Seguidores

terça-feira, 28 de maio de 2019

A MISTERIOSA MAGIA QUE SENTIMOS PELOS TRENS

Por Alfredo Bonessi

Quando um trem vem chegando  na estação os presentes  param  para admira- lo em sinal de profundo respeito. Nas paradas mais afastadas dos centros urbanos tanto as  pessoas como os animais ficam imóveis, silenciosos, enquanto o trem desliza pesado sobre os trilhos  - aço rolando sobre aço, até a parada final, e um jato de vapor esguicha pela lateral dos cilindros em sinal de descanso e anunciando o final da longa e cansativa jornada.

Quando o trem vem surgindo ao longe,  resfolegando e jogando no ar cartuchos de fumaça, o silêncio   é quebrado  por uma trovoada de metais em atrito - esse som vai aumentando a medida que se aproxima de um vilarejo. Um apito forte provocado pelo escape do vapor do chaminé  da máquina alerta os presentes: saiam da frente!

Imagem da internet

Quando o trem está desfilando pelo meio do povoado sente- se um tremor de terra provocado pelo peso da carga a invadir o solo e se apossar das casas, fazendo estremecer os telhados, as portas, as janelas - dando a impressão que tudo vira abaixo; um certo temor, curiosidade e uma emoção inexplicável faz com que todos os presentes cheguem às  janelas e  a medida que ele vai se afastando, perdendo-se na curva, o silêncio e a rotina  retornam outra  vez  ao ambiente das casinhas enfileiradas ao redor da linha,  deixando sozinha    a estrada  de aço refletida aos raios do sol.

Ao longo da história sabe- se que o trem  substituiu  a carroça.  O jovem camponês Chrysler, Norte Americano de nascença, aprendeu a regular as válvulas da Maria fumaça vendo os mecânicos mais velhos executarem esse serviço. Desde então era chamado a  todos  os cantos dos EUA para executar essa difícil e complicada  tarefa. Se a regulagem na ficasse bem feita e bem ajustada a máquina não sairia domingão. Ainda muito novo  Chrysler montou em seu galpão o seu primeiro automóvel,  considerado   uma obra prima para a época. Tornou- se um dos maiores fabricantes de veículos dos EUA. Quis o destino que morre- se na flor da idade, mas seu legado nunca será esquecido.

O vagão do trem recebe um rígido controle de tráfego. Ele   é numerado e seu proprietário recebe por dia. No século XIX uma diária de um vagão nos EUA era de $ 2 (dois dólares) - tinha  empresário que possuía 1.836.000 mil vagões de trens.

Um vagão carregado sai da estação com uma carga para um determinado endereço.  Viaja atrelado ao comboio dos demais vagões - todos para os mais variados destinos. Em determinado lugar ele é desengatado da composição e engatado em outra, seguindo sempre para o endereço da descarga. Uma vez descarregado , pode ser novamente carregado e seguir  destino para um outro local. Desse local podera seguir para outro e assim sucessivamente, até encontrar uma carga que coincida com o seu lugar de origem, quando então, retorna ao ponto do início da viagem, mas  sempre bem assistido, debaixo de rigoroso controle e sob  rigorosa inspeção. Necessitando de reparos ficará  afastado da linha e passará por minuciosa manutenção - recuperado passa a trabalhar novamente.

No Brasil, até a  década de 70, o trem era o preferido a outros veículos  pela preço da passagem ser barata  e pelos incômodos que a estrada de chão causava  em quem se aventurasse a transitar com automóveis e caminhões  pelos atoleiros e buracos, principalmente nos dias de chuva.

Imagem da internet

Naquela época as viagens de trem eram  cansativas e muito demoradas. Em poucos minutos  dentro dos vagões a expectativa da viagem sumia por completo da imaginação dos viajantes,  e cedia seu  lugar ao enfado, ao olhar perdido dos viajantes pela paisagem distante, que desfilava rapidamente aos olhos de todos, muitos faziam  da janela de madeira do trem  um apoio para se debruçarem ou um travesseiro para encosto da cabeça cansada. 

O odor  de tabaco queimado saindo  dos cachimbos, dos charutos, dos cigarros de palha lambida,   misturados ao suor do corpo das pessoas  carregadas  de roupas, o cheiro enjoativo do perfume barato, tudo se misturava e deixava  o ar pesado e mal cheiroso.

O calor, o burburinho das conversas desinteressantes entre passageiros  desconhecidos - as tais prosa para matar o tempo, uns de frente aos outros, olho no olho, obrigava por educação a   cada ouvinte  ser educado, atencioso, e a fingir interessado no papo, na esperava paciente para chegar a sua vez para então entrar em cena no teatro da lorota, do ouvir dizer, das mentirinhas imaginadas, das piadas  sem graça muito em voga naquele tempo.

Imagem da internet


O cheiro forte do carvão que alimenta  a locomotiva, expelido na atmosfera em forma de gás   pelo forte empuxo da máquina, se espalhava para todos os lados, e a fuligem escura que saia da chaminé da máquina, envolvia  todo o comboio com uma tisna preta e carvoenta,  que invadia  o interior  dos vagões,sujava  o traje dos passageiros, cobria tetos e os bancos e se depositava no piso sujo que ficava coberto por um pó  cinzento.

Aos poucos os viajantes  iam se acostumando com o persistente  balanço para frente e para trás, e com o sacolejo intermitente de um lado para outro,  retimado entre o avanço e o recuo dos vagões, característico da viagem  de trem.

Comentava- se na ocasião que o trem corria saltitando de dormente em dormente,  sem pressa nenhuma para chegar ao término da viagem e que  isso era a  principal razão para as  viagens serem intermináveis.

Mas a demora nas viagens não era tanto pela velocidade da máquina, algo em torno de 70 km/ h, mas devido à burocracia e a logística deficiente ocorrida no embarque e no desembarque das pessoas, na carga e na descarga das mercadorias, pelas  inúmeras paragens ao longo da ferrovia.

Imagem da internet

Ao longo da história dos trens inúmeras vítimas sucumbiram sob o peso das máquinas: animais, pessoas colhidas de surpresa pelo comboio, veículos de passageiros, caminhões de carga, todos esmagados por falta de atenção aos avisos nos cruzamentos ou um por descuido qualquer e  foram pegos em cima dos trilhos, sem contar os inúmeros casos de suicídios-  pois em  lance de completo desvario pessoas com a saúde abalada ou por causa de dívidas impagáveis imaginaram  que a solução para  seus problemas seria se jogar na frente de um trem.

Nos dias atuais sempre se encontra  alguma noticia estampada na primeira página dos  jornais envolvendo trens,   como essa história um tanto macabra que li na semana passada: um casal de namorados após ficarem noivos foram  comemorar o noivado em  uma casa de show. Festejaram felizes até às últimas horas da madrugada. Nas primeiras horas do dia foram caminhando para casa e  cansados se deitaram abraçados no meio dos trilhos. Adormeceram e o trem passou por cima deles, matando a ambos.

O trem também serviu de motivo para rebeliões sangrentas como foi a revolta do Contestado - uma disputa de terras  entre Paraná e Santa Catarina que imolou milhares de vítimas, que foram assassinadas a bala, a fogo, muitas foram degoladas, enforcadas e outras   fuziladas.

A questão explodiu  quando a ferrovia São Paulo - Rio Grande  foi inaugurada e por decisão do poder central 30 metros de terras  de ambos os lados do seu traçado passaram a pertencer a estrada de ferro, e os  proprietários não foram indenizados. Isso provocou um descontentamento entre eles. A insatisfação geral se acirrou a tal ponto que o ódio substituiu a razão e o bom senso e grupos armados resolveram agir e fazer justiça por conta própria e os assassinatos em série de pessoas inocentes começaram em ambos os lados.

Foi preciso a intervenção do Exército Brasileiro na contenda  e para acalmar os ânimos dos beligerantes foi designado o Marechal Rondon - o homem das virtudes e da paz, que com boas maneiras pôs fim ao conflito.


O tempo passou e uma Nova Era nos transportes  tomou conta de todos os caminhos. Veículos modernos, novas tecnologias, novos traçados, estradas duplicadas, novas encomendas, novas formas de negócio e um serviço de Correios veloz,  moderno e eficiente fez com  os empresários e comerciantes, na ponta do lápis, chegassem  a  conclusão  que as ferrovias não davam lucros e os trens de passageiros foram encostados, abandonados pelas antigas estações e hoje se transformaram em peças de museus.

Mas a  paixão inexplicável pelos trens ainda continua, doendo nos corações das pessoas pela saudade dos trens , mesmo nos corações daquelas  pessoas que nunca andaram aos sacolejos com eles. Bonessi

Enviado pelo pesquisador do cangaço e capitão do exército Jorge Alfredo Bonessi.

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário