*Rangel Alves da Costa
Junho é o mês dos três santos festeiros: Santo Antônio, comemorado no dia 13; São João, festejado no dia 24; e São Pedro, celebrado no dia 29. Juntos, os três santos juninos acendem fogueiras, esquentam namoros, soltam balões e rojões, oferecem pamonha e quentão, puxam o fole do forró, tornam o mês numa festa só.
Dentre os três santos, inegavelmente que São João é o mais famoso, sendo mesmo todo o período mais conhecido como o mês das festas joaninas. Pelo Nordeste e sertões, falar em festa junina sempre remete a São João, com tal designação servindo até para os demais festejos. Daí que o junino é joanino e todo o mês de junho é São João.
Na alma nordestina e também no espírito sertanejo, não há alento maior que a aproximação e chegada do mês junino. Há uma expectativa tamanha que antes mesmo da chegada do mês, muitos já se programam para os festejos de mais adiante. Então logo a proclamação de ser o melhor mês do ano, pois o mais festeiro, o mais animado, o mais romanticamente esperançoso, o mais devotado às danças, às comidas e bebidas.
A noção que sempre se tem é de um mês como um imenso arraial, com fogueiras acesas, com forrós por todos os lugares, com fogos riscando os céus, com chinelados pelos salões festeiros, com animações de não acabar mais. Também como um mês de muita comida de coco, muita bebida típica, muito de tudo e tudo muito. Uma noção de um mês pertencente de modo exclusivo ao povo nordestino e mais precisamente ao sertanejo.
Noutros tempos, a idealização junina que se tem hoje era traduzida em realidade, e de modo muito diferente do que atualmente se tem como festejos juninos. A começar pelos autênticos forrós. Nada de banda de forró ou de cantor de forró, mas de sanfoneiro mesmo, sempre acompanhado do triângulo, zabumba e pandeiro. Nada de forró romantizado ou eletrônico, mas ao som do fole, do chinelado pela sala de reboco e do suor respingando pelas roupas de chita e camisas listradas.
Noites antigas de fogueiras acesas por todo lugar, de roda de amigos ao redor das labaredas e das mãos ajeitando espetos sobre as brasas vivas. Cheiro de milho, cheiro de coco, de cravo e canela. Um cheiro de pinga da boa e de fumaça dos fogos subindo aos ares. Balões enfeitando as noites, chuvinhas alegrando a meninada, traques jogados debaixo das saias, bombas, bombinhas e foguetes, ecoando nas noites matutas. E quanta pamonha, canjica, arroz-doce, pé-de-moleque, queijo cru e queijo assado, bolo de milho, licor, quentão, cachaça e vinho de jurubeba. E as pessoas dando as mãos para o batismo da fogueira e para de cima das chamas saírem como compadres e comadres.
Se não havia salão forrozeiro por perto, então da vitrola se ouvia o Trio Nordestino: “Já é madrugada, até agora nada meu bem não aparece. Aqui tudo mudou, cadê meu amor ai se eu pudesse. Eu saía chorando, pela rua gritando, cadê São João? Pra que tanta fogueira, se pra mim a noite inteira vai ser grande a solidão. Pra que tanta fogueira, se pra mim a noite inteira. Vai ser grande a solidão. É noite de São João, quase amanhecendo o dia. É madrugada e não vem, quem tanto eu queria...”.
Contudo, a autenticidade junina foi sendo transmudada no passar dos anos. Rarearam as fogueiras, os casamentos caipiras, as quadrilhas matutas, as reuniões familiares e amigueiras ao redor das chamas abrasadas, e principalmente os forrós pé-de-serra ou qualquer forró de raiz. Agora se tem o festejo junino quase como uma festa qualquer, sem o tradicionalismo de antes nem com a preservação dos folguedos e brincadeiras próprios da época.
O que se percebe, infelizmente, é que a devoção junina da moçada de hoje é muito mais pela festança em si do que mesmo pelas belezas sublimes tão presentes na época. A prova disso é que se colocar um forró autenticamente sertanejo numa praça de eventos, poucos serão os presentes. Mas se disser que é um Xande ou um Esticado da vida, certamente que o espaço não caberá de tanta gente. Igualmente, entre um Trio Nordestino e um paredão, será ao redor deste que os jovens estarão.
Mas de qualquer modo é São João. Mesmo ao avesso, é São João. E de vez em quando surge uma espiga de milho, um copo de arroz-doce, um prato de canjica. E uma saudade danada com cravo, canela e gosto de coco.
Escritor
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