Por O Povo Online
Perseguido
intensamente em Pernambuco, Alagoas e Bahia, o cangaceiro desfrutava de abrigo
em território cearense. Resultado da omissão de políticos, da convivência de
policiais e de rede de apoios que ia de vaqueiros a fazendeiros, passando pelo
clero.
Mossoró,
no Rio Grande do Norte, foi a maior cidade atacada por Virgolino Ferreira da
Silva. Sua ação mais ousada - e sua maior derrota. O bando de Lampião encontrou
feroz resistência e, após cerca de uma hora e meia de combate, bateu em
retirada. A contagem dos mortos entre os cangaceiros varia de três a seis (apenas 1 e outro ficou ferido). Na
fuga, dirigiram-se ao Ceará.
Em 15 de junho de 1927, chegaram a Limoeiro do
Norte, no Vale do Jaguaribe, Ceará, dois dias após deixarem Mossoró. Lampião
enviou mensageiro para avisar de sua chegada. A polícia, então, deixou a
cidade. O bando entrou em Limoeiro dando vivas ao governador José Moreira da
Rocha e ao padre Cícero Romão Batista, de quem Virgolino era devoto. Os chefes
políticos mataram um boi para recepcionar os bandidos. O bando comeu, fez
orações. A contribuição em dinheiro foi acertada com os líderes locais. Após o
pagamento, o bando de Lampião se retirou.
De todos os Estados nos quais esteve, o Ceará foi, de longe, o que menos sofreu com a
violência imposta por Lampião. Ele dizia textualmente que preservava o
território. O motivo principal era o padre Cícero. Além disso, tinha boas
relações com políticos e a polícia local não costumava importuná-lo. Possuía também importantes aliados. Diante dessa equação, praticamente não há registro
de episódios de violência relevantes provocados por Virgolino no Estado.
Na época do
ataque à Mossoró, estava em curso em Pernambuco a maior e mais eficaz campanha
jamais realizada contra o cangaço. A perseguição em Alagoas também havia se
intensificado. Antes da maior cidade do interior potiguar, Lampião atacou o
norte da Paraíba, onde nunca havia atuado. Buscava territórios onde tivesse
circulação mais fácil. Esse foi o contexto que o levou a Mossoró, em 13 de
junho de 1927. Foi a cidade mais ao norte que atacou em toda sua trajetória.
Diante da resistência encontrada no Rio Grande do Norte, fugiu para o Ceará.
Visitou
frequentemente o Estado quando procurava descanso ou a perseguição crescia em
outros lugares. Em outubro de 1925, por exemplo, o bando foi visto em Mauriti,
onde fizeram compras na feira e pagaram tudo que consumiram. Como as passagens
eram pacíficas, é provável que tenha visitado o Ceará em muitas ocasiões sem
que se tenha tido notícia - eram os episódios de violência que faziam com que
circulassem as notícias de sua presença.
Padre Cícero
No Ceará, em
geral, isso só ocorria quando havia passagens marcantes. Caso de março de 1926,
quando chegou a Juazeiro do Norte. Havia recebido convite do deputado federal
cearense (baiano de Salvador) Floro Bartolomeu para integrar os Batalhões Patrióticos, formados para
combater a Coluna Prestes. Foi recebido pelo padre Cícero no encontro que
reuniu duas das personalidades mais emblemáticas da história dos sertões.
A pedido do sacerdote, Pedro de Albuquerque Uchôa, inspetor agrônomo do Ministério da Agricultura e única autoridade federal em quilômetros, assinou numa folha de papel almaço documento dando a Virgolino a patente de capitão dos Batalhões Patrióticos. Os cangaceiros desfrutaram da estada e foram alvos da curiosidade popular. Muitos familiares de Virgolino haviam se mudado para a cidade que já então era uma Meca dos sertões. Lá fizeram a última foto de família.
A pedido do sacerdote, Pedro de Albuquerque Uchôa, inspetor agrônomo do Ministério da Agricultura e única autoridade federal em quilômetros, assinou numa folha de papel almaço documento dando a Virgolino a patente de capitão dos Batalhões Patrióticos. Os cangaceiros desfrutaram da estada e foram alvos da curiosidade popular. Muitos familiares de Virgolino haviam se mudado para a cidade que já então era uma Meca dos sertões. Lá fizeram a última foto de família.
Ao irem
embora, receberam armas, munições e a promessa de trânsito livre. Em
Pernambuco, porém, a polícia os perseguiu. O status de capitão dos Batalhões
não foi reconhecido. Em pouco tempo, o bando estava novamente envolvido em
violência.
No ano
seguinte, pouco antes do ataque à Mossoró, em maio de 1927, Lampião esteve de
novo no Ceará. Foi a Aurora e, conforme noticiaram os jornais, teve encontro e
tomou café com o chefe de Polícia. No mês seguinte, já ao deixar Limoeiro do
Norte, Lampião tomava a direção de Aurora quando foi alvo de inesperada
hostilidade de policiais cearenses. Aparentemente, tomavam as dores do ataque à Mossoró, sobretudo pelo ataque tem ocorrido tão perto e em cidade tão ligada ao
Estado. Os cangaceiros ficaram acuados e quase sem comida, mas conseguiram
escapar, em episódio que rendeu duas críticas aos policiais cearenses e sérios
questionamentos por parte das tropas de outros Estados.
Mesmo sem a
repressão ter sido bem-sucedida, a inusual hostilidade em território cearense
parece ter sido determinante para uma guinada na trajetória de Lampião - e dos
sertões. Em 21 de agosto de 1928, numa canoa, ele cruzou o São Francisco. A
região ao sul do rio se tornaria a base de suas operações dali em diante. O
cangaço na Bahia conheceria nova era. E Lampião passou a ter como refúgio
preferencial outro Estado: Sergipe, onde um de seus protetores seria o médico e
capitão do Exército Eronides de Carvalho, com quem Virgolino se encontrou ao
menos uma vez. Em meados dos anos 1930, Eronides se tornou governador.
Paradoxalmente,
Lampião veio a morrer justo em Sergipe. Mas, pelas mãos da polícia alagoana.
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