Por Antônio Corrêa Sobrinho
O ARTIGO
abaixo, do Jornal de Recife (PE), publicado em 1925, jornal que, num momento
raro, deixa de lado o hábito, por sinal, da imprensa em geral, de, sem quase
nunca confirmar, atribuir a Lampião ou aos seus asseclas a autoria de crimes praticados
no interior nordestino, para informar à sociedade o quanto o sertão
pernambucano vivia infestado de bandoleiros, além da presença do já célebre, em
1925, Lampião, nomeando e mencionando, até, as regiões de atuação dos grupos
cangaceiros. E assim procedeu o Jornal de Recife, penso eu, para tornar mais
contundente sua crítica ao Estado, de ineficiente no combate à criminalidade no
interior, postura própria de órgão de comunicação situado na oposição ao
governo, que penso ter sido o caso.
É verdade que
Lampião foi contumaz na prática delituosa, da mesma forma que é vero que
anônimos criminosos foram chamados de Lampião pela imprensa.
PERNAMBUCO
FEUDAL
O
cangaceirismo é um problema que não foi ainda suficientemente levado a sério,
suficientemente combatido pelos poderes públicos do Estado.
No interior do
Estado campeia livremente, impunemente, sem coação de nenhuma espécie o
cangaceirismo que tudo leva de vencida, que aniquila, sempre vitorioso, sempre
feliz.
Não conhecemos
para um povo que se diz civilizado, manchas mais indeléveis, atestados mais
frisantes de sua barbaria, de sua decadência moral, do que essas que são dadas
pelos bandoleiros.
Em estado com
polícia, tribunais, justiça, governo, enfim, todos os órgãos que constituem a
civilização, um bando de homens armados, sob a direção de um bandoleiro se
lança a uma empresa trágica, horrorosa de destruir, de incendiar, de matar, de
roubar e nada sucede a esses facínoras.
Vivem do crime
e para o crime, como se vivessem para o desempenho de uma utilíssima profissão.
Vivem do mal e
para o mal, como se vivessem do bem.
Vivem da dor e
para a dor, como se vivessem para o prazer.
E os poderes
constituídos, esses poderes, a quem o cidadão entrega confiante a guarda, a
defesa de tudo que lhe pertence, assistem impassíveis, de braços cruzados o
desenrolar de todas as cenas de vandalismo no interior do Estado e não dá um
passo decisivo, enérgico, bastante firme para exterminar de vez, radicalmente
essa onda de bandidos que vai conduzindo uma grande faixa de território
brasileiro, às tristíssimas condições de um feudo, de uma senzala.
Documentos,
algo, as nossas asserções.
O
cangaceirismo está aumentando consideravelmente no interior do Estado.
Afora os
grupos de Sipaubas e Pequenos há os dos Marianos, dos Horácios e dos Sabinos.
Os Pequenos
assentaram o seu quartel general no Riacho dos Navios, em Flores; Os Horácios
naquele mesmo município onde assassinaram ultimamente um digno cavalheiro,
incendiando depois as casas e os cercados da pobre vítima; os Sabinos
predominam no município de Belmonte, e os Sipaubas e Marianos em Vila Bela.
O grupo dos
Sipaubas atacou no dia 30 de julho alguns almocreves, no lugar denominado
Macambice do município acima citado, roubando vários fardos de algodão.
A fazenda que foi
roubada vinha do município de Rio Branco e se destinava a Salgueiro e Jardim,
como se sabe, localizados, respectivamente, em nosso estado e no Ceará.
O grupo dos
Marianos é chefiado pelos irmãos Joaquim e João Mariano.
É terrível. É
doloroso.
Em um estado
civilizado viver-se sob o regime do trabalho, das armas, como se se vivesse em
um feudo cercado de barões feudais, onde a vida não era mais do que a
escravidão, a humilhação, a miséria.
Mata-se,
rouba-se, incendeia-se no interior de Pernambuco, como se tudo isso fosse a
coisa mais simples, mais natural da vida.
Até quando
esse viver de horrores, de miséria, de degradação?
Jornal de
Recife – 29.08.1925
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