Por Rostand Medeiros
Rostand
Medeiros ao lado de Ivanildo Silveira, João de Sousa, Lívio Ferraz, Kiko
Monteiro e Paulo Gastão; no Cariri Cangaço em Crato
Outros Episódios do Ciclo do Cangaço na Fazenda Abóbora...
Pelos muitos
autores que se debruçaram sobre o tema cangaço e pelos relatos da região está
mais que provado a franca convivência entre os membros da família Diniz e os
cangaceiros no seu verdadeiro feudo na Abóbora. Mas no meio desta
história, onde estava o aparato de segurança do estado? Segundo
informações colhidas pelo autor deste artigo, que esteve na região em várias
ocasiões, a polícia frequentava a Fazenda Abóbora, mas o poder dos Diniz era
tal, que os homens da lei tinham que avisar com antecedência que iriam lá.
Daí, no caso
de cangaceiros estarem acoitados na grande gleba, estes eram informados por
Marçal, Marcolino ou alguém de confiança, e seguiam tranquilamente para coitos
nas Serras Comprida, da Pintada, ou da Bernarda, ou nas propriedades
denominadas Xiquexique, Pau Branco, Areias do pelo Sinal e outras. Essa
verdadeira promiscuidade praticamente só vai ter um fim diante da extrema
repercussão do ataque dos cangaceiros a cidade de Sousa, na Paraíba. Ocorrido
na noite de 27 de julho de 1924, o fato logo ganha destaque nas páginas de
vários jornais e assusta as autoridades nas capitais da Paraíba e de
Pernambuco. Em pouco tempo os líderes sertanejos são instados a negarem a
proteção dada aos bandos de cangaceiros. [8]
Theophanes
Ferraz Torres
Tanto assim
que três dias após o assalto a Sousa, ao meio dia, uma força volante sob o
comando do major Theophanes Ferraz Torres, trava um combate contra um grupo de
cangaceiros comandados por Sabino, que foge sem dar prosseguimento à luta.
Certamente Sabino tentava chegar ao seu conhecido “lar” e teve esta
desagradável surpresa. [9] Ao longo do mês de agosto de 1924 vários combates serão
travados na região. Tiroteios nos lugares Areias do Pelo Sinal, Serra do Pau
Ferrado, Tataíra e outros vão marcar a história de luta contra os cangaceiros.
Não havia propriedade que não pudesse ser adentrada e varejada pela
polícia. Mas não seria o fim da presença de cangaceiros no local.
"Diário
de Pernambuco", 4 de agosto de 1926
Em uma pequena
nota existente na página quatro do jornal “Diário de Pernambuco”, edição de
quarta feira, 4 de agosto de 1926, encontramos a informação que por volta
das três horas da tarde do dia 30 de julho, na área da Fazenda Abóbora, foram
mortos pela polícia pernambucana e paisanos, depois de demorado tiroteio, os
cangaceiros Juriti e Vicente da Penha. Juriti era erroneamente apontado pelo
jornal como sendo o comandante de um ataque ocorrido no dia 7 daquele mesmo
mês, a uma casa comercial em Triunfo. No caso o comandante da ação foi Sabino.
O “Coito” do
Coronel José Pereira...
Com o declínio
da ação de cangaceiros na região de Triunfo, discretamente a Fazenda Abóbora
deixa de ser local de combates, mas não deixaria de servir como um ótimo
esconderijo. Em 1930, eclodiu um grave conflito armado na vizinha Paraíba,
mais precisamente no município de Princesa. Entre as origens deste sério
problema, estavam as divergências entre o governador eleito da Paraíba em 1927,
João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, e os coronéis monopolizadores da
economia e política do interior do estado.
João Pessoa
discordava da forma como este grupo político, que o elegera, conduzia a
política paraibana. Entre estes poderosos era valorizado o grande latifúndio de
terras do interior, possuidores de grandes riquezas baseadas no cultivo de
algodão e na pecuária. Estes fazendeiros, como vimos no exemplo de Marçal
Diniz, atuavam através de uma estrutura política arcaica, que se valia entre
outras coisas do mandonismo, da utilização de grupos de jagunços armados, da
conivência com cangaceiros e outras ações as quais o novo governo não
concordava.
Um dos pontos
mais fortes da discórdia era cobrança de taxas de exportação do algodão. Os
ditos coronéis paraibanos exportavam a produção desta malvácia pelo porto do
Recife, causando perdas tributárias para o estado da Paraíba. O governador
estabelece diversos postos de fiscalização nas fronteiras do Estado. Por esse
motivo os coronéis do interior passaram a apelidar João Pessoa de “João Cancela”.
José Pereira
O fazendeiro e líder político José Pereira Lima, mais conhecido como “Coronel
Zé Pereira”, da cidade de Princesa, era o mais poderoso entre todas as
lideranças do latifúndio na sua região. Para muitos ele é descrito como
verdadeiro imperador do oeste da Paraíba, na área da fronteira com o estado de
Pernambuco. Zé Pereira contava com o apoio dos governadores de Pernambuco e do
Rio Grande do Norte, respectivamente Estácio de Albuquerque Coimbra e Juvenal
Lamartine de Faria. Diante do impasse com o governador João Pessoa,
Pereira declarou Princesa “Território Livre”, separando-o do estado da Paraíba,
tornando-o absolutamente autônomo.
A reação do
governo estadual foi pesada e uma verdadeira guerra começou. Princesa se tornou
uma fortaleza inexpugnável, resistindo palmo a palmo ao assédio das milícias
leais ao governador João Pessoa. O exército particular do Coronel José Pereira
era estimado em mais de 1.800 combatentes, onde diversos lutadores eram
egressos das hostes do cangaço e muitos eram desertores da própria polícia
paraibana.
Combatentes da
Guerra de Princesa-Fonte - http:rotamogiana.blogspot.com
A força do
governador João Pessoa possuia cerca de 890 homens, organizados em colunas
volantes. Essas colunas eram chefiadas pelo coronel comandante da Polícia
Militar da Paraíba, Elísio Sobreira, pelo Delegado Geral do Estado, o Dr.
Severino Procópio e José Américo de Almeida (Secretário de Interior e
Justiça). Marçal Florentino Diniz e Marcolino, ligados por parentesco com
José Pereira, se juntam a luta na região. Houve muitos episódios sangrentos na
conhecida Guerra ou Sedição de Princesa.
João Pessoa
assassinado. Estopim da Revolução de 30
Após a morte
do governador João Pessoa, ocorrida em Recife, houve a consequente eclosão da
Revolução de 30 e o conflito em Princesa acabou. Durante os quatro meses e
vinte e oito dias que durou sua resistência, Princesa não foi conquistada pela
polícia paraibana. Após a eclosão da Revolução, as tropas do Exército
Brasileiro, de forma tranquila, ocuparam a cidade.Para muitos pesquisadores
José Pereira Lima organizou de tal maneira a defesa dos seus domínios, que
provocou baixas estrondosas à força pública paraibana.Diante da derrota, José
Pereira e muitos dos que lutaram com ele fugiram da região. A família Diniz se
retraiu diante do novo sistema governamental imposto e a fortuna de Marçal e
Marcolino ficou seriamente comprometida.
O tempo dos
caudilhos do sertão estava chegando ao fim, pelo menos naquele formato
utilizado por Marçal Diniz e José Pereira. José Pereira deixa Princesa no
dia 5 de outubro de 1930 e fica escondido em propriedades de pessoas amigas, em
diversas localidades existentes em outros estados. Segundo o Sr. Antônio Antas,
depois de percorrer vários locais, segundo lhe informou o próprio Marcolino
Diniz, José Pereira passou muito tempo escondido na Fazenda Abóbora, até que em
1934 o novo regime lhe concedeu anistia e ele decidiu permanecer em território
pernambucano.
Antônio Antas,
conviveu quando jovem com Marcolino Diniz, seu parente. Um grande amigo e
memória viva da história de sua região
Mas segundo o Sr. Antônio Antas, a situação na Fazenda Abóbora não foi fácil. Um ano depois da anistia, por ordens de Agamenon Magalhães, então Interventor Federal em Pernambuco, a polícia estadual cerca a Fazenda Abóbora. José Pereira escapa, volta a Princesa e recebe garantias dos líderes estaduais paraibanos.
Rostand
Medeiros, pesquisador e escritor
Fonte: tokdehistoria.com
Fonte: tokdehistoria.com
[8] Sobre o ataque a Sousa ver o livro “Vingança, Não”, de Francisco Pereira Nóbrega.
[9] Sobre este combate ver “Pernambuco no tempo do Cangaço –
Theophanes Ferraz Torres, um bravo militar (2 volumes)”, de Geraldo Ferraz
de Sá Torres Filho, págs. 379 e 380.
http://cariricangaco.blogspot.com.br/2014/12/a-lendaria-fazenda-aboboras-parte-2-por.html
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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