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quarta-feira, 18 de julho de 2012

Os Assombros de Itiúba - Depoimento diversos - Parte VI

Por: Rubens Antonio

1931

Depoimento de Isabel, do Maté:
"Quando Lampião chegou no Maté foi com uma turma. Vinham montados e na carreira. Estavam sentados fora da casa do Teófilo e Piroca. Eles levantaram para correr e Lampião falou:
- Não corra! Senão eu atiro!
Perguntou ao Teófilo pelas montadas que tinha e ele respondeu:
- Só tenho umas é-é-é-guas.
Eles arremedaram Teófilo:
- Umas é-é-é-guas.
Lampião pediu água para beber a Joaquina, que estava mexendo uma comida no fogo, em uma cozinha que ficava fora da casa. Mas ela demorou para pegar a água, porque estava nervosa e trêmula. Mas ele achou que ela tinha colocado porcaria na água, e não bebeu. E jogou fora. Lampião perguntou a Joaquina o que tinha no fogo. E ela respondeu:
– Uma comida para uma doente.
Lampião arremedou-a e repetiu o que ela falou, pois Joaquina falava um pouco fanhosa.
A passagem dele no Maté já foi à noite. Ele já estava vindo da Varzinha e foi nessa passagem que ele entrou na casa de Mariinha e deu umas chibatadas nela. Dizem que ela também era gaga e quando Lampião lhe batia, ela dizia:
- Ba-ba-te, diabo!
O povo disse que ele já vinha do Umbuzeiro... Existia muita mentira. Uma época disseram que ele estava atacando Itiúba e estava uma guerra danada.
Diziam que Lampião não fazia muita perversidade. Perversos eram os seus cangaceiros. Há uma história que ele chegou em uma casa ai pra cima. Tinha alguém assobiando e Lampião colocou a pessoa para assobiar a noite inteira para os cangaceiros dançar. Quando amanheceu a pessoa estava com a boca inchada...
Em uma casa, para o lado da Pedra Vermelha, município de Cansanção, pediu para a mulher cozinhar umas galinhas para eles comer. Enquanto comiam, um dos cangaceiros reclamou que a comida estava sem sal. Lampião pediu à mulher que trouxesse um quilo de sal e fez o cabra comer todo.”

Depoimento de Pedro José de Oliveira, o Pedro Cajá:
"Nesse tempo, eu tinha catorze ou dezesseis anos...
Nesse dia, Lampião passou no Poço do Cachorro...
Eu ia subindo para a Cajá e o local onde eu me encontrava era alto.
E vi muitas pessoas montadas, outras não, ao redor da casa da Eleonor, no São Roque.
Não sabia o que estava acontecendo naquele momento... No outro dia, soube que Lampião esteve lá revirando a casa da Eleonor, procurando ouro e dinheiro. Mas não acharam nada e perderam uma palmatória com pregos, pois quem achou foi o Zé Lima, meu cunhado.
E o mesmo deu ela ao delegado Francisco Simões de Carvalho, avô do Augusto Castro.
O Agenor estava fazendo farinha em um lugar chamado Capoeira, na Fazenda do velho Tietre e, quando soube que Lampião estava nas redondezas, correram e deixou a farinha queimar..."

Depoimento de Gabriel de Souza, do Povoado de Varzinha:
"Dizem que Lampião passou por fora da Varzinha. Ele ia passar aqui, mas foi Deus que o rapaz que vinha guiando levou para outro lugar. Eu e meus pais estávamos no terreiro da casa. Eram dezoito horas. Era menino. Tinha mais ou menos oito anos, mas me lembro. Ouvi uns tiros nessa serra, perto da Varzinha. Tem gente que o viu. Passou na casa da Canuto Mariinha, onde deu umas chibatadas nela. Aconteceu muitas vezes de ter notícias dele. Quando a conversa saía que ele estava na região nós corríamos para uma rocinha e íamos nos esconder lá. Estávamos sempre assustados. A gente dormia debaixo do pé de juazeiro ou no pé do lajedo. Não acendíamos nem a luz do candeeiro. Falavam que ele andava em Jenipapo, Jabucunã. Em Jabucunã um rapaz tinha um bar e Lampião passou por lá para beber junto com seus cangaceiros. Começaram a beber e os cangaceiros queriam que o dono do bar bebesse. Mas ele não quis. E um dos bandidos disse:
- Agora beba! Se você não beber, você morre.
Mas Lampião pediu que deixasse o rapaz em paz e fez uma proposta para ele:
- Quer se juntar ao nosso bando?
– Não posso. Tenho uma velha mãe que cuido e sustento.
– Resolva, porque nos quinze dias eu volto.
Foram embora, mas o rapaz, com medo que lhes fizessem mal, foi a Monte Santo e comprou uma arma boa. Alguns dias se passaram e o rapaz ficou de tocaia. Quando o bando ia passando ele conheceu o bandido que queria matá-lo no bar. Mirou e atirou na cabeça. Começaram a atirar no rapaz e ele caiu em uma bagaceira e escondeu-se. Eles olharam por ali e falaram que o cara era ruim. A seguir montaram e foram embora. Quando o rapaz viu a cascalheira, foi conferir e viu um cara morto.”
Depoimento de Sebastião José dos Santos, de 82 anos, de Itiúba:
Lampião não passou aqui, mas Volta Seca e mais alguns cangaceiros passaram no Sítio dos Meios... Atravessaram o campo de bola e o pontilhão, mas não passaram em nenhuma casa. Eu era rapaz e cortava lenha para as máquinas. Meu sonho mesmo era entrar para a volante para matar Lampião. Tinha quinze anos e meu pai não deixou. É que, se eu morresse sem matar ninguém, São Pedro ia perguntar:
- Matou alguém?
Quando eu dissesse que não ele diria:
- Então, você não pode entrar aqui!
Quando Azulão e Volta Seca passaram por Jacurici, todos abandonaram suas casas e foram dormir na casa do finado Antônio Mendes, que ficava dentro da mata. Só quem não fugiu foi eu, papai, mamãe e meu irmão. Meu pai disse:
- Daqui ninguém sai. Se tiver que morrer, morremos em casa."

Depoimento de Ângelo Pereira:
"Lampião tinha me levado a força da Fazenda Urubu, por ser jovem e domador de animais bravos... E eu, mesmo sem ser cangaceiro, vivi no bando de Lampião seis meses e vi coisas de admirar...
Certa vez, ele dormiu numa fazenda onde hoje é povoado de Rômulo Campos. O casal tinha filhas lindas. Lampião, quando viu, pediu uma para o pai das moças... O pai respondeu que as filhas só sairiam de perto dele casadas. E Lampião respondeu que estava certo... Ele, então, pediu ao dono da casa que colocasse suas filhas em um quarto e armasse a rede na porta da camarinha. Caso algum de seus cangaceiros tivesse a intenção de ir até o quarto, ele mesmo, Lampião, tomaria as providências...
Mas o Rei do Cangaço só era valente porque vivia rodeado de cangaceiros... Era tão medroso que não entrou em Itiubinha... Por onde passou foi nas redondeza, saqueando as fazendas e surrando os donos... E ele fazia miséria...
Não foi nada por causa de trincheiras que ele não entrou... Lampião não entrou em Itiúba porque uma entrada segue para Juazeiro do Norte.. e ele tinha um profundo respeito a Padim Padre Cícero... E a do outro lado toca para o Monte Santo, e aí ele não entrou por ele admirar a Santa Cruz...
Ele era mesmo um homem perverso que tinha prazer em matar e roubar, mas, antes de entrar em qualquer cidade, ele acendia uma vela. Caso a vela apagasse ele não entrava, porque lá estavam os macacos à sua espera. Acendeu a vela aqui, que se apagou... Aí é que ele não entrou mesmo em Itiúba... E morreu mas não teve o prazer de entrar na “Itiubinha”, que é como ele chamava."

Depoimento de José Cícero de Freitas Silva:
"Na... Era Lampiônica... Itiúba viveu dias de medo, coragem, humor e outros tantos adjetivos... Tinha o medo daqueles que não tinham brio para defender a alcantilada Itiúba e, a qualquer anúncio da presença de Lampião nas redondezas, refugiavam-se nos píncaros das serras fugindo do temível bandoleiro...
Contam uma história sobre o Senhor João de Castro numa dessas aproximações...
Ele era dono de uma padaria... Encheu um saco de pães para levar na fuga... Só não percebeu que o saco estava furado... Procurando homiziar-se na Serra do Cruzeiro, deixou o caminho pontilhado de pães... Isso mostrava o caminho por onde tinha seguido.
O medo foi tanto que poucos foram os pães que chegaram ao alto da serra e os que caíram serviram de pasto a pássaros e formigas, pois coragem o mesmo não teve para voltar e recolher os pães perdidos...
Admiro a coragem daqueles que ficavam entrincheirados no bueiro da Santa Helena e do Riacho dos Cambecas...
A qualquer notícia, mesmo que pudesse ser inverídica, para lá se dirigiam para enfrentar e encurralar o facínora, fazendo com que o mesmo não entrasse na cidade onde o Capitão Aristides o esperava com outros valentes...
Coragem, ainda, sem igual era a da dona Mariquinhas que, enquanto viveu Lampião, ela não se desgrudava de um fuzil e um haió... que era um saco feito de fibra de caroá... e que ela deixava cheio de balas...
Desta destemida senhora, conta-se que, certa noite, estava a mesma dormindo quando ouviu o barulho de gravetos sendo quebrados. Achando que eram homens do bando de Lampião, levantando de arma em punho e saltando a janela já com a arma engatilhada, quase tira a vida do seu esposo que estava satisfazendo uma necessidade fisiológica no sossego de muro, que até hoje mantém as características da época."

Enviado pelo professor e pesquisador do cangaço:
Rubens Antonio

http://cangaconabahia.blogspot.com.br/2012/07/os-assombros-de-itiuba-depoimento.html

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