcam o ponto onde ficavam as cruzes.
Os membros do GECC e da SBEC cercam o guia Zé Perninha e sua esposa Maria, colhendo informações sobre a morte da família Salina.


A Expedição formada pelo GECC e pela SBEC representados por João, Severo, Múcio, Valentin, Lívio, Juliana, Pedro Luis, Afrânio, Aderbal e os convidados Archimedes, Elane, Adrienne, Karlon, Lucas e Matheus colheram as informações que serão arquivos úteis para o futuro.



Enviado pelo escritor e pesquisador do cangaço: 
João de Sousa Lima

O ATAQUE DO BANDO DE CANGACEIROS DE LAMPIÃO AO SÍTIO JUAZEIRO

Por: Rostand Medeiros

Quando em 10 de junho de 1927, Virgulino Ferreira da Silva, o famigerado Lampião, juntamente com seus cangaceiros atravessaram a fronteira da Paraíba com o Rio Grande do Norte, teve início um verdadeiro suplício em várias propriedades rurais do Oeste potiguar.

O bando de Lampião em Limoeiro do Norte, Ceará, após a derrota em Mossoró.

Muitas destas pessoas que viviam no campo eram simples e pequenos agricultores, como foi o caso do sítio Juazeiro, então localizado na zona rural da cidade de Pau dos Ferros, atualmente pertencente ao território do município de Marcelino Vieira, a 380 quilômetros de Natal.

Serra do Panati e parte do açude do Junco.

Sentada na varanda da casa anteriormente invadida pelo bando, defronte ao açude do Junco e da grande serra do Panati, Dona Terezinha de Jesus Queiroz, de setenta e dois anos, relembra o que seu pai, o falecido agricultor Manuel Joaquim de Queiroz, conhecido na região como “Manuel Laurindo”, lhe contou daquele estranho dia.

Ele tinha na época vinte e dois anos de idade, era solteiro, e na parte da tarde estava sentado no alpendre da casa de seu pai, concertando um sapato com algumas ferramentas para esta função. O genitor de Manuel, na época já viúvo, estava ausente e junto com ele na residência se encontrava a sua irmã mais velha.

A casa do sítio Juazeiro, zona rural do município de Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte Casa onde morava Manuel Joaquim de Queiroz, o “Manuel Raulino”, localizada atualmente as margens do açude do Saco. Segundo Dona Terezinha, excluindo a calçada, a rampa e a coluna de alvenaria, o resto da casa está original.

De repente, em meio a uma grande algazarra, gritos, guinchados, urros, assovios e galopes das montarias, um grupo de cangaceiros se posta diante do agricultor. Grosseiramente alguns lhe apontam seus fuzis, enquanto outros invadem a casa e ameaçam a todos.
Maria Queiroz, a irmã de Manuel, passava roupa na sala da casa. Ao perceber a entrada dos invasores armados começou a gritar, logo fez menção de querer pular uma janela e correr. Rapidamente um cangaceiro apontou-lhe um fuzil na cabeça e ordenou que ela não fugisse. Outro membro do grupo de assaltantes disse que não maltratasse a mulher. Essa gritaria, esse movimento deixou os bandoleiros nervosos e foi preciso o irmão solicitar calma a jovem.

O autor deste artigo junto aos baús onde a família guardava roupas e outros utensílios. No dia do ataque todos foram revirados pelos cangaceiros em busca de armas e dinheiro.

Logo a pequena casa fica cheia de cangaceiros malcheirosos e rudes. Tem início uma busca frenética por dinheiro, armas e eles começaram a mexer em tudo. Alguns baús, peças de mobília que na época era comumente utilizada para guardar roupas, lençóis e outros objetos, foram bruscamente abertos e os seus conteúdos espalhados. Manuel negou a existência do que os cangaceiros desejavam, mas sua negativa apenas atiçou o desejo da rapinagem. Estes baús estão até hoje nesta casa e bem conservados.

Em meio à agonia e o terror proporcionado pelos cangaceiros, Manuel não percebeu a presença de seu tio Antônio Raulino, que naquele instante servia de guia forçado para aquela fração do bando de Lampião, que não se encontrava entre os assaltantes.

No momento de partirem, o pai de Dona Terezinha lhe contou que um dos cangaceiros estava tão pesado devido aos equipamentos, que o mesmo não conseguiu subir na sua alimária. Grosseiramente este ordenou a Manuel que segurasse as rédeas com força para que ele pudesse subir. Ameaçou o jovem que se caísse “ele iria sentir o peso de sua mão”. Manuel segurou as rédeas da maneira mais firme possível, para assim o arrogante bandoleiro conseguir montar e partir com seus companheiros.

Na cozinha da casa do sítio Juazeiro vemos Dona Terezinha e o Secretário de Cultura de Marcelino Vieira, o professor Romualdo Carneiro, que busca através de ações junto as escolas do município a valorização da tradição oral de sua região.

Após a saída do grupo, o clima dentro da casa era de desalento. Tudo estava revirado, roupas e lençóis estavam espalhados, objetos estavam pelo chão quebrados. O medo dos cangaceiros retornarem era enorme. Raulino chama sua irmã e decidem partir para o mato. Ainda tem tempo de escutarem outra parte da cavalaria de delinquentes passarem próximos de seu esconderijo e seguem em direção a casa de parentes.

No caminho escutam inúmeras detonações. Era o combate que ficaria conhecido como “Fogo da Caiçara”. Neste tiroteio, o primeiro do grupo de Lampião contra a polícia potiguar, o resultado foi um morto para cada lado e a fuga dos policiais comandados pelo tenente Carvalho Agra.

No dia 13 de junho, enquanto Lampião chegava a Mossoró, Manuel Joaquim de Queiroz se encontrava na Delegacia de Polícia da cidade de Pau dos Ferros, relatando para as autoridades presentes , os fatos ocorridos na casa de seu pai naquela tarde do dia 10 de junho. Entre outras informações, ele listou para o capitão da polícia Jacinto Tavares Ferreira, registrado na página 17 do processo que trata da passagem do bando de Lampião pela região, que os cangaceiros subtraíram uma quantidade de bens que o depoente calculou em 850.000 réis.

Dona Terezinha de Jesus Queiroz relembra com saudades o tempo em que a família se reunia no alpendre para ouvir histórias sobre a "visita" dos cangaceiros.

Dona Terezinha comenta que mesmo não sendo contemporânea destes fatos, ela recorda com satisfação as ocasiões em que a sua família relembrava estes episódios, todos reunidos a noite no alpendre da casa. Para ela, com a morte dos protagonistas e o desinteresse dos mais jovens da região pelo assunto, em breve não haverá mais quem se lembre dos fatos ocorridos no dia 10 de junho de 1927.

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Extraído do blog: "Tok de História"














João Cambraia - Olho via, mão pegava!

Por: José Mendes Pereira

João Cambraia era o seu apelido. Para falar a verdade eu nem sei o seu nome de batismo. Primo segundo de minha mãe, Antonia Mendes Pereira. 

Antonia Mendes Pereira
Antonia Mendes Pereira - já falecida

Astucioso todo e desonesto até o sorriso. O que os olhos viam, as mãos pegavam. Ladrão de quinta classe, ou quem sabe, de sexta, sétima..., principalmente de galinha.



Nesse tempo em que ele frequentava a casa da minha mãe eu ainda era criança, talvez dez, onze... anos.

João Cambraia vivia mais preso do que solto, por pequenos roubos. Quando se livrava da cadeia de Mossoró, apanhava o velho e cansado pinga-pinga, e se mandava para a capital de Natal, e lá praticava as mesmas desonestidades.

Quando os poucos moradores da "Barrinha" sabiam que o João Cambraia estava no pedaço, cuidavam de esconder valores e tudo de mais importância. João Cambraia não merecia confiança; aonde chegava era necessário um vigia para acompanhá-lo, pois ele roubava até saco de esterco, só para ter o prazer de furtar.

Certo dia, era um domingo, mais ou menos seis hora da manhã, chegou o João Cambraia em minha casa, afirmando à minha mãe que aquela vida de roubos havia deixado. Todo metido num uniforme de sargento; cabelo à moda militar, e, como prêmio, dizia ele, havia recebido da polícia militar do Rio Grande do Norte a patente de "sargento".

- Toinha, - era como ele chamava a minha mãe - aquela vida de malandragem, graças a Deus - dizia ele colocando as mãos postas para o céu, eu deixei, e de agora em diante prima, você não vai mais passar vergonha por mim. Sou sargento da polícia, afirmou ele retirando uma identidade com a sua foto.

- Felicidade para você, João! E que Deus conserve a sua patente de sargento.

Durante o dia ninguém mais fez vigilância a João Cambraia. Também pudera! Sargento da polícia. Sim senhor! Para que mais acompanhar uma autoridade? Um homem que prende os delinquentes, os marginais? Ora! Um homem que agora era sargento e todo metido num uniforme, com um gorro meio pendido para um dos lados, e um emblema distinguindo a sua patente?

E foi-se o dia.

Ao anoitecer João Cambraia apoderou-se de uma rede, armou-a sob o alpendre, só ouvindo os conselhos das pessoas que costumeiramente frequentavam a casa de meu pai. Ali, João Cambraia só ouviu elogios, pela sua boa vontade de ter deixado aquela vida, de nunca mais está trancafiado; ao contrário, agora seria ele quem iria prender, açoitar, judiar até o réu confessar o seu erro... Cada conselho, uma porção de aplausos surgia no alpendre. Elogios. Aplausos. E não?

Pedro Nél Pereira
Meu pai Pedro Nél Pereira - já falecido

O meu pai Pedro Nél Pereira fora o primeiro no lugarejo a comprar um rádio AM, de duas faixas, "ABC", feito de madeira de boa qualidade. Apesar do atraso da nação era lindo para época. Muito bem fabricado. Havia vendido uma porção de bodes para ser possuidor daquele comunicador.


Já havia se passado a voz do Brasil, e o rádio, além da presença de João Cambraia, foi um dos divertimentos aos presentes. Ouvindo o Bazar da Alegria, apresentado pelo saudoso Aldenor Nogueira.


Vamos conhecer o Aldenor Nogueira? Logo voltaremos à nossa história.


http://jullyetth-excombatentes.blogspot.com.br

Aldenor Evangelista Nogueira, cearense de Cascavel e nascido em 18 de agosto de 1922, faleceu em Mossoró-RN, na madrugada do dia 22 de abril de 2003.

O veterano radialista, que chegou a Mossoró em companhia dos pais aos três anos de idade, enfrentava há meses problemas cardíacos.

Aldenor apesar de ter nascido no vizinho Estado, disse certa vez que uma das maiores honras de sua vida era ter sido registrado como mossoroense.

Além da militância no rádio, Aldenor Nogueira teve um início de vida de muita luta e sacrifício  oportunidade em que vendeu jornais, foi professor de alfabetização de adultos do Tiro de Guerra e no 2o. Batalhão de Polícia Militar, ambos sediados aqui na cidade, e foi subchefe do Juizado de Menores.

Possivelmente um dos seus grandes feitos, claro e logicamente o de ter criado 21 filhos " dos quais 20 ainda estão vivos entre eles, dois coronéis da gloriosa e amada Polícia Militar: JANIO REGIS NOGUEIRA (2/5/1957) e JOÃO NOGUEIRA NETO(31/5/1956) " foi ter se apresentado como voluntário na época da 2a. Grande Guerra Mundial.

Isso muito o orgulhava, mesmo que de imediato tenha sido rejeitado como combatente, mas pouco tempo depois foi convocado e serviu em Natal.


Vamos continuar a nossa História?


Pouco tempo, um aviso. O locutor anunciava o seguinte:

"Atenção população de Mossoró! Quem souber o paradeiro de João Cambraia, por favor comunique ao comando geral da polícia militar, em Mossoró, pois o mesmo furtou o uniforme do sargento Delmiro em Natal"...

Ali, os presentes caíram de vez. Tantos elogios perdidos. Mas o João Cambraia foi esperto, afirmando ele que era brincadeira da emissora, pois um dos locutores já havia lhe comunicado. E volta-se a acreditar no João Cambraia.

A conversa entre a vizinhança continuou.

Daí a pouco João Cambraia se levantou da rede e saiu se escorregando em busca da cozinha.

Minutos depois. E o João Cambraia? Que João Cambraia que nada! Entrou nas matas. Adeus Toinha! Nunca mais minha mãe teve o prazer de ver João Cambraia.

João Cambraia foi morto em Natal quando tentava roubar uma residência. O dono da casa acordou, sentiu o chiado de telhas, mirou e atirou, descendo o infeliz já morto.
  
Minha simples histórias

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

ENCONTROS INESQUECÍVEIS (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa*
Rangel Alves da Costa

ENCONTROS INESQUECÍVEIS
                        
Lá pelos idos de 1690, numa manhã chuvosa enfim cheguei aos arredores da Serra da Barriga, lá em Palmares, nas Alagoas, para entregar em mãos – sob a máxima confiança – uma missiva que havia sido enviada para Zumbi dos Palmares.

Cheguei me escondendo por trás das moitas, com medo de ser confundido com um inimigo, e só quando percebi o caminho livre corri para depois parar e gritar que estava chegando em paz e que tinha uma encomenda importante para entregar ao grande líder negro. Acenaram que continuasse e em seguida fui levado ao salão principal do reino soberano de libertação: uma gruta, apenas isso.

Zumbi, negro bem alto e de forte musculatura, estava só com uma calça de pano branco à moda dos capoeiristas e baforava um charuto com fumo de cheiro muito estranho. Apontou-me uma pedra e pediu para sentar. Obedeci e em seguida outro negro que fazia às vezes de ordenança disse que eu me apressasse porque o seu rei estaria muito ocupado dali a instante. Então eu disse que estava ali como emissário especialmente para entregar um envelope enviado por...

Nem consegui dizer o nome, pois o rei negro se aproximou com um sorriso mais branco do que uma cuia de leite, dizendo que enfim havia chegado a ajuda que tanto esperava. Mas perguntou quem realmente havia mandado o cheque e o dinheiro vivo para comprar armamento e munição. Então prontamente respondi que havia sido o pessoal de um partido dos trabalhadores, uns companheiros da ala mais radical.

“Tô lascado. Esses caras pensam que negros fugitivos são guerrilheiros das Farc, é? Se não bastassem as forças inimigas, agora me vem esses companheiros querendo me colocar numa cocó. Se eu aceitar os milicos da federal amanhã aparecem por aqui intimando e o negão aqui tá é fodido. E levem esse rapaz com envelope e tudo lá para o penhasco e despeje de lá”.

Fui devidamente expulso da gruta e encaminhado para o tal penhasco. Mas como não sou besta e sei muito bem que tem gente esperta por todo lugar, sorrateiramente abri o envelope e coloquei algumas notas na mão. Os dois negrões que me acompanhavam se olharam e nem pensaram duas vezes. Perguntaram se tinha outro maçinho igual aquele e eu respondi que sim. E assim cada um botou o seu no bolso e consegui sair com vida de lá.

E mais tarde fui parar na cidade de Juazeiro do Norte, lá pelas do Ceará. Enviado novamente em missão, só que dessa vez com a incumbência de entregar ao Padre Cícero Romão Batista uma carta enviada pelo Vaticano. Com selo papal e tudo, num vermelho de sangue, a encomenda era mais que urgente, pois, segundo o bispo me confidenciou, o papa estava puto da vida com aquele homem que continuava confundido igreja com palanque, poder divino com poder político, pensando que hóstia é barganha política.

Desse modo, mesmo sem abrir a missiva, praticamente eu já sabia de tudo que continha ali. Como era coisa de urgência, ao chegar à igreja onde Padre Cícero poderia estar e informar que levava uma encomenda muito importante para lhe entregar pessoalmente, o sacristão assistente logo perguntou se era coisa de política, pois se fosse a entrada era pelos fundos da igreja.

Disse que estava a mando do Vaticano. Ao ouvir tal nome o homem se benzeu, começou a suar e a não saber o que fazer. Mas de repente eis que de uma porta lateral surge o Padre Cícero em pessoa, assustado, logo perguntando se eu havia mesmo dito que estava ali para entregar uma carta enviada pelo Vaticano.

Confirmei e vi o homem mudar de repente, se enraivecer, dar um chute num banco e gritar por alguém, mandando que fosse avisar ao povo que o comício daquela noite estava adiado. E que todos se reunissem naquela igreja pra ele dizer quem mandava realmente ali, se era ele ou o papa.

Entreguei o envelope, abriu apressadamente e disse: “Tô lascado. Esses caras de Roma acham que vou fazer o que eles querem, que é baixar as armas, entregar de mão beijada toda essa região aos inimigos políticos, deixar de ser o coronel que o povo assim também desejou. Eles tão é enganados comigo, pois quem me vê de batina não sabe com quantas armas se faz uma guerra”.

Depois perguntou se eu votava por ali. Como eu disse que não, então me mandou ir embora. Mas não sem antes rasgar a carta em pedacinhos e jogar as ordens do papa pelo ar. Nunca vi coisa igual, homem topetudo demais, coronel mesmo, gente de beato e jagunço. Minto. Vi uma coisa igual sim, e foi quando fui pessoalmente até Roma relatar o ocorrido.
Mas isso conto depois.


Rangel Alves da Costa
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com