Virgolino Ferreira da Silva o Lampião
http://blogdomendesemendes.blogspot.com/2016_07_11_archive.html
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Uma delas, aos
87 anos, nascida em Jeremoabo, até hoje teme represálias dos bandidos. Nascida
em Jeremoabo, em uma família influente, considera Lampião “um infeliz que só
fazia o mal”, pede para não ser identificada. Vale lembrar que Jeremoabo era a
terra do coronel João Sá, um dos principais coiteiros de Virgulino.
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Em suas
lembranças, histórias de crimes pavorosos, o julgamento do cangaceiro Labareda
e o dia em que sua tia foi retida por dois bandoleiros.
O outro
depoimento é de Elisangela Maria de Ribeira do Amparo. Ela conta como os pais
de seu avô reagiram ao saber que Lampião estava próximo. A reação inusitada
mostra como as pessoas sofriam no sertão só de ouvir falar o nome do
cangaceiro.
E.O, 87 ANOS,
DE JEREMOABO
“Eu era
menina. A cidade vivia apavorada, todo mundo estava assombrado. Lampião e seu
bando passaram pela Fazenda Almêcega e exigiu muito dinheiro do proprietário,
Manoel Salina, ameaçando-o arrancar a língua dele se não recebesse o que
queria. Manoel pagou e mandou avisar Jeremoabo que o cangaceiro estava próximo.
Tempos depois,
Lampião voltou e pediu mais dinheiro. Seu Manoel não tinha toda a quantia e foi
ameaçado de morte com a família. Resolveu vir para Jeremoabo (a fazenda
Almêcega ficava a 18 km da cidade e tinha um grande contingente de volantes)
depois que Ângelo Roque, o Labareda, cangaceiro nascido aqui na região, avisou
que era melhor todo mundo sair porque seu chefe ia matar a todos.
Passou um
tempo e Manoel, em dificuldades financeiras, reuniu cinco filhos, três
sobrinhos e quatro vizinhos para colher a mandioca de suas terras rapidamente.
Alguém avisou Lampião. Esse bandido foi na fazenda e matou cinco pessoas,
diante de seu Manoel.
Um dos filhos,
que estava no telhado, ao ver a família ser assassinada fugiu pelo mato e foi
até Jeremoabo pedir ajuda. Duas filhas do fazendeiro também escaparam.
Lampião ainda
mata três vizinhos de Manoel. Terminada a chacina, manda atear fogo em tudo o
que ali existia. Pega Salina e corta suas orelhas, castra-o, arranca-lhe unhas,
lhe fura os olhos e segue com ele para a casa de seu outro filho, o vaqueiro
Ulisses, em uma fazenda próxima. Lá, mata o rapaz e Manoel, que tem o coração
arrancado e deixado ao lado do corpo.
Lampião era um
bandido miserável, que desassossegou todo mundo, esbagaçou com tudo. Passou
pela Bahia em 1928 e ficou dez anos “infernando”. Se alguém tivesse que viajar,
rezava pedindo para São João para voltar a salvo.
Um infeliz
desse no sertão só fazia o mal. Na minha opinião, um bandido miserável que
destruiu muita coisa, destruiu famílias, propriedades, gado lindo.
Meu avô
contava que o coronel Pedro não seguiu os caprichos de Lampião e ele tocou fogo
no curral com o gado dentro. Gostei quando a família não deixou botar um
busto desse bandido na cidade.
O cangaceiro Balão
Quando eu era
menina, ficávamos com o coração na mão quando minha tia saía para trabalhar
fora do município. Um dia, ela encontrou dois bandidos, um era filho de Várzea
da Ema, o Balão, o outro era o Moita Brava.
O cangaceiro Moita Brava
Meu avô vinha
com ela. Os cangaceiros pararam os dois, apontando fuzis. Fiscalizaram tudo,
repararam no cabelo dela e disseram que quem tinha mulher devia mostrar logo e
não tentar esconder. Os dois ficaram apavorados. Só depois de um tempo foram
liberados.
Tempos depois
Labareda se entregou e fomos ver o júri dele. Só crime horroroso, muita
miséria, ninguém aguentou ficar ouvindo aquilo.
Lampião era um
infeliz, um cão. Ele e a tropa dele”
Mulher marcada
a ferro no rosto por cangaceiro
ELISANGELA
MARIA, 38, DE RIBEIRA DO AMPARO
“Meu avô era
um cabra valente, mas certa noite em meio a tantas conversas e prosas miúdas no
terreiro da casa, sob uma esteira de tábua velha, eu tão pequenina e curiosa
ouvi dele: “Minha filha, me escondi da tirania desse homem (Lampião).
Na realidade
meu “pai avô” viveu até os 93 anos. Ele é meu amor eterno, o maior sertanejo
que conheci. Matou minha fome no cabo da enxada e me contava suas histórias.
Ele nasceu no
povoado de Várzea Salgada, em Ribeira do Amparo (BA). Eu, Elisangela, venho de
dois lados. Os Canuto, por parte de minha mãe avó, estavam presentes em
Canudos. Os da parte de meu pai avô foram os que se esconderam de Lampião. Sou
valente de um lado e do outro, frouxa.
Meu pai avô
contou diversas vezes que seus país, nesse caso meus bisavós, cavaram uma
espécie de bunker (abrigo) e cobriram com palhas de licuri seca, após ouvirem
relatos de terceiros que Lampião se aproximava daquela redondeza.
Meus bisavós e
os filhos pequenos, um total de nove, ficaram escondidos por quinze dias
comendo batata assada e melancias, arrancadas das plantações próximas ao
esconderijo. A água era adquirida nas copas do gravatá, uma bromélia silvestre
que dá no sertão – eu até já bebi dela nas catas dos cambuís (fruta nativa dos
tabuleiros baianos, utilizada no tratamento de herpes, brotoeja, cólicas e
diarreias) que dá nesse lugar.
Eles ficaram
neste esconderijo até que o meu velho bisavô foi averiguar e ouviu de um
conhecido que Lampião já havia passado. Deixaram a toca e tocaram a vida,
normalmente.
Minha bisa
faleceu quando eu tinha um ano de vida, isso foi em 1979. Dizem que ela ainda me
colocou no colo. O meu bisavô foi primeiro, antes de eu nascer. Meu pai avô
morreu em 2015, dois meses depois dele apreciar meu enlace matrimonial.
Cantei para
ele no seu leito de morte e ele sorriu para mim como sempre. Nasceu na roça e
faleceu na roça, no hospital da região, pois ele tinha receio da cidade grande.
Tudo o que sou
devo a eles e ao sertão baiano que me fez mais humana. Se tiver um pedaço de
charque, compartilha-se com todos; um vaqueiro não descansa antes de juntar sua
boiada; se tiver um caju, um maturi, você não joga galho para tirar o fruto
maduro em respeito ao maturi que ainda brota. Coisas simples, mas que me servem
até o dia de hoje.
Obrigado foi o
que disse a meu pai avô e vos digo também, como ele me ensinou.
Obrigado por
se lembrar do sertão meu, seu, de Euclides e de quem chegar.
O sertão é
assim, vai além de céu estrelado e das caçadas em noites de lua cheia. O sertão vai comigo até onde eu for nesse mundo de meu Deus”.
Paulo Oliveira
Jornalista, 55
anos, traz no sangue a mistura de carioca com português. Em 1998, após
trabalhar em alguns dos principais jornais, assessorias e sites do país, foi
para o Ceará e descobriu um novo mundo. Há dez anos trabalha na Bahia, mas suas
andanças não param. Formou comunicadores populares nas favelas do Rio e treinou
jornalistas em Moçambique, na África. Conhece 14 países e quase todos os
estados brasileiros. Suas reportagens ganharam prêmios de direitos humanos e de
jornalismo investigativo.
Email
http://bogdomendesemendes.blogspot.com
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