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sexta-feira, 30 de maio de 2014

EXEMPLO DE DESCASO COM O PATRIMÔNIO HISTÓRICO FERROVIÁRIO DO RN

Publicado em 29/05/2014 por Rostand Medeiros

Rostand Medeiros

Mês passado viajei para a Região Central do Rio Grande do Norte, por onde não circulava já fazia um tempo. Este setor do meu estado eu conheço desde década de 80 do século passado, quando para ali seguia com a intenção de prestigiar ótimas festas de vaquejada. Nestes caminhos em busca do esporte dos vaqueiros nordestinos, muitas vezes passei pelo município de Pedro Avelino.

Atual estado da antiga estação ferroviária de Pedro Avelino, Rio Grande do Norte – Foto – Rostand Medeiros

Quando transitava por esta localidade sertaneja sempre me chamou atenção sua antiga estação ferroviária, localizada as margens da estrada que segue para a cidade de Afonso Bezerra. Algumas vezes parei para comtemplar aquela estação simples, mas interessante na sua estrutura. Infelizmente nestas ocasiões não estava com uma antiga máquina fotográfica de rolo para registrar a beleza típica e simples daquele local.

Foto – Rostand Medeiros

Hoje Pedro Avelino é uma cidade com pouco mais de 7.000 habitantes, foi emancipada do município de Angicos pelo Decreto Estadual nº 146, em 23 de dezembro de 1948, na época do governador José Varela. Mas na segunda década do século passado o esta cidade se chamava Gaspar Lopes e assim permaneceu até o ano de  1921. Com a chegada da ferrovia seus habitantes decidiram alterar o nome da localidade para Epitácio Pessoa, em homenagem ao então Presidente da República, paraibano da cidade de Umbuzeiro, Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa. Ele foi o homem que liberou a verba para o ramal da Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte – EFCRN, ligando a pequena localidade a outras regiões do Estado.

E não seria só a alteração do nome original do lugar que ocorreria em decorrência da chegada dos caminhos de ferro. Basicamente o desenvolvimento de Pedro Avelino se deve a passagem da ferrovia por seu território e a velha estação é o símbolo maior desta história.

Os Trilhos de Ouro

A Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte era conhecida como “trilhos de ouro”, pois grande parte da riqueza econômica potiguar era por ela transportada e a inauguração da estação de Epitácio Pessoa não foi um fato qualquer. Na edição do jornal natalense “A República”, do dia 10 de janeiro daquele ano, temos com grande destaque a informação que a estação começou a funcionar em um domingo, dia 8 de janeiro de 1922. Mas o evento começou ainda na Gare da EFCRN em Natal, às oito horas de uma manhã ensolarada, com a partida de um trem expresso especial em direção a nova estação. Na composição seguiram o então governador potiguar Antônio de Souza, o vice-governador Henrique Castriciano, o chefe de polícia Sebastião Fernandes, o desembargador Hemetério Fernandes, o juiz seccional Teotônio Freire, muitas outras autoridades e a banda de música do Batalhão de Segurança, que ao longo do trajeto foi tocando para animar os presentes. Tudo foi organizado por João Benevides, o diretor da Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte.


O trem especial seguiu por Pureza e Taipu, realizando uma parada as 10:45 na pequena povoação de Baixa Verde, atual município de João Câmara. Ali, na pousada de Getúlio Costa, ocorreu o almoço dos viajantes. Depois a comitiva saiu pelas poucas ruas do lugarejo, indo visitar a feira da cidade, que na época ocorria em um grande barracão.

Na sequência da viagem o trem passou por Jardim, atual Jardim de Angicos, onde embarcou o coronel Miguel Teixeira, sua esposa e filhos. Vale ressaltar que a mulher do coronel era Luiza Alzira Soriano Teixeira, que em 1928 seria eleita a primeira prefeita no Brasil, justamente na cidade de Lajes, onde o trem especial realizou a última parada antes do seu destino.

Estação ferroviária de Lajes – Fonte – http://lajesnewsrn.blogspot.com.br/

Na sequência do trajeto as amareladas páginas do jornal “A República” informam que, mesmo visto a distância, deslumbrou a todos a majestade e imponência do Pico do Cabugi, certamente o mais representativo acidente geográfico do Rio Grande do Norte.

Ao redor da nova estação de Epitácio Pessoa estava uma grande multidão. Veio gente montado em alimárias desde Angicos, Carapebas (atual Afonso Bezerra) e até de Macau. Ricos, pobres, fazendeiros, trabalhadores rurais, vaqueiros com chapéus, toda gente da região estava presente para ver a chegada da máquina de ferro. Eram três e meia da tarde quando o trem chegou apitando ruidosamente. Girandolas com potentes fogos de artificio estouravam no céu, vivas foram erguidos aos visitantes que partiram da capital. Primeiro desceu a banda para tocar hinos, marchas e dobrados, depois a comitiva.

Postal antigo que mostra uma locomotiva alemã que foi importada para o Rio Grande do Norte e utilizada pela Estrada de Ferro Central do Rio Grande do Norte – EFCRN a partir de 1915. Certamente esta antiga máquina passou pela estação de Epitácio Pessoal, atual Pedro Avelino

Na estação, pelos informes do velho jornal, durante a cerimônia ocorrida há 93 anos, o que não faltou foram discursos e homenagens, principalmente para o então Presidente da Republica. Pela comunidade falou Luiz Tassino de Menezes, enaltecendo a importância da chegada dos trilhos, do trem e da estação para a economia e desenvolvimento local. Fotos foram batidas pelo tenente João Galvão. Simbolicamente a chave da nova estação foi entregue ao encarregado do local, Antenor Brandão. Após os discursos, a comitiva, a banda de música e o povão foram caminhando até o povoado, que na época ficava a 300 metros de distancia da estação (hoje a área urbana cerca o prédio semidestruído).
Eram cinco da tarde quando o trem partiu com a comitiva para Baixa Verde, onde todos pernoitaram. Só chegaram a Natal às nove da manhã da segunda feira.

O povoado de Epitácio Pessoa passou a presenciar um forte desenvolvimento, tanto na agricultura, quanto no comércio.  Com o crescimento, no ano de 1938, o lugarejo foi elevado a distrito e dez anos depois se desmembrou de Angicos. Pela terceira vez a pequena urbe teve seu nome alterado, passando a chamar-se Pedro Avelino, numa homenagem prestada ao jornalista Pedro Celestino Costa Avelino.

Descaso

Infelizmente eu soube a poucos anos que a velha estação estava abandonada e se deteriorando. Mas em 2013 foi anunciada por parte do Governo Federal a liberação do prédio para a prefeitura de Pedro Avelino. Inclusive havia sido empenhado, desde o dia 25 de outubro de 2013, recursos da ordem de R$ 341.250,00, oriundos de uma emenda parlamentar do deputado federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), junto ao Ministério do Turismo, para transformar o velho prédio em um Centro de Cultural (Ver –http://www.aguasdemare.com.br/pedro-avelino-municipio-consegue-predio-da-estacao-ferroviaria-e-transformara-em-centro-de-cultura/ ).

Detalhe da antiga estação – Foto – Rostand Medeiros

Maravilha! Fantástico! Pois a recuperação das antigas estações ferroviárias potiguares é de fundamental importância para a ampliação da memória histórica das comunidades que se desenvolveram ao redor destes locais. Fruto da movimentação proporcionada pelo transporte de pessoas e mercadorias ao longo dos trilhos e por várias décadas.

Esperava que ao passar pelo local encontrasse a tradicional estação renovada no seu esplendor. Mês passado refiz este caminho. Mas aí o que ocorreu foi uma triste surpresa!

A estação está em situação deplorável, uma chuva mais forte e ela pode vir ao chão! Uma parte do teto já veio abaixo, no entorno o mato vai crescendo, existe algum lixo doméstico e o descaso é nítido. Tudo contrasta com a beleza simples da edificação que já tinha visto anteriormente. Uma lástima!

Por uma questão de justiça posso comentar que esta situação ocorre na antiga estação de Pedro Avelino não é exclusiva desta cidade. Mesmo com muitas cidades potiguares devendo sua criação, ou seu crescimento, as ferrovias. Onde as suas antigas estações são importantes marcos de memoria local, algumas só não desabaram por milagre. 

É bem verdade que em algumas cidades potiguares as suas antigas estações sofreram reformas e muitos destes locais passaram a ser utilizados como centros de cultura e memória pela população local. 

Foto – Rostand Medeiros

O que mais me assusta – e isso sim gostaria que servisse de reflexão por parte do poder público e da sociedade civil potiguar em geral – é o descaso com o nosso patrimônio histórico. Sei que o assunto não é novidade, que atualmente existem muitos outros problemas em terras potiguares, mas algumas situações de abandono clamam por mudanças.
As nossas antigas estações das estradas de ferro eram locais de destaque em várias localidades. Diante do quadro atual, se nada acontecer em breve muitas vão desaparecer. E com o fim destes locais, desaparece uma parte da memória e história de muitas comunidades potiguares por onde passavam os trens… 


Extraído do blog Tok de História do historiógrafo e pesquisador do cangaço Rostand Medeiros

http://tokdehistoria.com.br/2014/05/29/exemplo-de-descaso-com-o-patrimonio-historico-ferroviario-potiguar/

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

4 comentários:

  1. Anônimo09:40:00

    Caro Historiador Medeiros: O meu bom-dia
    O descaso com o patrimônio público neste nosso Brasil é geral. Quando passo em frente a velha estação ferroviária da nossa Serrinha da Bahia, fico muito triste. Aqui está sem nenhuma utilidade. Poderia ser feito o que fizeram na Estação da Grande Mossoró do meu amigo José Mendes Pereira: uma restauração para o aproveitamento na área da cultura. Como ficou bonito o prédio da Estação de Mossoró!
    E não é só isto Professor Rostand. Aqui, o prédio centenário da Prefeitura está caindo aos pedaços, e quem abriga o Gabinete do senhor Prefeito e algumas secretarias, é um prédio alugado. TAMANHO DESCASO NESTE GRANDE BRASIL!
    Gosto do meu País; amo a minha Terra, mas tenho muitas vezes, vergonha quando vejo a diferença para outros países e até mesmo de Estado para Estado e de Município para Município. ATÉ QUANDO PROFESSOR MEDEIROS?
    Abraços,
    Antonio Oliveira - E-mail: antonioj.oliveira@yahoo.com.br

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  2. Amigo Oliveira, realmente esta pergunta também me faço todos os dias. Sei que existem muitos problemas na nossa nação, mais urgentes até do que a situação desta estação. Mas acredito que a ideia de muitos políticos em deixarem o patrimônio histórico vir ao chão, tem haver com a intenção de destruir a cidadania dos seus eleitores, evitando assim a existência de cidadãos mais conscientes de suas origens, da história de suas comunidades e que cobram mais pelo bem estar do lugar onde vivem. Ao destruir a cidadania de seus eleitores, fica mais fácil para o político tocar seu "gado" para seu "curral eleitoral". Agradeço a sua mensagem e, apesar de ter um enorme respeito pela categoria, informo que não sou professor. Sou pesquisador da área de história, escritor, blogueiro e Guia de Turismo credenciado pela EMBRATUR, onde atuo com foco na área histórica da minha região, além de trabalahra como secretário geral do SINGTUR-RN. Mais uma vez obrigado pela sua mensagem.

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  3. Anônimo17:03:00

    Pois é nobre historiador das Terras do Rio Grande do Norte, necessário se faz a manifestação do nosso pensamento, seja por palavras ou ações. Se muitos fizessem como faz o senhor, talvez os governantes ouvissem melhor, até mesmo por sentirem-se envergonhados.
    Muito grato pelo texto a mim respondido caro pesquisador Rostand Medeiros.
    Antonio Oliveira - Serrinha

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  4. Anônimo17:15:00

    Mendes amigo, é como lhe falei ontem, embora seja por poucos dias seu afastamento "compulsório" do blogdomendes, vejo a força que tem o mesmo. O nobre historiador Rostand Medeiros certamente é um cidadão ocupado, mas teve o cuidado de observar o que escrevi hoje, e hoje mesmo, atenciosamente expressou a sua opinião. Sei que nem todos são cuidadosos como ele, mas muitos o são. Assim, agradeço pela atualização do blog e desejo um rápido retorno após o restabelecimento do procedimento pelo qual você irá submeter-se.
    Atenciosamente,
    Antonio Oliveira - Serrinha

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