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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Vó Marica do Tipi Parte Final

Por: Vicente Landim Macedo


Fazenda Tipi, em Aurora

Em julho de 1909, Dom Manuel Antônio de Oliveira Lopes, Bispo Coadjutor de Fortaleza, em visita pastoral ao sul do Ceará, ficou pasmo e indignado com os desmandos que ocorriam em Aurora.  Com a autoridade moral e religiosa que lhe era peculiar, Dom Manuel Antônio ponderou aos novos chefes políticos de Aurora que os homens armados deveriam desocupar a cidade, deixando seus habitantes em paz. No que foi imediatamente atendido. Após a destituição de todas as autoridades de Aurora, assumiram tais funções parentas, amigos e correligionários indicados por vó Marica. Coronel Cândido Ribeiro Campos, como Intendente Municipal; José Francisco Sales Landim, irmão de vó Marica, como Primeiro Suplente de Juiz; Antônio Landim de Macêdo, seu filho, foi agraciado com a função de Segundo Suplente de Juiz, sendo que, em 1918, exerceu o cargo de Primeiro Suplente de Substituto do Juiz Federal e, de 1919 a 1921, o de Prefeito Municipal.

A Delegacia de Polícia foi confiada a João Cândido Ribeiro, filho do Coronel Cândido. De 1914 a 1918, administrou Aurora o Coronel Manuel Teixeira Leite, sogro de Antônio Landim de Macêdo. O Coronel Cândido Ribeiro Campos voltou a ocupar a administração municipal no período de 1921 a 1926. O filho mais velho de vó Marica, Raimundo Antônio de Macêdo (Mundoca) foi nomeado Delegado de Polícia de Aurora em 1921. Como podemos observar, o nepotismo vigente atualmente na administração pública brasileira, já existia em Aurora no início do século XX, como em todo o Brasil.
      
Dom Manuel Antônio de Oliveira Lopes

Sobre o poderio de vó Marica no município de Aurora, transcrevo o que diz Joaryvar Macêdo, no seu livro Império do Bacamarte, pág. 104:  “Cessada a questão de 8 e entronizado o Coronel Cândido do Pavão no poder, iniciou-se, em Aurora, o período oligárquico dos Ribeiros Campos, conhecidos como os Cândidos, e dos Macêdos do Tipi, liderados por Marica Macêdo. Saindo ela do anonimato, tornou-se figura de prol no município. Investida de poderio e enroupada das características do coronelismo, firmou-se legítima mandona, exercendo, inquestionavelmente, até 1924, ano do seu passamento, profunda influência na política municipal, decidindo, lado a lado do Coronel Cândido, para quem sua palavra era lei.” 

Lampião no Tipi. A fama da coragem e bravura de vó Marica corria além dos limites de Aurora, espalhando-se pelo Cariri e adjacências. Em uma das incursões pelo Município de Aurora, Lampião mandou avisar a minha avó que gostaria de visitá-la.  Ela respondeu afirmativamente, desde que ele viesse em paz e não praticasse nenhum ato contra sua gente no Tipi. Caso contrário, ele, Lampião, seria recebido à bala.  Ele passou pelo Tipi, visitou vó Marica e foi embora em paz.

        

Aquarela Aurora Antiga por Enoque

Das histórias sobre Lampião que ouvi de meu pai, minha mãe, parentes e outras pessoas que residiam no Tipi, guardei na minha mente duas relativas à passagem de Lampião pela nossa região. A primeira a que acabei de mencionar e a outra, já após minha avó ter falecido. Essa segunda passagem de Lampião pelo Tipi ocorreu da seguinte maneira.  Lampião e seu grupo, em torno de trinta pessoas, chegaram ao Sítio Jerimum, que pertencera a vó Marica, a mais ou menos 1 km distante da casa de meus pais, ali pararam e o chefe mandou chamar meu pai.

Meu pai atendeu ao chamado e, em companhia de seu homem de confiança, Pedro Ribeiro, foi ao encontro de Lampião. Chegando ao Sítio Jerimum, papai foi recebido por um  homem, o Corisco, que, quando viu papai, perguntou quem ele era, papai respondeu ser Silvino Macêdo, então ele disse: “o chefe quer falar com o senhor.” E imediatamente perguntou a papai.  “Quem é este que está em sua companhia?” Papai respondeu ser uma pessoa de sua confiança.

 José Cícero, Adailton Macedo e Manoel Severo no Cariri Cangaço 2013 em Aurora: Marica Macedo, com Vicente Landim de Macedo

Corisco levou papai até Lampião. Os dois se cumprimentaram e Lampião falou para papai que precisava passar uns oito ou dez dias em um lugar reservado, uma vez que necessitava reformar seus bornais e uniformes e que, durante esses dias, lhes fosse fornecida alimentação. Papai, então lhe perguntou quem iria arcar com tais despesas.  Lampião respondeu que pagaria tudo. Papai confiou no que ele estava dizendo e disse-lhe que iria mandar uma pessoa, também de sua confiança, para levá-lo juntamente com seu grupo para  um local reservado, bem distante da estrada.

Ao voltar para casa, papai mandou chamar João Inácio, seu vizinho, amigo e compadre, contou-lhe o ocorrido e solicitou que ele conduzisse Lampião e seu grupo para a represa do açude de sua propriedade, que ficava a 1 km da estrada, lugar de difícil acesso, pois era composto por um juremal. Neste local, Lampião e seu grupo permaneceram durante 10 dias, onde reformaram seus bornais e uniformes. Eles possuíam máquinas de costurar e o material necessário à execução das tarefas.

Diariamente, João Inácio levava para eles carne, arroz, feijão e demais mantimentos necessários ao sustento deles. Terminado o período previsto, Lampião mandou chamar papai e lhe reembolsou todos os gastos ocorridos, indo embora e deixando todos em paz. O parente e amigo Joaryvar Macêdo na página 232 do seu livro Império do Bacamarte narra uma passagem de Lampião pelo Tipi, também após o falecimento de vó Marica, isto é, após 1924. Não sei se esta passagem é a mesma que acabei de lhes falar.

Pedro Luiz Camelo, Vicente Landim Macedo e Manoel Severo, em Juazeiro do Norte 
Acredito que não. Uma vez que Joaryvar nessa sua narração fala de meus tios Mundoca e Joaquim Furtado de Macêdo, não fazendo nenhuma menção ao meu pai, Silvino, que foi quem atendeu a Lampião na passagem pelo Tipi de que lhes falei. Imagino que Lampião tenha passado outras vezes pelo Tipi, já que Aurora ficava num dos caminhos que ia do Cariri para Lavras da Mangabeira e para a Paraíba.

Papai herdou a coragem e disposição de sua mãe, vó Marica, não temendo Lampião que amedrontava muitos coronéis e proprietários, mas que contava também com a amizade de muitos outros, entre eles, parentes de meus avós, como os coronéis Antônio Joaquim de Santana, de Missão Velha, e Raimundo Macêdo (Joca do Brejão), de Barbalha.

Vó Marica transmitiu para seus filhos e vários descendentes, principalmente para as mulheres, aquele temperamento encorajador, destemido, decisivo, justiceiro e muitas outras qualidades que lhe eram peculiares, inclusive traços fisionômicos.


Morte de vó Marica. Falei que vó Marica foi ouvida por Deus em sua solicitação de não passar outra vez pela grande dor de assistir à morte de um filho. Realmente, no dia 6 de janeiro de 1924, vó Marica foi a Aurora visitar sua única filha mulher, Joaninha, que estava muito doente. Lá chegando, encontrou a filha acamada e cuidando dela a sua neta Soledade, filha primogênita da tia Joaninha, e a senhora dona Maria. À noitinha, minha avó tomou uma xícara de café, acendeu o cachimbo, sentou-se em uma cadeira ao lado da filha e disse para a neta Soledade e para dona Maria que fossem dormir, pois ela ficaria cuidando da doente.

As duas, como estavam muito cansadas, foram para o quarto ao lado. Poucos minutos depois ouviram um barulho no quarto da doente. Correram para lá e encontraram vó Marica no chão, chamaram imediatamente o médico Dr. José Dias e o padre Vicente Augusto Bezerra, vigário de Aurora, que  constataram  que vó Marica, com 59 anos, estava morta. A causa-mortis atestada foi enfarte do miocárdio. Anos depois, ao exumarem os seus ossos para os recolherem na Capela da família Macêdo, construída pelos filhos no cemitério da cidade, verificou-se que a sua chapa dentária estava na garganta, ficando a dúvida, se vó Marica morrera, realmente, de enfarte ou de asfixia.
        

Vicente Landim de Macedo e João de Zeca na fazenda de Marica Macedo, Tipi
Caravana Cariri Cangaço 2013 no Tipi em Aurora

Tia Joaninha faleceu dois dias depois. Portanto vó Marica não viu a filha falecer. Nós da família Macêdo nos orgulhamos por termos como ascendente essa mulher com as características do juazeiro, árvore própria do sertão cearense, resistente às intempéries da natureza.

Sobre o assunto que acabo de expor há uma vasta bibliografia, entre as quais menciono: Joaryvar Macêdo – Império do Bacamarte; Otacílio Anselmo – Padre Cícero, mito e realidade; Edmar Morél – Padre Cícero, o Santo de Juazeiro; Amarílio Gonçalves Tavares – Aurora, História e Folclore; Rachel de Queiroz e Heloísa Buarque de Holanda - num opúsculo sobre Matriarcas do Ceará e, a obra Marica Macêdo, a brava sertaneja de Aurora, de minha autoria. 

Aurora, 20 de setembro de 2013.
Vicente Landim de Macêdo
Conferência do Cariri Cangaço 2013

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É amanhã (09/01/14) - Lançamento de 2 livros na Biblioteca Ney Pontes Duarte Centro - Mossoró - RN

 Influência do Sagrado na Poesia de Antonio Francisco.


Enviado pelo poeta, escritor e pesquisador do cangaço Kydelmir Dantas

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OS CABRAS DE LAMPIÃO (Ranulfo Prata) - Parte IV

Fragmento de capítulo de livro - transcrito por Luiz Alberto da obra: Lampião /Ranulfo Prata/Traço Editora
 Fotos de cangaceiros  

Antonio da Ingracia

Outra figura de relevo. Era natural da Feira do Pau, onde praticou o primeiro crime, assassinando João Carpina. Antes de ingressar na malta já possuía grande acervo de crimes, inclusive o assassínio, em plena feira de Chorrochó, de dois irmãos do coronel José Ribeiro da Jacoca, ex-deputado estadual em Sergipe.

Perseguido, buscou a proteção de Gregório da Pedra, famoso coiteiro do município de Belém, Pernambuco. Ao entrar Lampião na Bahia juntou-se lhe em companhia de dois irmãos, Cyrillo e Luiz, e de um sobrinho, Antonio Sionaro. Tio e sobrinho, porém não tiveram vida longa.

Certa noite, entre Chorrochó e Riacho da Várzea, chocou-se com o pequeno grupo chefiado por um tal Hermógenes. No desenrolar do tiroteio, na noite sem claridade, um dos cabras de Hermógenes aproxima-se dele, Antonio, que o chama, baixinho, dizendo-se amigo. Na negrura da noite, espichado no chão, de punhal erguido, aguarda, como um jararacussú, que o inimigo se avizinhe para dar-lhe o bote fatal. Não tardou que o outro, pensando que quem o chamava era, de fato, um dos seus, se chegasse. Antonio salta-lhe em cima.

Trava-se um feroz corpo a corpo dentro da escuridade da noite de breu. E apunhalam-se mutuamente, rolando cada um para o seu lado. Ali estertoram e morrem, com os corpos enrolados na mortalha da treva espessa.

O seu esqueleto enfeita o hospital da Força Pública de Jeremoabo.

(Texto transcrito da obra: LAMPIÃO/Ranulfo Prata/Traço Editora)

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