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sábado, 9 de dezembro de 2017

GENTE DAS RUAS DE POMBAL: DÉCADAS DE 1960 E 1970 CÍCERO DE BEMBEM; UM MALANDRO QUE NÃO DEU CERTO

Por Jerdivan Nóbrega Araujo

Cícero de Bembem é um dos personagens mais folclórico de Pombal. Chego a sentir pena de quem não o conheceu, ou de quem não viveu a sua época. 

Ver Cícero de Bembem dançando com aquela espada de madeira nas mãos, com seu jeito todo particular de marcar os passos do grupo, parecia que estava em transe. Ouvi-lo assobiar, o que ele fazia como ninguém, ou tocando xaxado no sino da Igreja do Rosário, ele era um ritmista sem comparação, é algo impagável e que faz valer a nossa infância nas ruas de Pombal.

Cícero Morava no Beco da Cadeia, mas, na verdade ele passava mais tempo preso do que em sua própria casa. Qualquer desarrumação que acontecesse na cidade ele já era o primeiro suspeito a ser levado à velha cadeia para “averiguação”. Outras vezes era preso para curtir a cachaça, outras vezes por pequenos furtos, principalmente da sua especialidade, que era o furto de galinha.



A vez que Cícero passou mais tempo preso foi quando ele esfaqueou uma prostituta no Rói Couro: passou uns quinze dias detido e logo foi solto.

Eu estudava no João da Mata e passava horas conversando com os presos, entre estes Leônidas, Cícero de Bebem e “Chico das Casinhas”. (Para este ultimo, a gente catava palitos de picolé para ele confeccionar umas casinhas que vendíamos nas ruas para descolar o dinheiro do cinema. Ele namorava uma filha de Maria Antonieta).

Fiz esse registro para avivar a memória, mas, o assunto aqui é Cícero de Bembem, que na verdade era um malandro destes que nunca se dão bem. Um malandro que não deu certo. 

Não era chegado ao trabalho, mas, se virava vendendo os peixes que ele trazia de Coremas: andava nas ruas com uma enorme bacia na cabeça cheia de curimatãs ovadas. Quando a coisa apertava, ele roubava algumas galinhas para vender para a sua freguesia, que mesmo sabendo que eram roubadas as compravam.

Conta-se que ele cometeu a proeza de vender o mesmo peru por três vezes ao Dr. Nelson, promotor de justiça da cidade, que não pôde reclamar da compra, pois era do conhecimento geral a procedência das penosas vendidas por este nosso folclórico personagem. 

O fato aconteceu quando o ilustre promotor, que costumava receber presentes por seus serviços, o que é bastante comum nas cidades do interior, foi agraciado com um belo peru. 

Tendo conhecimento do fato, Cícero de Bembem, não contou conversa: pulou o muro do “dotô”, pegou o peru e foi vender exatamente ao seu dono. Este por sua vez sabia que o produto não era de boa procedência, dada a má fama do vendedor, no entanto, o preço era atraente demais para resistir.

— Cícero, onde você achou este peru? Perguntou.

— Trouxe do sítio, “dotô”. Pode confiar. O senhor acha que eu sou de vender peru roubado e ainda mais ao senhor? Este eu ganhei de uma senhora para quem prestei uns serviços.

— E o preço? Se for barato eu compro. Mas cuidado com que está fazendo. Inclusive eu já tenho outro lá dentro que é a cara desse aí.

— Todo peru é parecido, “Dotô” 

— Tá bem. Coloca no “garajau” lá em casa, e volte para pegar o dinheiro.

Cícero sabia que o doutor era muito distraído e não ia lembrar-se de avisar à esposa, sobre o peru. Não contou conversa: levou o animal para casa, voltou, pegou o dinheiro e efetuou a mesma operação por mais duas vezes. Alguns dias depois, pensando que tinha três perus na engorda, o doutor teve uma surpresa ao descobrir que havia mesmo era comprado o seu próprio peru, e por três vezes. 

Como eu falei, Cícero era um ritmista nato.

Era dele a função de badalar os bronzes das duas igrejas, portanto ele tinha passagem livre para subir aos campanários.

Os sinos badalavam em duas ocasiões: nos dias de missa, a cada meia hora que antecede a celebração, convidando os féis para rezar, ou quando morria alguém, num repicar melancólico, até que o cortejo chegasse ao Cemitério Nossa Senhora do Carmo, aonde Bico Doce e Zé Cabeção davam o veredicto final. São, portanto, sinais por demais conhecidos da população, pois era assim há mais de 200 anos. 

Mas, certa vez Cícero de bebem quebrou essa rotina. O malandro tomou umas canas, subiu no campanário da Igreja do Rosário e por mais de meia hora deu um show, tocando um gostoso maxixe, visto ouvido e aplaudido por todos os que aos poucos foram se aproximando para assistir mais uma presepada deste folclórico personagem pombalense.

Depois desse dia o Padre Sólon proibiu dele subir nos campanários.

No final de 1969 as "Lojas Paulistas" fez uma promoção de rádios, tendo em vista a Copa do Mundo de 1970. 

Os rádios a venda ficavam expostos na entrada da loja. Cícero de Bembem viu ali uma oportunidade de dinheiro fácil.

Entrou na loja, pegou um rádio colocou em baixo do braço e se encaminhou para o fundo, onde clientes e vendedores se acotovelavam na compra e venda dos rádios. 

Chegando ao fundo da loja ele procura uma vendedora e pergunta:

- moça, vocês tem pilhas para esse radio? 

A vendedora responde:

- não: o senhor vai encontrar na loja de seu Pio Caetano na rua o lado.

Ele agradece, pega a porta de saída a direita e vai embora com o rádio. 

Certamente todos que viveram em Pombal nas décadas de 1960 e 1970 têm uma presepada de Cícero de Bembem para contar: essas são as minhas.


Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzagueano José Romero de Araújo Cardoso

http://blogodmendesemendes.blogspot.com

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