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terça-feira, 19 de dezembro de 2017

ANEDOTÁRIO DO CANGAÇO 1. A CAPITÃO SABE O QUE FAZ!

Por Ruy Lima

Ao invadir uma cidade na Paraíba, o Antônio Silvino se dirigiu à casa de um delator e disse, em público, que ia matá-lo. A esposa da vítima, desesperada, pediu-lhe, então: "Capitão, não mate o meu marido. Tenha pena de uma pobre mulher e de crianças que vão ficar órfãs."

Ao que o cangaceiro lhe respondeu: "[...] Antônio Silvino não sabe negar nada a uma mulher aflita." [...] "Perdôo-lhe a vida, mas, para não ficar sem castigo, vou mandar dar-lhe uma pisa."

Ao que a mulher voltou a lhe solicitar: "Capitão, se é para humilhar meu marido, o senhor me desculpe: em um homem não se dá! Mande logo matá-lo, que é melhor!

Naquele momento, vendo esvair-se a oportunidade de escapar da morte, o marido delator interrompeu o diálogo dos dois e exclamou: 

"Não se meta, mulher, que o capitão sabe o que faz!"

2. O VALENTÃO

Lampião passava com uma "cabroeira", num vilarejo que se chamava Tomé Vieira, e lá um caboclo, tomou a frente do grupo de cangaceiros e perguntou a Lampião: 

- Aonde o senhor vai com essa ruma de cangaceiro?

E Lampião respondeu: 

- Eu vou pra Serra do Pereiro.

O caboclo tentou intimidá-lo dando-lhe uma má notícia:

- Se eu fosse o senhor mudava de caminho, porque no pé daquela serra mora um caboclo muito valente, e insistiu afirmando que ele era valente. 

Lampião respondeu:

- Eu gosto muito de encontrar homem valente. Eu quero só o sinal onde ele mora.

O caboclo disse: 

- É numa casinha de tijolo no pé da serra.

Lampião acena para o grupo e sai em alta velocidade.

Chegando de fronte a casa, param todos de uma vez, e o caboclo tinha chegado da roça e estava deitado numa rede. Lampião chama ele em voz alta: 

- Venha cá, cabra!

O caboclo, sem olhar quem estava falando, responde: 

- Vou não senhor!

E Lampião insiste:

- Venha cá, cabra! Você sabe quem sou eu?

O caboclo disse: 

- Não sei, nem quero saber, nem gosto de quem sabe.

Lampião diz: 

- Eu sou Lampião!


E o caboclo assombrado, fala: 

Seu Lampião, me perdoe, aqui em casa tem almoço, janta, rede, cama, se o senhor tiver precisando de namorar, eu dou minha mulerzinha"...

Lampião disse: 

- Cabra, você tá precisando é de uma pisa, e perguntou: Cabra, você fuma?

O caboclo, todo trêmulo, responde: 

- Fumo, mas se o senhor quiser eu deixo agora mermo!...

3. A SOPA

Lampião e seu bando foram acolhidos por uma senhora, de idade avançada, e ele pediu a ela para preparar um jantar para o bando. A velhinha não tendo quase nada em casa, teve que fazer um caldeirão de sopa às pressas para os famintos cangaceiros. Com a pressa e o medo, ela acabou esquecendo de colocar sal na sopa...

A sopa foi servida e todos começaram a sorvê-la, sem problemas, mas um dos cabras, novato no bando, para talvez fazer bonito diante de Lampião ou por idiotice mesmo, começou a gritar com a pobre velha sobre a falta de sal.

Lampião terminou sua sopa sem nada dizer. Depois, tranquilamente, perguntou ao bando se alguém sentiu falta de sal. Exceto o tal reclamante, o restante, que não era besta, disse que não, que a sopa estava ótima! Então Lampião perguntou à velhinha se tinha mais sal em casa. Ela disse que sim e ele então mandou ela trazer um quilo! Ela correu a obedecer. Quando veio com o sal, Lampião mandou ela despejá-lo no prato do sujeito que havia reclamado, e ordenou: 

- Você reclamou da falta de sal, cabra, pois agora tem aí bastante sal, e você vai comê-lo até limpar o prato!

Apesar dos lamentos do homem, Lampião o obrigou a comer todo o sal do prato e, quando ele pedia água, Lampião não deixava que ele bebesse. E assim foi. Quando o cangaceiro, até verde de tanto comer sal, sentindo suas entranhas em brasa, terminou, Lampião o expulsou, mandando que o mesmo sumisse de sua frente, ameaçando que, se o encontrasse novamente, iria sangrá-lo. É claro que o tal sumiu até hoje. 

Saindo da casa, já um pouco distante, Lampião parou, olhou para trás, coçou a cabeça e comentou com um cangaceiro próximo a ele: 

- E num é que aquela sopa tava uma disgraçeira de insôssa? 

E o cabra ao seu lado, concordou imediatamente: 

- Tumém achei, capitão. Tumém achei...

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