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quinta-feira, 3 de junho de 2021

VIRGULINO, O UNGIDO POR SINHÔ PEREIRA

Por João Costa

A tradição oral e relatos de pesquisadores convergem no sentido de que o Sinhô Pereira, antes de deixar o cangaço, tratou de forrar sua poupança para a longa escapada até Goiás, ao mesmo tempo em que preparava a sucessão no bando – ele nem escondia seus planos, pelo menos para coiteiros abastados na divisa entre a Paraíba e o Ceará.

Conta-se que numa visita relâmpago a parentes em Bonito de Santa Fé(PB), e recebido amistosamente com seu bando por um certo chefe político local, de nome capitão Francisco Timótheo, teria esboçado seus planos.

- Eu não nasci para esta vida não. Estrei nela porque fui obrigado e ainda permaneço porque é o jeito. Tenho aqui em meu alforje uma carta do padre Cícero, pelas mãos do major Zé Inácio, do Barro, com recomendações para eu largar tudo e me mudar para Goiás – e é o que eu vou fazer: obedecer ao padre Cícero”, teria dito Sinhô Pereira ao capitão-coiteiro.

Coitos localizados nas divisas entre Paraíba-Pernambuco-Ceará sempre foram seguros para o Bando de Sinhô Pereira, como haveria de ser no futuro para o seu sucessor, Virgulino Ferreira, Lampião.

Daí o trânsito e pernoites seguros em fazendas e povoados até que, em abril de 1922, na fazenda Tabuleiro, do coiteiro Manoel Alves Terto, o “Neco Alves”, a rotina foi quebrada porque volantes paraibanas e pernambucanas estavam emboscadas e de armas engatilhadas.

O combate foi pesado, segundo relato do próprio Sebastião Pereira ao Jornal do Brasil muitas décadas depois.

- De longe avistamos uns homens, mas confundimos tudo, achando que eram dos nossos; Lampião estava como cabecilha do bando ao lado de Levino, os macacos atiraram e erraram, Virgulino pulava para se livrar dos tiros, perdeu o chapéu; voltou para apanhar, mas se deu mal: levou dois tiros um na virilha e outro acima do peito”.

O tiroteio recrudesceu dos dois lados, com xingamentos de parte a parte.

- Mesmo ferido, Virgulino saiu cambaleando caindo um pouco adiante, quando foi socorrido por Meia Noite e Levino que o arrastaram para dentro do mato, escapamos para uma fazenda de amigos, onde pedi socorro médico, acrescentou Pereira.

A sorte havia bafejado Virgulino porque o ferimento não era grave; Virgulino fora atingido por tiro de rifle e não de carabina, arma de calibre mais grosso.

- Por um triz a bala pegava na bexiga e a espinha, avaliou doutor Mota, o médico que cuidou dos ferimentos naquele jovem bandoleiro que viria a ser pouco tempo depois o “rei do Cangaço”.

A saga dos irmãos Ferreira no Bando de Sinhô Pereira durou treze meses, de meados de 1921 a agosto de 1922, quando Sinhô Pereira reuniu o bando em Serrita(PB), na fazenda Preá, para comunicar sua retirada para Goiás e organizar a sua sucessão.

Mas por quais razões Virgulino Ferreira foi o ungido por Sinhô Pereira?

- Virgulino se mostrava um homem de muitos planos, habilidoso e cordato, ao contrário de Antônio Ferreira, que tinha a cara amarrada, e era o oposto do corpulento e truculento Levino, foi a explicação dada muitos anos depois por Pereira.

- Ele, Virgulino, conseguiu coisas no bando que eu mesmo não seria capaz, teria dito Sinhô Pereira a seus parentes ao comentar o saque à baronesa de Água Branca, certamente o primeiro ataque do bando planejado e executado por Virgulino.

Enquanto Sinhô Pereira dava prosseguimento aos preparativos na sua retirada para o estado de Goiás, Virgulino Ferreira, naquele mês de agosto de 1922, ajustava contas da família Ferreira com os delatores que criaram condições para que a volante do tenente Zé Lucena cercasse a casa do velho Zé Ferreira (pai de Lampião) e o matasse.

Implacavelmente um tal Manoel Cypriano de Souza, delator, tombou com três tiros na caixa dos peitos e sua casa incendiada; pelo mesmo motivo Virgulino elimina mais um dos Quirino, uma família de Jatobá de Tacaratu, em que quase todos foram dizimados quando atuavam na volante de Zé Lucena.

Eis que chegara o momento para que a transição de comando fosse concluída e para tanto foi organizado um evento em que Sinhô Pereira anunciaria seu ungido para chefiar o bando.

Um regabofe na fazenda da Pedra, em setembro de 1922, inclusive com a presença do prefeito eleito naquele ano do município de Triunfo(PE) e do juiz de Direito de Princesa Isabel(PB).

Assim se formou o primeiro bando sob o comando de Virgulino Ferreira, tendo ao seu lado os dois irmãos Antônio e Levino, mais Antônio Rosa, o Toinho de Gelo (garoto que fora criado pela família Ferreira), Joaquim. o Coqueiro; Plínio, Bem-Te-Vi, Patrício, Raimundo Agostinho; João de Genoveva; Pedrão, Zé Dedé, o Baliza, José Melão, Laurindo; João e Antônio Mariano.

Antes de deixar o comando Sinhô Pereira impôs a Virgulino apenas o compromisso de poupar parentes e aliados seus, mas pediu, encarecidamente, que Virgulino promovesse uma reparação moral a um primo de nome Crispim Pereira, conhecido como Yoyô Maroto.

Um certo coronel Luiz Gonzaga Gomes Ferraz, importante latifundiário do Pajeú, se desentendera com Yoyô Maroto e, em represália, encomendara a um tenente chefe de volante de nome Peregrino de Albuquerque, que aplicasse um corretivo. A tal surra em Maroto não foi dada, mas ele e sua família passaram por acocho e humilhações por parte da volante.

Lampião atendeu prontamente ao pedido do ex-chefe. Ao atacar a fazenda de Gonzaga, determinou ao cangaceiro Cajueiro que prendesse num quarto a esposa de Gonzaga e os filhos, enquanto o resto do bando invadia o sobrado de dois andares.

O tiroteio durou cinco horas entre o bando de Lampião e o destacamento de São José do Belmonte, sob o comando do sargento José Alencar que de tanto disparar seu fuzil a arma explodiu; um soldado e dois civis parentes de Gonzaga foram mortos.

O coronel Gonzaga também foi morto, seu sobrado saqueado em muito dinheiro, joias e depois incendiado.

Foi neste tiroteio de estreia de Lampião como chefe de bando que o cangaceiro Baliza foi morto pelo “fogo amigo” de Antônio Ferreira, mas aqui já é outra história.

Fonte de consulta: Lampião na Paraíba, de Sérgio Augusto de Souza Dantas.

Apagando Lampião – Vida e Morte do Rei do Cangaço, de Frederico Pernambucano de Mello.

Acesse: blogdojoaocosta.com.br

Foto1. Sinhô Pereira. Foto2. Virgulino Ferreira, na juventude.

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