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domingo, 28 de setembro de 2014

TOTONHO, O COITEIRO DE LAMPIÃO

Por Rangel Alves da Costa*

Sem acrescentar ou tirar, apenas transcrevo:

“Eu sabia que a poliça tava pertim daqui. Simião avistou uns cabra da volante se apertano pru dento dos mato. Teve inté sorte o danado de num ter caído nas mão daqueles marvado. Se pega Simião era pa dizer o que ele num sabia. Mai o homi chegou aqui verde e tremeno feito cipó. Assim mermo foi correno avisar a Totonho. Sabia que ele era coitero do bando de Lampião. E assim seno os cangacero seria logo avisado da chegada dos macaco pelos arredor.

Totonho, o coitero, mai que acoitava sem quase ninguém saber, ficou num aperreio danado adespoi que ouviu o relato de Simião. Bem que podia arredar o pé no mermo instante e cortar a caatinga pa chegar até o coito e avisar Lampião. Mai corria o risco de colocar paia no fogo sem percisão. E num era coisa decente passar uma informação sem ter certeza da verança do causo. Entonce pensou e pensou e arresolveu que era mió pimero se asseverar da presença da volante da região. Num ia entrar nos matos pruque num era doido nem besta, mai cum certeza arguém na povoação sabia informar.

Entonce Totonho subiu no lombo de um jumentim esquipador e se danou rumo ao arruado. Morava pertim de Poço Redondo e em coisa de dez minuto já era tempo demais pa chegar. Mai o homi nem chegou ao lugar. Ia esquipando o jumentim quano lhe pareceu ouvir arguma coisa. Fez o jeguim parar de repente, desceu cuidadosamente e foi devagarzinho até detrás de um tufo de mato. Ali se escondeu e começou a oiá derredor. Seu medo maior naquele momento era seu jeguim ser avistado na estrada e acabar provando sua presença ali. Por isso que oiava ora pra estrada ora pa dento da mata. E de repente viu, do outo lado da estrada, uns vultos saindo de dento. Era a volante, a macacada, agora tinha certeza.


Num esperou tempo ruim diante do ocorrido. Deixou o jeguim do jeito que tava na estrada e se virou como pôde. Fui rompendo a mataria abaixadinho feito um preá, sem fazer quarque zoada, e quano viu que já num podia ser avistado se alevantou e começou a correr. E tanto correu que quano viu que já era tempo de parar pa descansar já nem sabia mai onde tava. Foi perciso percurá outa estrada pa puder saber adonde tava. Mais num tava longe do que tinha de fazer naquele momento, que era tomar força para chegar o mai depressa possive na gruta adonde o bando de Lampião tava acoitada.

Pensou e pensou como o mió a fazer e aprumou que ir até lá no lombo de animá ia acabar perdeno mai tempo, pois tinha lugá que só mermo as perna pa passar e seguir adiante. Oiou pru roló e dixe que daquela veiz ele se esfolava todim pela caminhada e tudo pontudo e ispinhento que ia encrontá adiante, inté chegar donde tava o Capitão. Seguiu, foi avançano pru riba de ispinho de todo jeito, pru cima de pedra, se esbagaçano todo nas ponta dos pau, se lanhando de cortar couro, passo a passo incrontano o perigo das jaraca e cascavé. Mai num podia parar, num podia nem se assentar pa descansar um tiquim. Se fizesse isso num tava cumprino seu crompomisso de coitero e colocano em risco a vida do bando e de seu amigo Lampião.

Foi seguino, seguino. Mai fartano coisa de uma légua pa chegar até adonde tava o Capitão, eis que ouviu outa zoada da molesta. Parecia gente vino naquela direção, e um monte de gente, aina que a zoada num fosse grande. Correu pa detrás dum lajedo e ficou todo quietim, escondidim. Quano pôde avistar teve a maior surpesa, poi era o bando do Capitão Virgulino. Mai o que pareceu coisa boa se tronou num aperreio danado. Não podia sair de veiz adonde tava pa que os cangaceiro num pensasse que ele era da volante. Coisa perigosa e difici de resovê, pensou Totonho. Entonce se alembrou duma coisa importante, dum siná acertado entre eles pa quano fosse chegano no coito. Entonce arremedou o canto dum passarim. Adespoi mai de dois. E bastou ouvir pa que a cangaceirada levantasse a caminhada. Foi o porpio Capitão que falou: Diga o seu nome e adespoi apareça daí.

Totonho feiz como mandado e adespoi já tava contano ao Capitão da presença da volante mai adiante. Adespoi disso só viu Lampião levantano o braço e a cangaceirada seguir em frente, agora pronta pa guerra. Totonho bem sabia o que ia acontecer mai na frente, poi tinha certeza que Lampião ia fazer uma supesa das boa na macada. Sentou numa peda pa pensar no que fazer dali em diante. E coisa de dez minuto depoi só ouviu o fogo comeno no centro. Era grito e bala zunido pa todo lado, num atropelo danado.

Totonho sabia que Lampião ia enxotar num rasto de sangue aquela macacada. E se tivesse matado tudo de uma só vez num tinha acuntecido o que acabou aconteceno. E daquela veiz, no Angico, Totonho num pôde dar nenhum aviso. A volante tava do lado de lá e a morte certa esperano do lado de cá”.

Poeta e cronista
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