Clerisvaldo B, Chagas, 22/23 de dezembro de 2020
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.439
Seguimos pelas trilhas da caatinga em fila indiana. Vaqueiro à frente com machado ao ombro, colega e amigo José Ialdo Aquino e, eu fechando a marcha, em busca de mel silvestre. Depois de boa caminhada, o guia deu com a mão e paramos sob bela florida e perfumosa, catingueira. O homem apontou com o dedo para a galhada da Leguminosae caesalpinioideae, onde havia um oco no pau e disse: “É ali onde as abelhas mandaçaias estão arranchadas”. Ficamos aguardando suas ações. Com o machado decepou o galho da árvore, produziu fumaça e espantou as abelhas. Em seguida, ajudou a alargar o oco do pau e escorreu o mel transparente e apetitoso para uma vasilha. Todos de água na boca aguardando aquela delícia selvagem da nossa flora. Se existe um doce extremamente doce, estava ali diante de nós. “Tão gostoso e tão doce que arrepuna!”, soltou alguém.
Encerrada a aventura no seio da mata, retornamos satisfeitos com várias investidas na estrada contra o mel cobiçado da vasilha. Dali sentamos no banco pela-porco da casa-grande de alpendre, onde o vaqueiro narrava sua participação nos combates da Revolução Paulista: “Tantos cadáveres que nem tínhamos vontade de comer outra coisa, somente doce e nada mais”. Ali conheci a capelinha bem arrumada onde fora assassinado o patriarca da família Aquino, pelo cangaceiro de Lampião, Português. Eu ainda não havia entrado no mundo fantástico das pesquisas, porém, produzi interessantes slides da fazenda. Com minha boa vontade e frustração, até hoje aguardo a devolução do material emprestado. Diz o ditado: que “quem empresta não presta”. Retornei imensamente feliz daquela incursão pela nossa flora. Ainda fui surpreendido nesse retorno, ao avistar a bela paisagem de Santana do Ipanema ao passarmos pelo sopé da serra Aguda. Não conhecia o cenário magnífico visto daquele monte circundante da cidade.
Décadas depois, pesquisei e trouxe à tona o episódio proibido e sangrento fruto da covardia do cangaceiro Português e mais dois asseclas. Acha-se relatado no livro “Lampião em Alagoas”, com o título: “A Morte do Patriarca”, publicado em 2012 pela editora GrafMarques, de Maceió. Foi o doce do mel com o amargo do fel. Muitas outras histórias das nossas caatingas permanecem escritas nas páginas reviradas dos nossos vegetais.
Meu Sertão, meu sertãozinho...
Salve!
ASPECTO DA CAATINGA SERTANEJA (FOTO: BIANCA CHAGAS/ARQUIVO DO AUTOR).
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