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segunda-feira, 15 de julho de 2019

FOTOS DA PRISÃO DE ANTÔNIO SILVINO

Por Rostand Medeiros
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A prisão de Antônio Silvio em 1914
O aprisionamento de Lampião não se me afigura impossível. Nada importa diga ele que prefere a morte. Antônio Silvino também o dizia, mas, apenas se viu baleado, foi o primeiro em fazer questão de mansamente se entregar à justiça. Restabelecido ulteriormente, voltaram-lhe no presídio os ímpetos brutais, como na manhã em que, entre descomposturas do calão mais vil, sacudiu um pão na cara de um desembargador.
Antonio Silvino preso.
Antônio Silvino preso.
Quando a captura de Lampião parece a tanta gente sonho irrealizável, vem a propósito recordar como se deu a de seu terrível predecessor.
O que desgraçou Antônio Silvino foi a perseguição sem tréguas que lhe moveu uma de suas vítimas mais humildes. Bem diz o povo que “não há inimigo pequeno” e que “mutuca é que tira boi do mato”…
Sargento Alvino, promovido a alferes após a captura de Antonio Silvino
Sargento Alvino, promovido a alferes após a captura de Antonio Silvino
José Alvino Correia de Queiroz era obscuro comerciante no sertão de Pernambuco, quando Antônio Silvino lhe saqueou o pequeno estabelecimento. Reduzido à miséria, jurou vingar-se e entrou a polícia daquele Estado. Acreditaram nos seus propósitos e fizeram-no sargento.
Inteirado de que Silvino transitaria por certa faixa do município de Taquaritinga, o Sargento Alvino buscou informações de João Vicente e Joaquim Pedro, moradores naquelas paragens. Ambos negaram a pés juntos ter qualquer conhecimento a respeito. Mas, tão jeitosamente o miliciano conduziu as investigações, que a esposa de João Vicente o orientou:
– Quando o Sr. chegar à casa de nosso vizinho, o Joaquim Pedro, e encontrar as mulheres torrando galinhas ou fazendo comedoria de sobra, pode apertar o pessoal que o “capitão” Antônio Silvino está escondido perto, no mato…
O oficial Theophanes Ferraz Torres, comandante da volante que capturou Silvino. Valente e destemido, seria um grande perseguidor de Lampião.
O oficial Theophanes Ferraz Torres, comandante da volante que capturou Silvino. Valente e destemido, seria um grande perseguidor de Lampião.
No dia esperado, 27 de novembro de 1914, os policiais, sob o comando do Alferes Teófanes Torres e do Sargento José Alvino, estavam no local referido, de nome Lagoa Laje.
Assim que penetrou na residência de Joaquim Pedro, o Sargento Alvino se encaminhou diretamente para a cozinha, atrás de cuja porta se lhe deparou pendurada uma banda de ovelha. E viu chegar desconfiado, pelo quintal, um rapazola com um tabuleiro à cabeça, cheio de tigelas, colheres e pratos. Interrogado, o recém-vindo explicou, titubeante, que havia ido deixar comida a uns “trabalhadores”, num roçado.
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Concomitantemente, o Alferes Teófanes submetia Joaquim Pedro a interrogatório, e este negava que soubesse do paradeiro de Silvino.
Aparece o sargento e, depois de falar na ovelha morta e de mostrar o tabuleiro com os restos de comida, pede permissão para forçar o velho sertanejo a não continuar mentindo. Ato contínuo, tranca-lhe, numa alcova, a mulher e os filhos e ordena que os soldados desembainhem os sabres.
Nos antigos jornais e revista por mim pesquisados, esta foto consta como sendo a força policial que lutou e capturou Antonio Silvino, mas muitos pesquisadores apontam como sendo o próprio bando de Antonio Silvino.
Nos antigos jornais e revista por mim pesquisados, esta foto consta como sendo a força policial que lutou e capturou Antonio Silvino, mas muitos pesquisadores apontam como sendo o próprio bando de Antonio Silvino.
Nesse momento, mais nervosa, uma filha do ameaçado pede, da alcova:
– Meu pai, por caridade, descubra logo!
Joaquim Pedro roga que não lhe batam e justifica-se, alegando que logo não disse a verdade por temer a vingança de Silvino, no caso de a polícia o não prender ou matar. E confessa que o celerado está escondido não longe dali.
Eram cinco horas da tarde e urgia assaltar os cangaceiros, antes que a noite sobreviesse.
Também nos jornais de época esta mulher foi apresentada como Antônia de Arruda, amante de Silvino.
Também nos jornais de época esta mulher foi apresentada como Antônia de Arruda, amante de Silvino.
Sob as ameaças de ser liquidado, se desse o menor sinal aos bandidos, Joaquim Pedro vai mostrar o esconderijo deles. Com todas as precauções imagináveis, a tropa se aproxima da malta criminosa.
Antônio Silvino estava deitado numa pedra, sobre a qual se debruçava copada oiticica. Perto, divertiam-se alguns de seus cabras, a jogar um sete-e-meio. Ao ouvir a primeira descarga, Silvino gritou, motejante:
Ferimentos de Antonio Silvino após a sua captura.
Ferimentos de Antônio Silvino após a sua captura.
– Espera aí, rapaziada! Deixem, ao menos, os menino acabar esta mão!
Mas o fogo irrompeu violento e sem intermitências, dos dois lados.
Com o cair da noite, o tiroteio deixou de ser correspondido. O Alferes Teófanes e o Sargento Alvino acreditaram que Silvino tivesse fugido. Suspeitando, todavia, que ele se quisesse vingar de Joaquim Pedro, foram entrincheirar-se na casa deste.
Antonio Silvino já com o uniforme da prisão.
Antônio Silvino já com o uniforme da prisão.
Coisa bem diversa se passava. Silvino fora atingido por uma bala nas espáduas e o seu companheiro Joaquim Moura tivera quebrada uma perna. Os demais cangaceiros se embrenharam, desorientados, na caatinga, favorecidos pelo negrume da noite.
Estando a perder muito sangue, Silvino convidou Joaquim Moura a se entregarem, mas este repelira o convite e, depois de dizer que macaco do Governo não tinha o gosto de botar-lhe as mãos em riba, ele vivo, suicidou-se com um tiro na cabeça.
Outra foto do oficial Ferraz.
Outra foto do oficial Ferraz.
Impressionado ainda mais com o trágico fim do último assecla que lhe restava, Silvino despojou-se das armas e arrastou-se para a casa da mulher que ele ignorava tivesse sido quem o denunciara. O marido dela, João Vicente, a estava censurando por sua leviandade, persuadido de que Silvino, sabedor da denúncia, lhes não perdoaria.
De repente, batem à porta. Quando, de fora, uma voz anuncia que quem bate é Antônio Silvino, João Vicente encomenda a alma a Deus, convicto de que vai morrer. É sua mulher quem se afoita a atender ao chamamento.
Aqui outra imagem do sargento Alvino.
Aqui outra imagem do sargento Alvino.
Ao se abrir a porta, aparece, à luz da lamparina, o vulto do grande salteador. Quase desfalecido e com as vestes rubras de sangue, Silvino está escorado no portal.
– Capitão, que horror é este?
– Mataram-me… arqueja aquele que, acovardado, começava a expiar crimes sem conta.
Conduzido a uma rede, ele pede que chamem a polícia. Vai alguém a Taquaritinga, mas não encontra lá os soldados. Na confusão em que todos se viam, ninguém a princípio se apercebeu de que os policiais poderiam estar pernoitando na fazenda de Joaquim Pedro. À mulher de João Vicente ocorre agora essa possibilidade. Despacham para ali o portador. Quando este bate à porta de Joaquim Pedro, os soldados aperram as armas, crentes de que é Silvino quem chega. Aberta a muito custo uma janela, o mensageiro dá contas de sua incumbência: vem avisar que Antônio Silvino, sozinho, desarmado e gravemente ferido, está em casa de João Vicente e quer entregar-se à prisão.
Expectativa para a chegada do famoso bandoleiro nordestino na Casa de Detenção de Recife.
Expectativa para a chegada do famoso bandoleiro nordestino na Casa de Detenção de Recife.
O Alferes Teófanes suspeita que se trate duma cilada e opina que se aguarde o raiar do dia. Tanto insiste, porém, o Sargento Alvino que, afinal, o seu comandante se dispõe a ir ver Silvino. Ainda assim, o recadista vai seguro pelos cós e advertido de que receberá uma punhalada, ao primeiro tiro com que a tropa seja surpreendida.
Cercada com cautelas a morada de João Vicente, houve grande alegria, quando se patenteou aos olhos de seus perseguidores a mísera situação daquele que se gabava de que, embora sem saber ler, governava todo o sertão! O Sargento Alvino parecia o mais contente. Exigiu que se não fizesse o menor mal a Antônio Silvino e saiu, pelos matos, a cortar umas folhas de quixabeira para lhe lavar as feridas.
Fora destronado o Átila bronco que, durante dois decênios, apavorara a gente matuta do meio-norte e assoalhava não ser passarinho que morasse entre grades… Por trinta anos ia se fechar atrás dele o portão da Penitenciária de Recife!
Multidão a frente da Estação Central do Recife na chegada do famoso cangaceiro.
Multidão a frente da Estação Central do Recife na chegada do famoso cangaceiro.
Foi à tenacidade do Sargento Alvino, à sua argúcia e vontade firme de vingança que se deveu a prisão de Antônio Silvino. Forçoso é, porém, reconhecer que colaborou inestimavelmente nisso a indiscrição duma mulher.
Acontecerá o mesmo, algum dia, a Lampião? Até na ruína dos cangaceiros terá aplicabilidade o cherchez la femme.
Texto acima é do Cearense Leonardo Mota, inserido no seu livro “No tempo de Lampião” e publicado pela Of. Industrial Gráfica, do Rio de Janeiro, em 1931. Esta reprodução é da segunda edição, de 1967. Leonado Mota era cearense da cidade de Pedra Branca, nasceu em 1891 e faleceu em 1948. Estudou a fundo o sertão nordestino, onde descreveu vários aspectos da região em obras memoráveis. 
Antes de Lampião, Antônio Silvino era o cangaceiro mais famoso e seu apelido mais conhecido foi “Rifle de Ouro”. Nascido no dia 2 de dezembro de 1875, em Afogados da Ingazeira, Manoel Batista de Morais entrou para a história como Antonio Silvino. Durante 16 anos, driblou a polícia, praticou saques e assassinou inimigos, mas era tratado pelos poetas populares como um “herói” por respeitar as famílias. A invencibilidade de Silvino terminou no dia 27 de novembro de 1914, quando ocorreu o seu último tiroteio com a polícia. Atingido no pulmão direito, conseguiu se refugiar na casa de um amigo e disse que ia se entregar. Da cadeia de Taquaritinga seguiu, dentro de uma rede, até a estação ferroviária de Caruaru, onde um trem especial da Great Western o levou para o Recife. Uma multidão o aguardava na Casa de Detenção, atual Casa da Cultura. Antonio Silvino tornou-se o detento número 1.122, condenado a 239 anos e oito meses de prisão. Em 4 de fevereiro de 1937, depois de vinte e três anos, dois meses e 18 dias de reclusão, foi indultado pelo presidente Getúlio Vargas. O ex-rei do cangaço morreu em 30 de julho de 1944, em Campina Grande, na casa de uma prima.
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