Por Bruno Yacub Sampaio Cabral
Para
lembrarmos dos 80 anos de falecimento do primeiro chefe político e o gestor
municipal de maior duração na história de Brejo Santo, A Munganga Promoção
Cultural disponibiliza para os leitores, o texto "Um Civilizador no
Cariri", de autoria do Padre Antônio Gomes de Araújo e publicado na
revista A Província; Ano 3; N° 3; em 7 de julho de 1955; Crato - Ceará; págs.
127 a 146. O texto será dividido em três partes.
CORONEL
BASÍLIO GOMES DA SILVA
80 ANOS DE
FALECIMENTO
08.04.1940
08.04.2020
UM CIVILIZADOR
NO CARIRI
PARTE DOIS
O CONSELHO DE
INTENDENTES
Os membros do
Conselho de Intendência da nova vila, Basílio Gomes indicou-os à nomeação
governamental, e, todos, foram nomeados: Lourenço Gomes Silva, seu irmão;
Benevenuto Bezerra da Paixão, seu primo e genro; José Florentino de Araújo, seu
compadre e sogro de um de seus filhos; José Nicodemos da Silva, meu pai, e José
Moreira Tavares, seu compadre, a quem fez tabelião, o primeiro do novo
município.
No dia cinco
de novembro de 1890, em sessão extraordinária, presente Basílio Gomes na
qualidade de chefe politico do município, aqueles Intendentes inauguraram a
Vila, por intermédio do intendente Lourenço Gomes da Silva, antes eleito chefe
do executivo pelos seus pares.
Ata da
Inauguração da nova Vila de Brejo dos Santos, como abaixo se declara:
“Aos cincos
dias do mês de novembro do anno de mil oitocentos e noventa, na Sala das
Sessões desta Casa, destinada para a realização das sessões do Conselho de
Intendência municipal desta Villa de Brejo dos Santos, creada por decreto do
Governador do Estado, coronel Luiz Antônio Ferraz, número quarenta e nove (49),
de vinte e seis de agosto do corrente anno, ás dez horas da manhã, presentes os
Intendentes Lourenço Gomes da Silva, Benevenuto Bezerra da Paixão, José
Florentino de Araújo Lima e José Moreira Tavares, nomeados por acto do
Governador do Estado, de vinte seis de Agosto, também do corrente anno, e,
todos, juramentados perante o Conselho de Intendência Municipal da Villa de
Porteiras, da qual foi esta Villa desmembrada, por aclamação foi escolhido o
intendente presidente do Conselho, o intendente, cidadão Lourenço Gomes da
Silva, qual, após, tomou assento à cabaceira da mesa e convidou para exercer as
funções de secretário, ao intendente, cidadão José Moreira Tavares, o qual,
assumindo o cargo, tomou seu respectivo logar. Em seguida. declarou o
presidente, que, havendo número legal de intendentes, declara aberta a sessão.
Então declarou inaugurada a municipalidade desta Villa, e que se lavrassem ofícios
de participação da presente sessão ao Exmo. Governador do Estado; ao Conselho
de Intendência Municipal de Porteiras, ao Doutor Juiz de Direito da Comarca e
as autoridades e empregados públicos, aqui, existentes, da antiga
Municipalidade, Para conhecimento de todos, lavrou-se a presente Acta.
Determinou-se o dia seguinte para a instalação da primeira sessão ordinária do
mesmo Conselho. Ordenou o Presidente, que se extraísse uma cópia da Acta e se
remetesse ao Doutor Juiz de Direito da Comarca, para os devidos fins, e outra,
para ser afixada em parte da Casa deste Conselho, para conhecimento dos povos
deste Município. Do que, para constar, lavrei a presente Acta. José Moreira
Tavares, servindo de Secretário, a escrevi. Sala das Sessões do Conselho da
Intendência de Brejo dos Santos, 5 de Novembro de 1890. Segundo Anno da
Republica - Lourenço Gomes da Silva, 1° Presidente; Benevenuto Bezerra da
Paixão; José Florentino de Araújo Lima; José Moreira Tavares.” (Extraído do
Livro de Lançamentos das Actas das Sessões do Conselho de Intendência da Villa
de Brejo dos Santos, fls. 1 e 2).
O
ADMINISTRADOR
Basílio Gomes
fundou, e dirigiu até 1912, a secção brejo-santense do Partido Republicano
Cearense, também vulgarmente chamado Partido Aciolino, alusão ao supremo chefe
estadual dessa agremiação partidária, o governador Antônio Pinto Nogueira
Acioly.
Eleita a
primeira Câmara de Vereadores em 1892 sob a influência decisiva do Patriarca,
nela predominaram desde então, elementos a ele ligados, por parentesco, oligarquia
que não degenerou nos males, a que a instituição conduz graças ao espirito de
Basílio Gomes, que conciliava a autoridade com a liberdade, quanto o permitiam
as circunstâncias do meio e da época.
Nomeado chefe
do executivo municipal em 1896, cargo que já vinha exercendo desde 1893 por
escolha dos intendentes, seus pares, manteve-se neste posto até 1909,
inclusive.
Estando tudo
por fazer, foi esse, o período CRUCIAL da administração do município, o da
construção. Apoucadíssimas, as rendas orçamentárias. O orçamento de 1891, por
exemplo, consignou a receita de dois contos, setecentos e noventa mil réis, e a
arrecadação somou apenas a quantia de seiscentos mil réis! Ainda, em 1908, a
receita não ultrapassou um conto, quinhentos e cinquenta mil réis.
Forrado da
estrutura de administrador, expressa em iniciativas rasgadas, ação fecunda e
honestidade catiônica e profundo espírito público, Basílio Gomes impôs-se á
confiança de seus munícipes.
No afio de
1898 esboçou o primeiro código de posturas do município. Apresentado à Câmara
Municipal em forma de projeto, discutido e aprovado, ele o promulgou no dia
onze de novembro desse ano.
A 14 de junho
do ano mencionado, a Câmara Municipal aprovou esta moção: “Paço da Câmara
Municipal da Villa de Brejo dos Santos em 14 de Junho de 1898. Ilmo. Sr.
Tenente Coronel Basílio Gomes da Silva, M. D. Intendente deste Município. A
Câmara Municipal desta Villa, reunida, hoje, em sessão extraordinária, votou,
sob proposta de seu Presidente, a moção seguinte: A Câmara Municipal, jubilosa
pela maneira por que têm sido mantidos a administração e serviços públicos da
mesma Câmara a cargo de V.S. ª. como Intendente deste Município, cargo que V.S.
ª. tem desempenhado com probidade e acrisolado patriotismo, esta Câmara
aproveita a ocasião para reiterar a V.S. ª. a mais sincera solidariedade,
reconhecendo-o como chefe prestimoso do Partido Republicano deste Município,
cuja duração, há muito, está a cargo de V.S. ª.. Pelos seus relevantes serviços
prestados á causa pública, tem V.S. ª. aberto novos horizontes ao
engrandecimento e prosperidade do mesmo Partido, que tão honradamente V.S. ª.
dirige, de perfeita solidariedade com o Exmo. Sr. Doutor Nogueira Acioli, chefe
do Partido Republicano Cearense - Saúde e Fraternidade. João Pereira da Silva,
Manuel da Silva Bastos; Manuel Inácio dos Santos”.
Em data de
23.07.1903, a Câmara Municipal, em outra moção, congratula-se com o Intendente.
O documento referiu a probidade que marcava a administração municipal, o trato
das finanças e a aplicação dos dinheiros públicos. Enumerou, entre outras, as
seguintes realizações: construção da Cadeia Pública, do Quartel da Policia, a
edificação (em andamento) dum prédio destinado ao funcionamento do executivo
municipal, da Câmara dos Vereadores e da Pretória. A moção traz a assinatura
dos seguintes vereadores: João Inácio de Lucena, presidente; João Antônio de
Moura, Pedro Bento de Figueiredo, Jerônimo Alves da Costa. Eram realizações à
base de rendas que continuaram magras, pois o orçamento de 1904 consignou uma
receita de apenas um conto, seiscentos e vinte réis.
Aos vinte de
novembro de mil de novecentos e três, Basílio Gomes compareceu à Câmara
Municipal, então reunida em sessão extraordinária, leu uma mensagem relacionada
com a gestão municipal desse ano, numa franca prestação de contas. Comunica,
por exemplo, a conclusão do edifício destinado à Câmara Municipal, dotado de
todos os móveis, encravado na Praça da Matriz, com duas portas de frente,
quatro janelas de oitão, rodeado de calçadas, e com três mesas envernizadas,
uma estante, cadeiras de palhinha, etc. (Declara a ata dessa sessão magna que
os serviços de construção foram administrados pessoalmente pelo intendente
Municipal, e consumiram um conto, oitocentos e oitenta mil, duzentos e sessenta
réis).
Terminada a
leitura, ou da mensagem, entregando o prédio à Câmara, ato logo, pregado em
alta voz pelo Porteiro das Audiências. Determinou o Presidente, que se
extraísse cópia dessa ata inaugural para publicação, ata assinada pelos
vereadores: Joaquim Gomes da Silva, presidente da Câmara; João Inácio de
Lucena, Manuel da Silva Bastos, (citado); Jerônimo Alves da Costa; José Tavares
Moreira, já referido; José Leite de Moura e Pedro Bento de Figueiredo.
Assina-a, por
igual, Basílio Gomes.
Como um
exemplo, a mais, do sentido do espírito público, que animava o Patriarca,
transcrevemos a sua mensagem à Câmara, pessoalmente lida, no dia 29 de julho de
1907, comunicando a constituição do patrimônio do Município: “Senhores
Vereadores. Para que a Câmara adquirisse um patrimônio em bens de raiz, que
assegurasse o seu futuro, tratei de tomar medidas, as mais eficazes, a fim de
economizar, quanto possível, os rendimentos da mesma Câmara nestes três últimos
exercícios financeiros, conseguindo, com isso, acumular um pecúlio de 868,000
(oitocentos e sessenta e oito mil réis), restantes dos saldos da receita e
despesas dos ditos exercícios, capital que se acha empregado nas seguintes
propriedades: uma casa de tijolo e telha com duas portas de frente, armação de
loja e balcão, e fundo correspondente na Praça do Comércio desta Vila; 4 ditas
de porta e janela de frente, à rua Coronel Ferraz; 1 dita com uma porta de
frente e outra na traseira, assoalhada, na mesma rua Coronel Ferraz no Comércio
Velho; mais uma armação de loja com balcão avulso. Além de duas casas
anteriormente adquiridas por esta Câmara, juntar-se-ão seis prédios que
atualmente constituem o patrimônio municipal. Senhores Vereadores! Não é com
finanças lisonjeiras que, no Caráter de Chefe do Poder Executivo Municipal,
tenho levado avante essas realizações, e, sim, por certa economia, posta em
prática no intuito de dotar nosso Município de um patrimônio garantido em bens
de raiz, cujo resultado, não padece dúvida, entrará, muito breve, no orçamento
do mesmo. Os referidos prédios acham-se devidamente documentados por meio de
escrituras públicas na conformidade da lei. Em conclusão, peço a vossa
aprovação para os actos por mim praticados, diante dos fundamentos expendidos”.
Texto do ato
de aprovação dessa mensagem: "A Câmara Municipal, considerando,
patrióticos, os atos do Intendente, resolve aprovar o relatório apresentado
pelo mesmo, em toda a sua plenitude, para consignar, na presente Acta, um voto
de louvor ao Coronel Intendente Municipal, que tem imprimido aos negócios do
Município, boa orientação - Antônio Gomes de Santana, João Pereira da Silva,
José Tavares Moreira, Antônio da Silva Bastos, João Antônio de Moura, Pedro
Bento de Figueiredo, José Leite de Moura".
Aquele
patrimônio não mais se ampliou desde 1909, ano em que o coronel Basílio deixou
definitivamente o executivo municipal, para continuar incontrastável, como
antes, na chefia política de sua comuna. Não se ampliou o patrimônio, senão há
poucos anos. O prédio da Prefeitura continua o mesmo, apenas acrescido de um
andar, apoucado e feio.
FLEXIBILIDADE
Basílio Gomes
não considerava monopólio individual ou dum grupo, a atividade política ou
administrativa. Se foi o supremo chefe político de sua terra por meio século (a
partir de 1876, data da criação do distrito), e chefe do executivo municipal de
1893 a 1909, pelos seus excepcionais predicados de guia e comando, os quais o
impuseram ao meio brejo-santense, que teve, nele, a encarnação do espírito
público em ação permanente e fecunda. Exceção feita das famílias Martins e
Cardoso, que, isoladas em suas fazendas de criar, conservaram-se à margem da
política e administrativa do município e de seu progresso urbano - todas as
demais famílias categorizadas participavam daquela vida: os Lucenas, os Mouras,
os Araújo Lima, tudo sem sombra autoritarismo do chefe.
Já referi como
o Patriarca transitou do regime monárquico para o republicano, inspirado pelo
seu bom senso e senso político sensível ao curso dos acontecimentos.
Em 1909, seu
amigo e correligionário, já, então, prestigioso elemento político local. Manuel
Inácio de Lucena, manifestou desejo de ocupar a direção do executivo municipal.
Basílio Gomes se antecipou a qualquer atitude concreta do amigo e lhe cedeu a
Intendência. E passou a apoiá-lo.
Politico e
administrador por vocação, educação e destino, não o empolgava, entretanto, a
volúpia do poder. Acima de todas as solicitações, colocava a grandeza da
comunidade brejo-santense.
Por força
dessa elevação moral, Brejo Santo gozou dos benefícios da paz entre seus
filhos, enquanto o Patriarca influenciou decisivamente em seus destinos
políticos e sociais.
Ainda por
força de sua envergadura moral e politica, mais moral do que politica, Basílio
Gomes desfrutava de justo e autêntico prestígio, junto a outros chefes
políticos do Cariri, seus correligionários, ou não. Conjurou mais de um choque
armado entre eles.
A Crato, onde
presidiu algumas eleições a convite do coronel José Belém, a Crato se
transportou quando esse chefe politico preparava-se para resistir ao coronel
Antônio Luiz, que se apresentava para arrebatar-lhe o poder municipal pela
força, costume, então, adotado, no Cariri, onde, na época, se conquistavam,
vezes muitas, a chefia local e o poder executivo municipal, à mão armada,
conquista, logo sancionada pelo Governador Acioli, homem do fato consumado.
Tentou, em vão, convencer ao compadre e amigo, a que cedesse ao império das
circunstancias, entregando o poder ao Cel. Nelson da Franca Alencar, seu
correligionário. E finalizou a démarche com estas palavras realísticas: “Você,
Zebelém, se arrependerá. Saiba que politica não é bem de raiz”. E quinze dias
depois, as armas de Antônio Luiz depuseram José Belém.
Essa
flexibilidade democrática valeu-lhe haver presidido a mais de assembleia
particular, de chefes políticos caririenses, face à confiança que nele
depositavam impressionados com a estatura moral correligionário, tão
rigidamente pacifista a ponto de nem sequer admitia um morador de suas terras
na posse de um clavinote, exceção, nesta zona, naqueles escuros. A propósito,
escreveu o padre Leopoldo Fernandes ex-vigário de Brejo Santo, referindo-se à
ação pacificadora do Patriarca naquela comuna caririense: “Quando tudo parecia
converter-se em sangrenta deflagração, surgia a figura simpática e enérgica do
coronel Basílio, e apenas com a sua autoridade moral, conseguia o desarmamento
de todos e a consequente tranquilidade da população”.
Foram
correligionários e contemporâneos do Patriarca de Brejo Santo, os seguintes
chefes políticos do Cariri, entre outros: Dr. Antônio Augusto de Araújo Lima e
Domingos Furtado Leite, em Milagres; Raimundo Cardoso dos Santos (Porteiras);
Joaquim Alves Rocha, Romão Sampaio Filgueiras e José de Anchieta Gondim
(Jardim); Antonio Róseo Jamacaru e Antônio Joaquim de Santana (Missão Velha);
Manuel Ribeiro da Costa, Antônio Pereira Pinto e João Raimundo Macêdo (Joca do
Brejão) (Barbalha); José Belém de Figueiredo e Antônio Luiz Alves Pequeno
(Crato); padre Cícero Romão Batista e Floro Bartolomeu da Costa (Juazeiro do
Norte); Roque Pereira de Alencar (Santana do Cariri) e Pe. Augusto Barbosa de
Menezes (Caririaçu).
Continua.
O Brejo é
Isso!
Por Bruno
Yacub Sampaio Cabral
A Munganga
Promoção Cultural
Extraído do
texto "Um Civilizador do Cariri"; do Padre Antônio Gomes de Araújo;
publicado na revista A Província; Ano 3; N° 3; em 7 de julho de 1955; Crato -
Ceará; págs. 127 a 146.
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