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sexta-feira, 16 de março de 2012

A construção discursiva de personagens históricos

Por:Wescley Rodrigues
Mais uma vez vem a baila o livro do ex magistrado Pedro de Morais, intitulado “Lampião, o Mata Sete”, que afirma ter sido o “Rei do Cangaço” um homossexual que viveu um triângulo amoroso e uma relação de fachada com Maria Bonita e Luiz Pedro, seu lugar tenente. As opiniões a cerca da obra são acaloradas, uns criticam, outras tratam-na com ar jocoso, e ainda há aqueles que a demonizam na tentativa de criar uma barreira para que os leitores não tenham acesso a tal produção. A priori deixo claro que não estou aqui para fazer uma defesa do livro em questão, mas para propor um novo olhar que historicamente, sociologicamente e antropologicamente estamos esquecendo, ou não queremos tirar as nossas vendas do comodismo para vislumbrá-la.
Primeiramente é bom salientar que sou completamente contrário a qualquer forma de censura a livros, vivemos em uma sociedade e estado democrático de direito, na qual a liberdade de expressão é princípio elementar que depõe a favor da dignidade da pessoa humana. Só porque um livro vai contra os nossos princípios ou as ideias que temos como verdadeiras, isso não nos autoriza a censurá-lo, pois ao fazermos tal, não estaremos longe do que fez a Igreja Católica com a sua lista de livros proibidos, ou a ditadura militar brasileira que impediu a circulação de toda obra que atentasse contra os seus princípios distorcidos de sociedade.
Não li na integra a obra do referido escritor, haja vista diretamente não poder criticá-lo ou elogiá-lo, mas confesso que pretendo ler, ao contrário da repulsa que alguns amigos pesquisadores do cangaço estão tendo com a obra, pois acredito que só através de uma minuciosa leitura é que estarei gabaritado para fomentar e construir as minhas análises de forma consistente sobre o escrito.
Mas para não me alongar na ideia apresentada, trago ao foco uma questão importante, essa diz respeito à fabricação dos personagens históricos. Antes de Lampião e seus cabras serem protótipos do Nordeste ou da sua dita masculinidade, cabras machos, de fibras, eles são produtos e sujeitos históricos. Como sujeitos históricos são fabricados, construídos, mediante discursos e narrativas. Falo isso por não acreditar em uma verdade histórica, mas uma verossimilhança, uma interpretação autorizada pelos documentos de um passado que já foi, o qual não poderemos resgatá-lo, somente interpretá-lo, representá-lo, mediante os vestígios que chegam ao presente. Essa é uma concepção que atenta de frente contra a teoria positivista de história que ainda vigora na atualidade.
Por ser uma figura histórica que é ditos por um corpus escriturário, Lampião é essa figura que congrega discursos, representações. O livro do Pedro de Morais ajuda-nos a entender um pouco dessas facetas narrativas que os mitos em torno das figuras históricas constroem. Esses são discursos que trazem em si a marca de seu lugar de produção. Por isso, conclamo os amigos a lerem a obra “Lampião, O Mata Sete”, não como um livro de história no sentido positivista, mas, como diriam os teóricos da história francesa, uma vertente de resignificação de personagens históricos a partir de propagandas de épocas distintas, uma página de entendimento de como a fabricação de um mito envolve polêmica e opiniões nem sempre comprováveis, mas que vão tornando-se válidas a partir de sua resignificação simbólica e infiltramento no imaginário e cultura histórica. Tal fabricação de personagens se deu com Napoleão, Hitler, Jesus Cristo, Delmiro Gouveia, Antônio Conselheiro, Padre Cícero, e tantos outros personagens históricos.
Acredito na necessidade de se abri um espaço no Cariri Cangaço 2012 para se debater tais questões fazendo um paralelo com o livro abordado há pouco.
Prof. Ms. Wescley Rodrigues
Sócio da SBEC
Sousa - PB 
Extraído do blog: "Cariri Cangaço"

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