Por Rangel Alves da Costa
Não é fácil
escrever e descrever percursos históricos. Não é fácil contar histórias. Não é
fácil narrar fatos acontecidos nos tempos idos. Não é fácil ir buscar os
episódios, os grãos que depois de recolhidos formam uma só colheita de
informações. Não é fácil catar nas entranhas das memórias as revelações tão
necessárias ao conhecimento. E depois de tanto ouvir sobre o mesmo fato, ainda
assim precisar ouvir mais testemunhos ainda sobre o mesmo episódio. Eu faço
sempre assim nas pesquisas sobre o cangaço e sobre as sagas sertanejas. Repito:
não é fácil. Não é fácil enveredar pelos matos, caminhar debaixo do sol e da
chuva, abrir porteira atrás de porteira, repetir “oi de casa” como um eco já
impregnando na voz. Não é fácil vencer pontas de espinhos, mutucas, urtigas e
as surpresas surgidas nos tufos do mato e em meio a macambiras. Não é fácil ir
além, e muito mais além, perante cada situação encontrada. Ao invés do
contentamento com o encontrado, o trabalho maior surge no instante seguinte, a
partir de indagações: quando, por que, como, e muitas outras. Mesmo que a
pessoa já leva consigo o conhecimento, ainda assim impossível não se intrigar
com o encontrado. Ora, uma cruz do cangaço não é só uma cruz, pois possui todo
um contexto histórico de seu surgimento, causas e motivações. Um coito do
cangaço não é só um coito, um local de refúgio e repouso de cangaceiros, mas
uma moldura estratégica e geográfica que envolve muitas outras análises. Não,
realmente não é fácil testemunhar pelo olhar e tocar com as mãos o passado
ainda sangrando, pulsando, querendo levantar das sepulturas para contar as
“verdades verdadeiras”. De repente ouço e me espanto com as folhagens das catingueiras
se abrindo em frêmito. Ouço passos, ouço sons vindos das entranhas das matas.
Vozes inaudíveis, sussurros, bramidos. As aves carnicentas rondam pelos
arredores. Cangaceiros e volantes estão por perto. Um pipoco, um disparo bem ao
lado, um grito, um “corre, corre, fuja, fuja, ataca, ataca...”. Sangue
espalhado, gemidos de dor. A pólvora sufoca os espaços catingueirentos. Mas
como, se eles não estão mais ali, se as armas de guerra já se calaram? Nada
disso. Cangaceiros, soldados volantes, coiteiros e coronéis, todos continuam
vivos. E bem vivos. Por isso mesmo que tanto são procurados. E sempre são
achados nos confins dos sertões.
https://www.facebook.com/rangel.alvesdacosta
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário