Os cabarés,
pensões altas ou alegres – como eram chamados nos idos dos anos 1940 e 1950 –
eram locais de diversão garantida e bastante frequentados nas noites de
Fortaleza. A maioria ficava no centro da cidade, nas ruas Major Facundo,
Floriano Peixoto, Barão do Rio Branco e arredores, e funcionavam em antigos
casarões, nos quais as pensões ocupavam o andar superior. Esses
antigos casarões eram sobrados em que durante o dia, funcionavam
estabelecimentos comerciais no térreo, e à noite, o andar superior tornava-se
ponto de encontro dos amantes da diversão, da boemia, da música e da companhia
de belas mulheres.
Sobrado do
Barão da Ibiapaba, na esquina das ruas Major Facundo e Senador Alencar, onde,
nos altos, funcionou durante muitos anos, a famosa Pensão Ubirajara.
Quando o
General Cordeiro Neto foi eleito prefeito de Fortaleza (1959-1963), proibiu a
venda de bebidas no centro depois da sete da noite, bem como as orquestras
depois das dez. A rigorosa medida, foi respondida com o deslocamento dos
cabarés para os bairros. Os que permaneceram no centro passaram a adotar a
música eletrônica, as radiolas e as máquinas de ficha.
Prefeito
Manuel Cordeiro Neto (1959-1963)
Surgiram assim
as boates da periferia. A mais importante delas foi a Margô, casa de diversão
que se instalou primeiro na chamada “mata da Aldeota”, à altura da atual
Avenida Desembargador Moreira. Depois no bairro Cachoeirinha, que corresponde
hoje aos bairros São Gerardo e Parquelândia. Sua casa era frequentada pelo que
havia de melhor da representação da boemia da cidade (juristas, deputados,
comerciantes, radialistas, jornalistas). Era um lugar distinto, onde todos se
sentiam seguros e respeitados. Não havia roubo, ou violência ou palavrões.
O Cabaré da
Santa (Maria Santa Pereira) ficava no Benfica, na Rua Francisco Pinto, por trás
do Dispensário dos Pobres. Suas “meninas” vinham de outros Estados e eram muito
disputadas porque começaram a inovar as técnicas da prostituição de Fortaleza,
com práticas sexuais antes nunca vistas por estas plagas. As novidades sexuais
foram duramente condenadas. Como a cidade era pequena, a sociedade terminava
tomando conhecimento dos que praticavam “estranhezas” nos cabarés.
A famosa
Casa do Português também acolheu um cabaré: a Boate Portuguesa
A Casa de
Natália estava localizada na Avenida João Pessoa e o seu público era,
predominantemente, homens de meia-idade. A proprietária, conhecedora das
fantasias e dos fetiches, recrutava mulheres novas e as vestia como estudantes,
com fardas da Escola Normal e do Colégio da Imaculada Conceição. Ensaiava
gestos e modo de falar, imitando a voz infantil e as meninas usavam tranças.
Também na
Avenida João Pessoa funcionou na conhecida casa do Português, a boate
Portuguesa, de pouca duração. Era bem frequentada e fingia ser um ambiente
familiar. Apesar de ter seu próprio elenco de mulheres, os clientes podiam
chegar já acompanhados. As acompanhantes eram profissionais, as denominadas
“garotas de programa”.
A Gaguinha
também era famosa. A casa de Irinete Cabral ficava nas Damas ou Vila Damasco.
Seu apelido vinha naturalmente da deficiência da fala. A gagueira, porém, nunca
foi empecilho para o bom relacionamento com a clientela, do qual faziam parte
pessoas influentes da sociedade. Era mulher de muitos amigos. Os fregueses
tinham nela uma confidente, relatando seus problemas. Alguns vinham a tarde,
para beber uísque e conversar.
Quando a
Gaguinha começou a declinar, instalou-se a boate Oitenta. O nome se devia ao
número da casa, Rua Governador Sampaio, 80. Era uma casa de certo nível, com
luz negra, suítes e bom serviço de bar. As mulheres eram atraentes, bonitas e
já não tinham restrições ou tabus.
Já nos finais
dos anos 1960 e por toda a década de 1970 o melhor cabaré de Fortaleza era a
Casa da Leila, na Maraponga. Suas mulheres eram altas, elegantes, louras
naturais de olhos claros, provenientes do sul do país. Eram pessoas finas,
educadas, algumas se diziam universitárias e comentavam sobre política, música
popular e variedades culturais. Dentre elas havia uma mulata, belíssima,
chamada Mércia, que mostrava uma carteira de estudante de Ciências Sociais da
UFMG.
Até a década
de 60, o lugar hoje denominado Maraponga era uma região com muitos sítios
e pouca urbanização. Da década de 1970 até o fim dos anos 1980, a Maraponga
passou a ser local de casas de veraneio.
Leila fora a
mulher de maior sucesso na Oitenta. Ali ganhara bons e generosos amigos, o que
lhe permitira abrir sua própria casa. Casarão amplo, com alpendres, arcadas,
grande salão com dois ambientes, confortáveis sofás, mulheres com roupas habillès,
falando baixo, sorrindo. Educadíssimos também eram os garçons, todos de smoking,
servindo as bebidas em bandejas de prata. Um primor. Leila, a madame,
reproduziu a distinção de Margô, adaptando-se ao tempo, climatizando as suítes
que contavam com banheiros de mármore e torneiras niqueladas, além das camas
redondas, uma delas com o recurso da trepidação. O baronato de Fortaleza se
orgulhava de contar com uma casa de tão alto nível e quando aqui aportavam
cantores, jogadores famosos e artistas de TV, todos, invariavelmente, eram
levados à Leila.
Até o dia em
que começou a entrar em decadência. Envelhecida, foi abandonada pelos amantes
ricos e terminou por se apaixonar por um de seus garçons. O cabaré resvalou
rapidamente para o fim.
Os últimos
estertores dos velhos cabarés se deram nos anos 1970, com o Senadorzão, Barba
Azul e Motel 90. No centro instalou-se o Senadorzão, na Rua Senador Alencar. O
proprietário era um sujeito simpático, mas cheio de autoridade, mantendo tudo
sob controle.No centro, numa galeria que liga a Rua Senador Pompeu à Barão do
Rio Branco, montaram uma boate da pesada, o Barba Azul. Lá dentro, luz negra,
uísque falsificado e muitas brigas.
Extraído do
livro
“Sábado,
Estação de Viver – histórias da boemia cearense”,
do Poeta,
Escritor e Historiador cearense Juarez Leitão – (Todos os Direitos Reservados).
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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