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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

ENTREVISTA COM O ESCRITOR JOÃO DE SOUSA LIMA

Por Geraldo Júnior

Entrevista que realizamos há algum tempo atrás com o nosso amigo/confrade, Escritor e Pesquisador João de Sousa Lima. Na ocasião alguns membros do grupo foram selecionados para enviarem suas perguntas.

LEIAM...

1 - O que o levou a se interessar a pesquisar e no conhecimento sobre o cangaço?
JSL- Minha pesquisa começou há uns 18 anos, foi um convite do professor e irmão Edson Barreto que lecionava na zona rural de Paulo Afonso e sempre colhia informações e detalhes da passagem de Lampião e seus seguidores nos povoados de nossa cidade...
2 – Qual a sua descoberta relacionada ao cangaço que considera ser a mais importante?
JSL- Foram várias descobertas e todas tiveram um grande significado. Há um envolvimento sentimental nessas questões todas. Não podemos em hipótese alguma tratar os fatos históricos sem nos envolvermos profundamente com sentimentos das pessoas que dão seus depoimentos, mesmo sabendo que uma pesquisar tem que ser imparcial para retratar os fatos históricos. É um trabalho que exige responsabilidades com essas questões históricas. Precisamos realizar um trabalho sério e, acima de tudo, ter gosto pelo que se faz.... porém não posso negar que encontrar Durvinha e Moreno foi um grande achado.... o único casal vivo de cangaceiros, logo eles que tiveram tantos momentos, principalmente Durvinha, com o Rei do Cangaço, Maria Bonita e os grandes chefes de subgrupos.
3 - Cite o objeto que para você tem maior importância em sua coleção de peças relacionadas ao cangaço?
JSL – Todos os objetos tem um valor histórico muito grande; entre mosquetões parabelluns, punhais, pertences, peças em ouro e fotografias originais. Porém há uma peça que tenho um carinho especial, esse carinho vai além da conta: Um brinco que o cangaceiro Cruzeiro deu a Aristeia e ela havia dado ao seu filho Pedro Soares e poucos dias antes de sua morte, durante uma visita que lhe fiz para irmos rever sua casinha no povoado Capiá da Igrejinha, Canapí, Alagoas, ela pediu a Pedro um dos brincos e na presença dos familiares me presenteou a peça, sem antes pedir para que eu nunca vendesse aquela lembrança. Promessa feita e o brinco é guardado à sete chaves como recordação daquela mulher que teve uma passagem conturbada no cangaço mais que conseguiu refazer sua vida e deu um grande exemplo de vida. E explique o por que.
4 - Qual dos municípios brasileiros que em sua opinião mais colaborou com a entrada de membros para as hostes de Lampião, Paulo Afonso-BA ou Poço Redondo-SE? Explique.
JSL – Paulo Afonso teve um contingente maior que Poço Redondo, os números seriamente registrados provam isso. E pra que prova maior do que ser reconhecido pelo próprio Alcino Alves Costa que foi o grande pesquisador daquela região? Em Paulo Afonso 47 jovens, entre homens e mulheres, seguiram as hostes do cangaço. Poço redondo chegou a 30 e poucos.
5 - Um momento importante que marcou sua trajetória durante o longo período em que estuda o fenômeno cangaço?
JSL – todos os momentos dessa longa pesquisa foram importantíssimos. Poder encontrar ex-cangaceiros, ex-volantes, coiteiros, objetos e acima de tudo colher a história oral desse nosso povo. As histórias fascinam, emocionam, elas nos tornam mais humanos diante dos depoimentos, muitas vezes de um sofrimento quase sem fim. Poder ouvir essas pessoas é o que há de mais gratificante. Entrar no mundo delas, participar em momentos de suas passagens pela vida errante do cangaço, suas dores, seus amores, incertezas, combates, medos, fugas e recomeço. Um dos momentos mais marcante foi quando em 1987 eu trabalhava como fiscal de tributos da prefeitura local e confeccionava umas carteiras para os idosos andarem gratuitamente nos coletivos. O dia para fazer as carteiras era segunda e terça e em uma sexta feira me apareceu uma senhora que queria tirar a carteirinha; expliquei a ela que não era naquele dia, ela disse que vinha de longe, estava velha e cansada.... fiquei penalizado e fiz a carteira e quando a entreguei ela me agradeço com um belo sorriso, sorriso esse que nunca consegui esquecer...... Já no ano de 2001 fiquei sabendo de uma filha de um casal de cangaceiros que era índia e morava na tribo dos índios Pankararé, no povoado Brejo do Burgo. Dirigi-me pra lá pra tentar entrevistar a senhora que se chamava Alzira. No povoado fiquei sabendo que Alzira não cedia entrevistas em hipótese alguma e mesmo assim fui lá. Ao chegar a casa de Alzira encontrei o marido dela que disse pra eu não insistir, pois ela era brava e não gostava de jornalista. Insisti e fui à casa de Alzira. Do portãozinho de madeira chamei seu nome e a rsposta veio como rio e alta como trovão: - Que éééé? - Gostaria de falar com a senhora... - Quero falar com ninguém não e procure o que fazer... Alzira apareceu na porta e disse: - Tá querendo desenterrar cangaceiro? Lampião já morreu! Eu quero só conversar, saber de uma história sua... Ela se dirigiu ao portão, olhou-me nos olhos e perguntou? - você é da polícia? - Não!!! - eu fui com sua cara, entre aqui, você já tomou café moído no pau? - Não... Alzira fez o café, tomamos e ela abriu o coração, contou sobre sua raiva da polícia, do sofrimento de sua mãe que teve o companheiro Nevoeiro morto em combate e ela ficou sozinha, grávida, no Raso da Catarina e teve que se entregar no povoado Salgado do Melão, no centro do Raso da Catarina. A polícia a transferiu para a cidade de Água Branca, em Alagoas. Dentro da cela Catarina teve a filha e o comandante não aceitou que ela ficasse com a criança, tendo que deslocar sua irmã Sabina e alugar uma casa pra ela ficar com a criança. Durante várias vezes no dia, quando Alzira sentia fome, Sabina a levava a delegacia e pelas grades de ferro da cadeia Catarina tirava o seio e amamentava a criança e isso criou um trauma em Alzira. Durante horas ouvi suas histórias e quando estava me preparando pra ir embora perguntei se ela não teria uma foto da mãe pra eu colocar em meu livro, ela disse que sim e foi buscar a foto. Tive uma grande surpresa: Ela trouxe a carteirinha que eu havia feito para aquela senhora que me pagou o serviço com o um belo sorriso..... isso mesmo, a mulher da carteirinha era a cangaceira Catarina, a Catarina de Nevoeiro... tantas histórias.... foi assim que a conheci, nunca e agora mais ainda, poderei esquecer aquele sorriso....
6 - Qual aquele que você considera que foi o maior equívoco que cometeu ao longo dos vários anos em que pesquisa sobre o cangaço?
JSL- Não lembro de nenhum equívoco que tenha atrapalhado minha trajetória de pesquisas.... mais tem algumas pessoas oportunistas que se aproximam de você e quando damos toda confiança elas te surpreendem de alguma forma... agora o maior equívoco no meio é achar que o Pedro de Morais é achar que é pesquisador e escritor... aquilo lá é uma farsa total, medíocre tanto com suas pesquisas quanto em sua falida arte de escrever......
7 – Qual o livro de sua autoria que lhe trouxe maior popularidade e reconhecimento?
JSL – tenho um carinho especial por Lampião em Paulo Afonso, por ser meu primeiro trabalho e que me trouxe o respeito no meio de quem estuda o tema e tenho uma questão de amor com o “Moreno e Durvinha, sangue, amor e fuga no cangaço”, pela amizade e convivência com os envolvidos diretamente com a história. A trajetória guerreira de Maria Bonita também foi uma pesquisa que tive muito prazer em finalizar.
8 - Você acredita que o senhor José Alves dos Santos seria realmente filho de Lampião com Helena filha do senhor João Ramos de Souza (Joãozinho) membro da família Engrácia ou esse fato já foi esclarecido? Explique o porquê.
JSL – Tenho certeza que ele é filho de Lampião, todos da comunidade sabem disso, inclusive ele que contou toda a história. Agora para provarem mesmo só o exame de DNA.... eu não preciso desse artifício para ter certeza, já basta o depoimento de Zé de Helena, mais também não colocarei esse fato em livro tendo por base minha certeza se ela não é provada através da medicina e por que na história nunca podemos ser donos da verdade... podemos ter nossas verdades mais abertos a novos olhares e novas descobertas...
9 - Quais nomes você citaria como sendo os três mais violentos cangaceiros que fizeram parte do grupo de Lampião?
JSL – sem sombras de dúvidas o Gato foi o mais perverso, depois vem o Corisco, Virgínio, Moreno, Mané Revoltoso, canário.... naquele mundo ninguém era Santo. Em nenhum dos lados tinha inocentes. Tanto cangaceiros como volantes foram violentos aos extremos.
10 - Um escritor?
JSL- Seria injusto se só citasse um. Indico: Ângelo Osmiro, Sérgio Dantas, Antônio Amaury, Frederico Pernambucano de Mello, Archimedes Marques, Sabino Basseti, Geraldo Ferraz, Vilela, Edson Barreto, Leandro Cardoso, Alcino Alves Costa. Existem pesquisadores sérios nesse meio. Se esqueci de alguém perdoe a memória.
11 - Um livro?
JSL – De todos esses escritores citados acima.
12 - Um filme?
JSL – Baile Perfumado retrata bem o cotidiano do homem que filmou os cangaceiros. Encontramos algumas poucas falhas de informações, mais no contexto geral é um filme excelente.
13 - Uma cangaceira?
JSL- Três: Durvinha, Aristeia e Dulce.
14 - Um cangaceiro?
JSL – Luiz Pedro.
15 - Um volante?
JSL – Teófilo Pires do Nascimento. (ainda vivo. Um grande homem)
16 - Em sua opinião o que mudou em termos de comportamento e disciplina no bando de Lampião após a entrada das mulheres?
JSL – Todas as cangaceiras que entrevistei e convivi afirmaram que os combates diminuíram, os confrontos passaram a ser evitados. Os estupros diminuíram...
17 – Em relação às identificações dos cangaceiros(as) mortos em Angico durante o massacre ocorrido em 28 de Julho de 1938 é do conhecimento de todos(as) que muitos pesquisadores discordam de tais reconhecimentos. Como você se posiciona em relação a esse assunto?
JSL – Aquela relação que saiu nos primeiros momentos é totalmente incerteza. Cita o Caixa de Fósforo como sendo um dos mortos e Caixa de Fósforo ainda ficou tempos com Corisco. Ainda é muito incerto o reconhecimento, só temos certeza de Lampião, Maria Bonita, Luiz Pedro, Elétrico, Mergulhão, Quinta Feira e Enedina.
18 – Quais seus novos projetos?
JSL – Estou finalizando mais dois livros e ai guardo a espada e descanso na fé.....
19 – João De Sousa Lima por João de Sousa Lima?
JSL- Autêntico, Leal, verdadeiro..... dizem que tenho pavio curto mais estou aprendendo a conviver com as diferenças..... acho que a maior definição é meu trabalho, minha perseverança.... minhas realizações.... quem é meu amigo sabe o que estou falando....
PERGUNTAS ENVIADAS POR MEMBROS DAS PÁGINAS O CANGAÇO
João Paulo Celestino (Fortaleza-CE)
20 - João de Sousa Lima, o estudo do cangaço é baseado principalmente em relatos de pessoas que o vivenciaram, e de fontes documentadas. Infelizmente, as chances de descobrirmos novos fatos tornam-se cada vez mais difícil com o passar do tempo. Para você, dos fatos que ainda carecem de esclarecimento completo, qual mais lhe intriga?
JSL – A história oral tá se perdendo, estamos pegando os últimos remanescentes. É necessário urgência na mobilização de pesquisadores para que se registrem os fatos com essas guerreiros do passado para que as gerações futuras possam conhecer a história como foi passada... Os fatos que mais intrigam é a questão dos grandes comandantes e políticos como coiteiros e a ligação do cangaço com os índios Pankararé.
21 - Em sua opinião Lampião, já nos momentos finais de sua vida de bandoleiro, antes de sua morte, pensava em de alguma maneira abandonar o cangaço?
JSL- Não acredito, a observação primordial nessa questão é saber que ele estava armando o sobrinho para entrar no cangaço.
O sobrinho foi um dos sobreviventes da Grota do Angico. Se ele pretendia deixar o cangaço como poderia está armando um membro de sua família? Maria Bonita alguma vez tentou convencer Lampião a abandonar a vida de cangaceiro?
JSL- É possível que tenha acontecido esse diálogo, a própria cangaceira Dulce, que eu entrevistei há uns seis anos, disse que Maria Bonita andava cansada daquela vida.... Agora querer e colocar em prática o desejo é que não aconteceu.
Letícia Alves – Lê Alves (João Pessoa-PB)
22 - Na noite do massacre em Angicos, ouve algum relato de alguém que descobriu a emboscada e tentou avisar a Lampião?
JSL – Não Houve! Tem um depoimento de Sila que disse que ao anoitecer viu uma luz que poderia ser de lanterna. As volantes não estiveram lá ao anoitecer, estiveram ao amanhecer e eles não portavam lanternas....
Devanier Lopes (Feira de Santana-BA)
23 – Sila conheceu Dadá pessoalmente?
JSl – Caro Devanier Lopes eu estive uma vez com Sila em uma palestra em Canindé do São Francisco e depois conversamos um pouco mais não entrei nesse mérito. Também não lembro dessa passagem nos livros que li sobre ela e a Dadá.
Aderbal Nogueira (Fortaleza-CE)
24 - João o que você acha do "Amor no cangaço"? Quem foi o personagem mais importante que você conheceu? E por que?
JSL – Aderbal houve amor sim. Em alguns depoimentos como é o caso da Sila, ela diz que nunca foi amada, já a Durvinha foi apaixonada por Virgínio, a Aristeia pelo Cícero Garrincha e assim temos muitos depoimentos. Então tivemos pessoas bem amadas e pessoas que não conheceram o amor.. Todas as pessoas que conheci foram importantes no contexto da historiografia. Poder entender seus momentos tanto no cangaço, como no combate e ainda como suporte aos dois lados.
José João de Souza (Recife-PE)
25 - Lampião recebeu em Juazeiro do norte-CE a patente de capitão, para combater a Coluna Prestes. Como você analisa esta passagem na vida do rei do cangaço?
JSL – A notícia teve mais importância do que mesmo a validade da patente. Foi o encontro do maior cangaceiro com uma das maiores representações religiosas do nordeste brasileiro. A entrevista deixada pelo Rei do Cangaço ainda é uma das coisas que mais impressionam quem estuda o tema e, ainda, o Padre Cícero ter ficado com os familiares de Lampião para protegê-los.
26 - Alguns dos livros escritos sobre o cangaço são tendenciosos, tanto para o lado das volantes, como para o lado dos cangaceiros, dos trabalhos que você conhece, quais recomendariam?
JSL- José João existem verdadeiras aberrações no meio. Leia os livros dos escritores que citei acima. Agora se você encontrar um livro de um cidadão chamado Pedro de Morais, corra desse rapaz.

30 - Considerações finais.
JSL – Agradeço a oportunidade e estarei sempre aqui pra receber os amigos e colaborar com informações para deixar um legado sério sobre as pesquisas para que sirva às gerações vindouras.

Geraldo Antônio de Souza Júnior

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