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segunda-feira, 29 de junho de 2020

2ª EDIÇÃO FLORO NOVAIS HERÓI OU BANDIDO?


Mais um livro na praça: FLORO NOVAIS: Herói ou Bandido? De Clerisvaldo B. Chagas & França Filho. Este livro estará disponível a partir de amanhã no Cariri Cangaço São José do Belmonte e segunda feira dia 15/10 Para todo Brasil. 

Preço R$ 40,00 com frete incluso. 124 páginas. Franpelima@bol.com.br e fplima1956@gmail.com e Whatsapp 83 9 9911 8286.

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LAMPIÃO E O CANGAÇO NA HISTORIOGRAFIA DE SERGIPE

Por Archimedes Marques

Esta obra foi escrita pelo pesquisador do cangaço Dr. Archimedes Marques e se você leitor, deseja adquiri-la, entre em contato com o autor através deste e-mail: 

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"Lampião Contra o Mata Sete"

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A MORTE DE ISAÍAS ARRUDA NA ESTAÇÃO DE TREM DE AURORA

Por José Cícero
Antônio Vilela, José Cícero, Ivanildo Silveira e Manoel Severo 
o Cariri Cangaço Piranhas 2014.

A tarde estava cinzenta naquela Aurora pacata e provinciana de 1928. Uma enorme sensação de tranqüilidade cobria os semblantes dos viajantes, assim como o coração e o pensamento da multidão que se aglomerava na pedra da estação. Uma cena comum a todas as cidades interioranas atendidas pelo velho trem da Rede Ferroviária Cearense(RVC). Nuvens cor de chumbo em formação pareciam prenunciar no céu daquela Aurora antiga e calma, algo diferente prestes a ocorrer: uma tragédia.

Naquela tardezinha quase insossa de sábado, dia 4 de agosto de 1928 quando muitos já se esqueciam dos episódios um ano antes relacionado à presença do rei do cangaço na terrinha; o velho aparelho do telégrafo da RVC de novo estava prestes a receber no código morse um telegrama diferente. Um comunicado estranho; digamos que chave, para todos os desdobramentos do acontecimento dramático que se seguira ao fato: "Antonio, algodão hoje sobe!". Uma missiva quase enigmática considerando que o algodão " o ouro branco d"Aurora faria sempre o sentido contrário, ou seja, descia. E o seu preço no mercado há muito era de todos conhecido.

Porém, aquela mensagem codificada não seria de todos estranha. Havia um destino e um desiderato certo: surpreender o coronel. Dizia muito mais do que ali estava escrito de modo lacônico...A estação de Aurora estava repleta de gente. Um acontecimento que se tornara comum deste a sua inauguração oito anos antes em 7 de setembro de 1920.

E a cronologia do momento seguinte, provaria depois para todos que era um crime. Um atentado violento à ordem e a vida em nome da vingança e da intolerância. Uma intriga passada à limpo, expressa na força da violência e da ignorância em detrimento da razão e da justiça. Sinais de uma época densamente marcada pelo poder de fogo do coronelismo oligárquico, engendrado pelos mais temíveis e truculentos líderes políticos que o Cariri cearense já experimentou. Um período onde a lei no mais das vezes era a do mais forte e a justiça quase sempre era feita pelas próprias mãos, em geral, dos poderosos.

Coronel Isaías Arruda

Naquele sábado, de tarde escura de agosto, a estação de Aurora não tardaria a ser palco de um episódio que marcaria à história do Cariri e do Ceará para sempre, vez que envolveria, aquele que foi certamente o mais famoso e temível chefe político da região: o coronel Isaias Arruda. Filho do lugar, ex-delegado, agora prefeito pela força da vizinha Missão Velha. De quebra, o maior dos coiteiros de Lampião no interior cearense. Um autêntico mantenedor de jagunços e hábil negociador político junto aos grandes da capital.

O relógio do prédio apontava 14h25min quando, finalmente, todos puderam escutar o apito estridente da máquina a ecoar no horizonte. Apenas Sabina entretida demais com o seu café não se deu conta do acontecido. Todos, de repente voltaram suas atenções na direção do corte-grande lá para as bandas do alto da cruz, do sito Frade. O trem da Fortaleza vinha ligeiro beirando o rio Salgado.

Exímios chapeados transportavam com pressa e celeridade grandes caixotes, pacotes e outros fardos de mercadorias. Uns descian para o armazém da RVC outros subian para os vagões do trem com destino ao Crato. Animais, peças de madeira, artesanato, aguardente, rapadura, oiticica, panelas de barro. O trem acelerava a curiosidade, tanto quanto a economia daquela terra.

Mas de repente o som de um tiro seco ribombeou no ar. Quebrando a normalidade natural daquele acontecimento diário. Em seguida vários outros disparos puderam ser ouvidos no interior do segundo vagão da primeira classe. Talvez sete ou oito no total... Até hoje ninguém sabe ao certo. Um silêncio quase sepulcral se abateu na plataforma por alguns instantes que pareceram eternos. Somente o ronco da locomotiva estacionada deforfronte a caixa d"água. Em seguida uma correria...

Vozes diziam tratar-se de uma discussão. Três homens saíram atracados e em seguida correram no sentido contrário do vagão. Uma disparada em direção do armazém e depois para o beco da antiga rua que dava para o cemitério. Um quarto homem um tanto elegante, bem tratado, gestos aparentemente finos surgiu do segundo vagão da primeira classe. Vestindo impecavelmente um linho branco, ele pisou de modo esquisito e desaprumado o piso, a pedra da estação. Alguns passos apenas e cambaleando fitou a multidão como quem quisesse dizer algo. Não foi possível. Sangrando e com a mão direita colada ao peito chamava baixinho pelo primo. O linho branco do seu terno agora começava a se tingir de vermelho. Seus sapatos de cor marrom e bem polidos contrastavam com o vermelho escuro do seu próprio sangue formando porças na plataforma. Era o coronel Isaias Arruda, chefe político, prefeito da Missão Velha. Homem afamado em toda região e na capital do estado. Devagar caiu ao chão da plataforma ainda com arma junta ao cinto da calça. Não teve tempo de usá-la.

Alguém saindo de dentro do vagão posterior se aproxima dele e forra o chão da pedra com um jornal que lia; edição do dia 3. Seu braço esquerdo e parte superior do tórax estavam em frangalhos. Ferimentos gravíssimos provocados pelos sete balanços com que fora atingido.O coronel ferido seriamente pronunciava baixinho como que cansado:

- Os irmãos paulinos me acertaram! Mas como é que nem o Viana nem ninguém me avisou que meus inimigos estavam aqui?! Bando de covardes...

E de chofre emendou:

- alguém me chame o farmacêutico! Foram os Paulinos, eles me acertaram... Bando de covardes!

Outros mais ousados e corajosos aos poucos foram se aproximando da vítima que gemia deitada ao solo da pedra sobre as folhas do jornal "O Ceará". Enquanto isso, um pouco afastado da estação José Furtado(Nequinho de Milica) primo da vítima saíra em perseguição(ou fugindo) dos irmãos paulinos: Antonio e Francisco, responsáveis pelo atentado.

Levado para a residência de Augusto Jucá um antigo amigo na rua grande, Isaias foi socorrido, inicialmente por um farmacêutico - o único que existia na cidade. No dia seguinte dois médicos vindo de trole pela linha da RVC: Antenor Cavalcante e Sérgio Banhos atenderam o coronel. Porém, diante das gravidades dos ferimentos não tiveram como salvá-lo. Sendo que no dia 8 de abril uma quarta-feira às 6h da manhã, quatro dias após ser alvejado, Isaias Arruda faleceu como que por capricho do destino na terra em que nascera.

Rumores apontaram ter sido o assassinato uma vingança de Lampião pela traição do coronel um ano antes, durante a célebre tentativa de envenenamento do bando lampiônico e o histórico cerco de fogo do sítio Ipueiras, propriedade de Arruda em Aurora em cujo local Virgulino se arranchara por diversas vezes. Ocasião em que o rei do cangaço fugia das volantes após o fracasso da invasão de Mossoró, arquitetada sob as estratégias de Massilon Leite e financiada pelo próprio Isaias.

Mas o certo, segundo se provaria depois foi que os paulinos vingaram o assassinato do irmão mais velho João, morto numa emboscada no serrote d"Aurora pelos jagunços de Arruda no ano anterior.

Terminava ali de modo trágico, na estação ferroviária de Aurora a verdadeira saga de um dos mais temíveis e respeitados coronéis do Cariri - Isaias Arruda. Assim como sua rixa ferrenha contra os irmãos paulinos da Aurora.

Prof. José Cícero
Escritor, Pesquisador e Poeta.
Secretário de Cultura de Aurora
TEXTO NA ÍNTEGRA: jcaurora.blogspot.com


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O CÓDIGO DE CONDUTA DOS CANGACEIROS DE LAMPIÃO

Por Rangel Alves da Costa

Como é do conhecimento de muitos, Virgulino Lampião não era pessoa completamente analfabeta, um iletrado errante pelas caatingas nordestinas. Pelo contrário. Mesmo não tendo levado adiante com mais afinco seus estudos de meninice na pernambucana Vila Bela, verdade é que havia aprendido a ler e escrever o suficiente.

Muitas de suas cartas e bilhetes, missivas enviadas aos comandantes da polícia e aos coronéis sertanejos, bem como aos amigos com quem mantinha vínculo de proximidade, são por demais conhecidas. Museus e colecionadores guardam tais correspondências como verdadeiras relíquias. E certamente assim podem ser consideradas, verdadeiras preciosidades daquele que foi o maior combatente, o mais estrategista e o melhor comandante de todo o sertão nordestino.

Do mesmo modo, muitas fotografias amareladas mostram Virgulino, sozinho ou ao lado de sua Maria, folheando revistas ou lendo jornais. Numa dessas fotos lê um livro parecendo encadernado; noutra, tendo o seu cachorro de estimação entre Maria e ele, posa com uma revista na mão, até mesmo mostrando um retrato de mulher que estava apreciando; e ainda noutra, também feita por Benjamim Abraão, vê-se dois ou três cangaceiros de olhos voltados para alguns escritos.

Além desse rudimentar conhecimento da escrita e da leitura, certamente o Capitão enriquecimento o seu conhecimento com a própria vivência, no trato com os poderosos, com a experiência dos matutos, e principalmente daqueles que procurava quando precisava tomar uma decisão que fosse mais a respeito da realidade exterior do que do cotidiano cangaceiro. Neste último aspecto, era verdadeiro doutor.

Numa besta comparação, e até desnecessária, se poderia dizer que o conhecimento exterior adquirido pelo Capitão aparentava com a de um certo ex-presidente brasileiro. Rude, com pouco estudo, só possuindo exímia habilidade na estratégia de perseguição política, de maquiavelismos e de querer menosprezar os adversários a todo custo. Só que Lampião não vivia nem falando nem fazendo besteira quanto este, pois o comedimento era uma de suas características mais conhecidas.

Desse modo, Lampião não só sabia ler e escrever como foi adquirindo ao longo de sua caminhada um grande cabedal de conhecimentos. Além de ser mestre em tudo que dissesse respeito a sertão, seus labirintos, perigos, armadilhas, também era perito no conhecimento comportamental das pessoas. Conhecia o inimigo só no ouvir dizer; se lançava o olhar sobre um já sentia se o cabra prestava ou era falso; bastava ouvir alguém dizer alguma coisa para ter certeza do quanto de verdade havia ali.

Mas não ficava apenas nesse conhecimento próprio perante o outro, pois apreciava e muito ouvir as pessoas que confiava e gostava. Muitos se tornaram seus verdadeiros amigos e confidentes, aos quais o Capitão fazia confidências sem parcimônia. E um dos que mais gostava de prosear era o fotógrafo sírio-libanês, radicado nas terras agrestinas, Benjamim Abraão, que passou algum tempo acompanhando as andanças do bando e registrando tudo em fotografia.

Após conhecer Lampião em 1926, no Juazeiro do Norte, pelas bandas do Ceará, na casa paroquial onde estava reservado o famoso encontro entre o rei dos cangaceiros e o poderosíssimo Padre Cícero " homem da igreja, da política e do mosquetão -, Benjamim Abraão, então servindo como secretário do religioso, logo se mostrou interessado em imortalizar iconograficamente os passos do bando mais famoso de cangaceiros.

Nesse encontro com o Padre Cícero - ocasião em que Lampião recebeu a patente de Capitão num acordo firmado para combater a Coluna Prestes, e que não vingou porque os outros líderes nordestinos se negaram a apoiar o negociado entre o deputado Floro Bartolomeu e o presidente Artur Bernardes -, ao ser fotografado por Benjamim, e vaidoso como era, Lampião chamou-o num canto e perguntou-lhe se não estava disposto a tirar uns retratos de sua cangaceirada, principalmente dele e Maria Bonita.

Diante da pergunta do Capitão, o fotógrafo, num misto de medo e exultação, conseguiu forças para responder que por enquanto não podia abandonar os serviços que prestava ao religioso, mas assim que fosse possível nem pensaria duas vezes. E assim fez quando do falecimento do coronel milagreiro.

Mas ao chegar e ser cordialmente recebido por Lampião, Benjamim Abraão não ficou apenas incumbido de fazer os registros fotográficos, pois pesquisadores asseveram que o mesmo também servia, muitas vezes, como redator daquilo que lhe era mandado também registrar na escrita. Tudo no papel para não ser esquecido. Assim gostava de fazer o Capitão quando o assunto lhe interessava.

E numa bela tarde de sol sertanejo, enquanto o Capitão passava lenço na testa para afastar o suor encardido, olhou em direção ao fotógrafo que organizava seus equipamentos, mandou que pegasse um caderninho e o acompanhasse até uma pedra mais afastada, lajedo grande de onde se avistava uma paisagem seca e crepitante. E foi a partir desse momento que Lampião começou a registrar no papel aquilo que mais tarde passaria a ser conhecido como o Código de Conduta dos Cangaceiros de Lampião.

"Ninguém do bando deve se espelhar num mal para o mal cometer; ninguém se servirá de uma injustiça cometida para trilhar no caminho injusto. Para se cometer um mal ou uma injustiça, o cangaceiro não seguirá outro exemplo senão aquele que o momento de luta permitir".

"Qualquer arma que se carregue por cima do corpo não deverá ser usada para amedrontar ou para atirar em qualquer um. O assovio da morte ou da defesa só deve ser dado no momento preciso que o inimigo deseje assoviar o mesmo assovio".

"Ninguém do sertão é inimigo de cangaceiro; nenhum sertanejo trai a confiança do bando; de lado a outro, o sertão é da mesma família dos que vivem em bando. Por isso mesmo todos devem ser respeitados, defendidos, sempre vistos como família de sangue que corre nas veias".

"Nem todo som da mata é de bicho, nem todo bicho faz barulho para ser ouvido. No meio da mata não se deve confiar em som algum, muito menos imaginar que um cancão está piando. Qualquer barulho ouvido é bom se preparar para matar passarinho".

"Que o sono seja pesado para o corpo ficar descansado, mas não tão carregado que não posso ouvir barulho estranho. E ao despertar ligeiro, nem pensar em primeiro olhar para agir, mas buscar proteção já de arma na mão".

"Quando receber ordem do Capitão, somente ao Capitão deverá obedecer. Quem desconfia no que ouve e procura outra ordem para seguir é porque não é obediente ao comando e precisa dizer a quem deve respeitar".

"Quem optou seguir pela vida cangaceira deve ter o mato como casa e os companheiros como irmãos. Seus pais são a própria vida, e o seu futuro o destemor. E tudo o que ficou para trás só deve ser olhado de frente, e quando fizer a volta para reencontrar".

"Com tanto inimigo no encalço, com tanta gente que verdadeiramente deve ser perseguido, jamais um cangaceiro que se honra deverá apontar sua arma ou desferir seu rancor contra um inocente, um desvalido, uma criança ou um idoso. Não se diz que um homem é valente pela maldade que faz, mas pelo mal que evita praticar".

E por aí vão outras inúmeras lições, regras de conduta e de comportamento cangaceiro. Uns dizem que nada do tal código jamais foi praticado, enquanto outros juram de pé junto que se não fosse o coração justo e bondoso de Lampião o cangaço teria sido uma guerra de um bando contra todo o sertão, indistintamente.

(*)Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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A MORTE DE MANÉ MORENO !

Por Sálvio Siqueira

Em certa época, Mané Moreno com seu pequeno subgrupo, seguem pelos rincões sertanejos e vão com destino à Porto da Folha. Antes, porém, vão a Jaramataia, para descansarem em determinado coito.

Mané Moreno

O local em que estão é propriedade de Pedro Miguel, senhor que não está nada satisfeito com as aparições desse pequeno grupo de ‘cabras’, pois, já havia chamado a atenção das autoridades. Seo Pedro vai à busca do chefe mor, para comunicar-lhe que Mané Moreno está a abusar da estadia em suas terras. O “Rei dos Cangaceiros” diz para o coiteiro não mais preocupar-se, pois, falaria com o Mané Moreno sobre o caso. Se falou ou não, a verdade é que Mané com seu pequeno grupo, continuam a ‘abusar’ das suas acomodações.

O comandante Odilon Flor, já sabedor das ‘visitas’ que fazem os cangaceiros ao sítio Jaramataia, resolve ir lá e ter uma prosa com o senhor Pedro. Nessa conversa o senhor Pedro revela ao comandante que Mané Moreno e seus ‘cabras’ estão em Poço da Volta.

Havia, naquela noite, um samba, forró, na sede do sítio Palestina. Lá, dançando, bebendo e farreando muito, estavam Mané Moreno, que se divertia bastante com sua companheira, a cangaceira Áurea, e seus cangaceiros.

Informação: Na foto a legenda mostra que o cangaceiro do meio é Gorgulho, mas foi o cangaceiro Cravo Roxo que morreu nesse combate, segundo Alcino Alves Costa.

O comandante Odilon Flor, de longe escuta o toque da sanfona, o bater da zabumba e o repicar do triângulo. Alerta seus homens e vão tomando chegada com cautela... Em pouco tempo, o comandante distribui seus homens e cerca aquela localidade. A volante tem tempo de escolher posição e alvos. E é o que faz. O tiroteio começa e os gritos, palavrões e pedidos de socorro substituem o som da musica tocada. O chefe cangaceiro e sua companheira são os primeiros a tombarem na senda da escuridão eterna.

A coisa fica feia e o reboliço é medonho. Ninguém é de ninguém numa hora dessas. Correm para um lado e para outro, feito barata tonta, enquanto o fogo, tiroteio, toma conta da noite, numa melodia fúnebre.

Algumas literaturas, trazem como sendo o terceiro cangaceiro morto nessa investida, o cabra “Gorgulho”. Há, no entanto, registro que Gorgulho foi baleado, porém, consegue chegar em casa de amigos, um senhor chamado Lisboa, da família Félix. Ficando nessa casa até sua total recuperação. Depois, deixa o cangaço e lasca-se no meio do mundo, até voltar para sua terrinha natal, Salgado do Melão. Também, alguns livros trazem de como sendo o “Fogo do Poço da Volta”, ficando esclarecido que o embate deu-se na fazenda “Palestina”. (“LAMPIÃO ALÉM DA VERSÃO – MENTIRAS E MISTÉRIOS DE ANGICO” – COSTA, Alcino Alves.)

A volante do comandante Odilon Flor teve êxito total nesse embate. 

Adentram na casa e deparam-se com três cadáveres, Mané Moreno, Áurea, sua companheira e Cravo Roxo, um de seus asseclas... numa noite escura, em um forró, nas quebradas do Sertão.

Sálvio Siqueira - 
Fonte Ob. Ct.


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UMA VITÓRIA DA INTELIGÊNCIA SOBRE A FORÇA O ATAQUE DE LAMPIÃO A UIRAÚNA-PB.

Por Sérgio Augusto de Souza Dantas*

Há meses Lampião sumira dos noticiários dos jornais. O ano de 1926 encerra-se sem grandes novidades sobre a horda do famoso cangaceiro de Vila Bela. Bem instalado e seguro no ‘coito’ da Serra do Diamante, do poderoso Coronel Isaías Arruda, Lampião sai da aparente inatividade apenas em fins de abril de 1927. Naquele fim de mês, o bandoleiro deixa o refúgio e pratica assaltos em pequenos vilarejos situados na região noroeste da Paraíba, entre os municípios de Cajazeiras e São José de Piranhas. São ataques rápidos, com vistas apenas ao saque. A proximidade desta parte da Paraíba com o valhacouto do ‘dono’ de Missão Velha facilita sobremaneira a ação do bando.

 Alguns dos defensores de Uiraúna. Ao centro, de paletó escuro, Luiz Rodrigues. Na extrema direita, sentado, o Subdelegado Nelson Leite.
De fato, no dia 15 de maio daquele ano, liderando uma falange de cerca de trinta e cinco homens, Lampião se prepara para tomar de assalto a Vila de Belém do Arrojado - atual cidade paraibana de Uiraúna. Há dias que ‘olheiros’ residentes em sítios da fronteira já haviam sondado o vilarejo e o cangaceiro – decerto bem ciente das condições do lugar – crê que tem plena chance de sucesso na empreitada que pretende levar avante.

O arruado de Belém situa-se junto à fronteira do Rio Grande do Norte e é então inexpressivo. Ali não há mais que cento e trinta casas e uma igreja singela. Comércio pobre ou quase inexistente. Também ali não está destacado sequer um contingente policial para manutenção da ordem ou para oferecimento de uma defesa – mesmo que acanhada – no caso de um eventual ataque de cangaceiros. A ‘ordem’ no povoado é garantida somente por um Subdelegado civil, o potiguar Nelson Leite. Apesar de reiteradas notícias sobre incursões de cangaceiros naquela parte da Paraíba nos últimos dias, o Governo do Estado parece ignorar os eventos propalados pelos jornais e pela boca do povo. Apesar de vários reclamos por parte de proeminentes de Belém, o Estado não enviara tropa regular para a localidade.

Tenente Nelson Furtado Leite 

No início da tarde daquele dia 15 de maio, no entanto, o sertanejo Leonardo Pinheiro percebe a marcha de cangaceiros em direção a Belém. Sem demora, espora o cavalo e entra no povoado em sonoro alarde:

-“Vem cangaceiro por aí! Vem cangaceiro por aí! Parece que é Lampião e não está a mais que umas duas léguas!”

Enquanto a horda marcha em busca do vilarejo, Nelson Leite se apressa em organizar uma defesa. Sangue quente, cioso de suas obrigações, Leite parece disposto a sacrificar a própria vida na defesa da comunidade que lhe fora confiada.

Abandonados à própria sorte, os habitantes de Belém – incentivados por Nelson Leite - tratam de se armar e garantir a resistência do lugar. Civis são convocados e há mesmo os que comparecem voluntariamente para pegar em armas.

Ao final do rápido recrutamento, chega-se à desanimadora soma de onze homens apenas. Um contingente ínfimo que tentará rechaçar um bando com cerca de trinta e cinco cangaceiros. Uma luta desigual – se considerarmos a proporção de três bandoleiros para cada defensor e a falta de experiência de guerrilha dos citadinos.

Por volta das dezessete horas, finalmente, Lampião avizinha-se da Vila. O frágil agrupamento de casas lhe parece excessivamente frágil e torna-se ainda mais amiudado pela sombra da serra de Luís Gomes, não muito distante dali. “Um alvo fácil”, provavelmente terá pensado o poderoso cangaceiro. O desenrolar dos fatos, porém, lhe revelará um grave erro de prognóstico.

Em que pese a correria desenfreada que se seguiu ao alarma dado por Leonardo Pinheiro, os homens de Nelson Leite aprestam munição e armas. Tudo é feito com rapidez e disciplina.
Ao mesmo tempo, mulheres, velhos e crianças – a seguir igualmente os apelos do Subdelegado – buscam refúgio na caatinga ou em sítios de familiares fincados nos arredores de Belém. Pequenos “tesouros” são previamente enterrados em lugares seguros. Potes de barro, caixas de papelão, latas de querosene: qualquer coisa serve como invólucro para as ‘economias’ adquiridas ao longo de anos de trabalho.
Em pouco tempo, os defensores se organizam e estão posicionados em lugares previamente definidos pelo Subdelegado. Dedos nervosos aguardam o desfecho do ataque.

Uma testemunha registra os momentos iniciais do entrave:
“O ‘delegado’ Nelson Leite distribuiu uns homens nos pontos mais altos da rua principal, dois outros guarnecendo as laterais e três instalados no teto da Igreja. Quando Lampião entrou com o bando, pela ‘rua velha’, começou a fuzilaria”. (Sinforosa Claudina de Galiza, entrevista).
Nelson Leite, de fato, engendrara bom plano. Distribuíra os poucos rifles e fuzis disponíveis com os onze defensores. Repartiu com irrepreensível parcimônia a rala munição que tinha ao seu dispor. Os melhores atiradores foram destacados para pontos estratégicos. No teto da igreja - prédio mais alto e com abrangente visão dos arredores - posicionaram-se Luís Rodrigues, Moisés Lauriano, José Teotônio e Joaquim Estevão.
O tempo corre lento. Não há novidades. Até perto das oito horas nem sinal da sinistra patuléia de chapéu de couro. A espera alongada transforma as trincheiras em ninhos de ansiedade.

De súbito, Luís Rodrigues dá o alarma. Alguém se aproxima. O luar denuncia vultos sorrateiros. Homens armados aproximam-se do povoado pela ‘Rua da Proa’.
É o início da invasão. De pronto, grande incêndio ilumina a noite na pequena Belém. Grossas labaredas passam a consumir a casa de um agricultor e espalham-se rapidamente para um antigo curral e plantação de milho já há dias quebrado. O incêndio. Método infalível para incutir terror aos sitiados.

Josefa Augusta Fernandes, bem jovem à época do evento, anota a origem do fogaréu:
“Lampião começou destruindo a propriedade do finado João Gabriel, tendo em seguida tocado fogo nos currais e nas plantações de feijão e milho. O fogo serviu para alertar os homens da cidade, sendo que eles já estavam em posição nos principais pontos daqui”. (Maria do Socorro Fernandes, entrevista).
Não havia mais o que esperar. Ao primeiro grito de comando de Nelson Leite, trava-se pesado tiroteio.

Lampião, decerto, não esperava semelhante reação. A fantástica fuzilaria oriunda da Vila lhe faz recuar. De efeito, os tiros vindos da Rua da Proa tornam inviável uma entrada por aqueles lados.
Sem sucesso na primeira investida, o chefe de cangaço tenta confundir os defensores entrincheirados. Sob sua batuta, os bandoleiros passam a gritar, urrar como animais e a praguejar insultos e xingamentos aos defensores e suas famílias. A permear a gritaria, grossas baterias de tiros.

O rei-do-cangaço deseja tomar Belém. Tentará de todas as maneiras penetrar no vilarejo para vilipendiar suas casas e lhes extrair até o último ‘cobre’. Sem demora, ordena aos comandados a ‘abertura’ de uma linha de fogo pela lateral, com o fito de invadir a Vila pelo flanco oposto.

Nada, entretanto, parece gerar resultado prático. A posição privilegiada dos atiradores locados no telhado da igreja permite que tiros sejam disparados em todas as direções.

A resistência agiganta-se com estrondos de repercussão fantástica e de curiosa origem. Nelson Leite improvisara – no pouco tempo que dispôs antes da consecução do ataque - algumas “ronqueiras” e logo começou a fazer uso dos artefatos. Os estrondos causados pelas bombas caseiras são assustadores e surpreendentemente surtem efeito. Um simples improviso que, ao que tudo faz crer, parece realmente ser a chave para uma vitória. (1)

 Exemplos de "ronqueiras"

Em pouco, qualquer objeto metálico em formato cilíndrico - e vazado pelo menos em um dos lados - torna-se invólucro para manufatura dos pesados rojões. Joel Vieira, com dezoito anos à época do fato, registrou em depoimento:
“Os que estavam no alto da Igreja, começaram a atirar de ponto e também para dentro da igreja, causando um eco que parecia canhão. O Subdelegado também tinha improvisado umas ‘ronqueiras’, feitas com pólvora socada dentro de latas, e de quando em quando estourava uma. Já estava escuro, e aqueles tiros davam a impressão que havia um canhão com a gente”.
No alto da igreja, Luis Rodrigues - artilheiro mais aguerrido – resolve acrescentar estrondos adicionais aos estampidos das ‘ronqueiras’ improvisadas pelo Subdelegado. Dessa forma, com o intuito de causar impacto ainda maior, começa a atirar quase em paralelo à lateral da nave do prédio sagrado. Estrondos fantásticos, causados pelo eco do salão quase vazio, dão ainda mais ânimo aos outros defensores entrincheirados no teto da igreja. Decide-se que alguns deles, alternadamente, passarão a atirar também para dentro da nave.

A estratégia funciona. Os estrondos se multiplicam. De fato, para quem está do lado de fora, resta a impressão de que algum tipo de canhão está sendo utilizado. Os cangaceiros, atarantados, mantém posição de cautela e não avançam. O escuro da noite enevoada pela fumaça dos disparos os impedem de enxergar, na verdade, o tipo de “arma” adicional que ora se usa na defesa do arruado. O engodo paulatinamente funciona.

No calor da peleja, porém, passos apressados denunciam silhueta humana esgueirando-se próximo à igreja. A escuridão da noite não permite distingui-la com precisão. Da torre principal um defensor atira. O civil Antônio Correia é atingido. Confundiram-no com um cangaceiro. Correia morre pouco tempo depois em razão do profundo ferimento à altura do pulmão. É a única baixa durante o combate.

Os cangaceiros não desistem e tornam a investir contra o território inimigo por uma ruela lateral à igreja. Lampião brada ordens aos seus homens. Todos, contudo, parecem hesitar em razão dos estrondos que continuam a reverberar entre as casas da pequena Belém.
Do lado dos defensores, um voluntário prontifica-se para preparar novas ronqueiras, de forma ininterrupta, servindo-se como espécie de municiador.

Dominado pela ira, Lampião manda reacender o fogo que arde tênue na propriedade de João Gabriel. O vento rapidamente espalha as labaredas em espantosa velocidade. As chamas consomem vacas e bezerros cativos no cercado contíguo a casa. Urros de dor de animais engolidos pelas chamas desenham dantesco suplício. Poucos escapam ao bizarro holocausto.
A derradeira tentativa de conquista do povoado fracassa. Com pesar, os cangaceiros reconhecem que não conseguirão penetrar em Belém.

O desconhecimento dos pontos de defesa, o espocar das “ronqueiras”, o ribombar de tiros reverberados pelo salão da igreja, a configuração física da vila, o cansaço da longa marcha até ali. Tudo parece sugerir uma retirada. Lampião não demora em perceber o malogro da empreitada:
- Vamos sair para economizar munição! – grita furioso.
Ainda se ouvem tiros por mais um quarto de hora.

Aos poucos os cangaceiros se retiram do campo de luta. Disparos tornam-se esparsos. Ao compasso da retirada, a fuzilaria regride até reinar o mais absoluto silêncio. Lampião e seus homens deixam Belém em definitivo. É ainda Joel Vieira quem destaca:
“Eles tentaram muito, mas não conseguiram entrar. Antes das sete horas da noite, já tinham ido embora. No dia seguinte, o festejo foi grande, pois todos pensavam que ia morrer muita gente, mas não. Apenas um rapaz morreu vítima de uma ‘bala doida’ e caiu ali perto da Igreja. Tirando o incêndio na propriedade de João Gabriel, o prejuízo aqui foi pouco. Com pouco recurso, a gente botou Lampião prá correr!”.
E Lampião, de fato, jamais voltou a Uiraúna. Nos dias seguintes, um telegrama é enviado para as principais cidades do sertão do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Anunciava-se a vitória de um povo contra o poderoso rei do cangaço. O Intendente local assinou o comunicado:
Fomos atacados dia 15 famigerado Lampião. Resistimos cerrado fogo, bandoleiros recuaram. Vítima tiroteio Antônio”. (a) José Caboclo.
É a vitória inconteste de um sumário grupo de cidadãos contra quase quarenta cangaceiros. Uma vitória nascida da confiança de homens do povo; sertanejos comuns. Não houve – como aconteceu em Mossoró – um grande lapso de tempo para a preparação de uma defesa. Não houve reuniões; não se teve tempo para comprar armas modernas. Não havia sequer uma torre na igrejinha da cidade. Existia, apenas, a vontade de preservar os próprios lares.

Uiraúna se defendeu heroicamente, a exemplo da resistência mostrada pela pequena Nazaré, em Pernambuco, quatro anos antes. Uiraúna impediu a entrada dos cangaceiros de Lampião como faria a população sergipana de Capela, liderada pelo destemido Mano Rocha, três anos mais tarde.

A vitória do povo de Uiraúna foi obtida sem recursos, sem alarde e sem exploração midiática posterior. Vitória conseguida sem um ‘notável planejamento prévio’ e sem colóquios barulhentos. Vitória de um pequeno grupo de homens pegos de surpresa pelo maioral do cangaço. Vitória, porém, recheada de atos do mais real e verdadeiro heroísmo. Vitória, enfim, da inteligência sobre a força.

* Sérgio Augusto S. Dantas é autor dos livros “Lampião no Rio Grande do Norte – A História da Grande Jornada” (2005), “Antônio Silvino – O Cangaceiro, o Homem, o Mito” (2006) e “Lampião: Entre a Espada e a Lei” (2008).

NOTA:
(1) s.f. – Ronqueira: “Cano de ferro, preso a uma tora de madeira e cheio de pólvora, o qual produz grande detonação quando se lhe inflama a escorva”. (Aurélio). As ronqueiras já haviam sido largamente usadas em revoltas populares, como na guerra de Canudos. N do A.
 
IMAGEM: Alguns dos defensores de Uiraúna. Ao centro, de paletó escuro, Luiz Rodrigues. Na extrema direita, sentado, o Subdelegado Nelson Leite 

FONTES UTILIZADAS:

A União, edições de 17 e 18 de maio de 1927.

DANTAS, Sérgio Augusto de Souza. LAMPIÃO NO RIO GRANDE DO NORTE – A HISTÓRIA DA GRANDE JORNADA. Editora Cartgraf, Natal/RN. 2005. 452 pgs.

SOUZA, Tânia Maria de. UIRAÚNA NO ROTEIRO DE LAMPIÃO, in Revista Polígono, 1997, 158 pgs.

Entrevistas concedidas ao autor por Maria do Socorro Fernandes (2003), Joel Vieira da Silva (2001), Josefa Augusta Fernandes (2000) e Sinforoza Claudina de Galiza (2000).


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UM DOS PRIMEIROS PARCEIROS DE LAMPIÃO A EFÊMERA VIDA DE MEIA-NOITE


Por Joel Reis

Antônio Augusto (Feitosa ou Correia)[1], conhecido como Bagaço, natural de Olho d’Água, município de Piranhas – AL (atual Olho d’Água do Casado – AL)[2], era filho de Zé Bagaço, no qual herdou o apelido.

Quando tinha de 11 para 12 anos de idade, sua mãe, já viúva, pediu-lhe que fosse buscar legumes na roça. No caminho de volta, um rapaz o perguntou:

- Donde tu vem fedelho?

O menino se zangou com tratamento e respondeu:

- O qui você qué sabê? É da sua conta?

O rapaz também se irritou e lhe deu umas tapas. Antônio Bagaço jurou vingança:

- Isso num vai ficá assim, você vai me pagá.

Ao chegar em casa se armou com uma espingarda lazarina e disse:

- Mãe, vô ali.

Saiu à procura do rapaz, mas só o achou por volta das 19h em uma fazenda. Estava chovendo muito, aproximou-se sorrateiramente e atirou no rapaz. Certo que o tinha matado, fugiu e foi dormir em uma casa de farinha na Fazenda Olho d’Água, do coronel Zé Rodrigues. Pela manhã um vaqueiro o encontra deitado e todo molhado, o acorda e faz diversas perguntas, o menino acaba falando do ocorrido. O vaqueiro o leva até o Coronel e conta a história.

- Menino, vou te dar uma pisa.

Aperreado, o menino revidou:

- Coroné, pelo leite que o sinhô mamou, não dê n’eu. É mió me matá qui estou satisfeito.

Então, o coronel para saber se de fato ele tinha coragem, mandou o vaqueiro pegar uma enxada e uma pá, entregou os instrumentos para o menino:

- Toma, cave sua cova.

Quando o menino já havia cavado uns seis palmos de fundura:

- Está bom, agora se prepare prá morrer.
- Tô pronto prá morrê, coroné! Agora peço que diga a minha mãe que morri como um homi e não como covarde!
- Olha que infeliz, não vou te matar, não. Mas na próxima te mato.

Ao chegar em casa, avisou à sua mãe que ia embora para não ser preso. Sem demora, saiu pelo mundo... acabou chegando em Espírito Santo – PE (atual Inajá – PE)[3], onde foi acolhido pelo velho Terto Cordeiro (Tertulino Cordeiro - da família Marcos)[4]. Por volta de 1921, surgiram questões de intriga entre os Marcos e os Quirinos. Em vista disso, já com dezoito para dezenove anos de idade, os filhos de Antônio Quirino tentaram espancá-lo, na luta saiu ferido na cabeça. Depois disso, chegou em casa, disse ao velho Terto:

- Tio! (Não era, mas assim o chamava), vô m’imbora procurar os cangaceiros.

A princípio, Bagaço entrou no grupo de Antônio Porcino. Logo, conquistou notoriedade. Posteriormente, integrou-se ao grupo de Lampião, no qual foi denominado de Meia-Noite por ser de cor parda. O chefe cangaceiro nutria verdadeira admiração, em virtude que, Meia-Noite possuía extrema coragem, tendo triunfado ao seu lado em diversas ações[5].

Em agosto de 1924, Meia-Noite discutiu de maneira severa com os irmãos de Lampião; Vassoura (Livino) e Esperança (Antônio). Foram acusados de terem roubado seus Rs. 9:000$000 (9 contos de réis = 9.000 mil-réis)[6]. Lampião interveio na discussão, indenizando o valor que ele alegava ter sido subtraído por seus irmãos quando estava dormindo. Questão resolvida, o chefe cangaceiro o expulsa do bando e exige a entrega do armamento. Sem demora, Meia-Noite responde:

- Si no meio desta cabroêra tem homi, venha tomá.

Os cangaceiros presentes preferiram não tentar. Sem demora, Meia-Noite foi andando para trás com os olhos fixos nos velhos companheiros, em pouco tempo desaparece na caatinga.

No dia 18 de agosto de 1924[7], poucos dias do ocorrido, Meia-Noite foi visto atravessando o sítio Bandeira em direção ao sítio Tataíra[8], na companhia apenas de uma mulher[9]. Um olheiro avisou o coronel Zé Pereira (José Pereira Lima) que o famanaz cangaceiro se encontrava no sítio Tataíra. Com o comunicado, tratou imediatamente de organizar uma diligência, a fim de apanhar o bandoleiro.

Por volta das 21 horas, foi formado um grupo em Princesa – PB (atual Princesa Isabel – PB)[10], composto de quatro soldados da Força Pública e oito civis, marcharam 4 horas até o sítio Tataíra. Já era madrugada quando o cerco começa em duas casas, mas não o encontraram, batem na porta da terceira casa[11] (o bandoleiro estava em plena lua de mel):

- Quem é?

- É os meninos do coroné...

- Ah!... Eu não abro a minha porta prá descunhecidos... Zulmira não qué qui eu abra a porta. Ela tem medo...

- Venha dar um bocado d’água a gente...

- Num tem água, não.

- Que diabo de véia da fala fina...

Proferidas essas palavras, atento a conversa e com intuito de ganhar tempo para se equipar, o sicário enfurecido vocifera:

- Qui desaforo de seu Zé Pereira, mandá incomodá os homi essa hora, apôis vocês tão pegado cum Meia-Noite, nêgo nascido em meio de desgraça.

Sem demora, inicia o fogo contra a tropa... após uma hora de tiroteio e ofensas de ambas as partes, o cangaceiro brada:

- Canaias, o qui vocês quére, chega já. Cabra de barro num aguenta tempo.
- Vem aqui fóra, nêgo ladrão!
- Ladrão, é vocês, qui quére robá a roupa de minha muié, magote de peste!

Depois de algum tempo, o cangaceiro pede para o grupo cessar-fogo e que permitisse a saída de Zulmira, sua mulher, mas o pedido foi ignorado e o tiroteio se intensificou até amanhecer, apesar disso, o bandido volta a zombar:

- Rapaziada, vocês são de barro? Esse mangote de peste tá cum fome... Entre, venha tomá um cafezinho cum queijo de mantêga...
- O café qui nós qué é ti passá nas corda.

Em seguida, ouve-se uma voz cantada de dentro da casa sitiada:

"Si quizé sabê meu nome
Faça favô preguntá
Eu me chamo é Meia-Noite
Canário de bom lugá
Eu sou um carnêro fino
Do colo de minha Iaiá!
É Lampe, é Lampe, é Lampe
O Virgolino é Lampeão
É o dedo amolegando
Embolano pelo chão!”

No alvorecer, próximo ao local do tiroteio, as Forças comandadas pelo Tenente Manoel Benício, Tenente Francisco de Oliveira e o Sargento Clementino Furtado (Quelé) foram alertadas. Logo, reuniram o efetivo de 84 homens e rumaram para o campo de luta. Ao ouvir o clangor da corneta, berra furioso:

- Sustenta a ispingarda, canaias pôde, qui nêgo vai simbora.

Debaixo de uma saraivada de balas feriu alguns homens e também foi ferido[12], ainda assim, conseguiu escapar. A Força seguiu o rastro de sangue, porém o perdeu de vista.

Passaram-se seis dias, o Comissário de Polícia de Patos, Manoel Lopes Diniz e quatro companheiros encontraram Meia-Noite gravemente ferido. Mesmo assim, resistiu à prisão, disparando dois tiros de parabellum contra o grupo que, rapidamente revidou, e acabou matando o temido bandoleiro no auge dos seus 22 anos.

NOTAS:

[1] Nomes - Antônio Augusto Feitosa (ALMEIDA, 1926); Antônio Augusto Correia (MELLO, 2013); José Tiago (LIRA, 1990).
[2] Olho d’Água - povoado, subordinado ao município de Piranhas, posteriormente Distrito de Olho d’Água do Casado, pela Lei Estadual nº 1473, de 17 de setembro de 1949.
[3] Espírito Santo - atual Inajá – PE.
[4] Terto Cordeiro - Tertulino Cordeiro era da família Marcos.
[5] Diversas ações - As mais importantes foram: O assalto a residência de Joana Vieira de Siqueira Torres, a Baronesa de Água Branca (26.06.1922) e  o ataque à cidade de Sousa - PB (27.07.1924).
[6] Rs 9:000$000 (9 contos de réis ou 9.000 mil-réis) = 9.000.000 (9 milhões de réis) - Conversão para Real = R$ 250.000 (Duzentos e cinquenta mil reais).
[7] Érico Almeida (1926), afirma que foi no final do mês de setembro de 1924.
[8] Sítio Tataíra - nos limites do município de Princesa – PB com o de Triunfo – PE. (ALMEIDA, 1926).
[9] Mulher -  Alexandrina Vieira (Zumira). (DANTAS, 2018).
[10] Princesa – PB - atual Princesa Isabel - PB.
[11] Casa - Alguns autores/pesquisadores afirmam que era uma casa de farinha, outros que era uma casa velha.
[12] Ferido - em uma das pernas.

FONTES:

ALMEIDA, Érico de. Lampião: sua história. João Pessoa: Editora Universitária, 1996. [Fac-similar à edição de1926].

DANTAS, Sérgio Augusto de Souza. Lampião na Paraíba: notas para a história. Natal – RN: Polyprint, 2018.

LIRA, João Gomes de. Lampião: memórias de um soldado de volante. Recife: FUNDARPE, 1990.

MACIEL, Frederico Bezerra. Lampião, seu tempo e seu reinado: II. A guerra de gerrilhas (fase de vinditas). Petrópolis - RJ: Vozes, 1985.

MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do Sol: violência e banditismo no nordeste do Brasil. 5. ed. São Paulo: A Girafa. 2011.


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NA TORRE DOS SINOS

Clerisvaldo B. Chagas, 29 de junho de 2020
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.334

 Confirmamos para uma pessoa interessada que o maior cartão de visitas de Santana do Ipanema, sem dúvida alguma, continua sendo a Matriz de Senhora Santana. A sua belíssima arquitetura resultante da segunda reforma dos anos 40, obedece às principais linhas da capela de origem de 1787. Santana ainda não é oficialmente uma cidade turística, mas a atração principal, no caso, seria o mirante do campanário onde abriga três ou quatro sinos perto dos 35 metros de torre. Logo acima dos sinos, está a engrenagem dos relógios gigantes das quatro faces do abrigo. Logo em seguida vem uma plataforma estreita e externa por onde se alcança a cruz no topo do edifício por uma escada de metal.
UM DOS ÂNGULOS VISTOS DA TORRE. (FOTO: LIVRO 230, PARTE NOSTALGIA/DOMÍNIO PÚBLICO). 
Para se chegar à torre dos sinos, galga-se cerca de trinta degraus de cimento até o chamado “coro da igreja”, um bom espaço onde o coral cantava ao som vivo de um órgão, tocado por dona Maroquita, irmã do padre Bulhões, o reformador da igreja. Daí para a torre dos Sinos, teríamos que subir uma escadaria de madeira. A segurança era pouca e, no campanário com as quatro bocas em forma de portas abertas sem uma única barra de ferro como proteção. Para se chegar até ali não era tão difícil. Difícil mesmo era não se encolher no local ao apreciar a paisagem nas quatro direções dos pontos cardeais. Estamos falando para quem tem medo de altura, como nós. Mas havia quem subisse para consertar lâmpadas na cruz sem nenhum equipamento, Gente de nervos de aço que ficava de braços abertos na cruz, cuja camisa tremulava igual a bandeira nacional.
Quem teria feito aquela escadaria de madeira? Não existe registros sobre a origens dos sinos, tocados pelos ritmos mágicos do zelador e sineiro “Major”. A paisagem é plena a partir do lado sul da torre, que se espraia para a região da serra Aguda. O lado Leste foca nos telhados do comércio e parte da Avenida Coronel Lucena (foto abaixo). O major, descendente de escravos, era o zelador da igreja. Idade avançada, muito calmo, fala mansa, desfilava pela nave, descalço e nunca nos recusou à subida até os sinos que ele tocava com a magia das suas mãos. Alma boa que deve estar bem privilegiada no céu. Muito se tem a dizer sobre a Matriz e que não cabe em apenas numa crônica.


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