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sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Chôro do Gado

Por: Napoleão Tavares Neves
Jadílson Bin Laden ao lado do Mestre Napoleão Tavares Neves

O gado descia mansamente da planura araripana para as verdes pradarias do sertão, enfastiado do capim agreste da Chapada do Araripe e sedento do verde capim mimoso com que as primeiras chuvas do inverno revestiam as chapadas das fazendas dos sertões do Cariri. Os trovões já reboavam no horizonte chamando o gado para o sertão. E o gado obedece! Era aproximadamente 200 reses. A melodia dos aboios dos vaqueiros era reforçada pelo tintilar dos chocalhos das vacas paridas e amojadas. Tudo muito alegre e sonoro! Na guia do gado ia meu pai, no coice ia eu, adolescente e de cada lado dois vaqueiros evitavam que algumas reses mais ariscas se desgarrassem.

Ao atingirmos o Lambedouro do Mulungú, lugar onde o gado sempre matava a sua carência de sal, lambendo a terra salgada daquele rincão, uma cena para mim inusitada: um touro mestiço do pescoço grosso parou, deu um forte esturro como se fora um grito de guerra, levantou as patas dianteiras e ao baixá-las, retorcia com os chifres as moitas do mato verde e cavava o chão jogando a terra para traz! Instintivamente, todo o rebanho o imitava. Paramos todos! Os vaqueiros deixaram de aboiar! O vaqueiro Zé Feliz, muito místico, levou o chapéu de couro ao peito e parou também.

Esta dolente cena durou alguns segundos ou minutos.

Em seguida, o touro mestiço parou e tomando a frente do gado, começou a caminhar, seguido por todo o rebanho, mostrando que sua liderança era inconteste. Curioso, fui ver a causa de tudo aquilo e boquiaberto, vi que ao pé da moita de mato retorcida pelos chifres do touro estava a ossada de uma rês recentemente morta, ainda com pedaços de couro pregado nos ossos cuja limpeza os urubus de plantão ainda não haviam concluído.

Meus pelos estavam eriçados pela emoção daquela bucólica cena que igual jamais vira antes. A natureza tem os seus mistérios e suas lições! Jamais vira eu os humanos chorarem tão convulsivamente os seus mortos! Eu tinha 13 anos e nunca esqueci até hoje cena tão tocante.

Napoleão Tavares Neves

Barbalha-Ceará

Conselheiro Cariri Cangaço
cariricangaco.blogspot.com

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