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domingo, 9 de abril de 2023

CONTANDO HISTÓRIAS.

 Por Rangel Alves da Costa

Não é fácil escrever e descrever percursos históricos. Não é fácil contar histórias. Não é fácil narrar fatos acontecidos nos tempos idos. Não é fácil ir buscar os episódios, os grãos que depois de recolhidos formam uma só colheita de informações. Não é fácil catar nas entranhas das memórias as revelações tão necessárias ao conhecimento. E depois de tanto ouvir sobre o mesmo fato, ainda assim precisar ouvir mais testemunhos ainda sobre o mesmo episódio. Eu faço sempre assim nas pesquisas sobre o cangaço e sobre as sagas sertanejas. Repito: não é fácil. Não é fácil enveredar pelos matos, caminhar debaixo do sol e da chuva, abrir porteira atrás de porteira, repetir “oi de casa” como um eco já impregnando na voz. Não é fácil vencer pontas de espinhos, mutucas, urtigas e as surpresas surgidas nos tufos do mato e em meio a macambiras. Não é fácil ir além, e muito mais além, perante cada situação encontrada. Ao invés do contentamento com o encontrado, o trabalho maior surge no instante seguinte, a partir de indagações: quando, por que, como, e muitas outras. Mesmo que a pessoa já leva consigo o conhecimento, ainda assim impossível não se intrigar com o encontrado. Ora, uma cruz do cangaço não é só uma cruz, pois possui todo um contexto histórico de seu surgimento, causas e motivações. Um coito do cangaço não é só um coito, um local de refúgio e repouso de cangaceiros, mas uma moldura estratégica e geográfica que envolve muitas outras análises. Não, realmente não é fácil testemunhar pelo olhar e tocar com as mãos o passado ainda sangrando, pulsando, querendo levantar das sepulturas para contar as “verdades verdadeiras”. De repente ouço e me espanto com as folhagens das catingueiras se abrindo em frêmito. Ouço passos, ouço sons vindos das entranhas das matas. Vozes inaudíveis, sussurros, bramidos. As aves carnicentas rondam pelos arredores. Cangaceiros e volantes estão por perto. Um pipoco, um disparo bem ao lado, um grito, um “corre, corre, fuja, fuja, ataca, ataca...”. Sangue espalhado, gemidos de dor. A pólvora sufoca os espaços catingueirentos. Mas como, se eles não estão mais ali, se as armas de guerra já se calaram? Nada disso. Cangaceiros, soldados volantes, coiteiros e coronéis, todos continuam vivos. E bem vivos. Por isso mesmo que tanto são procurados. E sempre são achados nos confins dos sertões.

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