Autor Saudoso Alcino Alves Costa
Outrora, Poço Redondo era um arruado pertencente ao vasto município de Porto da
Folha. Com sua emancipação em 25 de novembro de 1953 quase todas as fazendas
nascidas nos escondidos daquelas brenhas caatingueiras passaram a pertencer ao
novo município. Dentre elas uma fazenda chamada Pia Nova. Nos idos do cangaço o
proprietário da Pia Nova era um caboclo de “boa cepa”, “raiz de braúna”,
verdadeira “madeira de lei”, “homem atutanado”, sertanejo de “peso e
medida”, chamado Torquato José dos Santos.
Já caindo para a idade seu Torquato cuidava com esmerado carinho e zelo de sua
terrinha, de sua família, especialmente de sua numerosa filharada. No meio dela
um rapazinho saindo da puberdade, chamado João. Este jovem caboclo carregava
orgulhosamente o nome de seu pai junto ao seu nome de batismo. Vindo, com o
passar dos anos, a se tornar no célebre João Torquato, o homem que derrotou
Corisco, o “Diabo Louro”, na famosa medição de força acontecida na fazenda
Queimada de Luís.
O sofrimento, dores e provações de João Torquato começaram acontecer naquele
entardecer do triste dia 02 de maio de 1937, quando chegou a sua casa um bando
de malvados cangaceiros comandados por Zé Sereno e Mané Moreno.Numa atitude
injusta e perversa, os cruéis cangaceiros assassinam o velho Torquato e seu
genro Firmino. Medonha tragédia que destroçou a vida de João e todos da
família.
Desatinado com tamanha injustiça, João Torquato só pensava em vingar a morte do
papai amado e de seu cunhado Firmino. Só lhe restava uma alternativa. Mesmo
sabendo que sua mãe iria acrescentar ainda mais as suas dores e sofrimentos se
decidiu por procurar uma das “forças do governo” que combatiam Lampião e nela
se engajar. Só assim teria oportunidade de caçar e se vingar dos monstros que tiraram
a vida de seu pai.
Foi o que fez. Procurou a volante comandada pelo famoso Zé Rufino e nela deu
início a uma nova e inesperada etapa de sua vida; a vida de caçar cangaceiro.
Pouco se demora sob o comando de Zé Rufino. O seu destino é a volante do temido
Antônio Recruta, onde perseguiu cangaceiro por longo tempo. Nesta volante, João
Torquato participou de vários confrontos com os cangaceiros.
Um deles, no entanto, se tornou célebre. Aquele em que sozinho enfrentou a
cabroeira de Corisco, baleando-o e tirando a vida dos cangaceiros Guerreiro e
Roxinho.
Como se sabe Corisco, após a morte de Lampião, ficou “atuleimado” e
“atarantado” da cabeça, sem tino e sem razão. Ensandecido, cometeu diversas
atrocidades, dentre elas as monstruosas execuções e degolamento de Domingos
Ventura e mais cinco pessoas da família do vaqueiro da fazenda Patos, nas
Alagoas, e como requinte final, após cortar as cabeças de suas desventuradas
vítimas, as enviou para a cidade de Piranhas, aonde foram entregues ao prefeito
João Correia Britto. O mesmo acontecendo, já em Sergipe, na fazenda Chafardona,
em Monte Alegre de Sergipe, quando em mais um ato brutal assassinou Sinhozinho
de Néu Militão, cortou a sua cabeça colocando-a em uma gamela e a enviando para
o então povoado de Monte Alegre, por um rapaz chamado Santo e entregá-la ao
cabo Nicolau que ali destacava.
Foi logo após esse crime que Corisco se deslocou até as caatingas da linha
divisória entre Sergipe e Bahia. Existem duas versões sobre o local em que
aconteceu o extraordinário combate travado por João Torquato e Corisco.
O notável historiador Antônio Amaury, em seu livro “Gente de Lampião: Dadá e
Corisco”, no capítulo “Agonia do cangaço”, páginas 113, 114 e 115, seguindo as
acreditáveis informações de Dadá, diz que este confronto entre Corisco e João
Torquato, aconteceu na fazenda “Lagoa da Serra”, residência do coiteiro
Geraldo. Ocorre que João Torquato afirmava convicto que o seu embate com
Corisco se deu em uma fazendinha abandonada chamada “Queimada de Luís”. Está em
muitos livros a história deste confronto. Como se sabe o cangaceiro Guerreiro
foi morto pelas balas do fuzil de João Torquato quando caminhava ao lado de
Dadá e Roxinho pela malhada da fazendinha.
Imaginando que Guerreiro fosse Corisco, João Torquato faz pontaria em seu
corpanzil e dispara a sua mortífera arma. O bandido tomba gravemente ferido.
Não é Corisco é o cangaceiro Guerreiro. Corisco e os que lhe acompanhavam
pensaram ser uma volante. A cabroeira corre e se ampara no paredão de um
tanque. Prepara-se para enfrentar os agressores. Assim pensando, Corisco grita
raivoso:
“- Macacos
covardes! Venham! Vamo brigar. Vocês tão pegados é com Corisco”
Jamais poderia
imaginar que estava sendo atacado apenas por um soldado. João se surpreendeu ao
ouvir aquela possante voz. Pensava que o bandido que havia derrubado na malhada
da fazenda fosse justamente Corisco, mas estava enganado. Os cangaceiros estão
amparados no paredão do tanque. No outro lado do paredão está João Torquato que
os enfrenta como desmedida coragem. Troca tiros com os bandidos. De repente
divisa um cangaceiro que como se fosse uma cobra – e cobra ele era – se arrasta
cautelosamente a sua procura. Sem perda de tempo o “contratado” dispara seu
fuzil e o assecla despenca, rolando em sua direção. O “cabra” é muito jovem.
Mais parece um menino. É Roxinho, o mesmo que estava ao lado de Guerreiro e
Dadá na malhada da fazenda.
O menino é valente. Tenta pegar a sua arma que havia escapado de suas mãos. Não
consegue. João Torquato com o coice de seu fuzil esbagaça a sua cabeça.Temendo
o cerco da volante, assim imaginava Corisco, o mesmo e sua Dadá deixam o
paredão do tanque e procuram a proteção da caatinga. João Torquato grita para o
“Diabo Louro”:
“- Tá correndo
covarde? Num diz que é valente, cabra frouxo. Num corra! Vamo brigar”.
O famoso
alagoano escuta as palavras desafiadoras do soldado. É um valente. Vira-se para
enfrentar a volante. Surpreso se depara apenas com um inimigo. Cadê os outros?
Fica a se indagar por segundos. É a sua perdição. João Torquato aproveita
aquela momentânea indecisão e dispara a sua arma. Naquele dia o filho de seu
Torquato estava totalmente protegido pela sorte. Uma bala atingiu justamente os
dois braços de Corisco deixando-o fora de combate.
O balaço fez com que o fuzil do companheiro de Dadá caísse por terra. Sem
forças para segurá-lo o cangaceiro se desespera e procura se proteger na
mataria. Percebendo a situação do famoso bandoleiro, João Torquato grita
desafiador:
“- Não corra
covarde. Espere pra morrer”.
Mesmo com os braços destroçados Corisco pára. Mostra o quanto é valente. Sabe que irá morrer, mas morrerá como um verdadeiro homem. João Torquato aponta-lhe a sua mortífera arma. Será o fim de um dos mais famosos companheiros de Lampião.
É neste instante tão decisivo que entra em cena a figura de Dadá. Sem temer o
inimigo o enfrenta com inusitada coragem. Nele atira, fazendo-o desviar a sua
atenção em Corisco e ter que trocar tiros com ela. Dadá não pára de atirar.
Atira no feroz inimigo e empurra Corisco na direção de uma baixada protetora
ali nas proximidades. As balas de sua arma se acabam. Eis que numa atitude
gigantesca e inesperada, a companheira de Corisco o defende jogando pedras em
João Torquato, o homem dos olhos grandes e “abotecados” como ela dizia.
Continua empurrando o companheiro. Escorrega e cai. O vingador da morte do pai
sorriu. Apontou-lhe o seu fuzil. Iria matá-la sem piedade. Errou o alvo. Com
raiva se prepara para o segundo tiro. Percebe então que a sua arma estava sem
munição. Enfia uma das mãos no bornal. Tem que recarregar rapidamente o seu
fuzil. Ao retirar a mão do bornal com as balas o nunca esperado aconteceu. Seus
companheiros vinham chegando e sem medir as consequências atiraram justamente
em João Torquato ferindo-o na mão que ele segurava as balas. Os pedidos que
naquela agonia Dadá rogava a Nossa Senhora foram atendidos. Na confusão que
reinou no meio dos da volante, Corisco e sua valente companheira conseguiram se
salvar.
Como se sabe, Corisco deixou esse mundo no dia 25 de maio de 1940, assassinado
pelas armas de Zé Rufino. Baleada, Dadá teve a sua perna amputada.
João Torquato deixou à volante e retornou a sua amada Pia Nova, onde viveu até o final de seus dias. Em 1958 vamos encontrá-lo ao lado de Zé de Julião. (Foto à direita) Havia se tornado um de seus fiéis aliados, naquela famosa disputa política entre o antigo cangaceiro Cajazeira e o seu oponente Artur Moreira de Sá, quando os dois eram candidatos a prefeito de Poço Redondo.

Desesperado com a monstruosa perseguição que lhe movia o governador do Estado, Zé de Julião roubou a urna no dia da eleição, ou seja, em 03 de outubro de 1958, e João Torquato ali estava de arma em punho, pronto para matar ou morrer defendendo um dos antigos “cabras” de Lampião, cangaceiros que ele tanto odiava.
Para conhecer
mais detalhes sobre essa história de sofrimento do povo sertanejo de Poço
Redondo, em especial da família Torquato, leia-se os capítulos “Combate da
Arara – morte de Zepelim”, página 249; “Os cangaceiros se vingam e matam
Torquato e Firmino”, página 259; “A traição se consuma”, página 261; “Um
milagre salva a volante”, página 265; e “A vingança de João Torquato, o filho
de Torquato e o tiroteio com Corisco”, página 273, da terceira edição do
livro “Lampião além da versão – Mentiras e mistérios de Angico”, que se
encontra a venda com professor Pereira, em Cajazeira, na Paraíba. através
do E-mail fplima1956@gmail.com
Ou pelos tels. (83) 99911 8286 (TIM) - 98706 2819 (OI).
Ou ainda:
Alcino Alves Costa
Caipira de Poço Redondo
Sócio da SBEC, Conselheiro Cariri Cangaço
http://lampiaoaceso.blogspot.com/2012/02/encontro-de-gigantes-por-alcino-alves.html
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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