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sábado, 4 de abril de 2020

UM CIVILIZADOR NO CARIRI - PARTE I


Por Bruno Yacub Sampaio Cabral

Para lembrarmos dos 80 anos de falecimento do primeiro chefe político e o gestor municipal de maior duração na história de Brejo Santo, A Munganga Promoção Cultural disponibiliza para os leitores, o texto "Um Civilizador no Cariri", de autoria do Padre Antônio Gomes de Araújo e publicado na revista A Província; Ano 3; N° 3; em 7 de julho de 1955; Crato - Ceará; págs. 127 a 146. O texto será dividido em três partes.

CORONEL BASÍLIO GOMES DA SILVA
80 ANOS DE FALECIMENTO

08.04.1940
08.04.2020

UM CIVILIZADOR NO CARIRI
PARTE UM

(À memória de Victor José Modesto cofundador da cidade pernambucana de Araripina)

Por Padre Antônio Gomes de Araújo

…a vida conspícua de um varão sintetiza tudo quanto há de mais grandioso e edificante, através da história da humanidade. Mário Linhares (In Rev. da Academia Cearense de Letras, fls. 31 – 1954).

Cel. Basílio, que por muitos anos ocupou ali (em Brejo dos Santos) o mesmo cargo (de prefeito municipal) na quadra mais terrível por que tem passado o sul do Estado nas suas frequentes mutações políticas, imprimindo tão honesta, pacífica e segura orientação, que conquistou para aquela localidade o título de “Seio de Abraão”. O Araripe, 11-10-1919 (Crato, Ceará), de José Alves de Figueiredo, jornalista e poeta.


O venerando coronel Basílio Gomes da Silva, foi uma das figuras de mais relevo, de mais larga projeção, de atuação mais acentuada, na vida pública desta região, mormente em seus períodos mais agitados. Brejo dos Santos isolava-se em meio às tormentas que batiam de todos os lados, como um oásis de paz, de bem estar e segurança, graças à ação prudente e pacifica de seu ilustre chefe que era, com justiça, tido naquela cidade como o patriarca da terra. Padre Leopoldo Fernandes, "Basílio Gomes da Silva", pgs. 1 e 2, Tip. Mainha, Crato-Ceará, 1940.

O CENÁRIO

O brejo, em cuja orla ergue-se a atual cidade cearense de Brejo Santo, sede do município caririense de idêntico nome, foi, em seus primórdios e ao longo de muitos anos, o coração da fazenda "Brejo", e, ao que parece, o núcleo social, primeiro, daquela comuna, á qual deu o seu nome, depois acrescido de "Santos" apelativo de antigos donos da fazenda "Nascença”, limítrofe de sua congênere, mencionada.

Embora uma tradição de 240 anos, oral e escrita, atribua á viúva baiana, Maria Barbosa, o título de pioneira do senhorio das citadas fazendas, recebidas em datas de sesmaria; apesar de o alagoano, tenente coronel Antônio Mendes Lobato e Lira, haver conseguido em 28.01.1714, terras na região, no "'Brejo da Barbosa", não obstante estes fatos ponderáveis, em verdade o véu de certa obscuridade envolve, ainda, os cinquenta primeiros anos da vida histórica das mesmas fazendas, células matrizes da cidade brejo-santense.

É historicamente certo, entretanto, que, em 1769, a fazenda “Brejo” era propriedade do casal baiano-caririense, aí, domiciliado, Francisco Pereira Lima - Teodora Maria da Conceição, sendo, ela, filha legítima dos baianos, alferes Gonçalo Coelho de Sampaio e s. m. Lourença Barbosa de Melo, troncos, neste Cariri, dos Sampaio, dos Coelho, e dos Correia, de Barbalha e Jardim, e ascendentes dos descendentes de Basílio Gomes da Silva, de Brejo Santo, entre os quais sou numerado.

Falecidos em datas diferentes, Francisco Pereira Lima e Teodora Maria da Conceição legaram a fazenda "Brejo", inteiriça, a seus filhos, cuja descendência a vendeu, retalhadamente, no curso de todo o século passado, acontecendo que uma parte coube ao alvo deste trabalho, Basílio Gomes da Silva, pelo casamento contraído, 1869, com Maria da Conceição de Jesus, trineta daquele casal patriarcal.

Configurando dentro na região nordestina em que surgiu e medrou uma civilização curraleira, e projeção dela no Cariri - o território atual do município de Brejo Santo constituiu-se numa vasta paisagem pastoril de extensas fazendas de gado vacum, durante os séculos 18 e 19, restringindo-se, a agricultura, ao consumo local.

Na sexta década do último século, referido, resumiam a aristocracia local, entre outros: os Pereira Lima, ramos do citado Francisco Pereira Lima; os Pereira de Lucena e os Alves de Moura, originários da Paraíba; os Martins, procedentes de Portugal na pessoa de seu tronco, Bartolomeu Martins de Morais; os Cardoso, de Barbalha, Ceará; os Sá Batinga, vindos de Cabrobó, Pernambuco; os Gomes da Silva, alguns portando o sobrenome – Bezerra - mas todos pertencentes ao mesmo clã parental, fundado pelo português Manuel Gomes da Silva, emigrados do município pernambucano de Águas Belas.

Nos poucos, pouquíssimos latifúndios pastoris, que cobriam a região, agitava-se uma população rarefeita, constituída de assalariados, meieiros e rendeiros, gente humilde, mas heroica.

Nenhuma instrução havia, nem aglomerado humano ou urbano. O centro religioso e civil estava em Jardim, de cujo município e paróquia dependia esse rincão caririense.

O brejo do sitio "Brejo" destinava-se, logicamente para o centro urbano, religioso e político da terra, consideradas suas aguadas perenes, as quais ofereciam pouso obrigatório, ponto de cruzamento, que era, e é, das estradas que, do sertão pernambucano e de Jardim, conduziam às zonas dos rios Salgado e Jaguaribe, e S. João do Rio do Peixe na Paraíba. A Transnordestina incide sobre a 1ª, estrada.

Pelo curso do ano de 1858, na área da atual cidade de Brejo Santo, recortavam-se os perfis de duas casas apenas, o prédio - logradouro dum curral de gado bovino, de propriedade do coronel Aristides Cardoso dos Santos, e a vivenda de Antonio José de Sousa e sua esposa Senhorinha Pereira Lima, bisneta do aludido patriarca do sítio "Brejo", Francisco Pereira Lima. Antonio e Senhorinha casariam sua filha, Maria da Conceição de Jesus, com Basílio Gomes da Silva, conforme já escrevi.

NO SÍTIO "BREJO"

Nesse cenário e naquele ano, Basílio Gomes da Silva, aos 12 de idade - nascera, 14 de julho de 1846, na vila pernambucana de Águas Belas, surgiu na companhia de seus pais, os pernambucanos José Francisco da Silva, de Buíque, Ana Gomes da Silva, também de Águas Belas, Ana foi filha do casal luso-baiano, Manuel Gomes da Silva - Cândida da Rocha Pita, filha, por sua vez, de outro casal luso-baiano, capitão-mor João da Rocha Pita - Cândida da Rocha Pita, senhores na segunda metade do século 18, de extenso latifúndio pastoril em Baixa-Verde, atualmente Triunfo, no Estado de Pernambuco.

Ana Gomes da Silva, mãe de Basílio Gomes, faleceu em 08.06.1859, como mostra o Livro de Registro de Óbitos da paróquia de Missão Velha, 1851 - 1859, fls. 171 verso. A mãe de Basílio Gomes da Silva está sepultada na Matriz de Milagres - CE. — em Brejo Santo.

Ana Gomes da Silva, mãe de Basílio Gomes, faleceu em 08.06.1859, como mostra o Livro de Registro de Óbitos da paróquia de Missão Velha, 1851 - 1859, fls. 171 verso. A mãe de Basílio Gomes da Silva está sepultada na Matriz de Milagres - CE.

Acompanharam Basílio Gomes, seus irmãos, dos quais era o benjamim: Antônio Gomes da Silva Bastos, Lourenço Gomes da Silva, Luzia Gomes da Silva, Víctor José Modesto e Inácio Gomes da Silva. Exclusão feita dos dois últimos, tendo, Inácio, voltado a Águas Belas, onde fundou numerosa descendência, e Victor, se retirado para Pernambuco, e, no sítio São Gonçalo de Sanhem, lançado uma das raizes sociais da atual Araripina, exclusão feita, dos dois últimos, repito, Basílio Gomes, e os outros imigrados, seus irmãos, fixaram-se definitivamente á margem do brejo da fazenda “Brejo”, sob a direção do pai.

A Basílio Gomes e irmãos, logo se vieram juntar, vindos igualmente de Águas Belas, donde eram naturais, alguns primos, filhos de sua tia materna, Joana Maria Gomes Cavalcante, casada com o pernambucano Inácio Gonçalves Bezerra, o “Inacinho”, que acompanhou os filhos, todos adultos. Foram eles: João Gomes da Silva, bisavô meu e do deputado José Napoleão de Araújo; Manuel Inácio Bezerra; Joaquim Gomes da Silva Torres; Carlota Maria Gomes; Félix Inácio Bezerra e Antonio Inácio Bezerra. Deixaram em, Pernambuco quatro irmãos casados. Alguns de seus descendentes vieram, em seguida, estabelecer-se, por igual, no então Brejo dos Santos. Designo, nominalmente, os quatro: Cândida Gomes Silva, c. c. João de Barros Cavalcante; Maria Francisca Gomes da Silva, c. c. o alferes José Pereira Nunes, avós do farmacêutico pioneiro de Brejo Santo, João Anselmo e Silva, pai do tenente Otacílio Anselmo; Luzia Inácio Bezerra, c. c. em primeiras núpcias com Antônio Nunes Barreto; Ponciana Maria Bezerra, que foi casada e deixou prole.

Basílio Gomes, seus irmãos e primos constituíram famílias numerosas em Brejo Santo, de que são co-construtores respeitáveis,

Dessa maneira, os descendentes de Manuel Gomes da Silva e Cândida da Rocha Pita, em breve se converteriam num poderoso clã parental na nova terra que adotaram por pátria, clã sempre reforçado pela inclusão de novas famílias através de uniões matrimoniais. Por exemplo: com os Lucena, os Alves de Moura, os Araújo Lima e os Leite Rabelo.

O clã de consanguíneos e afins, assim estruturado no campo social, assumiria o caráter de incontrastável força política local, se surgisse uma têmpera de chefe que lhe imprimisse unidade sólida e direção segura.

Basílio Gomes da Silva seria o chefe social e político desse clã, posição que lhe conquistou, com justiça, o título de Patriarca de Brejo dos Santos, na expressão do padre Leopoldo Fernandes.

INICIAÇÃO POLÍTICA

Como já foi escrito, Basílio Gomes matrimoniou-se no ano de 1869 com a jovem Maria da Conceição de Jesus, filha, neta, bisneta, tataraneta respectivamente de Antônio José de Sousa, Antônio Pereira Lima, tenente João José Moreira Guimarães, Francisco Pereira Lima e alferes Gonçalo Coelho de Sampaio. Maria da Conceição, ou dona Conceição, como era conhecida, seria a companheira ideal de Basílio Gomes, até 1919, quando faleceu, depois de lhe dar 11 filhos dos quais formaram-se por seu turno, troncos de famílias numerosas.

Já, então, Basílio Gomes começava a impor-se ao meio pela circunspecção, a palavra sóbria, o juízo exato, a mentalidade aberta, o empreendimento e realização largos, a energia temperada, o ímpeto progressista, a iniciativa fecunda, a inflexibilidade de caráter, o faro da realidade, a perspicácia, a maleabilidade no trato com os homens, o poder catalizador, a bondade nata, a decisão ponderada, o poder de direção, a aversão à violência e o apego intransigente ás soluções pacíficas.

Em 1864, os principais da terra constituíram-no seu representante junto aos políticos de Jardim, e estes, a ele, seu cabo eleitoral, no sítio “Brejo”.

Nessa ocasião, ele inscreveu-se no Partido Conservador, fato decisivo em sua vida de homem público, pois, desde então, foi o chefe político de Brejo Santo até 1920, 16 anos á frente do poder executivo municipal.

TEMPLO E POVOAÇÃO

Basílio Gomes da Silva criou o complexo da grandeza de seu rincão adotivo. Afora o sentimento religioso, que ele possuía, profundo, a experiência lhe falava da influência social dos templos na gênese das povoações. Por motivo religioso e político, conseguiu, á frente de um grupo de amigos, do então vigário de Jardim, padre Joaquim de Sá Barreto, parente de sua esposa, a presença do padre Ibiapina na fazenda Brejo, quando esse Apóstolo do Nordeste missionava em Porteiras e Goianinha (Jamacarú).

No curso das pregações Ibiapina traçou os limites e lançou a pedra fundamental dum templo dedicado ao Coração de Jesus, templo em torno do qual se formaria a futura cidade.

Basílio Gomes inspirou atividades e estimulou esforços, dirigidos no sentido da construção da modesta capela, fadada a converter-se em ampla matriz, cujo patrimônio foi oferecido por Francisco Alves de Moura, que Basílio Gomes fizera sogro de seu irmão, o citado Lourenço Gomes. E foi além. Criou a mentalidade da construção de residências em derredor do templo, mentalidade urbanista. Orientou alinhamentos. Diante de seu dinamismo e olhos progressistas, começou a surgir o casario. Era a povoação.

O DISTRITO

Basílio Gomes, por si e pelos do Brejo dos Santos, agiu sobre os políticos de Jardim com o fim de obter, para terra, os foros de distrito. Satisfeita a pretensão, no mesmo ano ele assumiu a chefia politica da nova circunscrição municipal cabendo, as funções policiais, a um seu irmão o mencionado Víctor José Modesto.

A FREGUESIA

Basílio Gomes cooperou indireta e superiormente para a criação da freguesia de Brejo Santo.

No primeiro semestre daquele ano de 1875, d. Antonio Luiz dos Santos, primeiro bispo desta província, encontrava-se nesta cidade de Crato, empenhado na construção do prédio do seminário, que hoje branqueja a cavaleiro de nossa urbe, como um marco, quase secular, de superior civilização no Cariri. Basílio Gomes lançou a ideia da criação da paróquia, entre os brejo-santenses qualificados, e encabeçou o apelo escrito, que, neste sentido, e com a aprovação previa do vigário de Jardim, foi dirigido ao ilustre Antíste por intermédio do referido pároco, que se fez patrono dos peticionários. Entre outros, assinaram o documento: coronel Francisco Alves de Moura, Francisco de Sá Batinga, capitão Francisco Pereira de Lucena, João Gomes da Silva, Joaquim Gomes da Silva Torres, Antonio Gomes da Silva Bastos, Manuel Inácio Bezerra e Antônio Silião Bispo.

Resultado positivo, pois a Lei Provincial número 1708, de 25 de julho do ano de 1876, criou a freguesia e lhe traçou os limites, destacando-a das paróquias de Milagres e Jardim. E, dela, tomou posse, seu primeiro vigário, 02.09.1877, o padre Francisco Lopes Abath, de ilustre família cratense e tio materno do honrado Teopisto Abath, residente nesta cidade.

O vigário era pobre. A freguesia, pobre também, começava a sofrer os terríveis efeitos da que seca, que se prolongaria até 1879, acompanhada de incursões dos grupos dos bandidos dos Quirinos, dos Calangros e outros, frequentes na nova paróquia, cuja escrita acusou, no ano de 1878, 126 batizados e 16 casamentos.

Em 1884, escrevia o pároco padre Abath que aquela seca e os bandidos haviam despovoado bastante a freguesia, reduzindo o povoado de Porteiras a oito habitantes.

Durante os três anos secos, e o seguinte, 1880, Basílio Gomes organizou e dirigiu um bloco de pessoas generosas que mantiveram economicamente o vigário, ou melhor, auxiliaram-no.

Cinco anos depois da mencionada crise, o padre Belarmino Gomes de Sousa, achou-se em Brejo dos Santos, secretariando d. Joaquim José Vieira, sucessor do dito d. Luiz Antônio dos Santos, e, em quem, aquela paróquia contemplava. Pela vez primeira, um príncipe da Igreja, o qual permaneceu ali, dois dias, de 29 a 30 de julho de 1884. O secretário escreveu: "Chegamos nesta paróquia na manhã de 29 de julho. Aí encontramos uma população pobre, mas prendada dos melhores predicados, convicta e animada para as nobres conquistas do trabalho, de que vive na confiança de seus perseverantes esforços. Não obstante batida pelos bandos de sicários que no triênio da seca devastaram aquele e outros lugares, do que encontramos vestígios, a população de Brejo é bastante valorosa e resignada na história que conta de seus infortúnios.

A casa que nos deram, em falta de outra, para hospedagem, foi a que serviu de trincheira de um dos grupos facinorosos, que sustentaram um tiroteio com outro grupo; não menos insolente, que disputava a posse do lugar”.

VILA

Monarquista, Basílio Gomes dirigia, em Brejo Santo, a secção distrital do Partido Conservador, em nome dos chefes municipais de Jardim, como se disse. Como distintivo partidário, conservava a barba, que lhe era breve, uso com que transitou. Sem mais esse simbolismo, para o regime republicano, a manteve até a sepultura.

O trânsito para a nova ordem instaurada no País em 15 de novembro de 1889 fê-lo, Basílio Gomes, sobretudo ao influxo da nítida compreensão do fato consumado, e tocado de acentuado civismo e olhos postos na grandeza de sua gleba. Mas, surpreendida a oportunidade, não aderiu sem explorá-la superiormente em beneficio de seu distrito, exigindo em compensação, a sua elevação à categoria Vila. Já, então, Brejo Santo era parte do município de Porteiras, há pouco tempo, criado.

A aspiração e esforços do chefe político brejo-santense concretizaram-se nos termos do decreto número 49 de 26 de agosto de 1890, de autoria do Governador do Estado coronel Luiz Antônio Ferraz, que, nessa data e por esse decreto, criou a Vila de Brejo dos Santos.

Continua.

O Brejo é Isso!

Por Bruno Yacub Sampaio Cabral

A Munganga Promoção Cultural

Extraído do texto "Um Civilizador do Cariri"; do Padre Antônio Gomes de Araújo; publicado na revista A Província; Ano 3; N° 3; em 7 de julho de 1955; Crato - Ceará; págs. 127 a 146.

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