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terça-feira, 25 de dezembro de 2012

O SEU MELHOR PRESENTE (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
 Rangel Alves da Costa

O SEU MELHOR PRESENTE 


De repente toca a campainha e na porta estará uma belíssima cesta de natal: docinhos, chocolates, geleias, panetones, brioches, além de vinhos, outras bebidas importadas, flores e uma reluzente joia. E um cartão com os seguintes dizeres: Que este presente reflita bem a pessoa que você é! 

De outro modo, simplesmente chegam à sua casa para uma visita e levam à mão um embrulho requintado, cheio de enfeites e lacinhos, dizendo que é o presente de final de ano, e ao abrir encontra as mais agradáveis e maravilhosas surpresas: a poesia de Florbela Espanca, um CD antológico do MPB4, uma Bíblia Sagrada em dourada brochura. Ou outras dádivas das lembranças. Mas eis que surge a indagação: será este o seu melhor presente?



Creio não seja demasiada intromissão perguntar se você realmente merece o presente encontrado com tanto esforço e adquirido com tanto carinho; se suas ações, gestos e atitudes condizem com o oferecimento de tão preciosa lembrança; se a pessoa que tem mostrado ser verdadeiramente merece uma recordação tão cativante.

Não sei como você é, realmente nada sei sobre você. Engana-se quem diz conhecer o outro como a palma da mão, principalmente porque, muitas vezes, nem a própria pessoa se reconhece, sabe verdadeiramente quem é. E um presente a ser oferecido a alguém assim só pode ser imaginado a partir de duas premissas: imaginar o que poderia ser ou mentir a si mesmo, no intuito de agradar.

Realmente não sei se uma pessoa egoísta mereça uma flor da manhã; por outro lado sei qual presente daria àquela que nunca faltou amizade. Verdadeiramente não sei se vale a pena agradar, agindo por pura bajulação, presenteando quem se esforça para fugir da presença; e por outro lado sei quanto vale o esforço para agradar aquele descrito no poema: Oh, quanto me agrada quem me reconhece na escuridão

Contudo, quem oferece o que bem deseja nada tem a ver com o merecimento, ou não, de quem recebe. Presume-se, de toda sorte, que aquilo oferecido reflete a consideração que a pessoa tem com relação ao presenteado. O que importa aqui, pois, não é saber do seu mérito, mas simplesmente indagar se intimamente você se reconhece como pessoa merecedora.

Pensar assim envolve outros aspectos. Mesmo que você se ache com valor suficiente para o que recebeu, e que pela pessoa que é poderia receber o mais valorizado presente, ainda assim – ao menos neste momento – preferia ser lembrada com uma lembrancinha mais simples, mais singela. Como um ramalhete faria bem ao seu coração, como uma mera bijuteria faria bem ao espírito.

Pessoas de bom coração, que pautam sua existência pela valorização de aspectos como humildade, companheirismo, amor verdadeiro e reconhecimento do próximo, geralmente são aquelas que renegam o luxo, joias reluzentes, modismos exacerbados. A estas bastam, tantas vezes, o prazer da presença, o compartilhamento, um abraço afetuoso, uma palavra amiga

Diferentemente de outras que se impõem valores – pois pessoas egoístas, orgulhosas, vaidosas, verdadeiramente chatas -, aquelas de sublime coração veem sempre com outro valor o presente recebido. E tal valor certamente está distante da importância material, do quanto o outro gastou ou do que acham que realmente merecem.

Houve um tempo em que as lágrimas chegavam aos olhos quando o carteiro entregava o cartãozinho de natal. Não está muito distante quando alguém se enchia de felicidade ao receber um calendário de bolso ou de parede, uma pequena agenda, uma garrafa de sidra. Mas hoje ninguém corra o risco de entregar – somente – um cartãozinho de natal. E então ressurge a sabedoria dos velhos brocardos: Ó tempore, ó mores! Que tempos, que costumes nesse nosso corrompido tempo!

 
No sertão de onde vim as singelas lembrancinhas sumiram de vez. Em Nossa Senhora do Poço Redondo há muito que não se fala mais em toalha bordada à mão, em passadeira produzida artesanalmente com renda de bilro, em bonecas de panos, em um punhado dos frutos da terra. Atualmente, da infância à velhice outra coisa não prevalece que não os modismos tecnológicos.

Será que os meus conterrâneos, nos dias atuais, gostariam de ser presenteados com um chapéu de couro ou um cantil de matar a sede, ou ainda, quem sabe, um alforje de caçador? Talvez quisessem também. Mas primeiro o celular recém-lançado ou a televisão de plasma. Merecem ter tudo, porém desde que não afastem de si a simplicidade, o encanto singelo da vida.


(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.



(*)Poeta e cronista

blograngel-sertao.blogspot.com

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