Por José Cícero
Antônio Vilela, José
Cícero, Ivanildo Silveira e Manoel Severo
o Cariri Cangaço Piranhas 2014.
A tarde estava
cinzenta naquela Aurora pacata e provinciana de 1928. Uma enorme sensação de
tranqüilidade cobria os semblantes dos viajantes, assim como o coração e o
pensamento da multidão que se aglomerava na pedra da estação. Uma cena comum a
todas as cidades interioranas atendidas pelo velho trem da Rede Ferroviária
Cearense(RVC). Nuvens cor de chumbo em formação pareciam prenunciar no céu
daquela Aurora antiga e calma, algo diferente prestes a ocorrer: uma tragédia.
Naquela tardezinha quase insossa de sábado, dia 4 de agosto de 1928 quando muitos já se esqueciam dos episódios um ano antes relacionado à presença do rei do cangaço na terrinha; o velho aparelho do telégrafo da RVC de novo estava prestes a receber no código morse um telegrama diferente. Um comunicado estranho; digamos que chave, para todos os desdobramentos do acontecimento dramático que se seguira ao fato: "Antonio, algodão hoje sobe!". Uma missiva quase enigmática considerando que o algodão " o ouro branco d"Aurora faria sempre o sentido contrário, ou seja, descia. E o seu preço no mercado há muito era de todos conhecido.
Porém, aquela mensagem codificada não seria de todos estranha. Havia um destino e um desiderato certo: surpreender o coronel. Dizia muito mais do que ali estava escrito de modo lacônico...A estação de Aurora estava repleta de gente. Um acontecimento que se tornara comum deste a sua inauguração oito anos antes em 7 de setembro de 1920.
E a cronologia do momento seguinte, provaria depois para todos que era um crime. Um atentado violento à ordem e a vida em nome da vingança e da intolerância. Uma intriga passada à limpo, expressa na força da violência e da ignorância em detrimento da razão e da justiça. Sinais de uma época densamente marcada pelo poder de fogo do coronelismo oligárquico, engendrado pelos mais temíveis e truculentos líderes políticos que o Cariri cearense já experimentou. Um período onde a lei no mais das vezes era a do mais forte e a justiça quase sempre era feita pelas próprias mãos, em geral, dos poderosos.
Naquela tardezinha quase insossa de sábado, dia 4 de agosto de 1928 quando muitos já se esqueciam dos episódios um ano antes relacionado à presença do rei do cangaço na terrinha; o velho aparelho do telégrafo da RVC de novo estava prestes a receber no código morse um telegrama diferente. Um comunicado estranho; digamos que chave, para todos os desdobramentos do acontecimento dramático que se seguira ao fato: "Antonio, algodão hoje sobe!". Uma missiva quase enigmática considerando que o algodão " o ouro branco d"Aurora faria sempre o sentido contrário, ou seja, descia. E o seu preço no mercado há muito era de todos conhecido.
Porém, aquela mensagem codificada não seria de todos estranha. Havia um destino e um desiderato certo: surpreender o coronel. Dizia muito mais do que ali estava escrito de modo lacônico...A estação de Aurora estava repleta de gente. Um acontecimento que se tornara comum deste a sua inauguração oito anos antes em 7 de setembro de 1920.
E a cronologia do momento seguinte, provaria depois para todos que era um crime. Um atentado violento à ordem e a vida em nome da vingança e da intolerância. Uma intriga passada à limpo, expressa na força da violência e da ignorância em detrimento da razão e da justiça. Sinais de uma época densamente marcada pelo poder de fogo do coronelismo oligárquico, engendrado pelos mais temíveis e truculentos líderes políticos que o Cariri cearense já experimentou. Um período onde a lei no mais das vezes era a do mais forte e a justiça quase sempre era feita pelas próprias mãos, em geral, dos poderosos.
Coronel Isaías Arruda
Naquele sábado, de tarde escura de agosto, a estação de Aurora não tardaria a
ser palco de um episódio que marcaria à história do Cariri e do Ceará para
sempre, vez que envolveria, aquele que foi certamente o mais famoso e temível
chefe político da região: o coronel Isaias Arruda. Filho do lugar, ex-delegado,
agora prefeito pela força da vizinha Missão Velha. De quebra, o maior dos
coiteiros de Lampião no interior cearense. Um autêntico mantenedor de jagunços
e hábil negociador político junto aos grandes da capital.
O relógio do prédio apontava 14h25min quando, finalmente, todos puderam escutar
o apito estridente da máquina a ecoar no horizonte. Apenas Sabina entretida
demais com o seu café não se deu conta do acontecido. Todos, de repente
voltaram suas atenções na direção do corte-grande lá para as bandas do alto da
cruz, do sito Frade. O trem da Fortaleza vinha ligeiro beirando o rio Salgado.
Exímios chapeados transportavam com pressa e celeridade grandes caixotes,
pacotes e outros fardos de mercadorias. Uns descian para o armazém da RVC
outros subian para os vagões do trem com destino ao Crato. Animais, peças de
madeira, artesanato, aguardente, rapadura, oiticica, panelas de barro. O trem
acelerava a curiosidade, tanto quanto a economia daquela terra.
Mas de repente o som de um tiro seco ribombeou no ar. Quebrando a normalidade
natural daquele acontecimento diário. Em seguida vários outros disparos puderam
ser ouvidos no interior do segundo vagão da primeira classe. Talvez sete ou
oito no total... Até hoje ninguém sabe ao certo. Um silêncio quase sepulcral se
abateu na plataforma por alguns instantes que pareceram eternos. Somente o
ronco da locomotiva estacionada deforfronte a caixa d"água. Em seguida uma
correria...
Vozes diziam tratar-se de uma discussão. Três homens saíram atracados e em
seguida correram no sentido contrário do vagão. Uma disparada em direção do
armazém e depois para o beco da antiga rua que dava para o cemitério. Um quarto
homem um tanto elegante, bem tratado, gestos aparentemente finos surgiu do
segundo vagão da primeira classe. Vestindo impecavelmente um linho branco, ele
pisou de modo esquisito e desaprumado o piso, a pedra da estação. Alguns passos
apenas e cambaleando fitou a multidão como quem quisesse dizer algo. Não foi
possível. Sangrando e com a mão direita colada ao peito chamava baixinho pelo
primo. O linho branco do seu terno agora começava a se tingir de vermelho. Seus
sapatos de cor marrom e bem polidos contrastavam com o vermelho escuro do seu
próprio sangue formando porças na plataforma. Era o coronel Isaias Arruda,
chefe político, prefeito da Missão Velha. Homem afamado em toda região e na
capital do estado. Devagar caiu ao chão da plataforma ainda com arma junta ao
cinto da calça. Não teve tempo de usá-la.
Alguém saindo de dentro do vagão posterior se aproxima dele e forra o chão da
pedra com um jornal que lia; edição do dia 3. Seu braço esquerdo e parte
superior do tórax estavam em frangalhos. Ferimentos gravíssimos provocados
pelos sete balanços com que fora atingido.O coronel ferido seriamente
pronunciava baixinho como que cansado:
- Os irmãos paulinos me acertaram! Mas como é que nem o Viana nem ninguém me
avisou que meus inimigos estavam aqui?! Bando de covardes...
E de chofre emendou:
- alguém me chame o farmacêutico! Foram os Paulinos, eles me acertaram... Bando
de covardes!
Outros mais ousados e corajosos aos poucos foram se aproximando da vítima que
gemia deitada ao solo da pedra sobre as folhas do jornal "O Ceará".
Enquanto isso, um pouco afastado da estação José Furtado(Nequinho de Milica)
primo da vítima saíra em perseguição(ou fugindo) dos irmãos paulinos: Antonio e
Francisco, responsáveis pelo atentado.
Levado para a residência de Augusto Jucá um antigo amigo na rua grande, Isaias
foi socorrido, inicialmente por um farmacêutico - o único que existia na
cidade. No dia seguinte dois médicos vindo de trole pela linha da RVC: Antenor
Cavalcante e Sérgio Banhos atenderam o coronel. Porém, diante das gravidades
dos ferimentos não tiveram como salvá-lo. Sendo que no dia 8 de abril uma
quarta-feira às 6h da manhã, quatro dias após ser alvejado, Isaias Arruda
faleceu como que por capricho do destino na terra em que nascera.
Rumores apontaram ter sido o assassinato uma vingança de Lampião pela traição
do coronel um ano antes, durante a célebre tentativa de envenenamento do bando
lampiônico e o histórico cerco de fogo do sítio Ipueiras, propriedade de Arruda
em Aurora em cujo local Virgulino se arranchara por diversas vezes. Ocasião em
que o rei do cangaço fugia das volantes após o fracasso da invasão de Mossoró,
arquitetada sob as estratégias de Massilon Leite e financiada pelo próprio
Isaias.
Mas o certo, segundo se provaria depois foi que os paulinos vingaram o
assassinato do irmão mais velho João, morto numa emboscada no serrote
d"Aurora pelos jagunços de Arruda no ano anterior.
Terminava ali de modo trágico, na estação ferroviária de Aurora a verdadeira
saga de um dos mais temíveis e respeitados coronéis do Cariri - Isaias Arruda.
Assim como sua rixa ferrenha contra os irmãos paulinos da Aurora.
Prof. José Cícero
Escritor, Pesquisador e Poeta.
Secretário de Cultura de Aurora
TEXTO NA ÍNTEGRA: jcaurora.blogspot.com
http://blogodmendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário