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domingo, 3 de maio de 2015

O GLOBO – 23/06/1927 REVOLTANTE O DESCASO DO GOVERNO CEARENSE


LAMPIÃO em Limoeiro do Norte, Ceará, no dia 15 de junho de 1927. 
O que disse a respeito o então prefeito FELIPE SANTIAGO DE LIMA. 

O Sr. Felipe Santiago, prefeito do município de Limoeiro, dali recentemente chegado, concedeu ao “O Ceará” a seguinte entrevista, relativa à incursão dos bandoleiros na sua localidade:


Na qualidade de prefeito comuniquei, com antecedência, ao Sr. Presidente do Estado, que Lampião se dirigia para Limoeiro. Esperamos até à última hora, que ao menos nos fosse enviada munição para os que estavam empenhados em organizar a resistência e a defender a cidade. Na manhã de quarta-feira última, muito cedo ainda, Lampião mandou o agricultor, em cujo sítio estava acampado, descansando, transmitir um telegrama para Mossoró. Esse portador trazia também a incumbência de avisar que o bando entraria, mais tarde, na cidade, e que esperava ser bem recebido. Muita gente fugiu. Diante da impossibilidade de resistir e temendo a sanha dos bandidos, não tivemos outro recurso senão receber o bando sinistro, poupando-nos, assim, às depredações e crimes em que se tem celebrizado. Mandamos abater um boi e preparar farta refeição para os facínoras. Depois do meio dia, Lampião conforme prometera, fez sua entrada pacífica, mas espalhafatosa. Ao aproximar-se da primeira rua deu voz de comando, em altos brados, gritando: 

- “Bala na águia! é pra entra que entra! Todo direito nós temos Ceará!”

Depois, o bando penetrou no beco, do Corredor, numa algazarra infernal, dando vivas ao padre Cícero, ao prefeito, vivas que eram correspondidos pela maioria das pessoas presentes e atemorizadas. Já dentro da cidade ordenou, em tom severo, aos seus sequazes que não tocassem em ninguém, nem em cousa alguma. Antes de se dirigir ao telégrafo, Lampião avisou que queria falar, com urgência, ao prefeito, indicando o lugar onde ia esperar-me. Dominado por um mal estar, como o senhor deve avaliar, fui à audiência. O ser gentil, a seu modo, tratou-me, o temível bandoleiro, esforçando-me por começo, com muito respeito, passando depois a maior familiaridade, dizendo-me, então: “Não tenha receio, está tudo garantido. Aqui não se bole em ninguém. O pessoal é disciplinado.” Entrando em seguida, em diversas indagações sobre o movimento de forças, lamentou não ter encontrado o major Moisés, pois “desejava conhece-lo nessas alturas”. Massilon (que é uma espécie de lugar-tenente de Lampião, cujo nome verdadeiro é Antônio Leite) aparteou: “Queria encontrar o major Moisés para ajustar uma conta velha”.

Terminada a palestra, Lampião ficou de procurar-me mais tarde, o qual de fato fez. Nessa ocasião, achava-me em companhia do padre Vital Guedes.

Disse-me o bandido que precisava de dinheiro. Declarei-lhe que não daria dinheiro algum. O cangaceiro riu e olhou para Sabino, um cabra mal encarado, de gestos hediondos, que disse: “Quando nós qué, rouba, mas eu agora tou pedindo. Quero dez contos.”

Relutei em dar-lhes a importância pedida, mostrando-lhes as dificuldades em que me encontrava de arranjar dez contos. Propus dar-lhe dois. Sabino interveio, dizendo: “Dois contos não é dinheiro.”

Apelei, então, para Lampião, dizendo-lhe estar Sabino muito duro.

Lampião, riu-se. O padre Vital, batendo no ombro de Sabino, camaradescamente, disse: “Sabino, é até bonzinho, não é, Sabino?!” Nessa ocasião chegaram outros bandoleiros.

Lampião pensou um instante, declarando, então, que aceitava os dois contos, mas fazia outro pedido: - Queria balas. Declarei que não havia na cidade munição alguma, no que fui acreditado.

Após isso, Lampião retirou-se me dizendo que se responsabilizava por tudo que o comércio vendesse aos seus “cabras”, menos bebidas, que não considera artigo de necessidade.

Os cangaceiros almoçaram fartamente, percorrendo, em seguida, toda a cidade. Compravam tudo por altos preços. Além de donativos à igreja, Lampião distribuiu muitas esmolas, dando aos cegos e aleijados cédulas de dez mil réis.

À tarde, em frente à igreja, reuniram-se todos. Traziam os bolsos cheios de níqueis e pratas. Lampião deu ordem para que despejassem as moedas, a fim de poderem carregar maior quantidade de munição. Nas proximidades estavam muitas crianças. Os bandidos começaram a atirar-lhes as moedas. Isso determinou a luta entre os garotos, com o fim de apanhá-las, o que muito divertia os facínoras. Houve meninos que conseguiram apanhar mais de 10$000.

Quando levei os dois contos ao bandoleiro, pedindo-lhe que os contasse, Lampião respondeu: “Não precisa. Tenho todas as confianças”. Em seguida meteu o dinheiro na bolsa grande que conduz a tiracolo, com alguma dificuldade, pois a mesma estava recheada. 

À noite, Lampião foi à estação do telégrafo, onde se achavam diversas pessoas. Falou diretamente com Aracati. De momento a momento, o bandido interrompia: “Cuma diz? Arrepita de novo!” Antes de Lampião retirar-se do aparelho, comunicou-se com a estação de Russas, obtendo a notícia de que ali chegaria uma força. Declarou, então, que queria ficar só, dizendo-me, com uma intimidade revoltante: “É bom, vamos botá tudo pra fora. Aqui só fica eu, senhô e aquele rapaz”. Referia-se ao telegrafista. Quando o sinistro assassino certificou-se de que, de fato, havia forças em Russas, encolerizou-se gritando: “Vou defender a cidade!” mandando, em seguida, empiquetar as estradas. Com muito custo consegui demovê-lo do contrário obtendo que o grupo se retirasse. Lampião aquiesceu com a condição de indicar-lhe, eu, a fazenda de uma pessoa conhecida, onde o bando pudesse pernoitar. Assim foi feito. No dia seguinte, chegou a força paraibana, que cometeu os maiores desatinos. A sua atitude foi tal que a cidade ficou inteiramente deserta. Apesar de ter chegado inesperadamente, ofereci-lhe almoço, que o tenente Quelé recusou, dizendo ser pequena a sua demora. Mais tarde, porém, resolveram adiar a partida. Pediram refeição. Na impossibilidade de prepara-la de repente, mandei-lhe queijos, rapaduras e bolachas. Comeram, as praças, cinco e meia arrobas de queijos.

A força do tenente Quelé tem no seu meio indivíduos que foram cangaceiros de Lampião. Um deles já serviu dois anos com o terror do Nordeste.

A imagem do prefeito Felipe Santiago de Lima foi extraída do site http://maurilofreitas.blogspot.com.br/…/capitulo-ii-2-oliga…

Fonte: facebook

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

2 comentários:

  1. Anônimo08:25:00

    Caro Mendes: Tenho eu uma grande dúvida que não sei quem poderá dirimi-la. Você conhece muito bem a entrevista do Juiz Municipal de Limoeiro do Norte que foi concedida a um radialista, onde (ele) o Dr. Custódio Saraiva afirma ter recebido Lampião em Limoeiro, logo que o Prefeito Felipe Santiago não estava presente. Agora leio este artigo, no qual o referido prefeito desenvolve como fora recebido Lampião ali naquela cidade. Pergunto a quem souber: Quem mesmo recebeu o cangaceiro naquela sua entrada em Limoeiro?
    Grato,
    Antonio Oliveira - Serrinha - e-mail: antonioj.oliveira@yahoo.com.br

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  2. Anônimo15:48:00

    Caro pesquisador Correa Sobrinho: Não tenho a intenção de contrariar nem contestar o autor do texto. Mas as diversas matérias que temos lido, quem recebeu o grupo de Lampião em Limoeiro do Norte foi o Juiz Municipal Custódio Saraiva de Menezes, inclusive na gravação de áudio que ele concedeu a um jornalista, no final está um depoimento em vídeo, do sr. Antonio Saraiva Menezes, irmão do Juiz, endossando as palavras do referido Juiz. FINALMENTE CARO COMPANHEIRO, QUEM RECEBEU LAMPIÃO, FOI O JUIZ SARAIVA OU O PREFEITO FELIPE SANTIAGO DE LIMA? Descubra caro pesquisador Corrêa Sobrinho.
    Muito grato e no aguardo,
    Antonio Oliveira - Serrinha - E-mail: antonioj.oliveira@yahoo.com.br

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