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sábado, 3 de março de 2012

O SERTÃO DE MINHA TERRA

Por: Alcino Alves Costa

Deus deu-me a ventura de ter nascido na região mais distante e desconhecida do Sertão do São Francisco, num pequenino lugarejo de caboclos. O tempo andejou pelos caminhos das eras e aquela humílima povoação se tornou na cidade de Poço Redondo.
Vivi a minha meninice, adolescência e juventude admirando e amando a imensa caatinga que se estendia pelos horizontes infindos; emoldurada pelos rios e riachos, charcos e lagoas, serras e vales, prados e campinas. Caatinga dos bichos e animais. Caatinga que tinha a proteção do descampado azul do infinito e das nuvens claras do meu sertão, o sertão de minha terra.

O sertão de Poço Redondo
Sertão do riacho Jacaré, com sua areia fofa e seus poços d`água, onde a meninada tomava banho no amanhecer dos dias sertanejos e o gado vinha beber e sestar nas sombras aconchegantes de suas caibreiras.
Sertão do gado pé duro e da orelha cabeluda, onde o vaqueiro campeava com coragem e destreza a manada bravia, criada quase selvagem, enfiada nos cafundós da terra sertaneja de Poço Redondo.
Sertão onde o vaqueiro, o cavalo e o boi brabo e mandingueiro protagonizavam a notável medição de forças que marcaram o apogeu da vida pastoril dos campos sertanejos do São Francisco.
Sertão do gado brabo de Mané do Brejinho e da Cuiabá.
Sertão de Pedrinho de Eustáquio, Daniel, Zé Leobino, Miguel Quita, Tião de Sinhá, Abdias, Rivaldo de Janjão e Elias, os maiores vaqueiros da história campesina do Sertão do São Francisco.
Sertão daqueles tempos em que, quando no morrer do dia, ouvia-se o aboio dolente e cheio de ternura do vaqueiro tangendo a vacaria de leite para o curral.
Sertão do mugir dos rebanhos bovinos nas festas de apartação, ajuntamento e vaquejadas.
Sertão do carro de boi com seus cocões azeitados e cantando fino pelas estradas e trilhas do mundo caipira.
Sertão das festas e leilões; do fole, do pandeiro e do ganzá; do reisado e da cantiga de roda; do “entrudo”, das novenas e dos louvores aos santos e imagens.
Sertão de minha terra.
Quanta saudade eu sinto do reboar da passarada; do chuá-chuá das águas barrentas que abarrotavam os riachos e lagoas nos tempos das trovoadas; do colorido mavioso das borboletas nas malhadas das fazendas e nas tardes sertanejas daqueles tempos; do cheiro agreste que exalava do colo generoso de nossa mãe natureza; do perfume inebriante das flores campestres que enchiam de estonteante beleza os campos sertanejos; do verdejante capim nativo se espalhando como se fosse um tapete mágico e verde pelos campos e serranias da terra cabocla do sertão.
Será que você, homem sertanejo, você que em sua juventude morou neste pedaço de Sergipe que se convencionou em chamá-lo de Sertão do São Francisco; você que pode ter vivido a vida e a cultura enraizada e herdada de nossos antepassados, aqueles pioneiros de nosso mundo caboclo; mas que, por força do destino, passou a residir na grande cidade, não sente uma dor no peito ao se recordar dos idos de um sertão e de uma caatinga que nos tempos atuais existe apenas em nosso pensamento e em nossas recordações? Sente, eu sei que de vez em quando o seu peito fica dilacerado de tanta saudade do rincão em que você nasceu e viveu por alguns anos de sua existência.
Mesmo eu tendo o privilégio e a felicidade de viver neste chão amado, verdadeiro paraíso de minha vida, eu sinto a mesma dor e saudade do homem sertanejo que vive na cidade grande. A minha angústia e tristeza é por saber que nunca mais verei o sertão de minha meninice. Aquele sertão que vivi por tantos e felizes anos nos tempos passados da aurora sublime e serena de minha infância.
Eu bem sei que o sertão de minhas origens não mais existe. Foi tragado pela voracidade da sucessão dos anos e vive somente no mundo fantasioso de minha imaginação – e isto é causa de enorme tristeza e grande tormento que me faz padecer profundamente.
Eu bem sei, meu sertão e minha caatinga amada, eu bem sei que vocês perderam aquela primitiva rusticidade que tanto os caracterizava e que enchia as paragens caboclas de tanto encanto e fascínio. Hoje o sertão está descarecterizado e a caatinga foi dizimada pelo vendaval da insensibilidade do homem. É certo e verdadeiro que o sertão e a caatinga não são nem uma tênue sombra de seu passado glorioso. Foram devassados pela civilização que adentrou o seu interior, desmatando a mataria, derrubando suas árvores, queimando sua terra, numa agressão sem limites ao nosso chão caboclo.       
No passado não era assim. Via-se de longe em longe um lugarejo, uma povoação, um pequeno núcleo habitacional. Aqui e acolá, lá longe, na imensidão da caatinga, uma fazenda encravada na distância de um e outro povoado.
O caminheiro e os mascates que perambulavam pelas lonjuras dos sertões atravessavam grandes e penosas distâncias sem encontrar uma habitação, uma pousada onde pudesse se hospedar e receber a necessária hospitalidade tão peculiar ao camponês de boa índole e amigo.
Hoje, o que se constata é que o sertão e a caatinga são espectros tristes e solitários de um mundo sem amor.
É uma pena!
Publicado no dia 3 de janeiro de 2007, no JORNAL DA CIDADE, Aracaju – Sergipe.
Publicado nos dias 26 de janeiro a 03 de fevereiro de 2007, no jornal TRIBUNA DO POVO, de Mundo Novo – Mato Grosso do Sul.
Alcino Alves Costa
O Caipira de Poço Redondo – SE


NUVENS BRANCAS DO SERTÃO
Autores: Alcino Alves Costa e Dino Franco
Interpretes: Dino Franco e Fandangueiro

Nuvens lindas que passeiam
Lá longe na imensidão,
Parece um bando de garças
Voando no chapadão
Nuvens brancas que andejam
Em eterna procissão
O vento seu companheiro
Nuvens brancas do sertão.

Nos tempos das trovoadas,
Lá no céu raio e trovão.
As nuvens ficam pesadas
A chuva que cai no chão.
O homem prepara a terra,
Planta o milho e o feijão.
Benditas sejam essas nuvens,
Nuvens brancas do sertão.

A roça já foi plantada,
Já tá gordo o alazão,
O gado vem pro curral,
Vaca, boi e barbatão.
O vaqueiro na porteira,
Cantando bela canção,
No céu as nuvens caminham
Nuvens brancas do sertão.

Chega à safra, que ventura,
Chega à festa de São João,
Chega o fole e a morena,
Vai ter baile no salão,
A chuva é sangue da terra,
Que sustenta nosso irmão
A chuva que vem das nuvens,
Nuvens brancas do sertão.

Música gravada em forma de cateretê pela dupla, Dino Franco e Fandangueiro

Enviado pelo caipira de Poço Redondo
Alcino Alves Costa

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