Por Beto Rueda
Nas terras do
sítio Ipueira, próximo a Mata Grande, Alagoas, era o abrigo do pacato lavrador
e famoso vaqueiro Jorge Horácio e sua família.
O filho do vaqueiro, João Horáci, menino alegre de nove anos, brincando pelos matos do sítio, com um bodoque nas mãos para caçar passarinhos, encontrou-se de repente com um grupo de homens estranhos e com trajes diferentes dos que habitualmente via. Era Lampião e seus cabras.
O cangaceiro trazia amarrado um bode e perguntou ao menino se ele conhecia alguém que sabia matar e cozinhar o bode depressa. O menino respondeu que sabia, e que era o seu pai.
Foram até a casa do sítio e o chefe dos cangaceiros chamou Jorge Horário, falou o que queria e retirou-se para o mato afim de ficar esperando a encomenda.
O vaqueiro já tinha morto e picado o caprino quando chegou uma comadre sua, Ana Rosa, que tinha fama de ser muito faladeira.
Ela ajudou a assar os pedaços e no prazo determinado por Lampião, dois cangaceiros foram buscar a comida. Ana Rosa curiosa, ficou observando os visitantes com olhos espantados e de segundas intenções...
Jorge Horácio que conhecia bem a fama de fofoqueira da mulher e com medo de ser denunciado como coiteiro, como não quer nada, deixou a residência e foi até onde os cangaceiros comiam e contou a sua preocupação para o comandante.
Este escreveu um bilhete para a mulher dizendo que se ela contasse o que viu, teria os olhos arrancados. Não falasse a ninguém sobre a parada do grupo no sítio Ipueira.
Pouco tempo depois, Ana Rosa não conteve os seus instintos, despediu-se do pessoal da casa e foi direto... à polícia de Mata Grande e contou tudo.
Ali, na casa do sítio, as volantes às vezes acampavam até por uma semana. Ficavam descansando, comendo à tripa forra, aproveitavam bem e não pagavam um tostão sequer.
Jorge Horário ainda muito cismado com o acontecido e prevendo o pior, resolveu esconder-se num serrote próximo dali, da Mina Grande. Antes passou na casa do irmão José e contou tudo o que acontecera, combinou com o irmão para levar-lhe comida e dar notícias do que ocorresse.
Já fazia três meses que Jorge Horácio estava escondido no serrote da Mina Grande, longe da mulher Bela Tiete e dos filhos; o irmão levando os alimentos e contando as novidades.
Foi então que uma volante policial de Inhapi veio até a casa de José Horácio, seu irmão. O comandante disse ao dono da casa, com maus modos, que tinha que dar conta do lugar onde estava Jorge, senão sua esposa e a filharada iriam sofrer tudo o que estava reservado ao fugitivo.
José negou ao comandante que soubesse onde ele se encontrava.
Subiu o serrote e contou ao irmão que a volante estava na sua casa e tinha o ameaçado, bem como toda a sua família.
O vaqueiro Jorge Horácio, homem honesto, sabia da desgraça que podia acontecer à cunhada, aos sobrinhos e ao próprio irmão, resolveu entrega-se ao comandante.
Ao chegar em casa com José, qual não foi a sua surpresa: os policiais volantes em tom de ironia o cumprimentaram, e o comandante disse que ele apenas iria prestar esclarecimentos às autoridades.
Todos montaram e dirigiram-se para a sede da força em Inhapi, cinco léguas de distância.
No meio do caminho o cruel comandante mandou alguns soldados cortarem uns paus de catingueira e baterem nas pernas do preso. Deram pra valer, sem dó nem piedade.
Quando chegaram na cidade mandaram buscar o menino João Horácio, aquele que estava caçando quando encontrou os cangaceiros com o bode.
O menino chegou ao quartel e os soldados começaram a espancá-lo.
Batiam, o menino chorava e gritava tanto que as famílias vizinhas ao local, começaram a fechar as janelas e as portas das casas para não ouvirem.
Soltaram o garoto todo arrebentado e começaram a bater no pai. Batiam no corpo, chutavam a cabeça, pulavam em cima da barriga e Jorge Horácio pedia para que o matassem, mas que não judiassem assim.
Os soldados respondiam que não queriam matar, que era só para machucar, que coiteiro precisava era disso, e outras frases de ameaças.
Ao ser solto, depois de muito apanhar, montou no animal e foi direto para a casa do irmão.
Não teve forças nem para desmontar, tiveram que tirá-lo de cima e carregá-lo para a cama.
Sua mulher Bela Tiete foi avisada e foi visitar o marido semi morto. Pensaram que não escaparia pelo castigo sofrido.
Ficou em tratamento por quase quatro meses, só pensando nas humilhações que sofreu.
Um dia qualquer, uma fita de luz começava a clarear o horizonte, não aguentando as lembranças do acontecido, confessou à esposa que iria partir e unir-se ao bando dos cangaceiros para vinga-se dos soldados.
Foi juntar-se ao grupo de Corisco e foi numa quinta-feira, por isso passou a ser conhecido por esse apelido. Acabou, posteriormente, ficando sob as ordens de Lampião.
O destino trágico do lavrador pacato, vaqueiro destemido e cangaceiro valente Quinta-Feira, teve fim no dia 28 de julho de 1938, no coito de Angico, Sergipe.
REFERÊNCIAS:
ARAÚJO,
Antônio Amaury Corrêa de. Lampião, as mulheres e o cangaço. São Paulo: Traço
Editora, 2012.
ARAÚJO,
Antônio Amaury Corrêa de. Assim morreu Lampião. São Paulo: Traço Editora, 2013.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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