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sábado, 9 de junho de 2018

LAMPIÃO: “ENTRE A CRUZ E A ESPADA...”

Por Verluce Ferraz

Até me surpreendeu a grande quantidade de leitores de minha página no Facebook acenando positivamente com suas curtidas. Confesso que havia em mim certo receio de expor minhas idéias sobre o assunto Lampião que já tem inúmeros pesquisadores do melhor naipe; muito respeitados no mundo literário publicando excelentes matérias sobre o cangaceiro. O assunto é desafiador mesmo. Por isso, no início, hesitei mesmo; até que me ocorreu que eu devia publicar minhas análises sobre o que teria levado Lampião aos conflitos; reais e imaginários que permearam sua existência. Ele não está mais aqui para me responder; talvez se estivesse até se aborrecesse, ou compreendesse por que era de inteligência brilhante. 


Inteligência não obriga atitudes perfeitas e foi da imperfeição de delas que nasceu o mais temido dos cangaceiros; entrando para a história. Imaginemos os momentos em que viveu os conflitos imaginando sua avó/mãe tentando resolver uma situação difícil, no seu desprendimento e linda tarefa de parteira, dentro de um quarto ou de outro lugar, da casa. Reinavam as dúvidas de ser bem ou mal sucedida. Difícil minimizar tantas angústias e questionamentos. E cá fora, as incerteza do filho/neto. Estaria ela ajudando na solução para trazer alívio às dores daquelas mulheres nesse momento ou estaria compartilhando para resultados contrários? Por que ele nada compreendia de trabalho de parto e tampouco de parteiras. Não queria pensar mal da avó, amor filial envolvido. 


Surgem assim os medos reais e medos imaginários. Reais, quando saíam com alegrias um bebê enrolado nos queiros acompanhado do ar cheiroso a alfazema queimada; comemorações com licor (o cachimbo oferecido aos compadres). Real também quando saiam mãe e filho enrolados nos lençóis para os respectivos enterros. O que precedia sempre aos trabalhos da avó eram os medos imaginários. Lampião não desenvolveu uma epilepsia, por exemplo, mas desenvolveu outra patologia da angústia que queria se livrar a todo custo: uma psiconeurose que o levou ao mundo dos crimes. Virgulino cresce e para livrar-se dos próprios conflitos internos, torna-se cheio de superstições; faz uso de rezas e orações que carrega sob as vestes; pratica rituais de missa, carrega penduricalhos, e vai até o Padre Cícero Romão Batista, do Juazeiro do Norte, em busca de bênção, para aliviar-se das tensões e traumas. 


Afastou-se das mulheres; abandonou a profissão de almocreve. Segue o cangaço; mundo do crime. Sobressai no grupo e torna-se respeitado pelo manuseio das armas. Recebe uma patente falsa que irá levá-lo ao Poder como Capitão para lutar contra o Estado e contra seus próprios conflitos internos. Vai tornar-se costureiro e confecciona as próprias roupas. Logo todos os seus seguidores usarão roupas iguais, surgindo assim um estilo próprio e personalizado: as fardas coloridas, detalhes em bordados que tanto aprecia. 


Com a entrada da mulher no grupo, Lampião será o costureiro e designer – cria e confecciona roupas, masculinas e femininas. Usa jóias, símbolos exotéricos e perfumes. Os símbolos vem das crendices; o uso dos perfumes é forma de livrar-se do odor que lhe ficou impregnado na memória olfativa durante os tempos em que acompanhava os trabalhos de sua mãe/avó; mas será aceito como uma forma de refutar as ações dos policiais das Volantes, suas inimigas. Cada dia mais vai exercer atividades que imitam a avó. Torna-se parteiro das mulheres cangaceiras que entraram para os grupos; todas foram assistidas pelo Capitão Virgulino, quando dos seus de partos. Mas, ser pai e gostar de choro de criança nunca foi algo aceito por Lampião, que tentou livrar-se da própria filha; não a matou por que a sua companheira interveio e assim deram para que um casal de vaqueiros a adotasse.


Muitos casos de conflitos internos de pessoas são conhecidos na história conduzindo seus personagens aos mais elevados patamares; alguns viraram estrelas da literatura; outros por suas ações criminosas. Machado de Assis vai se tornar o maior ‘casmurro’ da história da literatura nacional; escreve sua obra de maior tomo em virtude de um grande conflito: quem é meu pai: Francisco ou Joaquim? O escritor desenvolveu uma epilepsia que o vitimou até o último dia de sua existência. E Nero, imperador romano, teve uma infância turbulenta; é associado habitualmente à tirana e a extravagância; é recordado por uma série de execuções sistemáticas, incluindo a da sua própria mãe. O general Napoleão Bonaparte foi muito indisciplinado e sofreu influência da mãe. O Antônio Conselheiro perdeu a genitora quando contava apenas quatro anos de idade; teve uma infância permeada de conflitos; tornou-se beato. Cada um dos citados com uma história de infância difícil; assim incapazes de resolver seus conflitos entram para a história...

Prefiro examinar os crimes de Virgulino Ferreira da Silva à luz das ciências por entender que o mesmo foi agente ativo/passivo dos seus feitos; portador de problemas de ordem psicológica. Um exame à luz do Direito Penal Pátrio o cangaceiro teria que pagar por seus crimes com penas poderiam chegar a mais de 5... anos de prisão; ou seja, terminaria seus dias de vida num presídio.

Do título: Vem da história da época da catequese de índios no Brasil, do século XVI, pelo padre José de Anchieta.

As fotos são: Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião; Machado de Assis, escritor; Padre Cícero, do Juazeiro; Nero, imperador de Roma e Antônio Conselheiro, o beato.

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