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terça-feira, 4 de dezembro de 2018

A ESCOLA RURAL DA VILA DE CARACARÁ

Por Benedito Vasconcelos Mendes

Na década de 1960, a Escola Rural de Caracará era a única escola existente naquela vila. Tinha cerca de 30 alunos, que estudavam no turno da manhã, sob as orientações e ensinamentos da professora Mariinha Silva, que ensinava a ler, escrever, contar e trabalhos manuais. A escola localizava-se ao lado da Igreja (Igreja de Santo Antônio) e funcionava em um prédio adaptado, ou seja, na sala da frente de uma casa residencial. O proprietário permitia o funcionamento da escola em sua casa, sem cobrar aluguel. O quadro negro e as carteiras conjugadas para dois alunos foram fornecidos pela Prefeitura Municipal de Sobral. A Professora Mariinha Silva recebia mais ou menos o equivalente a meio Salário Mínimo da Prefeitura de Sobral, mas não era funcionária municipal. Ela era Professora Leiga, sem curso superior (Pedagogia) e sem curso de nível médio profissionalizante (Curso Normal). Ela tinha apenas o antigo curso ginasial (ensino fundamental completo) e fez um treinamento de um mês em Sobral para ser professora. 

Na sala tinha um estrado de madeira e sobre ele uma mesinha de imburana não envernizada, de um metro e vinte centímetros de comprimento por 80 centímetros de largura, com uma cadeira de pau-branco, com tampo de couro cru, para a professora se sentar. Sobre a mesa ficava uma pesada palmatória de aroeira, uma caixa de giz branco, um globo terrestre e uma flanela vermelha, para apagar o quadro negro. Na parede, atrás da mesa, tinha um crucifixo pendurado e ao lado da mesa, sobre um suporte de madeira, ficava a bandeira do Brasil. Nos fundos da sala tinha uma cantareira com um pequeno pote com água de beber, uma caneca de zinco com cabo, para tirar água do pote e uma caneca de alumínio de uso coletivo. O pote era coberto por um pano de coar água e uma tampa de madeira. 

Cada aluno levava seu material escolar , constituído por uma taborda, uma carta de ABC ou uma cartilha, um caderno feito em casa com papel almaço, costurado com linha zero, um lápis grafite com uma borracha acoplada na extremidade e uma gilete ou canivete bem amolado, para fazer a ponta do lápis. Às 7 horas, os alunos ficavam perfilados na calçada da escola e entravam na sala dois a dois. Dentro da sala, em frente a Bandeira Nacional, cantavam duas ou três estrofes do Hino Nacional e rezavam um Padre Nosso e uma Ave Maria. A professora corrigia o dever de casa, tomava a tabuada, fazia um ditado e depois passava para copiar um pequeno texto. Quando os alunos iam fazer o ditado e a cópia do texto, eles faziam um cabeçalho com o nome da escola, o nome do município, a data e o nome do aluno. 

Os alunos eram dos dois sexo, masculino e feminino (sala mista) e de idades que variava de 7 aos 12 anos e com diferentes graus de conhecimento (classe multisseriada ), ou seja, uns sabiam assinar o nome e já estudavam pela cartilha, enquanto outros ainda estavam na carta de ABC. A professora sabia o nível escolar de cada aluno. Alguns alunos que tinham letra ruim eram obrigados a ter caderno de caligrafia. A tabuada, a carta de ABC, a cartilha, o caderno de caligrafia, o lápis e a borracha eram comprados na bodega do Seu Raimundo Galdino. O recreio iniciava às nove horas e se prolongava até às nove e meia e era anunciado por uma sinetinha, que a professora mantinha em cima da mesa. No recreio, as mulheres brincavam de jogar pedras e de macaca (amarelinha), que era feita com giz, pelas próprias alunas no patamar cimentado da igreja. Os meninos brincavam com uma bola de meia, em um campinho de terra, ao lado da igreja. Os meninos chegavam suados e com muita sede. 

Os membros da comunidade, na medida do possível, ajudavam a escola. Seu Chico Carpinteiro presenteou a escola com a mesinha e o proprietário da casa emprestou a cadeira para a professora sentar. O bodegueiro, Seu Raimundo Galdino, doava diariamente, uma rapadura e um pacote de bolachas para os alunos merendarem. Meu avô, sempre que ia a Vila Caracará, levava um queijo de coalho grande e algumas rapaduras, que ele produzia em seu Sítio Frecheiras, na Serra da Meruoca. Outros fazendeiros da redondeza, também doavam queijo para a merenda dos estudantes. 

Após o recreio, os alunos entravam em fila dupla na classe. A professora colocava na lousa o dever de casa e lembrava o dia da prova escrita para os que estavam na cartilha. 

Duas vezes por semana, no turno da tarde, a professora Mariinha Silva, dava aula de Trabalhos Manuais (artesanato), que se resumia em ensinar a fazer artesanato de palha de carnaúba, como chapéu, esteira, uru, surrão, abano e outras peças. Como o Rio Aracatiaçu, que banha a região, tinha muitas carnaubeiras em suas margens, para estes artesanatos havia matéria prima em abundância. O chapéu tinha comprador na própria vila, pois Sobral era um grande exportador de chapéu de palha, especialmente para os Estados Unidos, México e Espanha. Interessante era a exigência de tamanho do chapéu feito por cada País comprador, uns exigiam carapuça (forma) maior e outros chapéus menores. A feitura de chapéu de palha era uma atividade generalizada na região, pois era difícil encontrar uma casa na Vila Caracará que não produzisse chapéus. Era um artesanato feito principalmente, por mulheres. Elas usavam um banquinho baixo, para não mostrar as pernas, quando estavam fazendo chapéu. Para a confecção de chapéus, usava-se palha do olho. A palha era riscada com a ponta de uma pequena faca e as tiras estreitas eram entrelaçadas com muita sincronia e rapidez. Era impressionante a habilidade e a rapidez das mulheres da região na confecção de chapéu de palha de carnaúba.

Enviado pelo professor, escritor e pesquisador do cangaço Benedito Vasconcelos Mendes.

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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