Por Benedito Vasconcelos Mendes
Na década de
1960, a Escola Rural de Caracará era a única escola existente naquela vila.
Tinha cerca de 30 alunos, que estudavam no turno da manhã, sob as orientações e
ensinamentos da professora Mariinha Silva, que ensinava a ler, escrever, contar
e trabalhos manuais. A escola localizava-se ao lado da Igreja (Igreja de Santo
Antônio) e funcionava em um prédio adaptado, ou seja, na sala da frente de uma
casa residencial. O proprietário permitia o funcionamento da escola em sua
casa, sem cobrar aluguel. O quadro negro e as carteiras conjugadas para dois
alunos foram fornecidos pela Prefeitura Municipal de Sobral. A Professora
Mariinha Silva recebia mais ou menos o equivalente a meio Salário Mínimo da
Prefeitura de Sobral, mas não era funcionária municipal. Ela era Professora
Leiga, sem curso superior (Pedagogia) e sem curso de nível médio
profissionalizante (Curso Normal). Ela tinha apenas o antigo curso ginasial
(ensino fundamental completo) e fez um treinamento de um mês em Sobral para ser
professora.
Na sala tinha um estrado de madeira e sobre ele uma mesinha de
imburana não envernizada, de um metro e vinte centímetros de comprimento por 80
centímetros de largura, com uma cadeira de pau-branco, com tampo de couro cru,
para a professora se sentar. Sobre a mesa ficava uma pesada palmatória de
aroeira, uma caixa de giz branco, um globo terrestre e uma flanela vermelha,
para apagar o quadro negro. Na parede, atrás da mesa, tinha um crucifixo
pendurado e ao lado da mesa, sobre um suporte de madeira, ficava a bandeira do
Brasil. Nos fundos da sala tinha uma cantareira com um pequeno pote com água de
beber, uma caneca de zinco com cabo, para tirar água do pote e uma caneca de
alumínio de uso coletivo. O pote era coberto por um pano de coar água e uma
tampa de madeira.
Cada aluno levava seu material escolar , constituído por uma
taborda, uma carta de ABC ou uma cartilha, um caderno feito em casa com papel almaço,
costurado com linha zero, um lápis grafite com uma borracha acoplada na
extremidade e uma gilete ou canivete bem amolado, para fazer a ponta do lápis.
Às 7 horas, os alunos ficavam perfilados na calçada da escola e entravam na
sala dois a dois. Dentro da sala, em frente a Bandeira Nacional, cantavam duas
ou três estrofes do Hino Nacional e rezavam um Padre Nosso e uma Ave Maria. A
professora corrigia o dever de casa, tomava a tabuada, fazia um ditado e depois
passava para copiar um pequeno texto. Quando os alunos iam fazer o ditado e a
cópia do texto, eles faziam um cabeçalho com o nome da escola, o nome do
município, a data e o nome do aluno.
Os alunos eram dos dois sexo, masculino e
feminino (sala mista) e de idades que variava de 7 aos 12 anos e com diferentes
graus de conhecimento (classe multisseriada ), ou seja, uns sabiam assinar o
nome e já estudavam pela cartilha, enquanto outros ainda estavam na carta de
ABC. A professora sabia o nível escolar de cada aluno. Alguns alunos que tinham
letra ruim eram obrigados a ter caderno de caligrafia. A tabuada, a carta de
ABC, a cartilha, o caderno de caligrafia, o lápis e a borracha eram comprados
na bodega do Seu Raimundo Galdino. O recreio iniciava às nove horas e se
prolongava até às nove e meia e era anunciado por uma sinetinha, que a
professora mantinha em cima da mesa. No recreio, as mulheres brincavam de jogar
pedras e de macaca (amarelinha), que era feita com giz, pelas próprias alunas
no patamar cimentado da igreja. Os meninos brincavam com uma bola de meia, em
um campinho de terra, ao lado da igreja. Os meninos chegavam suados e com muita
sede.
Os membros da comunidade, na medida do possível, ajudavam a escola. Seu
Chico Carpinteiro presenteou a escola com a mesinha e o proprietário da casa
emprestou a cadeira para a professora sentar. O bodegueiro, Seu Raimundo
Galdino, doava diariamente, uma rapadura e um pacote de bolachas para os alunos
merendarem. Meu avô, sempre que ia a Vila Caracará, levava um queijo de coalho
grande e algumas rapaduras, que ele produzia em seu Sítio Frecheiras, na Serra
da Meruoca. Outros fazendeiros da redondeza, também doavam queijo para a
merenda dos estudantes.
Após o recreio, os alunos entravam em fila dupla na
classe. A professora colocava na lousa o dever de casa e lembrava o dia da
prova escrita para os que estavam na cartilha.
Duas vezes por semana, no turno
da tarde, a professora Mariinha Silva, dava aula de Trabalhos Manuais
(artesanato), que se resumia em ensinar a fazer artesanato de palha de
carnaúba, como chapéu, esteira, uru, surrão, abano e outras peças. Como o Rio
Aracatiaçu, que banha a região, tinha muitas carnaubeiras em suas margens, para
estes artesanatos havia matéria prima em abundância. O chapéu tinha comprador
na própria vila, pois Sobral era um grande exportador de chapéu de palha,
especialmente para os Estados Unidos, México e Espanha. Interessante era a
exigência de tamanho do chapéu feito por cada País comprador, uns exigiam
carapuça (forma) maior e outros chapéus menores. A feitura de chapéu de palha
era uma atividade generalizada na região, pois era difícil encontrar uma casa
na Vila Caracará que não produzisse chapéus. Era um artesanato feito
principalmente, por mulheres. Elas usavam um banquinho baixo, para não mostrar
as pernas, quando estavam fazendo chapéu. Para a confecção de chapéus, usava-se
palha do olho. A palha era riscada com a ponta de uma pequena faca e as tiras
estreitas eram entrelaçadas com muita sincronia e rapidez. Era impressionante a
habilidade e a rapidez das mulheres da região na confecção de chapéu de palha
de carnaúba.
Enviado pelo professor, escritor e pesquisador do cangaço Benedito Vasconcelos Mendes.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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