*Rangel Alves da Costa
Por mais estranho que possa parecer, mas a saudade do cafezinho chega mesmo quando a gente não está muito distante dele. Basta olhar pra cozinha, pro fogão, pra garrafa ou xícara. Ou basta que o relógio biológico sinalize que já chegou de mais um cafezinho.
Mas não somente o cafezinho causa saudade. A gente se acostuma de tal modo ao que é nosso, ao que tem gosto de casa, que nada de lá fora parece ter sabor igual. A comida pode ser chique, de nome estrambólico, mas a nossa, mesmo aquela simples e de quase todo dia, sempre melhor.
É sempre assim: quando a gente está distante ou por momentos se afastou daquilo que tanto gosta, então a real valorização chega em forma de saudade grande, de desejo de ter novamente, de nunca mais se afastar. Acontece sempre comigo.
Quando viajo por alguns dias e mesmo estando entre amigos, mesmo sem um só instante que não haja alegria, festividade e compartilhamento, mesmo com os prazeres do conhecimento do novo e da sabedoria alcançada, ainda assim sempre bate uma saudade danada de casa.
Ora, quem ama nunca afasta do pensamento aquilo que tanto tem e tanto quer. É como se água mineral nunca matasse a sede, nunca suprisse a água com gosto de barro da moringa e do pote. É como se o café encorpado, perfumado e diferenciado na mistura, jamais pudesse ter melhor aroma e sabor que o café da cozinha de casa.
É como se a comida - por mais diversificada e bonita que seja - nunca consiga ter o mesmo gosto e prazer daquela tão conhecida e apreciada no dia a dia da vida. É como se a cama fosse dura demais, o banheiro estranho demais, a porta de entrar e sair não deixasse entrar nem sair do mesmo modo que aquela da costumeira moradia.
Um povo amigo em reencontro, as palavras novas surgindo de boca em boca, os abraços e os carinhos por todo lugar, os olhares que sorriem a cada encontro, mas mesmo assim sempre diferente do encontro com o conterrâneo, com o povo do meu lugar, com João, Zabé, Aristarco, Gerúsia...
Com aquela esquina, com aquela praça sem praça e sem banco de praça, com Dona Maria de Lenço na cabeça e Seu João Berdoega passando o cigarro de fumo nos beiços. Quanta estranheza há entre o vasto mundo e o mundo que é meu, o seu, o de cada um!
E se vai de avião, então dá vontade de ser passarinho e voejar ligeiro para o doce e afetuoso ninho. E se vai de carro, logo dá vontade de sair correndo e fazer o caminho de volta. E se vai pra ficar três ou quatro dias, então as horas e os segundos passam a ser contados na palma da mão. Por que assim acontece?
Não por que o local visitado seja ruim, não por que os amigos reencontrados não trouxessem alegria e satisfação, mas simplesmente pelo fato de que é na nossa casa, seja de tijolo e cimento ou no cipó e barro, que nos completamos de alma e coração.
É na nossa casa que sabemos onde estão espalhadas todas as nossas páginas de vida. E as juntamos para verdadeiramente ser o que somos. E as escrevemos para que os outros não rabisquem nem falseiem as linhas de nossa história.
E somente na nossa casa, que é a moradia e a terra, que é a porta e o chão, é que nos sentimos assim: livres, grandes, passarinhos, donos do nosso destino.
Escritor
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