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domingo, 10 de junho de 2012

GRACILIANO RAMOS E O CANGAÇO

Por: Honório de Medeiros
 
Graciliano Ramos e o Cangaço.

Ricardo Ramos ao ouvir seu pai contar acerca de quando Palmeira dos Índios se armara para enfrentar Lampião, ficara fascinado:

“Passara a meninice acalentado pelas estropolias dos cangaceiros, da polícia volante, duas pestes que nos assolavam.”

“E (lhe) contei de uma noite, após a ceia, em que, atraído por foguetes, sai à calçada e vi os caminhões, as cabeças cortadas, espetadas em estacas, de Lampião, Maria Bonita e mais dez outros, os soldados empunhando archotes, gritando vitoriosos, um cortejo macabro pelas ruas de Maceió”.

Graciliano lhe diz:

“- Eu escrevi sobre isso”.
                              
“Não havia lido, era pequeno e estava fora do Rio. Bem depois, ao se reunirem as crônicas de Viventes das Alagoas (título sugerido por Jorge Amado), afinal encontrei “Cabeças”. Ou reencontrei minha antiga visão, bárbara, mas transporta no sarcástico perfil do tenente Bezerra, que se reformou coronel, o falante matador de Lampião, versado em frases feitas, sua retórica elementar de glorificado primário.”
                              
“Havia mais, bem mais. O Fator Econômico no cangaço, crônica da propriedade que se mantém e cresce pela força, com pequenos exércitos de senhores rurais, sedentários, enquanto os cangaceiros se distinguem dos outros facínoras apenas por serem nômades, no regime de produção agrícola da caatinga.”
                              
“Corisco, uma crônica do diabo louro, seu conterrâneo de Viçosa, filho de decadente família de donos de engenho, forçado a decair, enlouquecido, o pequeno monstro baleado e decapitado, morto quase inédito porque havia a guerra na Europa, tantos crimes. Dois Cangaços, a crônica dos matutos indefesos diante de dois poderes, a volante e o cangaceiro, a primeira muitas vezes obrigando-os à segunda opção, ou o seu reverso, em todo o caso forçando-os a escolher, pela imposição sócia, ou pior ainda, pela econômica.”
                              
“E Lampião e Virgulino, que buscam o perfil. Necessariamente fincado no agreste.”
                              
“Graciliano nunca idealizou Lampião. Desde 1926, ao escrever do assédio a Palmeira dos Índios, sem mencionar a sua participação pessoal. Chama-o ‘bicho montado’, ‘horrível’, ‘sanguinário’, diz dele o animal ‘cruel’, que ‘queima fazendas’, capaz ‘de violar mulheres na presença de maridos amarrados’, e ‘se conservara ruim, porque precisa conservar vivo o sentimento de terror que inspira’, enfim ‘vemos perfeitamente que o salteador cafuzo é um herói de arribação bastante chinfrim’”.
                              
“Por outro lado, não desconhecem a sua projeção lendária. ‘Lampião nasceu há muitos anos, em todos os estados do Nordeste’. E se refere à nossa tradição bandoleira, do remoto Jesuíno Brilhante ao envelhecido Antônio Silvino, para concluir: ‘Resta-nos Lampião, que viverá longos anos e provavelmente vai ficar pior. De quando em quando, noticia-se a morte dele com espalhafato. Como se se noticiasse a morte da seca e da miséria. Ingenuidade.’”
                              
Obra citada: “Graciliano RETRATO FRAGMENTADO”; RAMOS, Ricardo; Globo; 2ª edição; 2011; São Paulo.

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